Artes visuais
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Por Nelosn Gobbi — Rio


Walter Carvalho na Mul.ti.plo, com uma das transparências criadas a partir de suas fotos e a obra impressa em platina, na parede — Foto: Guito Moreto
Walter Carvalho na Mul.ti.plo, com uma das transparências criadas a partir de suas fotos e a obra impressa em platina, na parede — Foto: Guito Moreto

Fotógrafo de marcos da retomada do cinema brasileiro nos anos 1990, a exemplo de “Terra estrangeira” (1995), “Central do Brasil” (1998) e “Lavoura arcaica” (2001), realizador de longas como “Budapeste” (2009) e diretor de TV (no momento dedicado à nova versão de “Pantanal”, da TV Globo), Walter Carvalho diz manter alguns “trabalhos silenciosos”, desenvolvidos ao longo dos anos e revelados aos poucos. Um destes projetos paralelos, no qual trabalha há pelo menos uma década, chega aos olhos do público hoje, quando será inaugurada a exposição “Iluminuras”, na , com 17 imagens criadas a partir de impressão com platina, técnica patenteada em 1873.

Idealizada para 2020 e adiada por conta da pandemia, a mostra coincide com a volta de Carvalho à TV Globo, em que dirigiu outros produtos, como a adaptação de “O rebu” (1974), exibida em 2014, e a novela “Amor de mãe” (2019). Em “Pantanal”, ele divide a direção com Davi Alves, Beta Richard, Cristiano Marques e Noa Bressane, sob a direção artística de Rogério Gomes e Gustavo Fernandez. Por conta do volume de trabalho, diz preferir não acumular a direção de fotografia, como já fez em projetos anteriores.

— Uma coisa é uma série, em que você consegue acumular as funções porque só tem a sua frente de trabalho. Em “Pantanal” são três frentes de gravação, não daria para assumir também a fotografia — comenta Carvalho, que foi ao Pantanal no início dos trabalhos e agora se mantém no estúdio, no Rio. — Antes de gravar, foi feito um trabalho de conceituação, com a equipe de fotografia, para debatermos como mostrar esse Pantanal na TV. Depois, fiquei focado na direção.

Além das imagens da natureza do Centro-Oeste, Carvalho credita o sucesso do remake ao mergulho no Brasil rural, com um tempo que convida à reflexão:

— Todos os dias as pessoas ligam a TV e veem um elenco com cara do Brasil. Dira Paes, Marcos Palmeira, Jesuíta (Barbosa), Irandhir (Santos), tantos outros. É o ator, o texto e aquela natureza, sem verniz. Isso faz com que o espectador se sente à frente da TV e experimente outro tempo. O nosso coração bate e nosso pulmão respira num ritmo que não é o das redes sociais, da última novidade. O público contempla a novela porque ela trouxe de volta o ritmo do nosso corpo.

Inéditos, os trabalhos da exposição são fruto de um processo desenvolvido pelo fotógrafo, que primeiro transforma em fotolitos transparentes as imagens selecionadas, para depois aplicá-las sobre papéis de algodão que recebem pinceladas de uma emulsão à base de uma mistura de platina, paládio e óxido de ferro. Posteriormente levados a um banho de revelador com amônia e expostas ao sol, as imagens surgem apenas nos espaços preenchidos com a platina, em obras nas quais técnicas da pintura e da fotografia se encontram.

— Sempre me interessei por processos alternativos de impressão. Comecei com a gelatina de prata há uns 20 anos e depois descobri a platinotipia. Uma coisa determinante foi poder trabalhar à luz do dia, não é necessário estar numa câmara escura para revelar. Também me senti desafiado por uma técnica que era completamente desconhecida para mim — explica Carvalho.

As iluminuras, como o fotógrafo batiza as obras, trazem imagens selecionadas em seu acervo pessoal mas também feitas especialmente para a impressão com platina. São fotos de objetos, ferramentas e animais, que Carvalho clicou em diferentes épocas e lugares do país.

— Revendo meu acervo, vi que as imagens que tinha não dariam o resultado desejado para a impressão em métodos alternativos, e que teria de fotografar para aquilo. Quando comecei, cometia o erro de tentar preencher todo o campo da tela — conta o fotógrafo. — Só depois percebi que precisava marcar o gesto, deixar o rastro da pincelada, a memória daquele movimento na imagem.

O fotógrafo sempre estudou pintura e desenho, mas diz não se ver como pintor. Para Maneco Müller, diretor da Mul.ti.plo, é justamente esta característica que diferencia as iluminuras de um trabalho baseado na imagem fotográfica apenas.

— Isso é uma intervenção na linguagem fotográfica absolutamente inusitada. A imagem deixa de vir só do olhar poético do seu autor, ela é transformada pelo seu gesto contundente, no papel. Não daria certo se o Walter não soubesse pintar — atesta o galerista. — E cada obra é única, vai ser revelada somente pelas pinceladas da platina naquele suporte. Isso rompe a própria lógica de reprodutibilidade infinita da fotografia.

Meio século como diretor de fotografia

Longe dos sets de cinema desde “Barretão” (2019), Walter Carvalho mantém projetos para a tela grande, como a direção de um documentário sobre o vazio, por ora adiados pelo trabalho na TV.

— Também tenho projetos de ficção, mas a TV me absorve muito. Após o fim de “Pantanal”, vou ver se consigo voltar a eles. Agora consegui separar esse tempo para montar a exposição.

Autor do ensaio que acompanha a mostra, o crítico e curador Paulo Sergio Duarte destaca justamente a relação com o cinema para falar sobre o título da série de obras:

— As iluminuras nos escritos medievais eram imagens que abriam áreas de luz nos textos, a palavra vem de “iluminação”. Não poderia ter um título mais apropriado para alguém que dominou a luz por tantos anos no cinema batizar sua série.

Aos 74 anos, Carvalho completa, em 2022, meio século como diretor de fotografia — após ser convidado por Vladimir Carvalho para fazer a assistência de direção em “O país de São Saruê” (1971), ele assumiu a fotografia de “Incelença para um trem de ferro” (1972), também de seu irmão. A inquietação, garante ele, continua a mesma:

— Digo sempre que meu melhor filme é o próximo. É um sofisma, mas de fato sinto isso como uma verdade cristalina. Quero o desconhecido. Fazer um filme, dirigir uma cena na TV ou produzir uma iluminura para mim tem a mesma sensação de rodar o primeiro take da minha vida.

Onde: Mul.ti.plo Espaço Arte — Rua Dias Ferreira 417/206, Leblon (2259-1952). Quando: Seg a sex, das 11h às 18h. Abertura hoje. Até 24/6. Quanto: Grátis. Classificação: Livre.

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