• Nathan Fernandes
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"Frances e as fadas", 1917 (Foto: Domínio Público)

O que crianças faziam para se divertir em 1917? No caso das primas Elsie Write e Frances Griffiths, com 16 e 10 anos respectivamente, a resposta é: fotografar fadas.

Filha de um dos primeiros engenheiros elétricos da Inglaterra, Elsie resolveu pegar a câmera fotográfica do pai para fazer imagens no jardim de casa. O que ninguém esperava era que fadas fossem aparecer nas fotos e que a nação inteira ficaria comovida com a surpresa. Trata-se de um dos casos mais bizarro de boatos falsos pré-internet, conhecido como as “Fadas de Cottingley” — em referência à cidade inglesa onde o caso ocorreu. 

Quando as garotas contaram sobre a “experiência mística” que haviam registrado, o pai, Arthur, não teve dúvidas de que aquilo tudo era falso, e proibiu as meninas de brincarem novamente com a câmera. Já a mãe, Polly, pensava diferente. E, em 1919, ela recorreu à Sociedade Teofísica.

Sem conseguir distinguir os recortes grosseiros em 2D, os membros da sociedade ficaram chocados com a informação. O escritor Edward Gardner, um dos principais nomes do grupo, considerou aquilo como prova de que o “próximo ciclo de evolução estava a caminho” e tratou de tentar convencer a Inglaterra inteira da ideia.

"Elsie e o gnomo", 1917 (Foto: Domínio Público)

“A cobertura inicial da imprensa era meio cética”, escreveu Rosa Lyster em um artigo do Quartz. “Mas durante e após a Primeira Guerra Mundial, o espiritualismo e o misticismo cresceram muito entre a população britânica, que estava de luto. As fotos das fadas pareciam críveis para pessoas que acreditavam na existência de um mundo melhor.”

A história chegou até o escritor Arthur Conan Doyle, que, apesar de ser o criador de um dos personagens mais racionais da literatura, Sherlock Homes, tinha uma forte crença no sobrenatural. Ele chegou a escrever um artigo na revista The Strand reforçando a fé nas fadas e enviou o amigo Gardner ao encontro das meninas para ver se conseguia mais “provas”. E conseguiu.

 (Foto: Domínio Público)

"Frances e a fada saltitante", 1920 (Foto: Domínio Público)

 (Foto: Domínio Público)

"Fada oferecendo um ramalhete a Elsie", 1920 (Foto: Domínio Público)

 (Foto: Domínio Público)

"As fadas e seus banhos de sol", 1920 (Foto: Domínio Público)

Compreensível: imagine que você é uma garota pré-adolescente responsável por uma mentira que enganou todo mundo. O escritor mais famoso do país te pede para falar mais sobre o caso. O que você faz? Sustenta a mentira. E isso permaneceu por décadas.

A verdade só veio à tona na década de 1980. Em 1983, as duas confessaram que as fadas haviam sido recortadas de livros infantis — caso alguém não tenha notado. Elsie admitiu que toda a história era falsa, mas Frances insistiu que a última foto que haviam tirado [As fadas e seus banhos de sol] era verdadeira.

Como escreveu Lister, no Quartz, “o problema de contar uma mentira é que, no geral, você precisa contá-la também para outra pessoa para manter as aparências. E aí é tarde demais para admitir que você inventou tudo, e continua mentindo”. Não raro, os próprios mentirosos também acreditam nas próprias mentiras.

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