Rio Bairros

Com Museu Nacional e Jardim Zoológico fechados, Quinta da Boa Vista sofre com má conservação

Área de lazer tem buracos, sujeira e banheiros danificados
Quinta da Boa Vista abriga pessoas em situação de rua, além de sofrer com falta de conservação Foto: Pedro Teixeira
Quinta da Boa Vista abriga pessoas em situação de rua, além de sofrer com falta de conservação Foto: Pedro Teixeira

Esqueça a Quinta da Boa Vista retratada nos livros de História. O complexo paisagístico localizado em São Cristóvão está longe de reviver os áureos tempos em que hospedou a família real portuguesa entre 1808 e 1822. Atualmente, abriga em seus bancos (muitos deles quebrados) e gramados pessoas em situação de rua. Já a antiga casa sede da realeza, que deu lugar ao Museu Nacional , passa por uma grande reforma após o incêndio ocorrido em setembro de 2018, e a previsão de reabertura ao público é só para 2022. O Jardim Zoológico também está de portas fechadas para obras e deve voltar a funcionar, parcialmente, no primeiro trimestre do ano que vem. Sem duas das suas principais atrações, restaria ao espaço oferecer ao público segurança, asfalto impecável, calçadas niveladas, lago e córregos limpos e banheiros em bom estado de conservação. Não é o que se vê, ainda que sua beleza natural resista e se revele deslumbrante.

— Caminho na Quinta diariamente, mas priorizo andar nas vias principais, porque as laterais estão muito esburacadas. Sem contar que, às vezes, o córregoque fica perto das quadras poliesportivas tem um mau cheiro insuportável. É um contraste com o ar puro natural desse lugar tão arborizado — analisa o aposentado Elias Dias, morador de São Cristóvão.

No mesmo ambiente em que a equipe de reportagem encontrou um grupo de praticantes de tai chi chuan se exercitando em movimentos que transmitiam paz e serenidade, havia também cães soltos, incluindo um pitbull sem focinheira. Essa é a maior preocupação de José Carlos Pascoal, aposentado e frequentador assíduo do parque.

— Durante a semana, quase não se vê a Guarda Municipal atuando aqui. E mesmo quando tem um agente perto de um cachorro solto, ele não pede para o dono botar a coleira. Isso é um absurdo que faz parte da rotina da Quinta — critica.

Beleza natural da Quinta da Boa Vista resiste à falta de manutenção Foto: Pedro Teixeira
Beleza natural da Quinta da Boa Vista resiste à falta de manutenção Foto: Pedro Teixeira

A Guarda Municipal informou por meio de nota que mantém uma base avançada da 1ª Inspetoria (Centro) na Quinta da Boa Vista com agentes atuando, diariamente, no patrulhamento do parque com o apoio de três bicicletas e um carrinho elétrico. O órgão disse ainda que, além do efetivo fixo, uma viatura com dois agentes atua em rondas no local reforçando o patrulhamento e que, nos fins de semana, o parque recebe outras ações, como o reforço na fiscalização e no controle de trânsito, devido ao considerável aumento de público.

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Mobiliário quebrado

Se transitar pela Quinta pode ser arriscado, sentar-se, mesmo nos lugares apropriados, também é uma missão para os fortes. Há bancos quebrados por todos os lados. Sobre esse problema, a Comlurb, órgão responsável pela manutenção desse tipo de mobiliário, informou que vai fazer uma vistoria para verificar os problemas e programar os reparos necessários. Quem sente esse drama na pele tem urgência em ver uma solução.

Parque tem mobiliário quebrado Foto: Pedro Teixeira
Parque tem mobiliário quebrado Foto: Pedro Teixeira

— Nos fins de semana, quando a Quinta está cheia, procuro um banco para me sentar e não encontro, porque só ficam livres os quebrados. Como eu não sou maluca de correr o risco de me machucar, muitas vezes até desisto de dar uma paradinha para ler. É uma pena a atual situação em que a Quinta se encontra, porque esse lugar é nosso, lindo, e merece ser bem cuidado — lamenta a dentista Janaína Barroso.

Buracos, Pessoas em situação de rua e

Destino concorrido nas férias escolares, a Quinta da Boa Vista, temporariamente sem museu e zoológico, tem como atração principal seus mais de 150 mil metros quadrados de área ao ar livre, espaço mais do que propício para andar de bicicleta, patinete, jogar bola, fazer piquenique... Mas a questão é que até caminhar tranquilamente pelo local pode ser um perigo, tendo em vista as pistas esburacadas e as calçadas desniveladas. Sobre esse assunto, a Secretaria municipal de Conservação informou que enviará uma equipe para vistoriar a área e programar os reparos necessários, com serviços de tapa-buraco e recomposição asfáltica.

