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Clipping – Conjur – STJ divulga casos em que aceitou e rejeitou “adoção à brasileira”

05-02-2018

O Superior Tribunal de Justiça publicou, neste domingo (4/2), precedentes da corte sobre a validade da chamada “adoção à brasileira”, que consiste na entrega de crianças, pelos pais biológicos, para que outras pessoas possam criá-las, sem seguir exigências legais. Os números dos processos não foram divulgados, por estarem em segredo judicial.

Em outubro de 2016, por exemplo, o tribunal permitiu que um casal ficasse com irmãos gêmeos, adotados à brasileira, aos nove meses de idade. A princípio, o marido alegou que seria pai biológico das crianças, frutos de relacionamento extraconjugal passageiro, e que sua esposa estaria disposta a adotá-las.

Um exame de DNA, no entanto, concluiu que o adotante não era o pai biológico dos gêmeos. Segundo os autos, a mãe biológica manifestou expressamente sua concordância com a adoção, e foi constatado que o pai e o avô das crianças, na família de origem, abusavam sexualmente das crianças mais velhas com a conivência da mãe biológica.

Diante dessa situação, o relator do processo, ministro Raul Araújo, defendeu a permanência dos gêmeos com os pais adotivos. “Não é possível afastar os olhos da situação fática estabelecida para fazer preponderar valores em tese. O que se tem, no momento, são duas crianças inseridas em um lar no qual vivem há mais de cinco anos, com a recomendação para que sejam recolhidas a um abrigo, sem entender, porém, a razão pela qual lá estarão e porque seus ‘pais’ não podem mais lhes fazer companhia”, disse o ministro.

“Os danos psicológicos são constatáveis de pronto e são de difícil reparação”, continuou. “Se serão ocasionados pelos adotantes ao descumprirem as ordens judiciais, ou se decorrem do próprio sistema de adoção, não importa, o fato é que atingem menores, cuja proteção e bem-estar imantam todo o sistema criado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente”, concluiu o relator.

Bem-estar psíquico e físico

Outro julgado, de agosto de 2017, resultou na guarda da criança pelos pais adotivos, de forma provisória, até ser concluído o processo regular de adoção. Nesse caso, a criança foi abandonada pela mãe biológica aos 17 dias de vida e foi encontrada em frente a uma casa, dentro de uma caixa de papelão.

A dona da casa entregou a criança para seu filho, que vivia em união estável homoafetiva desde 2005. Após entrarem em contato com a Polícia Civil e contratarem investigador particular, os adotantes conheceram a mãe biológica e descobriram que ela, por não ter condições financeiras, os escolheu para que criassem o menor.

O relator, ministro Villas Bôas Cueva, concluiu que “admitir-se a busca e apreensão de criança, transferindo-a a uma instituição social como o abrigo, sem necessidade alguma, até que se decida em juízo sobre a validade do ato jurídico da adoção, em prejuízo do bem-estar físico e psíquico do infante, com risco de danos irreparáveis à formação de sua personalidade, exatamente na fase em que se encontra mais vulnerável, não encontra amparo em nenhum princípio ou regra de nosso ordenamento”.

Tráfico infantil

Apesar de algumas decisões favoráveis à família adotante, muitas vezes as crianças não permanecem com aqueles que as adotaram à brasileira. Em agosto de 2017, a 4ª Turma do STJ decidiu que uma criança, entregue pela mãe biológica a terceiros, logo após o nascimento, deveria ser encaminhada a abrigo, mesmo tendo convivido com a nova família por dez meses. O caso envolvia a suspeita de tráfico infantil.

O relator do processo, ministro Marco Buzzi, afirmou que “é notória a irregularidade na conduta dos impetrantes, ao afrontar a legislação regulamentadora da matéria sobre a proteção de crianças e adolescentes, bem assim às políticas públicas implementadas, com amparo do Conselho Nacional de Justiça, visando coibir práticas como esta”.

