Foto datada de novembro de 1948 (France Presse)
Claude Lévi-Strauss, morto no último sábado (1º), aos 100 anos de
idade, foi um dos intelectuais mais relevantes do século XX.
Destacado antropólogo, ele é considerado o pai do enfoque
estruturalista, que influiu de maneira decisiva na filosofia, na
sociologia, na história e na teoria literária. Poucos pensadores
foram tão longe quanto Lévi-Strauss na exploração dos mecanismos
ocultos da cultura, segundo o obituário publicado nesta
terça-feira (3) no jornal francês "Le Monde".
"Por vias diversas e convergentes, ele se
esforçou para compreender a grande máquina simbólica que reúne
todos os planos da vida humana, da família às crenças
religiosas, das obras de arte às maneiras à mesa", diz o
principal diário do país.
Leia também: Morre Claude Lévi-Strauss
Veja
galeria de fotos de Claude Lévi-Strauss
Considerado um precursor da ecologia, segundo o
jornal "Le Figaro", Lévi-Strauss escrevia de forma
admirável sobre o funcionamento da sociedade. Autor de “Tristes
Trópicos”, considerada um das mais importantes livros de
não-ficção do século passado, ele viveu no Brasil nos anos 1930,
e atuou como professor visitante na Universidade de São Paulo
(USP). Na obra, ele narra seu encontro com índios no Mato Grosso
e na Amazônia, fruto de expedições realizadas enquanto viveu no país.
saiba mais
"Gigante do pensamento francês", segundo a revista "Nouvel Observateur", Lévi-Strauss era conhecido em todo o mundo como o mestre da antropologia moderna. "Filosofo de formação, este pioneiro do estruturalismo viajou o mundo para estudar os mitos”, diz a publicação na internet.
Centenário e lúcido
Ao completar 100 anos de vida, em 28 de novembro de 2008,
reportagens nas principais agências de notícias do planeta
relatavam que apesar de sua longevidade e intensa atividade
intelectual desde antes da 2ª Guerra Mundial, Lévi-Strauss,
membro da Academia da França desde 1973, gozava de boa saúde e
se mantinha lúcido.
Francês, ainda que nascido em Bruxelas (Bélgica)
em 28 de novembro de 1908, este humanista era filho de um judeu
agnóstico de origem alsaciana que o educou em um ambiente
artístico, embora tenha terminado cursando Direito e Filosofia
na Sorbonne de Paris. Autor também de "Mitologias",
lecionou como professor desta última disciplina até receber um
convite de Marcel Mauss, pai da etnologia francesa, para
ingressar no recém-criado departamento de etnografia.
Foi assim que despertou em Lévi-Strauss a
curiosidade por um campo do conhecimento no qual desenvolveria
uma brilhante carreira e que lhe concedeu um "lugar
proeminente entre os pesquisadores do século 20", explicou
à Agência Efe o professor de Antropologia Social da Universidade
Complutense de Madri Rafael Díaz Maderuelo.
Na Amazônia
Sua nova vocação o levou a aceitar um posto como professor
visitante na Universidade São Paulo (USP), de 1935 a 1939,
estadia que lhe possibilitou realizar trabalhos de campo no Mato
Grosso e na Amazônia.
Ali teve estadias esporádicas entre os índios
bororós, nambikwaras e tupis-kawahib, experiências que o
orientaram definitivamente como profissional de antropologia,
campo no qual seu trabalho ainda hoje "continua sendo
válido para a maioria dos antropólogos", declarou Díaz
Maderuelo sobre o autor de "O Pensamento Selvagem".
Após retornar à França, em 1942, mudou-se para os
Estados Unidos como professor visitante na New School for Social
Research, de Nova York, antes de uma breve passagem pela
embaixada francesa em Washington como adido cultural.
Novamente em Paris, foi nomeado diretor associado
do Museu do Homem e se tornou depois diretor de estudos na École
Pratique des Hautes Études, entre 1950 e 1974, trabalho que
combinou com seu ensino de antropologia social no Collège de
France, até sua aposentadoria em 1982, quando dirigia o
Laboratório de Antropologia Social.
Discípulo intelectual de Émile Durkheim e de
Marcel Mauss, além de interessado pela obra de Karl Marx, pela
psicanálise de Sigmund Freud, pela linguística de Ferdinand
Saussure e Roman Jakobson, pelo formalismo de Vladimir Propp
etc., era ainda um apaixonado por música, geologia, botânica e astronomia.
Três contribuições
As contribuições mais decisivas do trabalho de Lévi-Strauss podem
ser resumidas em três grandes temas: a teoria das estruturas
elementares do parentesco, os processos mentais do conhecimento
humano e a estrutura dos mitos.
A teoria das estruturas elementares defende que o
parentesco tem mais relação com a aliança entre duas famílias
por casamento respectivo entre seus membros que, como
sustentavam alguns antropólogos britânicos, com a ascendência de
um antepassado comum.
Para Lévi-Strauss, não existe uma "diferença
significativa entre o pensamento primitivo e o civilizado",
declarou Díaz Maderuelo, pois a mente humana "organiza o
conhecimento em processos binários e opostos que se organizam de
acordo com a lógica" e "tanto o mito como a ciência
estão estruturados por pares de opostos relacionados
logicamente".
Compartilham, portanto, a mesma estrutura, só que
aplicada a diferentes coisas.
A respeito dos mitos, o intelectual sustenta,
desde a reflexão sobre o tabu do incesto, que o impulso sexual
pode ser regulado graças à cultura. "O homem não mantém
relações indiscriminadas, mas as pensa previamente para
distinguir-las. Desde este momento perdeu sua natureza animal e
se transformou em um ser cultural", comentou Díaz
Maderuelo.
Para Lévi-Strauss, as estruturas não são
realidades concretas, estando mais próximas a modelos cognitivos
da realidade que servem ao homem em sua vida cotidiana.
As regras pelas quais as unidades da cultura se
combinam não são produto da invenção humana e a passagem do
animal natural ao animal cultural - através da aquisição da
linguagem, da preparação dos alimentos, da formação de relações
sociais, etc - segue leis já determinadas por sua estrutura
biológica.
Leia mais notícias de Ciência e Saúde