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Zaira Regina Zafalon Samanta do Prado (organizadoras) ENTRE LEMBRAR E ESQUECER 20 ANOS DEPOIS: MEMÓRIAS Zaira Regina Zafalon Samanta do Prado (organizadoras) ENTRE LEMBRAR E ESQUECER 20 ANOS DEPOIS: MEMÓRIAS Niterói Intertexto 2020 ©2020 by Zaira Regina Zafalon e Samanta do Prado (organizadoras). Direitos desta edição reservados à INTERTEXTO. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Editora. Projeto Gráfico, Capa e Editoração Eletrônica: Camilla Pinheiro Fotografia da Capa: Waldeck Schutzer Fotografias: Sílvia Moura e Waldeck Schutzer Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) E61 Entre lembrar e esquecer 20 anos depois : memórias / Zaira Regina Zafalon, Samanta do Prado (organizadoras). – Niterói : Intertexto, 2020. 380 p. ; il. color. ; 23 cm. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7964-095-7 1. Memória autobiográfica. 2. Memória coletiva. I. Zafalon, Zaira Regina, org. II. Prado, Samanta do, org. CDD 920 Comissão Editorial Eliana Lucia Ferreira Maria Lucia M. Carvalho Vasconcelos Doutora em Educação Física – UFJF Franciele Marques Redigolo Doutora em Educação – Universidade Presbiteriana Mackenzie Doutora em Ciência da Informação e em Gestão da Informação e da Comunicação – UFPA Doutora em Ciência da Informação – UFS Martha Suzana Cabral Nunes Ieda Pelógia Martins Damian Meri Nadia Marques Gerlin Doutora em Administração de Organizações – USP Doutora em Ciência da Informação – UFES Márcia Ivo Braz Simone Weitzel Doutora em Ciências da Linguagem – UFPE Doutora em Ciência da Informação – UNIRIO Intertexto Editora Ltda – ME. Rua Antonio Augusto da Paz, 290, Quadra 256 – Lote 17 Piratininga – Niterói – RJ – CEP 24358-120 Tel.: (21) 3902-8099 e-mail: intertexto@terra.com.br SUMÁRIO APRESENTAÇÃO 7 ESCOLA DE BIBLIOTECONOMIA E DOCUMENTAÇÃO DE SÃO CARLOS: TRAJETÓRIA PARA A EFETIVAÇÃO DO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO DA UFSCar SONIA MARIA TROMBELLI 15 PROCESSO DE INCORPORAÇÃO DO CURSO DE GRADUAÇÃO DA ESCOLA DE BIBLIOTECONOMIA E DOCUMENTAÇÃO DE SÃO CARLOS (EBDSC) DA FUNDAÇÃO EDUCACIONAL SÃO CARLOS (FESC) PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS (UFSCar) ELISABETH MÁRCIA MARTUCCI 28 A MEMÓRIA É UMA ILHA DE EDIÇÃO: COM AS LEMBRANÇAS ATRAVESSO O MAR, VOU ME PERDER, VOU ME ENCONTRAR... ARIADNE CHLOE MARY FURNIVAL 49 FRAGMENTOS DE HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DE UMA TRAJETÓRIA NO CAMPO DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO MARIA CRISTINA PIUMBATO INNOCENTINI HAYASHI 60 A GÊNESE E TRAJETÓRIA DO CURSO DE BCI NA UFSCar: HISTÓRIAS ENTRELAÇADAS LUZIA SIGOLI FERNANDES COSTA 72 20 ANOS DE BCI – MEMÓRIAS DE UM ENGENHEIRO NAVEGANDO NAS CIÊNCIAS DA INFORMAÇÃO SERGIO SILVA 80 DAS CIÊNCIAS NATURAIS AOS SABERES INDÍGENAS: UM RELATO DE VIAGEM MARIA CRISTINA COMUNIAN FERRAZ 101 ENTRE O QUERER SER E O SABER: TRAJETÓRIA DE UMA VIDA, UMA PROFISSÃO, UMA PAIXÃO LUCIANA DE SOUZA GRACIOSO 112 MEMÓRIAS COMO PRESENTES ZAIRA REGINA ZAFALON 129 RELATO DE UMA TRAJETÓRIA DOCENTE NA UFSCar: RELEMBRANDO O PASSADO E PLANEJANDO O FUTURO ROGÉRIO APARECIDO SÁ RAMALHO 142 REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO “CIÊNCIA E SOCIEDADE” NO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO DA UFSCar: UM DEPOIMENTO CAMILA CARNEIRO DIAS RIGOLIN 150 SONHOS E REALIDADE: UM PERCURSO NOS CAMINHOS DA BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO À UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS FABIANO FERREIRA DE CASTRO 163 MINHAS LEMBRANÇAS NA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO ANA CAROLINA SIMIONATO ARAKAKI 173 MEUS CAMINHOS NA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO: ENTRE PALAVRAS E LEMBRANÇAS PAULA REGINA DAL’EVEDOVE 184 CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO: ENTRELAÇAMENTO ENTRE APRENDER E ENSINAR MARCIA REGINA SILVA 197 VIVA À VIDA DE UNIVERSITÁRIA VÍVIAN LUCIANE DE MORAES MACHADO 205 UMA TRAJETÓRIA PARA RECORDAR... E CONTAR! DANIELE SPADOTTO SPERANDIO 212 A INFLUÊNCIA DO CURSO DE BCI DA UFSCar NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL E ACADÊMICA FABIO PINHO 224 BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS: ONDE TUDO COMEÇOU GIOVANA DELIBERALI MAIMONE 234 FRAGMENTOS DA MINHA GRADUAÇÃO NO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO DA UFSCar IURI ROCIO FRANCO RIZZI 244 UM POUCO DA UFSCar NA UNIRIO: PEQUENO RELATO DE UMA GRANDE VIVÊNCIA NAIRA CHRISTOFOLETTI SILVEIRA 256 O PAPEL DA BIBLIOTECA NAS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS IANDRA MARIA CARLOS CARTAXO 266 A CONSTRUÇÃO DE UMA PAIXÃO MARISA CUBAS LOZANO 274 BIBLIOTECÁRIO ESCOLAR: ENGAJAMENTO E PAIXÃO PELA PROFISSÃO TIAGO FERNANDES ANDRADE 280 DA GRADUAÇÃO PARA A ATUAÇÃO NA BIBLIOTECA ESCOLAR MARCELA ANTOCHIO 291 ENTRE PASSAGENS, BAGAGENS E UM PORTO: UM PERCURSO NA BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO PEDRO IVO SILVEIRA ANDRETTA 302 SOBRE INSISTIR, APROVEITAR A JORNADA E SE REALIZAR ACADÊMICA E PROFISSIONALMENTE TAMIE LANÇA 318 TRAJETÓRIA E MEMÓRIAS DE JOÃO AUGUSTO E RELAÇÃO COM A BCI