História do Sapateado


Muito se fala sobre a história do sapateado, mas sua origem é o fato que causa grande controvérsia, justamente por parecer ter originado de vários lugares. A conclusão de inúmeras pesquisas nos leva a crer em três principais influências.

A primeira nos remete ao século V na Irlanda, onde os camponeses que usavam sapatos com solado de madeira para aquecer os pés, começaram a brincar com os sons que esses sapatos faziam. Criavam diversos ritmos, originando uma dança conhecida como Irish Jig.

Já na Inglaterra, durante a Revolução Industrial, os operários usavam sapatos de madeira para se protegerem do chão muito quente das fábricas. Nos intervalos de trabalho, os operários ingleses se divertiam com os sons produzidos por aquele sapato, criando uma nova dança chamada Lancashire Clog. Mais tarde os tamancos de madeira foram substituídos por moedas de cobre presas aos sapatos de couro.

Outra influência também muito forte veio das danças africanas, que eram feitas pelos escravos em suas poucas horas de lazer. Alguns senhores feudais admiravam essas danças que uniam o trabalho dos pés descalços a movimentos do corpo, e usavam seus escravos para seu próprio entretenimento.

Entre os anos de 1909 e 1920, vários estilos musicais e de dança foram criados nos EUA como o "FOX TROT", "TUKEY TROT" e o "LINDY HOP", por exemplo. E com a chegada dos africanos e europeus na América do Norte, essa fusão de informações se uniu ao estilo musical americano que estava em alta, então começaram a surgir os sapatos com chapinhas de metal nas solas.

O Sapateado Americano se consolidou realmente no início da década de 20, quando foi criado o espetáculo "Shuffle Along", onde 16 bailarinas executavam a mesma coreografia dando origem ao chamado "chorus line" e revolucionando os palcos da Broadway.

Desde então, até meados dos anos 40 o sapateado proliferou como uma febre nos Estados Unidos, espetáculos de Vaudeville, musicais da Broadway, casas de shows, clubes de jazz, em fim, estava por toda parte até nas ruas e esquinas de New Orleans ou do Harlem. Esta é uma vertente na história do sapateado desconhecida pelo grande público, onde grandes sapateadores se desafiavam e criavam seus estilos próprios dentro de uma mesma característica: os pés plantados quase que inteiramente no chão, então chamados de HOOFERS, os principais eram: Honi Coles, Cholly Atkins, Sandman Sims, Jymmy Slide, Steve Condos, Bunny Briggs, Arthur Duncan, The Nicholas Brothers e Sammy Davis Jr ; que apesar de espetaculares não conseguiam papéis em filmes ou musicais da Broadway.

Mas onde entra Bill Bojangles nessa história? Bem, para a nova geração Bojangles não passa de um ilustre desconhecido, mas a verdade é que sua contribuição para o sapateado foi muito valiosa e específica: ele o levou para a "meia ponta" , trazendo aos palcos uma leveza e uma clareza nos passos jamais vista na tradição dos hoofers que dançavam com os pés inteiros no chão. A pouca movimentação dos braços era notada em ambos os estilos, mas o gingado do corpo e o som preciso de Bojangles era ritmicamente perfeito e inconfundível.

Nasceu em 25 de Maio de 1878, em Richmond, Virgínia. Em 1898 foi para Nova Iorque tentar a vida de bailarino,mas sua vida por lá não foi nada fácil; Bojangles fez o que parecia impossível, quebrou a chamada "regra dos dois negros", onde uma dupla de sapateadores negros interpretava situações consideradas "engraçadas" para uma platéia homogeneamente branca, sendo que, a humilhação da própria raça era o toque principal para despertar gargalhadas na platéia. Mas Bill Robinson era corajoso e fantástico, começou a subir ao palco sozinho, mas ainda em uma situação no mínimo inusitada pois, coisas estranhas aconteciam no show business. Quando os brancos começaram a admirar negros nos palcos, alguns artistas brancos ficaram sem trabalho, então passaram a se pintar de negro. Essa "fantasia" era muitas vezes reconhecida pela platéia, mas o que valia para eles era o estigma de ver um negro sapateando e divertindo-os. Ao mesmo tempo, para os negros era difícil conseguir trabalho em grandes teatros e casas de shows. Diante disso, Bojangles, que era negro, passou a se pintar de preto querendo parecer branco pintado de negro, dá pra entender porque esse tipo de coisa acontecia? Mas ele já estava preparando a grande surpresa. Em um show no Canadá, subiu ao palco pela primeira vez sem a tinta preta, sua elegância superou toda e qualquer expectativa, calando a boca do preconceito velado e fazendo desta turnê um verdadeiro sucesso.

