• Fabiana Pires
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A arena dos jogos: indutora do desenvolvimento em uma das regiões mais carentes de Londres (Foto: Getty Images)

A arena dos jogos: indutora do desenvolvimento em uma das regiões mais carentes de Londres (Foto: Getty Images)

Stratford está bastante
diferente desde que o Parque Olímpico de Londres foi construído. O antigo bairro industrial, conhecido por seus galpões de fábricas abandonados e paisagens cinzentas, era uma das regiões mais pobres e carentes da Europa quando o seu projeto de revitalização foi apresentado, em 2008, pela Aecom (Architectural, Engineering & Planning). O plano da empresa de arquitetura e engenharia era simples: construir o centro dos Jogos Olímpicos de Londres de 2012 ali, na desvalorizada região de East London, para melhorar a qualidade de vida local. A ordem era não deixar que os benefícios trazidos pela Olimpíada fossem embora quando ela acabasse.

Segundo o carioca Marcelo Tavares, gerente de esporte e infraestrutura da UK Trade (órgão que fomenta negócios entre Brasil e Reino Unido), a ideia, desde o início, era transformar os jogos em um mecanismo de mudança social, capaz de reduzir as desigualdades entre as Regiões Oeste e Leste. A primeira abrange todos os cartões-postais da capital britânica, com o Palácio de Buckingham, as Casas do Parlamento, a residência do primeiro-ministro e o Big Ben, o famoso sino da Abadia de Westminster. Para o East London, sobraram as fábricas e indústrias que, durante muito tempo, permitiram ao outro lado manter a sua pompa.

Apesar de não ser mais uma zona industrial, o leste londrino ainda guarda muitos estereótipos de sua antiga imagem, o que deve mudar agora que a região abriga o mais novo cartão-postal da cidade. O local passou por uma ampla reforma: terrenos que estavam contaminados por resíduos tóxicos deixados por empresas desde o século 19 foram saneados; os galpões abandonados serviram para abrigar as novas estruturas olímpicas e o sistema de transporte da região – um dos mais precários da cidade – foi completamente reformulado. A estação de trem, por exemplo, agora leva os usuários até o centro de Londres – há ainda uma conexão com a EuroStar, a linha que liga a capital britânica a Paris. E como uma coisa puxa outra, as construtoras de shop­ping centers passaram a olhar com mais carinho para Stratford. O grupo australiano Westfield inaugurou na região, em setembro do ano passado, o maior shopping do continente. O empreendimento gerou cerca de 7 mil empregos e a projeção é de que circulem 20 milhões de pessoas todos os anos pelo local. 

ALÉM DE ÚTIL,BONITO  um cartão-postal para stratford  O Parque Olímpico  (1)  se transformará no maior parque urbano construído nos últimos cem anos. Com mais de cem hectares,  o complexo possui, além das construções, oito quilômetros de hidrovias (2). A (Foto: Getty Images)

ALÉM DE ÚTIL,BONITO um cartão-postal para stratford O Parque Olímpico (1) se transformará no maior parque urbano construído nos últimos cem anos. Com mais de cem hectares, o complexo possui, além das construções, oito quilômetros de hidrovias (2). A arena de Polo Aquático (3) será desativada após a Olimpíada (Foto: Getty Images)

Dados do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Londres revelam que, de cada libra gasta nas construções para o evento (o orçamento total foi de 9,3 bilhões de libras, ou R$ 26,6 bilhões), 75 centavos foram investidos na melhora da qualidade de vida da região. Toda a estrutura do Parque Olímpico, por exemplo, foi pensada de maneira que pudesse ser usada pela comunidade local. Aquilo que era necessário para os jogos, mas não servia como legado, ganhou o status de obra temporária. O Comitê não queria criar “elefantes brancos”. Neste sentido, o exemplo a não ser seguido era Pequim. Para sediar a Olimpíada de 2008, os chineses construíram o belíssimo Ninho do Pássaro, que serviu de palco para as cerimônias de abertura e encerramento do evento. Custou US$ 423 milhões e agora serve apenas como ponto turístico. 

Em Londres, as arenas de basquete, hóquei e polo aquático serão desmontadas após os jogos para abastecer ginásios e centros esportivos da cidade. Já as estruturas permanentes farão parte do processo de revitalização do East London. O prédio que receberá a imprensa para os jogos será transformado em um edifício comercial no futuro, e as mais de 2,8 mil casas construídas para abrigar os atletas serão vendidas para a população. O próprio Parque Olímpico se transformará em um parque urbano – o maior da Europa, segundo a prefeitura londrina. “Londres já tem uma bela estrutura esportiva. Para os Jogos Olímpicos não seria necessária a construção de quase nada. O intuito foi realmente criar algo que pudesse ajudar a cidade”, diz Tavares.

Uma usina especial, movida a gás e biomassa, proverá energia para o Parque Olímpico e reduzirá em até 50% as emissões de carbono

Além da preocupação com a qualidade de vida dos habitantes de sua região mais carente, a prefeitura londrina se esforçou para fazer a primeira edição ecologicamente sustentável dos Jogos Olímpicos. Essa meta foi traçada desde a candidatura da cidade para sediar o evento. No processo de construção do Parque Olímpico, por exemplo, foram reutilizados 97% das sobras de demolição dos galpões e das fábricas abandonadas em Stratford. O Comitê também ergueu uma usina movida a gás e biomassa para fornecer energia e água gelada ao parque. A medida reduzirá em até 50% as emissões de carbono.

Enquanto isso, no Rio...
Legado também é um termo muito utilizado no planejamento das obras para 2016. Como em Londres, o endereço escolhido pela prefeitura do Rio de Janeiro para abrigar um dos grandes projetos para os Jogos Olímpicos é um ponto desvalorizado da cidade. O centro carioca receberá o Porto Olímpico, local onde ficarão as instalações de equipamentos, dos árbitros e da imprensa para o evento. Com as obras, a área e seus casarões antigos serão restaurados e revitalizados. Além disso, o projeto prevê o aumento do número de residências no centro do Rio, ocupado atualmente por empresas. Outra obra importante é o Parque Olímpico da Barra da Tijuca, projetado pela mesma empresa que cuidou do complexo de Londres, a Aecom. Depois dos jogos, deve se transformar num novo bairro, moderno, com toda a infraestrutura herdada do evento. É este o objetivo.

Em visita ao Brasil, o presidente do Comitê Organizador da Olimpíada de Londres, Sebastian Coe, elogiou o planejamento para 2016 e disse que Rio e Londres trabalham com o mesmo objetivo, que é preservar as estruturas após o evento. Apesar do otimismo de Coe, a pressão sobre o Rio é grande. Primeiro, porque sediar a Olimpíada depois de Londres significa bater os britânicos em planejamento e organização, tarefa difícil até para as nações mais preparadas. Segundo, porque esta será a primeira vez que uma cidade da América do Sul receberá o evento. Aos brasileiros, cabe a tarefa de começar a torcer bastante. Desde já. 

Reprodução (Foto: Reprodução)
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