UFSCar JOÃO AUGUSTO DIAS BARREIRA E OLIVEIRA 329 BCI UFSCar: SENTA QUE LÁ VEM A HISTÓRIA... JOSÉ CARLOS BASTOS JUNIOR 338 RELATO DE SOBRE O TRABALHO NA BIBLIOTECA E A TRAJETÓRIA NO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS – UFSCar CÉLIA APARECIDA RUFINO GOMES DA SILVA 350 CONTRIBUIÇÃO DO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIAS DA INFORMAÇÃO PARA MINHA ATUAÇÃO PROFISSIONAL SANDRA TIOSSI 354 UM FUTURO CONSTRUÍDO DIARIAMENTE KLICIA SILVA MENDONÇA 364 QUANDO A SUA BIBLIOTECA É O UNIVERSO MARCOS TERUO OUCHI 372 APRESENTAÇÃO O compartilhamento de lembranças individuais para a tessitura da memória coletiva é um argumento para que, diante da socialização de experiências, sejam reavaliados e ressignificados os referenciais de identidade e de pertencimento a um grupo. Essa temática nos é afeta! Quando nos propusemos a tornar viva a dialética da lembrança e do esquecimento pensamos em um livro de memórias. Este livro, portanto, é resultado do convite feito para despertar este desejo mútuo de “olhar para trás” para (re)lembrar parcerias, vivências, experiências, celebraçoes, ou seja, para (re)construirmos o coletivo, o social, o institucional. O leitor descobrirá, com esse material, que, mesmo tendo passado o tempo, as lembranças estão vivas e foram representadas e apresentadas sob o olhar de quem reavalia o que foi vivido, a partir de uma perspectiva crítica, e de quem direciona a leitura sobre o que foi lembrado para que tais experiências sociais narradas sejam conhecidas. Essa motivação para despertar a memória dos envolvidos com o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar surgiu quando, em agosto de 2014, foi lançado o Edital Especial de Apoio à Realização de Atividades de Extensão com Temática Específica sobre a Memória da Universidade em Comemoração aos 45 anos da UFSCar em 2015. O contexto para a proposição desse livro envolve, portanto, a experiência com o projeto intitulado Memória do curso de BCI: entre lembrar e esquecer 20 anos depois!, vinculado àquele Edital. Quando do envio do convite aos autores, foi solicitado que expusessem, a partir de um tom memorialístico, suas experiências com o curso da UFSCar. Desse modo, foram preservados os textos a partir da composição do autor, quer seja com divisões ou em texto sequencial, sem que houvesse uma orientação específica quanto a isso, visto que a intenção era que cada um mostrasse a sua perspectiva sobre o curso de BCI e a UFSCar. A padronização, porém, foi feita quanto à titulação de modo a sempre mencionar a EBDSC e a UFSCar. Ao recuperar a memória do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação torna-se presente, também, a recuperação da memória da UFSCar, diante da comemoração dos seus 45 anos (quando da submissão do projeto em 2014) e, agora, dos seus 50 anos, com esta publicação, mas também a memória de São Carlos, uma vez que o curso de Biblioteconomia se dá, na cida- 7 de, desde 1959. Estão construídos, portanto, vínculos institucionais, profissionais, acadêmicos, sociais e afetivos. O livro está organizado de modo a refletir esse percurso histórico de mais de 60 anos de oferta do curso na cidade, com mais de 1.020 bibliotecários formados pela EBDSC e mais de 730 pela UFSCar. Os leitores, porém, poderão notar que os textos refletem dois períodos diferentes: um da escrita do material; outro da revisão final para a publicação. Isto se explica por conta da lacuna havida por questões alheias à nossa vontade, entre a proposição, feita em 2016, incentivada por conta dos resultados com a proposta de extensão, e a realização da publicação, em 2020. Sonia Maria Trombelli, enaltecendo a profissão do bibliotecário, apresenta a trajetória do curso da Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos (EBDSC) desde sua criação até a implementação do curso na UFSCar. Elisabeth Marcia Martucci, do sonho à realidade, faz uma viagem ao passado e relata todo o processo de incorporação do curso de Biblioteconomia e Documentação da Fundação Educacional São Carlos pela UFSCar. Ariadne Chloe Mary Furnival, ao chegar no Brasil, conta sua experiência como docente desde o início do curso. Entre suas histórias, afirma que os alunos é que fazem parte de sua trajetória na UFSCar. Maria Cristina P. Innocentini Hayashi faz reflexões sobre as atividades desenvolvidas como docente do curso de BCI da UFSCar, relatando fragmentos de desafios enfrentados desde o início até os dias de hoje. Luzia Sigoli Fernandes Costa narra, com orgulho, sua trajetória pessoal, acadêmica e profissional concomitante ao início do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação na UFSCar. Feliz por fazer parte desta história, expressa sua experiência. Sérgio Silva relembra e relata fatos e vivências enriquecedoras no desafio efetivo e afetivo em sua trajetória docente no curso de BCI. Descreve seu aprendizado e como despertou nos alunos o olhar colaborativo da dinâmica de redes, contribuindo com algumas das competências do curso ligado à informação científica, tecnológica, industrial e empresarial. Maria Cristina Comunian Ferraz fala sobre o