Outro problema evidente é a presença de pessoas em situação de rua vivendo no parque. Por meio de nota, a Secretária municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, responsável pelo acolhimento de quem precisa de um lugar para morar, informou que age em todas as áreas da cidade, mas não pode forçar a ida para um abrigo. “A Secretária municipal de Assistência Social e Direitos Humanos atua diariamente junto às pessoas em situação de rua em todos os bairros da cidade, com abordagens feitas pelos educadores e assistentes sociais, realizadas de acordo com a agenda do dia. Vale ressaltar que as pessoas em situação de rua formam um grupo social itinerante, e as equipes da Secretaria obedecem estritamente à lei, que impede o acolhimento compulsório. Os assistentes sociais só podem agir conforme a vontade e o desejo do cidadão que está nas ruas”, observou.

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O estado de conservação dos banheiros também é um ponto crítico. Quando a equipe de reportagem esteve no parque, constatou que, no sanitário feminino, apenas uma das quatro pias funcionava, e apenas quatro das 13 cabines estavam próprias para uso. Além disso, faltavam portas, descargas e não havia o menor vestígio de papel higiênico ou sabão para lavar as mãos. Procurada para esclarecer o motivo das condições precárias, a Comlurb informou que faz rotineiramente a limpeza e pequenos reparos hidráulicos no local. Já em relação às portas, a companhia fez o levantamento do que precisa ser reposto e vai programar os serviços. O órgão também ressaltou que atos de vandalismo são constantes, obrigando seus funcionários a realizarem seguidos consertos nos equipamentos.

Banheiros da Quinta da Boa Vista precisam de reforma Foto: Pedro Teixeira
Banheiros da Quinta da Boa Vista precisam de reforma Foto: Pedro Teixeira

Um gari que trabalha no local e pediu para não ser identificado confirmou que parte dos frequentadores de fato destrói instalações, mas denunciou que falta até material de limpeza para fazer o seu serviço:

— É verdade que parte da população, principalmente nos fins de semana, que são dias de maior movimento, contribui para o estado em que os banheiros da Quinta se encontram. A culpa não é só das autoridades. Roubam pias, torneiras... Mas o que mais me revolta é que a Comlurb também não cumpre sua parte. Já cansei de trazer cloro e sabão da minha casa, porque, se não fizesse isso, nem conseguiria trabalhar. Esse é o mais completo absurdo.

Espaço para exercícios é um ponto positivo

Apesar do cenário desfavorável em vários aspectos, nem tudo é problema na Quinta da Boa Vista. Além de aulas ao ar livre de artes marciais e do vaivém constante de pessoas que usam o espaço para caminhar ou correr em busca de saúde e bem-estar, os aparelhos de ginástica estão em perfeito estado de conservação e são bem disputados. Sorte de Joselito Luiz Bel, morador de Benfica que aproveita seus momentos de folga para combater o sedentarismo.

— Malho aqui há anos e percebo que a manutenção dos aparelhos é feita regularmente. Felizmente, não tem nenhum equipamento quebrado. Eu também aproveito para caminhar nessa área verde tão bonita e que ainda guarda ar puro — elogia o vigia.

Parque é muito usado para prática de exercícios físicos Foto: Pedro Teixeira
Parque é muito usado para prática de exercícios físicos Foto: Pedro Teixeira

Rosângela Silva engrossa o coro. Pelo menos três vezes por semana, a professora aposentada sai de Vila Isabel e vai até São Cristóvão praticar atividades físicas no parque:

— Se tem uma coisa que funciona muito bem na Quinta são os aparelhos de ginástica. Além de ninguém destruí-los, a manutenção é constante e bem feita. Eu me sinto privilegiada por estar sempre aqui.

Um grupo de cerca de 15 pessoas é visto, rotineiramente, pela manhã, praticando tai chi chuan nos gramados do parque. Há quem passe por ali e sinta a alma massageada só de observar a leveza e a precisão dos movimentos, alguns  deles feitos com o auxílio de leques.

— É lindo de ver essa conexão que os praticantes de tai chi chuan criam entre corpo, mente e natureza. Tenho vontade de me juntar ao grupo, mas, infelizmente, os meus horários são muito inconstantes — explica o fisioterapeuta Guilherme Peixoto, morador da Tijuca.


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