Em seu voto, o ministro também justificou a decisão de encaminhar a criança, nascida em julho de 2016, para a instituição. “Dada a pouca idade da criança e em razão de os elos não terem perdurado por período tão significante a ponto de formar para a menor vínculo indissolúvel, prudente e razoável a manutenção do abrigamento”, esclareceu.

Falsa gravidez

Em dezembro de 2017, a 3ª Turma do STJ também decidiu pela permanência da criança em abrigo. O menino havia sido entregue pela mãe biológica, moradora de rua, ao pai, que o adotou à brasileira. Apesar de ser casado e de sua esposa ter usado uma falsa barriga para simular que estava grávida da criança que seria adotada, apenas o pai registrou o menino em cartório.

Os autos indicam que o pai seria reincidente na adoção à brasileira. Há mais de seis anos, a mesma moradora de rua havia deixado outra criança aos seus cuidados, mediante promessa de ajuda financeira.

Diante desse cenário e por meio de ordem judicial, a segunda criança adotada foi encaminhada, aos dois meses de idade, para uma casa de abrigo. Segundo o relator do processo, ministro Moura Ribeiro, as circunstâncias da adoção e o curto espaço de tempo em que a criança conviveu com a família adotante justificam sua permanência na instituição.

“A decisão objeto do writ, com efeito, não é manifestamente ilegal ou teratológica, bem como não visou somente privilegiar o disposto no parágrafo 13 do artigo 50 da Lei 8.069/90 em detrimento do bem-estar da criança, mas sim proporcionar que ela tenha um desenvolvimento sadio, ainda que seja provisoriamente no sistema de acolhimento institucional, tendo em conta as condutas nada ortodoxas da família substituta e os padrões éticos não recomendáveis para a educação e desenvolvimento sadio do infante”, explicou o relator.

Paternidade sem rescisão

Em fevereiro de 2015, a 4ª Turma do STJ decidiu manter registro de uma criança, cujo pai adotivo mantinha relacionamento com a mãe biológica, grávida de um relacionamento anterior. Segundo os autos, embora não existam vínculos biológicos, foi reconhecida a adoção à brasileira e a existência de relação socioafetiva ente o pai adotivo e a criança.

Após desentendimentos com a mãe do menor, o pai decidiu pela exclusão de paternidade. Segundo os autos, também havia a intenção de retirar o menino do rol dos herdeiros. O pedido foi negado porque o caso não se inclui nos princípios do Código Civil de 2002 e da Constituição Federal, referentes à ação negatória de paternidade.

“A chamada ‘adoção à brasileira’, muito embora seja expediente à margem do ordenamento pátrio, quando se fizer fonte de vínculo socioafetivo entre o pai de registro e o filho registrado, não consubstancia negócio jurídico vulgar sujeito a distrato por mera liberalidade, tampouco avença submetida a condição resolutiva consistente no término do relacionamento com a genitora”, esclareceu o relator do processo, ministro Luis Felipe Salomão.

Fila de espera

Mais de 8,4 mil crianças e adolescentes estão aptos para adoção no Brasil e registrados no Cadastro Nacional de Adoção (CNA) do Conselho Nacional de Justiça. Desde 2008, o CNA centraliza as informações sobre os menores e os possíveis adotantes de todo o país e do exterior.

O cadastro conta com um sistema de alerta que informa automaticamente ao juiz, via e-mail, sobre a existência de adotandos e adotantes compatíveis, inclusive quando estão em estados e regiões diferentes. No Brasil, o processo de adoção leva, em média, um ano para ser concluído.

Existem mais de 42,7 mil pretendentes cadastrados no CNA. Desse total, 92,18% aceitam crianças brancas, 80,18% aceitam crianças pardas, 52,47% aceitam crianças negras e 47,09% querem uma criança com qualquer cor de pele.

Para adotar uma criança, o primeiro passo é procurar uma Vara de Infância e Juventude para saber quais documentos devem ser apresentados. A idade mínima do adotante é de 18 anos, respeitada a diferença de 16 anos entre quem deseja adotar e o adotando. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Fonte: Conjur