POLÊMICA

Livro de campineiros vasculha a arte secreta de Michelangelo

Órgãos internos aparecem nos afrescos pintados por artista italiano no Vaticano

Rogério Verzignasse
18/01/2015 às 06:02.
Atualizado em 23/04/2022 às 20:43
Livro levanta polêmica sobre o artista italiano e autor do afresco na Capela Sistina, no Vaticano ( Reprodução)

Livro levanta polêmica sobre o artista italiano e autor do afresco na Capela Sistina, no Vaticano ( Reprodução)

A obra já teve quatro edições publicadas, e não para de entusiasmar de leitores. A Arte Secreta de Michelangelo, escrita há uma década por um médico e um professor universitário radicados em Campinas, disseca a arte do grande artista italiano que, ao pintar a Capela Sistina, reproduziu — conscientemente ou não — formas anatômicas humanas. E não só as visíveis. Órgãos internos, como rins, coração, pulmões e tímpanos, aparecem claros, detalhados, nos quadros que representam a criação do homem e do planeta. E o mais incrível é que os detalhes foram desenhados em uma época distante, quando a medicina não contava com os recursos tecnológicos de hoje. Muito antes do raio X, as pinceladas do mestre desenharam artérias, vasos, ossos, tendões, canais. A pesquisa paciente das imagens, feita ao longo de décadas por pesquisadores do mundo inteiro, faz revelações que impressionam até os leitores mais céticos. Que tipo de inspiração moveu aqueles pincéis? O jornalista Heródoto Barbeiro, autor do prefácio da obra, afirma que Michelangelo Buonarroti deixou atrás de si os enigmas que hoje são estudados por seus admiradores. Para o médico Gilson Barreto, um dos autores, o livro traz o gênio de um artista-cientista, que até então não se conhecia. A seu ver, a ligação do pintor florentino com a medicina foi reflexo da efervescência cultural e científica do Renascimento. A prática da dissecação virou febre no final do século 15, e exerceu influência decisiva sobre a arte que ele então produzia. No texto introdutório à obra, a professora de história Tereza Aline Pereira de Queiroz, da Universidade de São Paulo (USP), diz que Michelangelo transitava por muitos tipos de conhecimento. A anatomia era um deles. O pintor “dissecava cadáveres”, desenhava tudo que via na complexidade das formas. Transportar essa experiência para a Sistina seria natural. Mas ele o fez de maneira velada, como alguém que modestamente não revela sua profissão quando se apresenta. “As formas se camuflam. Acreditamos no que vemos? Compreendemos o que vemos? Cada um dirá por si”, resumiu.   Imagens A mais famosa associação citada no livro (já divulgada por outros autores no passado), está no Senhor cria Adão, tocando com o seu indicador o homem que nascia. Envolvido por anjos, Deus está no centro de uma figura que representa fielmente partes do cérebro. A coxa direita do Senhor é associada ao tálamo; a coxa esquerda é o corpo caloso; o véu verde contorcido na parte inferior é a reprodução exata da artéria vertebral. O quadro, para os estudiosos, representaria que o Pai cede o intelecto a Adão. Mas a publicação vasculha outras pinturas importantes do artista. Em A Criação de Eva, o pintor está envolvido em um manto que forma o desenho do pulmão esquerdo. O mais impressionante, na obra, é que Adão aparece repousando ao lado de um tronco. O galho reproduz o segmento trifurcado da árvore brônquica.No quadro que retratou A Criação do Sol e da Lua, há uma representação do Criador de costas, em pleno voo, com o dorso ligeiramente levantado. Os glúteos, as saliências formadas pelo manto e os calcanhares formam o desenho exato da base do encéfalo, onde aparecem o corpo mamilar, a hipófise, os nervos ópticos e a artéria cerebral anterior. E os exemplos se esparramam pelas 224 páginas. Os autoresGilson Barreto é médico formado pela Universidade Estadual de São Paulo, especialista em cirurgias, e se tornou com o tempo coordenador do Serviço de Cirurgia do Hospital Municipal de Paulínia. É um apaixonado pela pintura pela arquitetura. Marcelo Ganzarolli de Oliveira, mestre em química e doutor em ciências, fez sua pós-graduação na Inglaterra e fez carreira como professor universitário na Unicamp.    

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