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Com desenvoltura entre defesa e ataque, Paulinho é o equilíbrio da seleção brasileira

Recuperando-se de lesão, volante do Tottenham é o homem de confiança de Felipão

Paulinho comemora gol diante do Uruguai na semi-final da Copa das Confederações em 2013
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Christophe Simon/AFP
Paulinho comemora gol diante do Uruguai na semi-final da Copa das Confederações em 2013 Foto: / Christophe Simon/AFP

TERESÓPOLIS - A negatividade com que parte do país esperou pela Copa do Mundo fez até o talento de Neymar se transformar em problema. Embora ter um craque seja sempre solução, as discussões que marcaram a preparação em Teresópolis giraram em torno da dependência que a seleção tem de seu camisa 10 e da disputa entre Oscar e Willian. Os reais problemas, no entanto, nem sempre recebem a atenção que merecem. Por conta das lesões e da falta de sequência no Tottenham, Paulinho perdeu o padrão de atuações que faz dele uma síntese do conceito que orienta a formação e a dinâmica do time de Luiz Felipe Scolari.

Recuperando-se de torção no tornozelo esquerdo, o camisa 8 sentiu o campo e o jogo pesados e teve participação discreta no amistoso em que o Brasil sofreu para vencer a Sérvia na última sexta-feira. Sem a agressividade de Paulinho, a seleção teve dificuldades de avançar suas linhas e de se manter compactada no campo de ataque. Embora não tenha havido qualquer lesão nos ligamentos, o calor humano e o prazer de estar de volta à seleção servem para regenerar a confiança e a continuidade que se romperam na temporada europeia.

- Eu não estava jogando, me machuquei, depois voltei a fazer algumas partidas antes de sair do time novamente. Foi quando o Felipão esteve em Londres, para um almoço, e me deu tranquilidade. Naquele dia, me senti muito mais importante e confiante para a Copa do Mundo ‑ disse Paulinho, sobre o encontro em que o técnico antecipou sua convocação.

O investimento de Felipão não deixa seus jogadores mais ativos no banco. Revigorado física e emocionalmente, Paulinho fez três gols e foi titular nos últimos seis jogos da temporada europeia. Mesmo que comece a se aproximar do seu melhor momento, ainda parece distante do jogador que apareceu bem acima dos demais, ao marcar gols decisivos de cabeça para as conquistas da Libertadores, pelo Corinthians, em 2012, e da Copa das Confederações, com a seleção, no ano seguinte. Sem grandes alegrias desde então, enfrentou a solidão na Granja, ao ser poupado do primeiro amistoso, e questionamentos de que estaria triste

- Não, nem um pouco. Nunca, jamais. Em um momento tão importante da minha carreira, disputando uma Copa do Mundo... A tristeza está passando bem longe

ENTRE A DEFESA E O ATAQUE

Pela capacidade de flutuar entre a defesa e o ataque com a mesma desenvoltura, Paulinho é um jogador que apresenta um saudável comportamento bipolar. Sereno e cauteloso na forma de se expressar, exibe rara agressividade em campo, com arrancadas que o fazem surgir como elemento surpresa. Seja com a bola dominada ou na disputa dos rebotes ofensivos, o estilo de jogo do volante aproxima os setores, abre espaço para os meias e mantém o time agrupado no campo de ataque. Por conta de lesões e da perda de sequência no futebol inglês, no entanto, o jogador tem sido previsível e contido como em suas declarações até que a volta ao ponto de partida anuncia a inversão dos polos.

Identificado com o Corinthians, onde avançou para chegar à seleção, Paulinho tem no jogo de amanhã, contra a Croácia, uma dupla estreia. Apesar da acolhida por jogar em casa, o Itaquerão é uma novidade e um desafio para qualquer alvinegro. Na impossibilidade de reviver o passado, quando Paulinho e o Corinthians faziam o Pacaembu de base para conquistar o mundo, só resta começar uma nova história.

Ao contrário do discurso moderado que exibe sob câmeras e holofotes, internamente Paulinho já se mostrou disposto a qualquer sacrifício para a honrar a confiança que Felipão manifestou nele num momento em que parte do público e crítica já levantam dúvidas. Mesmo recuperado da torção, que já não lhe traz qualquer limitação de movimentos, o volante disse a amigos que precisava de uma perna só para fazer tudo que se espera dele na estreia. Desde que sofreu com o racismo e com a inadimplência, na via crúcis que passou por Polônia e Ucrânia antes de encontrar a glória no Corinthians, Paulinho aprendeu a usar as limitações como estímulo

- Não foi um problema ficar no banco do Tottenham por conta dos problemas que tive. Quando um jogador vai para a Europa, ele tem que ser firme. Enfrentei os desafios.

Falta o país fazer o mesmo diante da Copa que se anuncia. Num período em que o povo brasileiro teve motivos para cultivar uma visão crítica sobre si mesmo, cabe ao olhar estrangeiro revelar virtudes esquecidas. Enquanto ingleses jogam capoeira, alemães se abraçam à torcida baiana e holandeses desfrutam do doce balanço a caminho do mar, ainda há o torcedor local que vê problemas no talento de Neymar e que espera pelo pior no momento em que quase todo mundo já mostra entusiasmo diante da festa do futebol. Dentre os problemas reais, que não serão resolvidos pela boa vontade dos visitantes, um deles é a recuperação de Paulinho. A julgar pelo encontro dos círculos que formam o número e o conceito que carrega nas costas, o camisa 8 da seleção é o homem de ligação, capaz de transformar qualquer carga negativa em centelha para a explosão do bom futebol.