acolhimento que recebeu e o sucesso na carreira docente ao se dedicar à formação de bibliotecários. Conta um pouco sobre seus trabalhos de pesquisa e extensão na área de Ciência da Informação e do seu encontro com os saberes indígenas. Luciana de Souza Gracioso relata como foi sua trajetória acadêmica seguindo sua paixão, que é a Biblioteconomia, sempre contando com o apoio 8 e incentivo da família. Entre caminhos sem volta, ela descobre sua vocação e vários outros desafios que enfrentou. Descreve a releitura que fez sobre ser bibliotecária e da motivação que tem para trabalhar, estudar, aprender e ensinar. Muito da história profissional de Zaira Regina Zafalon se cruza com a história do curso de BCI/UFSCar. Em suas lembranças, ela compartilha experiências e desafios que enfrentou, contando como foi encorajada por oportunidades de aprendizado, do reconhecimento profissional e da responsabilidade na formação de seus alunos. Rogério Aparecido Sá Ramalho, no intuito de colaborar com a formação de profissionais conscientes e preparados para os desafios e responsabilidades do uso das novas tecnologias no campo da Ciência da Informação, faz um breve relato descrevendo seus passos na trajetória docente e no campo da pesquisa, a partir de uma sucessão de experiências e interações pessoais. O depoimento de Camila Carneiro Dias Rigolin trata de informações sobre “Ciência e Sociedade” no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar, de seus desdobramentos no ensino, pesquisa e extensão, assim como as oportunidades de publicação de artigos científicos, livros e capítulos de livros devido sua participação em projetos de pesquisa. Fabiano Ferreira Castro descreve sua trajetória para vivenciar o sonho profissional de atuar como docente e pesquisador em uma universidade pública. Conta sobre os desafios que enfrentou e as portas que a UFSCar lhe abriu para atuar e colaborar em distintas vertentes. Ana Carolina Simionato Arakaki resgata suas memórias, desafios, frustrações e alegrias, sempre com a presença marcante da família. Conta, com graça e leveza, seu primeiro contato com a Biblioteconomia e como cresceu cercada de livros, sempre incentivada à leitura. De pequena dizia que quando crescesse queria cuidar de livros, ser pesquisadora. Comprou do pai o sonho da carreira acadêmica e segue hoje fazendo parte da história da BCI UFSCar. Entre palavras e lembranças, Paula Regina Dal’Evedove, se recorda do esforço da mãe, dos conselhos e exemplos dela, sempre direcionados à importância do estudo como fonte de crescimento pessoal e profissional. Assim construiu sua jornada, se descobrindo nos caminhos da Biblioteconomia e Ciência da Informação. Revive agora momentos significativos e felizes. Marcia Regina Silva relembra o processo de sua formação acadêmica traçando uma linha do tempo com representações de fatos e constructos 9 que vão da graduação até o período atual. Comenta suas produções científicas e recompensas “simbólicas” constantes, afirmando se sentir realizada e orgulhosa com a escolha da carreira e também por fazer parte da UFSCar. Vívian Luciane de Moraes Machado relembra a euforia e a preocupação ao passar no vestibular para o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação na UFSCar. Apaixonada confessa, relata os desafios que enfrentou longe da família para realizar o sonho de se formar. Hoje é empresária e, apesar de não trabalhar diretamente na área, o interesse pela leitura, pesquisa e organização da informação sempre a acompanham. Já se passaram 22 anos desde que iniciou sua trajetória e Daniele Spadotto Sperandio recorda e conta fatos inusitados que aconteceram neste período desde a decisão de fazer Biblioteconomia e Ciência da Informação, aos 16 anos, até os desafios e dificuldades da graduação. Sempre com coragem, força e determinação lembra que ser bibliotecária é um eterno aprendizado. Fabio Pinho faz uma reconstrução memorialística do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) da UFSCar mostrando a influência em sua vida profissional e acadêmica, bem como os acontecimentos que moldaram suas convicções. A vida acadêmica de Giovana Deliberali Maimone, iniciada na UFSCar, foi um sonho semeado com entusiasmo e seriedade que floresceu e frutificou refletindo hoje em sua realidade de professora e pesquisadora. Em seu relato, Giovana fala como a Biblioteconomia entrou em sua vida e do orgulho que sente por ser bibliotecária. Iuri Rocio Franco Rizzi relata sua história na UFSCar e seu vínculo com o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, período rico em experiências e aprendizados que contribuíram para sua formação acadêmica e humana. Naira Christofoletti Silveira em seu relato, elenca sua vivência como aluna da UFSCar e a forma como isso impactou em sua vida como docente na UNIRIO. Conta, com orgulho, como descobriu seu melhor caminho dentro da Biblioteconomia e como a Universidade Federal a transformou e a transforma até hoje. Iandra Maria Carlos Cartaxo traz reflexões importantes sobre sua atuação profissional como bibliotecária escolar e a satisfação ao fazer um jovem