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Por Emilio Botta — São José do Rio Preto, SP

Nigel French/EMPICS/Getty Images

Aposentado desde o fim da temporada passada, Jefferson recebeu o GloboEsporte.com em São José do Rio Preto, interior de São Paulo, para um bate-papo sobre a vitoriosa carreira de quase duas décadas. Atualmente com 36 anos, o ex-goleiro defendeu clubes como Cruzeiro e Botafogo, além de ter feito parte do grupo que disputou a Copa do Mundo de 2014 pela seleção brasileira.

Relembrando momentos marcantes da carreira, que em breve você confere em outra reportagem especial, Jefferson comentou sobre quando foi desconvocado e posteriormente convocado para defender a seleção brasileira campeã mundial sub-20 em 2003. Segundo ele, a convocação só aconteceu após a saída de um diretor da CBF que, na época, teria orientado a comissão técnica a não convocar um goleiro negro. Confira a entrevista no vídeo abaixo:

Jefferson diz que questão racial impediu sequência na Seleção: "Indiretamente me atrapalho

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– Fui convocado para o Pan e o Sul-americano. Fomos campeões e vice-campeões. Estava eu, o Fernando Henrique e o Andrey. Na convocação para o Mundial meu nome não estava no jornal. Fiquei chateado pensando no que aconteceu, mas fiquei tranquilo esperando a resposta. O grupo viajou, mas cancelaram o campeonato porque tava rolando uma guerra nos Emirados Árabes (2003). Estava saindo do treino um dia e recebi uma ligação de um diretor da CBF dizendo que eu seria convocado. E ele me disse que iriam me convocar no início do ano, mas que tinha uma pessoa, que não quis me dizer o nome, que vetou a convocação porque foi orientado a não convocar goleiro negro. Aquilo foi uma injeção de ânimo, incentivo, mexeu comigo positivamente. Comecei o campeonato no banco, no meio entrei e na final contra a Espanha a gente ganhou. No meio da comemoração, o diretor me abraçou e falou um monte de palavrão. Aquilo me marcou demais, me emociona muito lembrar isso porque são obstáculos que você passa na vida, mas tem que superar – relembra o goleiro.

Jefferson foi convocado para a seleção brasileira principal 63 vezes, jogando em 22 jogos e conquistando quatro títulos (Superclássico das América 2011, 2012 e 2014, Copa das Confederações 2013). O goleiro esteve no grupo que disputou a Copa do Mundo de 2014, e chegou a ser titular no ano seguinte, sob comando de Dunga.

Jefferson ao lado de Júlio César e Diego Cavallieri, goleiros da conquista da Copa das Confederações — Foto: Alex Livesey/FIFA/Getty Images

Mas para Jefferson, a história dentro da Seleção poderia ter sido ainda maior. Segundo ele, existe certa discriminação com goleiros negros desde as possíveis falhas de Barbosa, titular na Copa de 1950 e apontado como grande "vilão" da derrota brasileira para o Uruguai no Maracanã.

– O brasileiro tem esse preconceito, não é só de cor, é a sociedade. O preconceito é geral. Falo na questão do goleiro porque teve aquele episódio do Barbosa. Hoje o espaço para os negros é pouco. O episódio do Barbosa afetou diretamente na seleção brasileira. Teve esse episódio, a pressão? Claro que tem. Você acha que não pensava nesse episódio do Barbosa quando estava na Seleção? Claro que pensava. O goleiro da cor branca pode errar ali, de boa. Qualquer goleiro negro que errar na Seleção, irão pegar a história do Barbosa. Isso sempre vai ter, é uma coisa que temos que superar. Nunca fui uma pessoa que fiquei lamentando. Obstáculos são feitos para ultrapassarmos – desabafa Jefferson.

"Não digo que foi o ponto chave para eu sair [ser negro], mas indiretamente eu creio que sim. Eu tinha que mostrar mais do que outras pessoas, talvez isso acabe mexendo um pouco", Jefferson, sobre questão racial e sequência na Seleção.

Em 18 anos de carreira, 12 deles foram no Botafogo. Jefferson é o goleiro que mais vezes vestiu a camisa do time alvinegro. Foram 459 jogos e a marca de terceiro jogador em números de jogos pelo clube, atrás apenas de Nilton Santos (721 jogos) e Garrincha (612 jogos).

Jefferson é um dos ídolos recentes do Botafogo — Foto: André Durão/GloboEsporte.com

Os recordes pelo Botafogo, segundo Jefferson, foram atingidos graças a um estudo feito jogador, que escolheu a equipe por achar que seria aceito facilmente, já que o clube teve outro goleiro negro como referência no passado recente, Vagner.

– Claro que o subconsciente pensa quando você recebe uma proposta. Primeiras coisas que o goleiro negro pensa é como é o país, o histórico do time com goleiro negro. Uma das opções minhas de ir para o Botafogo foi porque o Vagner foi um dos maiores goleiros do Botafogo. No Cruzeiro, o Dida. São jogadores que abriram as portas para outros negros – revela.

Jefferson vive atualmente em São José do Rio Preto, interior de São Paulo, onde é dono de uma cafeteria e de diversos empreendimentos imobiliários. Além disso, o jogador percorre o Brasil em eventos ligados ao Botafogo e à carreira. Em breve, no GloboEsporte.com, você confere um pouco mais sobre como o ex-goleiro vive atualmente e administra os negócios. Fique ligado!

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