31/08/2010 09h00 - Atualizado em 07/09/2010 18h38

Angra dos Reis ainda se recupera das chuvas do réveillon de 2009

Deslizamentos em um morro e uma encosta em praia deixaram 53 mortos.
Desastre levantou discussão sobre ocupação irregular em áreas de risco.

Carolina LaurianoDo G1 RJ

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Com mais de 300 ilhas e uma beleza natural reconhecida nacionalmente, Angra dos Reis, na Costa Verde do Rio, foi o destino de muitos turistas no réveillon de 2009. Minutos depois da virada do ano, porém, em vez de festejos, o dia 1º de janeiro de 2010 ficou marcado por uma das maiores tragédias da região. A forte chuva que atingia o estado na noite do dia 31 provocou dois deslizamentos, que deixaram 53 mortos, além de centenas de desabrigados.

Um deles ocorreu no Morro da Carioca, em Angra, e o outro na Praia do Bananal, na Ilha Grande, onde a parte da pousada Sankay  foi soterrada. Autoridades federais, estaduais e municipais deixaram seus compromissos no primeiro dia do ano para dar suporte às vítimas. O prefeito da cidade, Tuca Jordão, decretou luto por três dias.

Morro da CariocaDeslizamento no Morro da Carioca, no centro de Angra, destruiu casas e deixou dezenas de desabrigados (Foto: Marcos Arcoverde / Agência Estado)

O Ministério Público do Rio abriu três inquéritos para investigar a ocupação desordenada no município. Os deslizamentos em Angra levantaram a discussão sobre as áreas de risco, o uso e a ocupação do solo na cidade, além da legalidade das licenças de construção, em especial das encostas e áreas de preservação permanente e unidades de conservação.

Os proprietários da pousada Sankay ouviram o barulho do deslizamento e escaparam a tempo. Mas não conseguiram avisar a própria filha, Yumi Faraci, de 18 anos, estudante de arquitetura e urbanismo na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ela morreu soterrada.
As imagens gravadas no interior da pousada dão a noção do drama vivido por amigos e familiares que celebravam a virada do ano. É possível ver garrafas de bebidas numa varanda e restos de uma ceia de réveillon. Após a tragédia, a pousada suspendeu o funcionamento por tempo indeterminado.

Sobreviventes descreveram aquela noite como um pesadelo, com barulhos fortes, enxurrada de lama invadindo as casas e ainda falta de luz, o que aumentava o pânico das pessoas no meio da madrugada. A lembrança que ficou na memória da camareira Maria de Lourdes foi a filha mais nova, de 8 anos, com medo. “Ela gritava: ‘mãe, me ajuda, não quero morrer aqui’, foi um desespero”, contou ela, horas depois do deslizamento no Morro da Carioca.

Carioca viu casa deslizar
O sobrevivente Luiz Paulo Garcia havia alugado uma casa vizinha à pousada Sankay e fotografou o resgate das vítimas. Na época, ele contou o que ouviu naquela madrugada: “Veio tudo abaixo. Vi um pedaço da casa ao lado descendo com a enxurrada. Era árvore, lama, pedra e água, tudo junto”, lembrou o jornalista carioca, de 41 anos.

Ele ficou traumatizado com o drama vivido ao lado da mulher, a afilhada e um amigo. “Foi um momento de pavor. Nunca vou esquecer aqueles gritos de gente pedindo por socorro, dizendo que tinha gente soterrada. Na minha casa, a gente não sabia o que fazer, demos as mãos e oramos juntos. Colocamos coletes salva-vidas, porque achei que a gente ia ser jogado para o mar”, disse.

As irmãs Gabriela, de 9 anos, e Geovana Repetto, de 12, morreram com os tios, também no deslizamento da Praia do Bananal. A mãe delas, Cláudia Cristine Ribaski Brazil Repetto, sobreviveu à tragédia, mas teve esmagamento em ambas as pernas e fratura em três vértebras.

Chuva foi a maior dos últimos 10 anos, dizem meteorologistas

A chuva que atingiu Angra dos Reis, nas últimas 12 horas do dia 31 de dezembro e nas primeiras 12 horas do dia 1º de janeiro foi o maior volume de água em 24 horas dos últimos dez anos, segundo dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Foram 142,9 mm de água – um valor normalmente registrado em todo um mês.

Nessas condições, segundo o geólogo José Tadeu Tommaselli, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), mesmo um morro totalmente preservado e sem impacto humano nenhum correria risco de avalanches de terra.

A maior chuva em um dia da história de Angra ocorreu na década de 1960: 191,4 mm em 22 de dezembro de 1965.

A causa de tanta água, de acordo com o meteorologista Fabrício Daniel dos Santos Silva, foi a formação que levou para a região do litoral do Rio de Janeiro massas de ar mais úmidas, que combinam tanto nuvens que causam precipitações intensas como aquelas que geram chuvas mais fracas, mas mais duradouras.

Áreas de proteção ambiental são mapeadas
Uma semana após a tragédia, o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira, a liberação de R$ 80 milhões, em condições emergenciais, para a realização de obras em Angra dos Reis.

Uma equipe técnica contratada pelo Instituto estadual do Ambiente (Inea) em Angra dos Reis iniciou, no mesmo mês, um levantamento da ocupação do solo na Zona de Conservação de Vida Silvestre (ZCVS), com o objetivo de atualizar a Área de Proteção Ambiental (APA) de Tamoios, que delimita as construções nas ilhas da baía da Ilha Grande e também no continente.

O licenciamento ambiental, de acordo com o Inea, não permite construções em costões rochosos, encostas e manguezais. Na análise ambiental são levados em conta ainda saneamento básico, depósito de lixo, características do terreno.

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