hiperconectado se entregar ao desafio da leitura. A trajetória de Marisa Cubas Lozano teve início no começo do século XXI. Entre desafios, motivações e aprendizados diários, fala da insegurança 10 superada dia a dia com o apoio de colegas de trabalho, como despertou o desejo de voltar a estudar e aprendeu a amar a profissão. Tiago Fernandes Andrade relata, com encantamento, do viés tecnológico e empresarial da Biblioteconomia que o incentivou a iniciar o curso na UFSCar. Fala dos desafios e das experiências que ampliaram seus horizontes e o moldaram como profissional. Marcela Antochio relata fatos e experiências que mostram os caminhos que trilhou, a partir do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar, como profissional e as expectativas para dar continuidade aos estudos e às pesquisas. Pedro Ivo Silveira Andretta descreve sua passagem pela UFSCar retomando lembranças e recuperando influências e acontecimentos que marcaram seu percurso; memórias concretas e simbólicas vividas no decorrer dos anos, que permanecem até hoje. Tamie Lança conta que sua inspiração por ser bibliotecária veio da tia. Sua realização acadêmica e profissional surgiu pelo encantamento do ambiente universitário da UFSCar, repleto de docentes apaixonados pela área, dedicados e empenhados em mostrar o universo da informação, processo enriquecedor com vários exemplos de sucesso no mercado de trabalho. A conexão de João Augusto Dias Barreira e Oliveira com a Biblioteconomia se iniciou ao acompanhar a mãe em suas visitas à biblioteca da UFSCar, onde encontrou um objeto de estudo original e pioneiro no Brasil que o possibilitou cursar o Mestrado e o Doutorado. É grato a todos que fizeram parte da história da UFSCar, pela contribuição e crescimento do curso de BCI. Entre momentos de tensão, desafios e experiências, José Carlos Bastos Junior, que sempre gostou da área de Comunicação e Ciências Humanas, conta como construiu sua jornada acadêmica e profissional a partir do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar. Célia Aparecida Rufino Gomes da Silva descreve como excepcional sua trajetória no curso BCI da UFSCar, contando sempre como o apoio dos professores, que lhe proporcionaram conhecimentos utilizados em sua prática diária até os dias de hoje. Sandra Tiossi relata como o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar lhe preparou para atuar com proficiência na área, trazendo benefícios em sua atuação profissional, habilitando-a para atuar em várias áreas. 11 As conquistas profissionais, o desenvolvimento acadêmico e o crescimento pessoal e humano de Klícia Silva Mendonça se deram quando, ao ingressar na UFSCar, observou o pioneirismo e a tendência ao espírito inovador do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Com isto, se tornou uma profissional diferenciada e desempenha suas atividades com segurança, sentindo-se preparada para enfrentar desafios. Marcos Teruo Ouchi, encorajado pelas perspectivas da profissão, seguiu o conselho de um amigo e cursou Biblioteconomia e Ciência da Informação na UFSCar. Decisão que mudou e enriqueceu sua vida profissional. Marcos relata como os professores estimulavam trabalhos desafiadores e debates profícuos. Além dos autores, que aceitaram fazer parte desse compromisso de reviver o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, há muitos outros atores envolvidos nesta história: Simoni Aparecida Perrucino Campos e Rosângela Castilho Alcaraz Morais, que atuaram como secretárias na Coordenação do Curso, e Artur Protter Gouvêa, atual secretário; Wânia do Carmo Cassin Passarini, ex-secretária do Departamento de Ciência da Informação, e, atualmente, Mônica Guimarães Pithon Calió, na mesma função; Carlos Roberto Massao Hayashi, Januário Albino Nhacuongue, Leandro Innocentini Lopes de Faria, Roniberto Morato do Amaral e Wanda Aparecida Machado Hoffmann, docentes que estão conosco, e, aqueles que já deixaram sua contribuição, como docentes efetivos: Eliane Serrão Alves Mey, Helen de Castro Silva Casarin, Katia Maria Lemos Montalli, Lourival Pereira Pinto, Maria Cristiane Barbosa Galvão, Maria Matilde Kronka Dias, Nádea Regina Gaspar, Vera Regina Casari Boccato; e como docentes substitutos: Alexander Willian Azevedo, Aline Grasiele Cardoso de Brito, Ana Claudia de Oliveira Leite, Andre Luis Assumpcao, Deise Maria Antonio Sabbag, Douglas Henrique Milanez, Edneia Silva Santos Rocha, Elaine da Silva, Elaine de Oliveira Machado, Elenise Maria de Araujo, Eliane Colepicolo, Elisangela Goncalves Barbieri, Emilena Josimari Lorenzon, Fabio Cesar Montanheiro, Gilberto Domingues Junior, Glaucia Maria Saia Cristianini, Helio Marcio Pajeu, Jacqueline Aparecida de Souza, Juliana de Souza Moraes, Luis Claudio Dallier Saldanha, Mara Angelica Pedrochi, Marco Donizete Paulino da Silva, Marcos Paulo de Passos, Maria Altimira Tognetti Povoa, Maria Aparecida Pereira, Maria dos Remedios da Silva, Milena Polsinelli Rubi, Nilma Helena Franca Gibertoni, Raquel Juliana Prado Leite de Sousa, Regina Celia Di Ciommo, Rodrigo Alves Silva, Rogerio Xavier Neves, Simone de Azevedo Ramos Branicio. 