Sem dúvida, Bojangles foi um divisor de águas, mas sua maior contribuição ao sapateado foi o estilo charmoso e a técnica precisa e apurada de dançar na "meia-ponta" . Era admirado até pelos Roofers, produzindo ritmos enlouquecedores e também admiráveis. Mas o estilo de Bill Bojangles Robinson estabeleceu claramente essas duas formas de sapatear.

Só aos 31 anos seu trabalho foi reconhecido e então contratado pela produção do show Blackbirds, onde apresentava um número em que subia e descia uma escada sapateando. Mais tarde esse seria o marco de sua carreira.

Com o sucesso de Blackbirds, Bojangles tornava-se cada vez mais respeitado no mundo dos espetáculos, passando a ser o primeiro negro a conquistar um papel na Broadway em 1930 com o musical BROWN BUDDIES. Também conquistou Hollywood (em 1932), onde liderou o primeiro casal inter-racial da história do cinema americano, contracenando com Shirley Temple, com apenas 7 anos na época, em "The Little Colonel" , a dupla se deu tão bem que protagonizaram mais três filmes: "Hooray for Love", "The Littlest Rebel" e "Big Broadcast of 1936".

Parecia que o racismo no cinema estava chegando ao fim, mas a realidade era outra, quando Eleanor Powell foi cogitada a dançar ao seu lado, esse projeto foi barrado pelas leis da época que não permitiam que um negro contracenasse com uma mulher branca.

Bojangles fez ao todo 14 filmes e era atração frequente do Cotton Club, sem contar os inúmeros shows da Broadway que participou nos anos seguintes. Morreu em 1949, coberto de glória e endividado, mas sua genialidade deve ser lembrada não só a cada 25 de maio, mas sempre que colocarmos um par de sapatos com chapinhas nos pés.

O racismo continuava presente e muito forte também na área artística dos EUA, o sapateado conquistou as telas do cinema, porém seus protagonistas eram dançarinos brancos, deixando para os negros os papéis secundários, mas ainda assim há de se reverenciar os grandes mestres que ajudaram a fortalecer esta cultura, com classe, elegância, versatilidade em unir o sapateado a outras técnicas como a dança de salão, o ballet clássico e a dança moderna; e sem dúvida uma técnica apuradíssima, são eles: Fred Astaire, Ginger Rogers, Gene Kelly, Ann Muller, Donald O´Connor, entre outros, a partir de 1933.

Nas décadas de 50 e 60 o sapateado sumiu do cenário cultural americano, as grandes formações musicais estavam sendo desfeitas porque seus integrantes rumavam para o combate: A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL. A motivação dos jovens para ver sapateadores acompanhando as Big Bands estava esmorecendo e o gosto musical daquela época também estava mudando - era a explosão do ROCK´N ROLL.

Muitos achavam que o sapateado iria simplesmente morrer e levar com ele toda uma história. Mas nos anos 70 começou uma mobilização de alguns sapateadores com o objetivo de fazer essa arte "reviver".

Pode-se dizer que Brenda Bufalino tem um papel fundamental nessa história, sua energia e determinação proporcionaram novos rumos ao TAP DANCE. Brenda foi parceira do lendário Honi Coles por muitos anos, e em 1978 criou a American Tap Dance Orchestra, uma companhia caracterizada por suas construções rítmicas interagindo diretamente com os músicos.

Juntamente com Brenda , GREGORY HINES deu sua valiosa contribuição para o retorno do sapateado aos palcos da Broadway. Gregory Hines ficou famoso no mundo inteiro contracenando com o bailarino Mikhail Baryshnikov em "O Sol da Meia Noite", faleceu em 2003, vítima de câncer, mas deixou sua marca, a versatilidade, era tão maravilhoso com seu estilo hoofer como quando dançava no estilo tradicional em coreografias de Honi Coles, por exemplo. Gregory Hines também revelou outro grande talento, SAVION GLOVER, considerado um dos maiores sapateadores da atualidade. Desde então, a Broadway e os mestres da chamada "velha guarda" também vêm revelando nomes como: Jason Samuels Smith, Chloe Arnold, Maud Arnold, Jason Janas, e muitos outros; entre os brasileiros radicados em USA estão: Cintia Chamecki, Felipe Galganni, Charles Renato, Melissa Tannús, atualmente. Por isso temos certeza que essa arte não vai morrer, pois são desenvolvidos trabalhos sérios no mundo inteiro através de grandes companhias e professores que formam seus alunos.


