O empresário Roberto Nedelciu, da Raidho Tour Operator, conta sua impressionante jornada ao topo do Monte Kilimanjaro, norte da Tanzânia

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Texto e fotos: Roberto Nedelciu*

O Monte Kilimanjaro é o ponto mais alto do continente africano. O nome vem de Kilima Njaro, que significa “montanha brilhante”, no idioma kiswahili.

Com uma altitude de 5.895 metros no Pico Uhuru, não tem nada de “monte”. É um vulcão extinto, com o topo coberto de neves, que se ergue no meio da savana ao norte da Tanzânia, junto à fronteira com o Quênia.

Minha fascinação por este ícone imortalizado pelo escritor americano Ernest Hemingway (1899-1961) começou em 2008. Após anos admirando e planejando uma viagem ao local, consegui realizá-la em outubro de 2011.

A viagem começou, na realidade, um ano antes, com diversas pesquisas da melhor rota e orçamentos. Aproveitei também para convidar alguns amigos.

O interessante é que, ao ouvirem os meus planos de realizar o trekking até o topo do Kilimanjaro, as pessoas tinham duas reações. A primeira era: “Muito legal, mas não é para mim”. A outra, “Você é louco, vai morrer”.

Mas nada que pudesse me desencorajar. Eu estava decidido e, no final, conseguimos um grupo de 11 pessoas, sendo sete homens e quatro mulheres, todos entre 35 e 54 anos.

MAPAKILIA viagem é feita via Johanesburgo, na África do Sul. Após 8 horas de voo, pegamos uma conexão de mais cinco horas até Nairóbi, no Quênia, e, em seguida, outra de apenas uma hora até Moshi, já na Tanzânia.

Depois de um rápido descanso em Moshi, no dia seguinte cedo conhecemos nosso guia, Emmanuel, e sua equipe, com mais quatro pessoas, que iriam subir conosco.

Após carregarmos o ônibus com todo nosso equipamento, partimos em direção ao inicio da rota Rongai. Não é um caminho muito popular. Trata-se de uma rota mais selvagem, a única do lado norte da montanha, com algumas cavernas muito interessantes pelo percurso.

O momento tinha chegado e todos estavam ansiosos pelo início. Em Rongai, uma aldeia que fica a 1.950 m de altitude, perto da fronteira do Quênia, a temperatura era de 34oC, mas vista da planície Maasai era espetacular.

Ajudantes africanos – Em Moru Nale, pequena aldeia próxima a Rongai, os guias contrataram trinta e dois carregadores, que ficaram responsáveis por levar todos os nossos equipamentos, incluindo barracas, panelas, mantimentos e até fogão para o alto da montanha. Eles também preparariam as refeições.

A caminhada até o topo é dividida em cinco partes e cada uma tem características diferentes de vegetação, geografia e temperatura.

Começamos em meio algumas lavouras e logo a paisagem mudou para uma floresta tropical com muitos animais selvagens, a maioria macacos.

Começo suave – Nesta etapa, a trilha era suave, não muito íngreme. Durante todo o caminho víamos os carregadores, inclusive mulheres, levando bagagens enormes e pesadas, mas eles nos ultrapassavam com muita rapidez.

O acampamento da primeira noite foi no lugar próximo à primeira caverna, a cerca de 2.600 metros. Quando chegamos, foi uma surpresa: as tendas estavam prontas, com todos nossos equipamentos distribuídos. Havia inclusive um banheiro e uma barraca refeitório, com mesa de madeira, bancos, toalha e todas as louças para nosso jantar. Uma infraestrutura incrível e inesperada para as condições selvagens do local.

A refeição tinha salada, prato principal e sobremesa. Nossa primeira noite no Kilimanjaro estava magnifica, com a lua cheia refletindo no alto da montanha e um céu forrado de estrelas como eu nunca havia visto antes.