12 Agradecemos àqueles que colaboraram ao longo deste percurso e que, sem os quais, a publicação desse material não teria se realizado: Profa. Paula Regina Dal’Evedove, pelas conversas iniciais; Samanta do Prado e Thaís de Brito Barroso, pela revisão e formatação dos originais para envio à Editora; Sílvia Moura e Waldeck Schutzer, pela cessão das fotos; e pela revisão cuidadosa de Anamaria da Costa Cruz e Marcia Cristina Zafalon. Zaira Regina Zafalon Samanta do Prado 13 Foto: Waldeck Schutzer ESCOLA DE BIBLIOTECONOMIA E DOCUMENTAÇÃO DE SÃO CARLOS: TRAJETÓRIA PARA A EFETIVAÇÃO DO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO DA UFSCar* SONIA MARIA TROMBELLI** A Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos (EBDSC) foi fundada graças à coragem de quatro jovens bibliotecários1 1, que à época eram funcionários da Biblioteca Central da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), e ao apoio total do diretor dessa escola Dr. Theodoreto H. Inácio de Arruda Souto, que gentilmente cedeu as instalações até que a nova instituição tivesse a sua própria sede. O objetivo da fundação desta escola foi interiorizar a profissão de bibliotecário de modo a atender às necessidades das escolas superiores que estavam surgindo no Estado, instituições de ensino ligadas principalmente à Universidade de São Paulo. Em 15 de março de 1959, na Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC-USP), foi feita uma reunião com esses bibliotecários para discutir a proposta de criação de 1 Estes quatro bibliotecários foram graduados em Biblioteconomia na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, instituição que ainda forma bibliotecários, para o Estado de São Paulo e para outras regiões do país. * Este texto é uma adaptação de HANAI (1997). ** Mestre em Biblioteconomia (PUCCAMP) e Bacharel em Biblioteconomia e Documentação (EBDSC). Docente no curso de Biblioteconomia e Documentação da EBDSC no período de 1970 a 1997 e docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar no período de 1999 a 2002. Contato: smtrombelli@yahoo.com. 15 uma escola de biblioteconomia em São Carlos. Dessa reunião participaram quatro profissionais: Alfredo Américo Hamar, Eunice Diva Garcia, lná Bentim e Terezinha Abs. Ao final, os presentes firmaram o propósito de fundar a “Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos”. Com o início das aulas em 15 de abril do mesmo ano, o currículo previa a conclusão do curso em dois anos e abrangia disciplinas de Catalogação, Classificação, Documentação, História do Livro, Organização e Administração de Bibliotecas, Paleografia, e Referência e Bibliografia. Currículo esse que vigorou até 1961. A aula inaugural foi ministrada pelo emérito Prof. Mário Tolentino, no dia 20 do mesmo mês. Nessa época, a Escola funcionava numa sala do Edifício Dante Alighieri, sito à Rua 9 de Julho, 1257, prédio cedido pelo então diretor da EESC, onde hoje funciona o CDCC. A partir de 1960, o curso passou a funcionar simultaneamente no prédio (chamado de E0) da Escola de Engenharia da USP; em duas salas alugadas na Escola Técnica de Comércio D. Pedro II, e também no Salão do Museu Municipal denominado “Museu Histórico e Pedagógico Cerqueira Cesar”2, que ficava na sala abaixo do prédio onde hoje funciona a Câmara Municipal. A primeira turma, com 9 alunos, colou grau em dezembro de 1960, recebendo o título de Bacharel em Biblioteconomia, e teve como paraninfo o Dr. Theodoreto H. lnácio de Arruda Souto, diretor da EESC-USP, e como orador da turma o aluno Ruy Carlos Bizarro Wanderley. Em 31 de janeiro de 1961 a mantenedora da escola foi instituída, com o nome de “Sociedade Civil Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos”, inscrita no Cartório de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de São Carlos, sob o n° 152, tendo sido o logotipo da escola elaborado pelo artista plástico Sr. Marcos Roberto Calligaris. Porém, os professores só passaram a fazer parte da sociedade mantenedora da escola em 11 de fevereiro de 1965, tendo, então, sido eleito como presidente o Prof. Oswaldo Caron3 e como vice-presidente, a Profa. Carminda Nogueira de Castro Ferreira. A partir de 21 de fevereiro do mesmo ano, a Sociedade Civil passou a denominar-se “Associação Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos”. 2 3 Hoje este museu está alocado no Prédio da Estação Ferroviária, juntamente com a Fundação Pró-Memória de São Carlos. O Prof. Oswaldo Caron era professor de História. Depois passou a ser Juiz de Direito em São Paulo/SP. 16 Em 26 de agosto de 1961, pela Lei Municipal n° 4296, promulgada pela Prefeitura de São Carlos, a Escola foi considerada de utilidade pública, e, pelo Decreto Estadual n° 39.162, de 30 de outubro de 1961, o seu funcionamento foi autorizado. As primeiras alterações ao currículo inicial datam de 1962, quando foram levantadas propostas considerando-se aspectos tais como exclusões, inclusões e desdobramentos de disciplinas e mudança de periodização. A proposta definida modificou o tempo de duração do curso que passou de dois para três anos4. Considerando que a EBDSC já tinha um