Texto: Gisella Martins



A História do Sapateado no Brasil

Esse artigo é um breve apanhado da história do sapateado no Brasil. A proposta aqui não é listar todos as pessoas em atividade hoje, mas de relevar os pioneiros dessa história.O sapateado está de vento em popa no Brasil: a demanda para aulas cresce todo dia, surgem academias especializadas, sua popularidade nos festivais de dança está em alta, grupos e companhias estão se profissionalizando e a mídia está abrindo espaço. Melhor ainda, essa tendência não é restrita ao tradicional eixo cultural Rio-São Paulo, mas passa por cidades do país inteiro: de Curitiba a Fortaleza, de Cuiabá a Belo Horizonte, o sapateado está ganhando espaço e qualidade. Contudo, o sapateado é um fenômeno relativamente recente no Brasil e encontra-se ainda em fase de afirmação. Tem um longo caminho pela frente. Pode e deve evoluir. 

O grande obstáculo ao seu desenvolvimento é a falta de tradição e as dificuldades que os professores encontram para obter informações e material didático. As videotécas oferecem poucos filmes além dos clássicos de Hollywood, a televisão não mostra os documentários existentes e o material didático é raro. Se os melhores CD's de jazz podem eventualmente ser encomendados em lojas especializadas de São Paulo ou do Rio de Janeiro (e olha lá), para quem mora no interior a situação é mais complicada.Na disciplina do ballet clássico, o Brasil beneficiou-se da imigração de grandes mestres como Maria Olenewa, Tatiana Leskova e Eugenia Feodorova. O sapateado não teve essa chance, ou em escala bem menor. Os mestres consagrados, pessoas que conheçam por experiência própria a história do sapateado, que carregam um conhecimento profundo do seu potencial - ficaram nos Estados Unidos. Alguns foram para Europa quando o mercado apertou nos EUA e o trabalho ficou escasso (como Fayard Nicholas, Jimmy Slyde, Will Gaynes), mas nenhum estabeleceu-se no Brasil.Tendo em vista essa ausência, é extraordinário que o sapateado tenha se desenvolvido tanto. Isso é resultado da grande dedicação dos professores locais que não pouparam esforços (e dinheiro em viagens de reciclagem) para levar adiante essa arte que nós tanto amamos.A história do sapateado no Brasil começa já nos anos quarenta.

Em 1945, fugindo da 2a guerra mundial com sua esposa Nelly, o Australiano Philip Ascott estabeleceu-se no bairro pobre de Vila Carrão em São Paulo. Começou a ensinar os meninos e meninas do bairro, oferecendo também o espaço da sua casa para ensaios, tudo de graça. Depois de anos ganhou uma certa notoriedade ao aparecer com seus alunos no então popular programa de televisão "Kibon", da TV Tupi. Virou também professor particular das filhas da família Mattarazi e de outras moças da elite paulista. Teve como aluno xodó o Heloaldo Silva, hoje professor em Piracicaba, no interior de São Paulo.O estilo de Ascott era derivado do sapateado inglês. Seu pai lhe mostrou alguns passos mas o resto ele aprendeu sozinho, praticando. Não usava os braços, deixando-os ao lado do corpo. A ênfase era no pé e no ritmo. Não dava nomes aos passos, apenas botava a música e saia dançando, segundo Heloaldo, era muito criativo e carinhoso com seus alunos, repassando a eles a atenção que não pode dar ao seu filho, desaparecido na fuga da Austrália. O Professor Ascott faleceu em São Paulo, aos 87 anos de idade. O Professor Cid Pais de Barros teve também grande influência. Quatrocentão, foi rejeitado pela família por querer virar bailarino. Abriu no inicio dos anos 50 a Escola de Ballet Cid de Barros, na rua 24 de maio, no centro da cidade, onde ensinava ballet, jazz (como dança social, o jazz moderno ainda não tinha nascido) e sapateado. Também autodidata, aprendeu vendo filmes, memorizando e recriando passos das estrelas de Hollywood. Como Ascott, desconhecia os nomes dos passos e desenvolveu um método de ensino baseado em pequenas seqüências que chamou de "seqüências numeradas". Tinha muitos alunos e a escola funcionava o dia inteiro. Um só seguiu carreira e até hoje se lembra das seqüências, "muito bem elaboradas" segundo ele. É o professor Luís Boronini, que começou a fazer aulas de sapateado em 1949, com 16 anos de idade. Depois de um ano virou assistente do Cid e passou a dar aulas na academia, onde ficou até 1955. Mas o que queria mesmo era dançar ballet então abandonou o sapateado em 1962 quando ingressou no musical "My Fair Lady" em cartaz em São Paulo. Seguiu carreira no Ballet do Teatro Municipal de São Paulo. Também pioneiro foi o Professor Gualter Silva.Nascido em Minas Gerais, veio cedo para o Rio de Janeiro. Aos 14 anos assumindo seu amor pela dança, resolveu ser dançarino. Autoditada, mas com muita dedicação e talento, foi contratado por um conjunto americano em 1936, os "Black Stars", que ensinaram-lhe os segredos do sapateado. Fazia dupla com sua irmã Ina e dançava em cassinos: Urca, Quitandinha, Guarujá e Mar Del Plata. Participou de excursões para Portugal e Espanha. Durante a segunda guerra a dupla foi convidada para fazer shows para entreter os combatentes nas bases. Num deles sapateou com ninguém menos que a Orquestra de Glenn Miller. Tomou parte em diversos filmes nacionais, entre eles "Este mundo é um pandeiro", com Oscarito e Grande Otelo. Lecionou em São Paulo, nas academias de Renné Gumel, Yolanda Verdier, Cisne Negro, Stagium e Nice Leite. No interior, deu aulas em Bauru, Taubaté, Jundiaí, Ribeirão Preto e Araraquara. Era uma pessoa humilde e simples, muito querido por seus muitos alunos. 