No dia seguinte acordamos com o nascer do sol e, infelizmente, sem a possibilidade de um banho. Cada um de nós recebeu uma bacia com água aquecida, originária de uma fonte de degelo das neves um pouco abaixo do acampamento. Com esta água também abastecemos os cantis.

No inicio do segundo dia, após receber as instruções sobre o material necessário, iniciamos a caminhada rumo a Kikelewa. Vimos uma vegetação típica de lugares áridos, com diversas a colinas rochosas.

Foi uma subida gradual, com excelente vista das planícies verdes e enormes do Quênia. Em contraste, acima estava o espetacular Tarn Mawensi e uma espessa camada de nuvens, que certamente iriamos atravessar.

“Rei Leão” – Apesar do exercício físico exigido, os guias nos distraiam ensinando algumas músicas e palavras em kiswahili. Por exemplo, leão é “simba”; javali é “pumba” e tudo bem é “hakunamatata” – exatamente como no filme da Disney Rei Leão.

Almoçamos perto de Kibo, segunda caverna a 3.450 m. Quando chegamos, novamente já havia a tenda-restaurante armada, com uma refeição completa.

Partimos para a terceira caverna, a Kikelwa Cave, a 3.600 metros acima do nível do mar, e os sintomas da altitude começaram a aparecer. Finalmente me dei conta que estava em uma montanha muito grande e alta, pois estava me cansando mais facilmente e com dificuldade de respirar.

Chegamos ao acampamento, desta vez já bem diferente, uma vez que o terreno era todo rochoso e não havia nenhuma planta ou animal no local.

Nesse dia estava chovendo e infelizmente não dava para ter uma visão do topo. Foi quando nosso guia informou que apenas quatro de cada dez pessoas que tentam subir ao topo do Kilimanjaro conseguem chegar.

O mal da altitude – Apesar de cinco pessoas do nosso grupo já estarem com leves sintomas do mal de altitude, todos estavam animados e ansiosos. Dormimos bem e, no dia seguinte, uma grande expectativa pairava sobre o grupo, pois a próxima parada era o campo base, de onde iniciaríamos o ataque ao cume.

Após o café da manhã, passamos por paisagens que lembravam um deserto alienígena. A região foi coberta por lava que saiu das crateras laterais do Kilimanjaro (hoje os picos dos vulcões Mawensi e Kibo).

No meio da tarde, chegamos à Kibo Hut, o campo base, que fica a 4700 metros de altitude. Fizemos uma refeição reforçada de carboidratos, aproveitamos para verificar todo equipamento e descansamos nas tendas.

A temperatura nesta etapa já havia caído consideravelmente e estava em torno de 3oC. Descansamos até o horário do jantar e fomos dormir cedo, mas a ansiedade era grande e poucas pessoas do grupo tiveram um sono tranquilo.

Eu fiquei revisando o equipamento, principalmente a câmera fotográfica, pois sabia que as baterias descarregam mais rapidamente em temperaturas extremas. Eu planejava colocá-las junto ao meu corpo para mantê-las aquecidas

As instruções dos guias eram de levar pouca coisa para cume – no máximo algumas barras de cereais e um cantil de ponta cabeça, para evitar o congelamento, pois a água congela de cima para baixo, na mochila.

Por volta de 23h30 estávamos prontos para iniciar o ataque ao cume, com uma temperatura de 2º C negativos. Nesta noite tínhamos lua cheia, porém o céu estava com algumas nuvens.

Usamos lanternas da cabeça, mas mal enxergávamos dois metros a nossa frente quando a lua estava encoberta. O esforço para a caminhada era tremendo no caminho em zig-zag, bastante íngreme e com ar rarefeito.

Cansaço extremo – A cada 5 metros tínhamos que parar para respirar. Para completar o cenário, a temperatura caía assustadoramente a cada metro subido. Durante a madrugada chegou a fazer 25 oC Negativos.

Quando chegamos a 5.000 metros, uma das participantes perdeu a coordenação motora devido à falta de oxigênio e teve que descer de volta ao campo base com um guia.