percentual razoável de bibliotecários por ela graduados e sentindo que a Associação Paulista de Bibliotecários não tinha condições de dar respaldo para os problemas de uma escola no interior, em 4 de setembro de 1964 foi realizada uma reunião presidida pela então diretora da escola, a Sra. Eunice Diva Garcia, quando foi apresentado o anteprojeto de estatuto para a criação de uma associação de classe. Surge, então, a Associação dos Bibliotecários Sãocarlenses (ABS), com sede nas dependências da EBDSC. A primeira diretoria foi formada pela Sra. Laila Haddad, como presidente, a Sra. Iná Bentim, como vice-presidente, a Sra. Ana Maria do Amaral Zaitune, como primeira secretária, a Sra. Helena Mhirdaui, como segunda secretária, a Sra. Diva Maria Gallucci, como tesoureira e, como bibliotecária, a Sra. Vitória Atra. Em toda a existência da ABS, extinta em 1984, a diretoria, em geral, era composta pelos docentes da Escola. Em 1967, os alunos que participavam do Diretório Acadêmico XVIII de Março publicaram um periódico, que, infelizmente, teve curta duração denominado “Biblio Quê?”, nome este originado por conta das dúvidas que o nome “Biblioteconomia” incitava nas pessoas, quando os alunos eram indagados sobre o curso que faziam. A Escola, até 1971, funcionou em diferentes prédios. No segundo semestre de 1968 mudou-se para um prédio residencial localizado à Rua XV de Novembro, em frente à praça Cristiano Altenfelder Silva5. A partir daí não mais utilizou espaços emprestados, mas de casas alugadas pela mantenedo4 5 A nova estrutura curricular, que vigeu de 1962 a 1975, tinha as disciplinas de Bibliografia Especializada, Catalogação, Catalogação de Material Especializado, Classificação, Documentação, História do Livro, Introdução à Cultura Artística, Introdução à Cultura Científica, Introdução à Cultura Filosófica, Introdução à Cultura Histórica, Introdução às Ciências Sociais, Literatura, Organização e Administração de Bibliotecas, Paleografia, Psicologia, Referência e Bibliografia, Relações Públicas e Ética Profissional, Seleção Bibliográfica, e Teoria da Organização e Administração de Bibliotecas. Mais comumente conhecida como Praça da XV. 17 ra. Deixou definitivamente as dependências da EESC, instituição de ensino que muito colaborou por meio de seus diretores, para o sucesso desta pequena, porém brilhante, escola. Além do currículo formal, a Escola sempre procurou completar a formação de seus alunos e para isso, organizou e ofereceu na década de 1960 inúmeros cursos optativos: Inglês e Francês (1965), Inglês, Francês, Psicanálise e Psicologia Dinâmica (1966), Inglês, Francês, Psicanálise e Psicologia Dinâmica, Programação Fortran, Música para leigos (1967), Inglês, Música para leigos, História do Teatro (1968), Francês, Alemão, Língua portuguesa, Cultura cinematográfica (1969). A década de 1970, também foi muito produtiva para a Escola e seus alunos com a oferta de cursos optativos. Entre eles: Alemão, Língua portuguesa, Cultura cinematográfica (1970), Técnica de ilustração, Introdução à Informática, Informática I e II, Espanhol, Pesquisa Científica e a Biblioteca, Lei de Bradford e suas aplicações bibliométricas, Audiovisuais em bibliotecas (1976), Arquivística I e II, Didática, Língua Portuguesa, Comunicação e Expressão, Prática em indexação, Noções gerais de Estética visual, Metodologia didática, científica e tecnológica, Literatura infantil (1977), Arquivística II, Pesquisa bibliográfica na área Médica, Técnicas de Redação, Fundamentos básicos de Inglês, Fundamentos de Análise de sistemas para Bibliotecas, Literatura Infantil, Seleção e Coleta de documentos (1978), Catálogo sistemático, Seminário de Ciências de Informação, Sistemas micrográficos para Bibliotecas, Técnicas de Importação de Material Bibliográfico, Fundamentos Básicos de Alemão, Cartazismo, Arquivística, Biblioteconomia, Educação e Desenvolvimento (1979). Também na década de 1980 a Escola ofereceu cursos optativos e de atualização diante das novas tecnologias que estavam surgindo. Dentre as disciplinas optativas foram oferecidas: Fundamentos Básicos do Inglês, Introdução aos Sistemas Micrográficos para Bibliotecas, Metodologia do Trabalho Científico, Arquivística, Sociedade e Cultura Brasileira, Inglês I, Metodologia do Trabalho Científico. Dentre os cursos de Difusão Cultural e de Extensão Universitária foram ofertadas, em 1985, Programa de incentivo à leitura, Intersecção entre as Psicologias e os Biblio afins, Noções de Arquivística, Introdução à aplicação de Microcomputadores em Bibliotecas, Intersecção entre as Ciências Ortodoxas e as Ciências Ocultas. Em 1987 foi oferecido um curso denominado “Atualização em Biblioteconomia”, dirigido a professores e bibliotecários. Alguns dos professores da EBDSC ministraram estes cursos, dentre as quais os quais as professoras Elisabeth Marcia Martuci e Sonia Maria Trombelli. 