As duas maiores responsáveis pela subseqüente popularização do sapateado no estado de São Paulo nos anos 70, Kika e Marchina, foram alunas do Gualter. Começaram a ensinar e difundir o sapateado através do grupo Salto e Sola, rebatizado mais tarde Brasil Tap Dance. Ambas trabalham hoje individualmente e continuam ensinando para centenas os segredos do sapateado. Conheci em Recife um personagem quase folclórico, outro pioneiro do sapateado brasileiro: Valderedo Santana. Nascido em 1943, foi Campeão Pernambucano de levantamento de peso em 1965, e foi eleito Mister Pernambuco em 1969. Faixa preta de judô, é também músico e sapateador nas horas vagas. Estudou advocacia e pratica até hoje. Fã do Fred Astaire, via seus filmes "dezenas de vezes" e imitava-o na saída. Desenvolveu um estilo de sapateado fortemente ligado ás suas raízes nordestinas e cheia de improvisos. Trabalha com o pé inteiro no chão (flat foot), sem braços mas com ritmos elaborados e poderosos. Nunca ensinou sapateado, a não ser para as filhas, que estudam no Recife. 

No Rio de Janeiro, o sapateado apareceu mas tarde que em São Paulo, nos anos 70 e quem teve uma influência decisiva foi a Pat Thibodeaux. De todos os pioneiros citados acima, Pat foi a primeira com real conhecimento aprendido na fonte: nasceu e cresceu em New Orleans, berço histórico do sapateado e do jazz. Casou-se com um brasileiro. Mudou-se para o Brasil em 1970 passando logo a dar aulas de sapateado em colégios. Em 1980 abriu a academia UNIC. Pat produziu uma geração de sapateadores que formam hoje a vanguarda dessa arte no Rio, entre outros, Stella Antunes, Amália Machado, Maurício Silva e Cíntia Martin. Stella e Amália abriram a academia Dança e Cia em 1985 e mais tarde criaram a Companhia dá no pé, responsável por muitas produções e temporadas teatrais, mostrando o sapateado para um público encantado com a "novidade". Durante anos a Dança e Cia foi reduto dos melhores sapateadores locais. As duas ainda estão a frente da Orquestra Brasileira de Sapateado.

