Maria Antonieta, arquiduquesa de Áustria, última rainha francesa, usou e abusou do luxo, como forma de se impor na corte de Versalhes. Entendia que era esse o seu papel. “The Queen of Fashion”, como a designa Caroline Weber. Esta pesquisadora americana afirma que a rainha não era uma mulher fútil e ingénua, como se pensa mas, pelo contrário, uma mulher moderna e já muito consciente do poder da imagem.
Tratavam-na por Austrichienne, paranomásia de Autre-Chienne (outra cadela).
Confrontou-se com uma realidade muito dura, quando aos 14 anos saiu da sua Áustria natal para, com objectivos políticos, se tornar Delfina e casar mais tarde com o neto de Luís XV, este com 16 anos. Até aí muito mimada pela sua aia, a Condessa Brandeiss, foi recebida e integrada numa corte hostil, que tinha resistido fortemente à união com a corte austríaca, bastante mais modesta que a francesa e que a não respeitava. Tratava-a tão só pela “Austrichienne”, paranomásia de “Autre-Chienne (Outra cadela).
Assume aspectos de tragicomédia a cena da sua entrada em território francês. Escoltada por um cortejo com 57 carruagens, Maria Antonieta teve de deixar para trás tudo o que se relacionava com a sua terra, nomeadamente, o seu enxoval, as damas de companhia, e até as roupas que levava vestidas. Foi obrigada a despir-se e entregaram-lhe um vestido dourado que ela envergou, para poder depois continuar a sua viagem.
A corte em transformação
Ficou deslumbrada com o luxo de Versalhes. Habitava o Palácio mais esplendoroso da Europa, mas não suportava as regras de etiqueta da corte e, sobretudo, a falta de privacidade: o facto de ser permanentemente observada. Asfixiava naquela ampla e sumptuosa gaiola dourada. Por outro lado, opunha-se aos escandalosos costumes da nobreza francesa, que tinham amantes oficiais, ela que fora educada no puritanismo protestante. Os nobres franceses também não morriam de amores por ela. Encaravam-na como uma arrivista, despojada do refinamento e da elegância da corte. Era, contudo, inicialmente adorada pelo povo que lhe admirava a beleza e a juventude e por ter dado à França um herdeiro, facto que levou a que o rei lhe tenha oferecido como presente, Le Petit Trianon. “Vós amais as flores, Senhora. Tenho um pequeno bouquet a oferecer-vos”.
Substituiu as antigas damas de companhia por outras, jovens e bonitas.
Apoiada pelo marido, Maria Antonieta deu a volta à situação, transformando de forma radical o ambiente da corte. Aboliu a tradição de dar à luz na presença de todos. Dispensou antigas damas de companhia e substituiu-as por outras, novas e bonitas. Frequentava festas, óperas, representações teatrais, corridas de cavalos. Equilibrava estes gostos mundanos com o apego às questões da filosofia, política e história.
O fermento do sonho republicano
Famosa pelo seu luxo desmesurado foi denominada de Madame “Deficit”. Para que se faça uma ideia, dos seus gastos apenas no que respeita ao vestuário refere-se que o guarda roupa de Maria Antonieta (400 mil livres, a moeda da época) era 30 mil vezes mais caro do que o de uma plebeia (13 livres) e 200 a 80 vezes mais dispendioso do que o preço médio do guarda roupa de um casal de nobres (2 mil a 5 mil livres). Era a época do desregramento, quando o luxo foi assimilado ao termo de luxúria.
A França, arruinada pelo esforço de enfrentar a revolta das 13 colónias americanas, com um enorme deficit orçamental, também pelos dispêndios da corte, com a fome e a seca entre o povo, estava à beira do abismo. O descontentamento social e sentimentos anti-absolutistas fizeram eclodir no ano de 1789 a Revolução Francesa e com ela o destino trágico de Maria Antonieta. Novos ventos sopraram na História: Liberdade, Igualdade, Fraternidade, para todos. O sonho republicano.
Outros capítulos de “A deslumbrante história do luxo”
Capítulo 1. Introdução: tudo o que luz é luxo
Capítulo 2. Paleolítico: o luxo espiritual
Capítulo 3. Antiguidade: o luxo torna-se ostentação
Capítulo 4. Esbanjar para impressionar
Capítulo 5. Idade moderna, paixão por antiguidades
Capítulo 6. O luxo das amantes e do champanhe
Capítulo 7. O brilho da corte do rei Sol
Capítulo 8. As mulheres e amantes de Luís XIV
Capítulo 9. As mulheres que brilharam na corte do Bem Amado