Túnel no Rodoanel dá prejuízo de R$ 39 mi

24/03/2016 07:18 - O Estado de SP

SÃO PAULO - Um túnel que desabou há um ano e três meses nas obras do Trecho Norte do Rodoanel, em Guarulhos, causou prejuízo de R$ 39 milhões e é um dos motivos do atraso na conclusão da última alça do anel viário da Grande São Paulo, que deveria ser entregue no mês passado, mas foi adiada para março de 2018. 

Agora, a Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa), empresa controlada pelo governo do Estado, decidiu demolir o túnel vizinho, parcialmente construído, para destravar essa frente da obra e retomar a construção. O custo dessa operação, que ainda não tem prazo para começar, está estimado em R$ 45 milhões pela estatal. 

A Dersa afirma que esses custos serão arcados pelo consórcio responsável pela construção desse trecho no lote 5 (Construcap/Copasa), que ainda negocia a indenização com a sua seguradora. “Elas (empreiteiras) vão me devolver a obra na condição que estaria se o túnel não tivesse entrado em colapso”, afirmou o diretor de engenharia da Dersa, Pedro da Silva.

As obras do Rodoanel Norte são alvo de investigação da Polícia Federal por suposto superfaturamento nos serviços de terraplenagem para beneficiar empreiteiras. A Dersa nega.

Queda. O túnel, que fica no bairro Taboão, próximo do Aeroporto de Cumbica, tinha 143 metros escavados quando desabou, no fim da tarde de 6 de dezembro de 2014. Não houve vítimas. A causa da queda ainda é investigada pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), contratado pela Dersa no ano passado por R$ 3,6 milhões.

Segundo a Dersa, a solução encontrada foi remover totalmente os escombros da estrutura que caiu e destruir os 100 metros do túnel que ficou condenado por causa do acidente para fazer pistas a céu aberto no trecho atingido e iniciar uma nova passagem subterrânea 150 metros à frente. “Nós tínhamos várias alternativas. Essa foi a que se mostrou mais viável do ponto de vista técnico e econômico”, explicou Silva.

O IPT afirma que terá de aguardar o término da escavação do túnel soterrado para colher material necessário para conseguir emitir um laudo final sobre a causa do desabamento. “Essa etapa do testemunho é essencial para ficar clara quais são as causas do acidente. Sem isso a gente não consegue fechar”, disse o pesquisador José Maria de Camargo Barros.


Estrutura. Os dois túneis, um para cada sentido da via, teriam 1.010 metros de extensão e custariam R$ 198 milhões. A estimativa é de que o novo serviço demore quatro meses para ser executado após a desapropriação de uma nova área que terá de ser utilizada para a obra. De acordo com Silva, isso não tem data para começar.

Segundo operários que estavam no local no dia do acidente, a estrutura apresentou uma trinca por volta das 6 horas da manhã e, mesmo com um reparo de concreto, ruiu por volta das 18 horas, cerca de 50 minutos após os funcionários abandonarem o local. 

A estrutura condenada fica no lote 5 da obra e é um dos sete túneis duplos previstos ao longo dos 47,6 km do Rodoanel Norte. Ela fica cerca de 20 km distante do túnel visitado por Alckmin no dia 17 de fevereiro, no lote 2, no Jardim Peri, zona norte da capital. Na ocasião, o governador disse que já havia executado 53,4% de toda obra, que vai interligar o Trecho Oeste, a partir da Avenida Raimundo Pereira de Magalhães, em Pirituba, zona oeste da capital, e o Trecho Leste, na Rodovia Presidente Dutra.

Desapropriações. Além do acidente, outro entrave que tem atrasado a execução do Trecho Norte são as desapropriações necessárias para a construção do viário. Embora os contratos previssem a conclusão da obra em fevereiro, nenhum dos 6 lotes tem 100% das áreas necessárias liberadas. 

Segundo Silva, o lote 6, em Guarulhos, é o mais atrasado - ainda falta desapropriar 40% dos terenos. As contratações foram prorrogadas até maio, quando a Dersa deve reajustar o valor dos contratos após pedido de reequilíbrio econômico-financeiro feito pelos consórcios nos seis lotes.

Vizinha diz que obra secou mina d’água em sua casa

A construção do Rodoanel Norte mudou a paisagem e a rotina da cozinheira Maria do Carmo Silva, de 60 anos. Vizinha do túnel que desabou, em Guarulhos, ela conta que a obra secou a mina de água e levou lama para o lago da chácara onde mora. “Eles puxaram toda a água das nascentes para a obra e me deixaram sem nada.” Ela contou que, por dois anos, a Dersa forneceu água no caminhão-pipa, mas o serviço foi suspenso há nove meses. Desde então, capta água da chuva ou do próprio sistema de drenagem da obra. Segundo a Dersa, um laudo técnico concluiu que a obra “não teve influência no rebaixamento do nível da água” na casa e que o problema pode ser efeito da seca.

Nova testemunha confirma fraude na obra do Rodoanel à PF

Suspeita é que aumento de R$ 170 milhões com terraplenagem teria sido autorizado para beneficiar empreiteiras

FABIO LEITE

SÃO PAULO - Uma segunda testemunha que também trabalhou na empresa Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa) confirmou, em depoimento à Polícia Federal, as suspeitas de superfaturamento nas obras do Trecho Norte do Rodoanel denunciadas por um ex-funcionário da estatal controlada pelo governo Geraldo Alckmin (PSDB).

Nesta quarta-feira, o Estado revelou que investigadores da Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros (Delefin), braço da PF especializado no combate a desvio de recursos públicos, apuram se o aumento de ao menos R$ 170 milhões nos custos de terraplenagem da construção foi autorizado pela Dersa em setembro de 2015 para beneficiar as empreiteiras contratadas para construir o Rodoanel Norte.

A Dersa afirma que “não tem conhecimento do inquérito policial” e nega qualquer favorecimento às construtoras. A estatal afirma que teve de incluir novos serviços nessa etapa da construção por questões geológicas, por causa dos riscos de impacto em moradias do entorno, além de grandes deslocamentos de terra que não estavam previstos.

Segundo o delator, os custos com terraplenagem subiram mais de R$ 420 milhões depois dos aditivos, um acréscimo de 99,6% em relação aos valores previstos nos contratos dos seis lotes da obra, assinados em 2013 no valor total de R$ 3,9 bilhões. A Dersa rebate dizendo que o aumento real de custo nesse serviço foi de 40,4%, o equivalente a R$ 170 milhões.

O presidente da estatal, Laurence Casagrande, afirma que duas auditorias internas foram feitas e não constataram nenhuma das irregularidades apontadas pelo ex-funcionário que denunciou o suposto desvio de recursos do Rodoanel à PF. Segundo ele, um pedido de investigação foi encaminhado em fevereiro para a Corregedoria-Geral da Administração (CGA), que apura o caso.

O Ministério Público Federal (MPF) também instaurou um procedimento preparatório para apurar possíveis crimes na obra. A procuradora Anamara Osório Silva já requisitou à Dersa todos os contratos, projetos, aditivos e medições de serviços e o edital da obra.