18 No período de 1969 a 1970, a EBDSC teve sob sua responsabilidade um carro-biblioteca, mantido por meio de convênio firmado com o Instituto Nacional do Livro (INL), com sede em Brasília, DF, tendo como objetivo proporcionar à população amplo acesso ao acervo das obras publicadas, tanto para leitores infanto-juvenis quanto para o público adulto. Esse veículo, uma kombi adaptada, fez parte de uma experiência pioneira, que depois foi estendida para todo o país, mediante um itinerário que abrangia os bairros de Vila Prado (em frente à Escola Jesuíno de Arruda e o Grupo Escolar D. Gastão), Vila Monteiro (Rua Campos Salles), Vila Isabel (Largo da Igreja), Vila Pureza (Rua Princesa Isabel, próximo à Igreja Nossa Senhora de Fátima), Vila Nery (Rua Major José Inácio, nº 3850), Tijuco Preto (Rua Antônio Rodrigues Cajado), e o Distrito de Água Vermelha (Largo da Matriz). O carro-biblioteca tinha o seu acervo organizado por alunos da EBDSC em fase de estágio, sob a orientação da professora Lígia Gullo Daumichen. Nessa mesma época a Escola manteve um catálogo coletivo regional, coordenado pelo Prof. Alfredo Américo Hamar, cujo objetivo era o de registrar todo o acervo das bibliotecas públicas das cidades da Região de São Carlos. Na organização deste trabalho também houve a participação das professoras Ligia Gullo Dauminchen e Sonia Maria Trombelli, e alunas que se destacaram como Nilma Helena França, que veio a ser professora da Escola e Neusa Terezinha Mossin Celere, bibliotecária da EESC-USP, e também professora por um curto período de tempo. Até 1969, o número de alunos era relativamente pequeno. As turmas tinham, em geral, de 15 a 20 alunos. Nesse ano, o vestibular foi muito concorrido chegando a ter inscrição de smais de 70 alunos. Estes matriculados, foram divididos em turmas com aulas nos períodos da manhã e tarde, sendo alocados numa sala grande que havia no subsolo do prédio da Rua XV de Novembro. No ano seguinte, uma nova turma, com muitos alunos, fez com que fosse necessária a mudança para um prédio que tivesse salas maiores para comportar os antigos e os novos alunos. Isso resultou na mudança para a Rua Episcopal, nº 1253, esquina com a Rua Jesuíno de Arruda. Era uma casa antiga com salas amplas, e que não se vê mais, visto que não foi preservada como patrimônio histórico, mas demolida para dar lugar a uma loja de departamentos. Outra mudança de prédio aconteceu em 1972, quando a Escola passou a funcionar à Rua Marechal Deodoro, nº 2069, prédio da antiga Escola de Belas Artes D. Pedro II. 19 A Escola criada em 1959, não tinha ainda o seu curso reconhecido pelo órgão competente. A tramitação para o reconhecimento do curso foi iniciada em 1970 junto ao Conselho Federal de Educação, mas o seu reconhecimento só aconteceu com a publicação do Decreto Federal n° 71160, de 27 de setembro de 1972. Reconhecido o curso, neste mesmo ano foi aprovado o novo regimento da escola, e nele passou a ser exigida a elaboração de um trabalho de formatura6, que consistiu num “Planejamento para a Instalação de um Centro de Informação”, na área escolhida pelo próprio aluno e com a anuência do professor da disciplina “Documentação”, o Sr. Alfredo Americo Hamar. Nas décadas de 70 e 80, as turmas foram aumentando significativamente, mas, mesmo assim, a Escola passou por uma fase financeira bastante crítica, tendo a mantenedora que procurar soluções para viabilizar a sua continuidade, o que veio culminar com a criação da Fundação Educacional São Carlos. Isso só aconteceu por interferência do Prof. Alfredo Américo Hamar, que entrou em entendimento com as autoridades locais, em particular com o Sr. Interventor Federal Dr. Antonio Teixeira Viana, que promulgou o Decreto nº 6.890, de 29 de dezembro de 1971, criando a Fundação Educacional São Carlos (FESC) e vinculando-a à Prefeitura de São Carlos. Essa Fundação, em acordo com o município, recebeu para o seu uso as instalações do “Campus Rui Barbosa”, situado à Rua São Sebastião, nº 2828, local este ocupado em regime de comodato pela Escola de Educação Física de São Carlos. No contrato de criação da Fundação foram incluídas duas escolas que passaram a pertencer à ela, a Escola de Biblioteconomia e Documentação e a Escola de Educação Física. A Escola de Biblioteconomia foi a primeira a ser incorporada à Fundação, isso ocorrendo em 1º de outubro de 1973. Por conta dessa nova mantenedora, a EBDSC deixou de ser supervisionada pelo Conselho Federal de Educação (CFE), e passou para o Conselho Estadual de Educação (CEE). No ano de 1973, a EBDSC realizou um trabalho junto à Fundação para o Livro Escolar (FLE), denominado “Planejamento de Instalação de uma Rede de Bibliotecas no Estado de São Paulo, Região de São Carlos”, que foi premiado como o melhor trabalho apresentado. 6 Esse trabalho foi obrigatório para a conclusão do curso no período de 1972 a 1982. 