Cerca de uma hora depois, a 5200 metros, outro participante desistiu. Reunimo-nos e fizemos um pacto que todos iriam subir. Esta parte da caminhada era muito íngreme com muitas pedras soltas e amontoadas, exigindo um grande esforço físico e concentração.

Foi provavelmente a parte que mais exigiu atenção de todo o percurso. A partir desse ponto, estávamos literalmente arrastando os pés, movendo-nos lentamente, com gelo se formando nas sobrancelhas – única parte do corpo exposta. Todos em silencio absoluto. Sentíamos que falar seria um esforço imensurável.

Eu e os outros oito integrantes chegamos por volta de 6h30 ao Gilmans Point, a 5.690 metros de altitude. Foi maravilhoso ver o amanhecer à beira do vulcão, uma paisagem de tirar o folego, ou melhor, dizendo de recuperar o folego.

Após um breve descanso e um chá de gengibre, decidimos seguir em direção à cratera do pico Uhuru. Caminhávamos pela borda da cratera do vulcão com uma esplêndida vista dos glaciares que nos rodeavam. Mas era preciso muito cuidado, pois havia gelo e pedras soltas – o menor deslize poderia nos fazer cair na cratera, com ferimentos certeiros.

A conquista do cume – Por volta das 8h30 chegamos ao Uhuru Point que fica a 5.895 metros. Foi uma emoção única. Emoção de ter superado todos os obstáculos. A paisagem era fascinante e a energia era tanta que nos abraçávamos, pulávamos, riamos e chorávamos. Era uma mistura de exaustão e sensação de objetivo alcançado.

Após 15 minutos de fotos no Uhuru e comemorações começamos a descida. Na realidade nós tínhamos chegado à metade do caminho, pois tínhamos que retornar.

Gastamos cerca de duas horas até Gilmans Point. Deste ponto em diante, normalmente um guia da o braço para dois alpinistas e descem quase que escorregando pela encosta da montanha.

O esforço era muito grande e nos desorientava. Começaram as alucinações devido ao cansaço e ao ar rarefeito. Em uma das paradas, um membro do grupo pediu que eu pegasse uma garrafa de água dentro do frigobar em que eu estava sentado. Foi difícil convencê-lo que era uma pedra e não um frigobar.

kilimanjaro (158)

Alguns minutos mais tarde, outro amigo queria ir até um lago próximo para pegar água, mas na realidade não havia lago algum. Depois, foi minha vez de alucinar. Tive certeza de ver um ônibus que faria nosso transfer ao acampamento.

Chegamos ao acampamento base as 14h30, após 15 horas de caminhada, praticamente sem comer, pois as barras de cereais que levei congelaram no meu bolso.

Fomos recepcionados pela equipe com músicas locais e tratados como verdadeiros heróis – realmente emocionante.

Após um pequeno descanso, alimentação e hidratação, saímos em baixo de uma chuva fina em direção ao campo Horombo (3.720 m) agora pela rota Marangu, que é mais fácil. Foram 3 horas de caminhada para uma distancia de 10 km.

Depois, uma noite de sono e mais 12 horas até Marangu Gate, onde todos ganharam o “Golden Diplom” – o certificado para quem atinge o cume do Kilimanjaro.

Era uma mistura de alegria e exaustão. Graças a minha esposa e filhas, todos os integrantes do grupo receberam “cartinhas” dos familiares parabenizando-os pela conquista. Nesta noite, já no hotel, passei por outro momento emocionante, ao receber parabéns por meu aniversário do chefe da cozinha e sua equipe com um bolo e todos cantando parabéns a você em kiswahili.

Realmente foi um aniversario muito especial, comemorado “nas alturas”, literalmente. Tão especial que decidi repetir a “dose” e ir comemorar o próximo no Everest.

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Roberto Haro Nedelciu é diretor-executivo da Raidho Tour Operator, operadora de turismo fundada em 1990, especializada em viagens a lugares exóticos e diferenciados, com enfoque na cultura, filosofia e costumes de cada povo.

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