O Zdenek Hample, bailarino clássico vindo da Tchecoslováquia, também passou a ensinar sapateado no Rio de Janeiro no anos 70. Mora hoje no Recife. Em 1998, recebeu uma "menção honrosa" como "mestre inspirador" do Ministério da Cultura, através da Funarte (prêmio Mambembe).Um segundo "núcleo" do sapateado no Rio era liderado por Tânia Nardini, responsável por numerosas produções e peças teatrais envolvendo sapateado. Tânia é diretora da academia "Catsapa", em atividade até hoje. Giselle Saldanha, Flávio Salles e Valéria Pinheiro, entre muitos, trabalhavam com Tânia.Mesmo não sendo primeiramente um sapateador, não posso deixar de mencionar Lennie Dale. Vindo de Nova Iorque, ele provocou um grande impacto nos anos 70 quando adotou o Rio de Janeiro como segundo lar e mudou radicalmente o perfil da dança jazz no Brasil, introduzindo o estilo de dança-teatro da Broadway. O memorável grupo Dzi Croquette fez sucesso no país afora. Seu forte não era o sapateado, mas ele preparou o terreno e abriu as cabeças para sua chegada.A partir dos anos 90, o ótimo trabalho de sapateadores e professores em outras cidades quebrou a hegemonia Rio/São Paulo; tanto que, por exemplo, é atualmente impossível prever de onde surgirão os grupos premiados em concursos e festivais de dança. Em Campinas, Fortaleza, Curitiba, Florianópolis, São José dos Campos, Ribeirão Preto, Porto Alegre, Rio Grande, Blumenau, Brasília: em todo canto há trabalho sério e muita dedicação.Entretanto, em termos de real oportunidades no mercado profissional, a modalidade anda fraca ainda. 

Se um bom bailarino pode sonhar em integrar companhias clássicas e contemporâneas com estrutura profissional, remuneração mensal, temporadas extensas e viagens freqüentes, quem sonha em virar "sapateador" tem um difícil caminho pela frente. O "show business" (musicais, comerciais, vídeo-clipes) ainda não entrou na roda e os grupos e companhias existentes têm estrutura amadora, na sua maioria ligadas a academias de sapateado e com cachês eventuais. O sapateado nesse sentido não é uma opção de vida e o sapateador brasileiro vai ter que se virar de outra maneira, dando aulas ou trabalhando por fora para se sustentar.Mas, visto sua história recente, a quantidade e qualidade dos alunos, é inevitável que o Brasil se torne em pouco tempo uma "terra de oportunidades" para o sapateado.Um fenómeno interessante é o processo de "nacionalização" pelo qual passa o sapateado nas mãos (e nos pés) de alguns artistas que buscam uma identidade rítmica e corporal fora dos padrões do jazz tradicional ou do estilo mais comercial da Broadway. A técnica usada nos pés vem do sapateado americano mas os ritmos são brasileiros e a movimentação é inspirada nas danças com raízes populares. Isso é bem diferente do que simplesmente sapatear no estilo norte-americano em cima de música brasileira: envolve o conhecimento, o uso e a adaptação de passos tradicionais da dança brasileira e o respeito da sua essência e ginga. Nos Estados Unidos, os sapateadores sempre seguiram esse processo, inspirando-se nas danças em moda da época (o Cakewalk, o Turkey Trut, o Black Bottom, o Charleston, o Lindy Hop...), e adicionando sons para lhes dar nova dimensão. Fred Astaire fez a mesma coisa com dança de salão e Gene Kelly com dança moderna.

A música e a dança popular brasileira é um solo fértil para os sapateadores se inspirarem. Danças como o samba no pé e o frevo, embora não produzem sons, destacam um complexo jogo de pernas e um impacto visual de algum modo similar ao do sapateado. Usando uma técnica diferente, várias danças populares brasileiras, como o xaxado no nordeste ou a chula no sul, também usam os pés para criar sons e assim realçar ritmicamente a música. Os ritmos brasileiros tem um apelo corporal enorme, maior talvez que o próprio jazz. Seu swing, porém, é diferente e requer um sério trabalho de adaptação.Nessa busca se destaca a Valéria Pinheiro, uma cearense que mora atualmente no Rio de Janeiro. Filha de um dançarino de xaxado com quem aprendeu seus primeiros passos, está há anos pesquisando os ritmos do Nordeste e desenvolvendo uma linguagem muito própria no mundo do sapateado brasileiro.No âmbito musical, essa miscigenação Brasil/USA aconteceu com grande êxito nos anos 60 com o surgimento da bossa nova e seu imenso sucesso nos Estados Unidos. Stan Getz ficou semanas no topo das paradas populares com seu LP Jazz Samba e despertou o interesse de muitos músicos americanos. A bossa nova deu assim uma nova e inesperada dimensão ao jazz. Lindas colaborações seguiram envolvendo artistas como Herbie Mann, Johnny Alf, Herbie Hancock, Wayne Shorter, Sarah Vaughn, Ella Fitzgerald, Milton Nascimento, Sérgio Mendes, Tom Jobim, Tânia Maria e outros.Está na hora do sapateado no Brasil mostrar sua cara. Mãos a obra. Long live tap Dance!!

Steven Harper, Professor, Coreógrafo e Sapateador. Dança. Internet, disponível emhttps://www.dancas.com.br/master/portal/imagem/titulos/dt_sphis.gif.



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