Blog do Mauro Ferreira

Por Mauro Ferreira

Jornalista carioca que escreve sobre música desde 1987, com passagens em 'O Globo' e 'Bizz'. Faz um guia para todas as tribos

G1

Em cena desde 1984, Humberto Gessinger percorre há 35 anos estrada pavimentada com canções existencialistas escritas com altas doses de autorreferência, trocadilhos, citações de obras alheias e referências sulistas.

Não raro feito em círculo, porque o artista gaúcho gravita em torno de universo particular, o caminho de Gessinger tem continuidade com o lançamento, neste mês de outubro de 2019, do quarto álbum solo do cantor, compositor e músico, Não vejo a hora, cuja capa expõe ilustração de Felipe Constant.

Disponibilizado pela gravadora Deck nos formatos de CD, LP e fita cassete, além da dominante edição digital, o disco apresenta onze canções da lavra de Gessinger, sendo seis assinadas com cinco parceiros diferentes.

Capa do álbum 'Não vejo a hora', de Humberto Gessinger — Foto: Ilustração de Felipe Constant

Mesmo sem configurar safra especialmente inspirada no confronto com os cancioneiros de discos anteriores do artista, o repertório do álbum Não vejo a hora mostra o cantor transitando em segurança pela infinita highway do rock.

Sim, Não vejo a hora é essencialmente disco de rock, cuja batida se impõe logo na gravação da primeira música, Partiu (Humberto Gessinger). Comedido, o solo de guitarra de Felipe Rotta na angustiada Outro nada – parceria de Gessinger com o conterrâneo Bebeto Alves lançada no ano passado em álbum de Bebeto, Oh Blackbagual – Canção contaminada (2018) – vai conquistar quem habita a ilha sonora fundada por Gessinger.

Se todo mundo é uma ilha, o artista parece liderar o exército de um homem só, mesmo que Não vejo a hora seja álbum gravado com dois trios distintos. O disco é viagem ao centro do universo de Gessinger.

O trio acústico de violão e viola caipira (tocados pelo próprio Gessinger), baixo acústico (o de Nando Peters) e acordeom (o de Paulinho Goulart) dá acento folk a três das onze músicas do álbum com regionalismo sutil que evoca incursões da banda que projetou Gessinger em escala nacional nos anos 1980, Engenheiros do Hawaii, pelo universo musical dos Pampas.

Composição mais melodiosa da safra do álbum Não vejo a hora, a canção Bem a fim (Humberto Gessinger e Esteban Tavares) adquire tom quase caipira no arranjo que valoriza a gravação e a própria canção.

Humberto Gessinger cita obras do grupo Pink Floyd nas letras das canções siamesas 'Estranho fetiche' e 'Fetiche estranho' — Foto: Daryan Dornelles / Divulgação

O power trio elétrico domina o disco, dando tom pop roqueiro a músicas como Um dia de cada vez (Humberto Gessinger) e Algum algoritmo (Humberto Gessinger), destaque de repertório que inclui duas composições siamesas, Estranho fetiche e Fetiche estranho, ambas compostas pelo artista em parceria com Nando Peters, ambas com referências à obra do grupo inglês Pink Floyd nas letras (que compartilham duas estrofes) e ambas gravadas com o trio acústico.

Calmo em Estocolmo (Humberto Gessinger), Maioral (Humberto Gessinger), Missão (2013) – parceria de Gessinger com outro conterrâneo, Duda Leindecker, intérprete original da música em gravação lançada há seis anos – e Olhou pro lado, viu (Humberto Gessinger e Felipe Rotta) completam sem sobressaltos o repertório do disco.

Diferentemente do que faz supor o urgente título Não vejo a hora, o quarto álbum solo de Humberto Gessinger mostra o artista conduzindo a obra com a calma de quem está seguro do caminho que há 35 anos escolheu seguir na infinita highway do rock brasileiro. (Cotação: * * * 1/2)

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