20 Em 1976, novo currículo7 escolar foi implantado, tendo sido mantidos os três anos para a conclusão do curso. Também foi em junho deste ano que a EBDSC transferiu-se definitivamente para o Campus Rui Barbosa, passando a funcionar juntamente com a Escola de Educação Física de São Carlos (EEFSC). O destaque para o ano de 1979 é quanto à participação da EBDSC, com o Prof. Alfredo Américo Hamar, no planejamento da Rede de Biblioteca e Documentação em Engenharia (Biblioteca Complementar de Engenharia – BICENGE) e na colaboração com a pesquisa sobre a Metodologia de Informação em Engenharia no Brasil. Em 1981, a EBDSC participou do Projeto da Organização dos Estados Americanos (OEA) para planejamento de um curso de “Metodologia do Ensino para Professores de Biblioteconomia”. Diante da publicação da Resolução nº 8/82, o Conselho Federal de Educação fixou o Currículo Mínimo de Biblioteconomia, o que mobilizou, em 1983, o corpo docente para a elaboração de uma proposta para o novo currículo8, sob coordenação da Profa. Elisabeth Márcia Martucci. A proposta foi rediscutida e, em reunião da Congregação realizada em 31 de julho de 1984, foi aprovada. A implantação deste currículo, com duração de quatro anos, ocorreu no mesmo ano9. Essa mudança provocou alterações em seu regimento interno, aprovadas pelo parecer 139/84, de 8 de fevereiro de 1984. Posteriormente novas al- 7 8 9 Esta estrutura curricular tinha as seguintes disciplinas: Bibliografia Especializada, Catalogação, Catalogação de Material Especializado, Classificação, Documentação, Educação Física, Estatística, Estudo de Problemas Brasileiros, Fundamentos de Matemática, História do Livro, Inglês, Introdução à Biblioteconomia e Documentação, Introdução à Cultura Artística, Introdução à Cultura Científica, Introdução à Cultura Filosófica, Introdução à Cultura Histórica, Introdução às Ciências Sociais, Literatura Portuguesa e Brasileira, Literatura Universal, Organização e Administração de Bibliotecas, Paleografia, Programação, Psicologia, Referência e Bibliografia, Relações Públicas e Ética Profissional, e Teoria da Organização e Administração de Bibliotecas. A estrutura curricular abrangia as disciplinas: Administração de Bibliotecas, Aspectos Sociais, Políticos e Econômicos do Brasil Contemporâneo, Automação de Bibliotecas, Comunicação, Controle Bibliográfico dos Registros do Conhecimento, Disseminação da Informação, Documentos Especializados e Bases de Dados, Editoração, Educação Física, Estatística, Estudo de Problemas Brasileiros, Estudo de Usuário, Evolução do Pensamento Filosófico e Científico, Fontes Bibliográficas, Formação e Desenvolvimento de Coleções, História da Arte, História da Cultura, História das Literaturas, Informação Aplicada à Biblioteconomia, Introdução à Biblioteconomia, Introdução à Cultura Histórica, Introdução às Ciências Sociais, Língua Inglesa, Língua Portuguesa, Literaturas de Língua Portuguesa, Lógica, Metodologia da Informação, Metodologia da Leitura, Métodos e Técnicas de Pesquisa, Noções de Arquivos, Pesquisa e Monografia em Biblioteconomia, Planejamento Bibliotecário, Produção dos Registros do Conhecimento, Psicologia Social, Representação Descritiva, Representação Temática, Sistemas de Informação, Tecnologia Educacional, Teoria Geral de Administração, Tratamento da Informação. No 8º período era desenvolvido Estágio orientado, com 4 horas-aula (o novo regulamento para os estágios foi implantado em 1986). Com a nova estrutura curricular a escola passou a contar, a partir de 1985, com dois departamentos: o Departamento de Formação Profissional, que englobou os departamentos de Processos Técnicos e de Bibliografia e Documentação, e o Departamento de Formação Básica e Instrumental, que englobou os departamentos de Artes e Letras, Ciências Humanas e Cultura Científica. 21 terações ocorreram no regimento, desta vez em função da aplicação de uma nova estrutura curricular. Em 1984, a EBDSC elaborou o projeto BIBLOS, voltado para a obtenção de recursos bibliográficos para sua biblioteca, e o projeto MICRO, para a aquisição de um computador, com a participação das professoras Elisabeth Marcia Martucci e Sonia Maria Trombelli. Nesse mesmo ano, participou da elaboração de provas para concursos para admissão de bibliotecários em várias bibliotecas, incluindo as das cidades de Rio Claro, Descalvado e de outros municípios da região. Participou desse processo a professora Sonia Maria Trombelli, a época vice-diretora da Escola. Um dos fatos marcantes de 1984 foi a constituição da primeira comissão de estudos que visavam à incorporação da EBDSC e da EEFSC pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). O outro grande acontecimento foi o Jubileu de Prata da EBDSC. Para comemorar o evento foi feita uma “Exposição Retrospectiva da Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos”, com fotos, apresentada nas instalações da Biblioteca da FESC, organizada por um grupo de alunos, sob a coordenação da Profa. Miriam Mani Zambel; foi realizada palestra denominada “Os 25 anos da Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos”, proferida pela Profa. Eunice Diva Garcia. A programação também incluiu a distribuição de uma publicação alusiva à data; um almoço de confraternização e uma Missa em Ação de Graças. Com a aprovação, em 1988, dos projetos BIBLOS e MICRO, deu-se a implantação do Laboratório de Microinformática na Escola. Em 1989, ressurge o periódico “Biblio Quê? em caráter mensal sobre as curiosidades da EBDSC. Seu corpo editorial era composto pelas professoras Elisabeth Márcia Martucci e Rosemeire Marino Nastri; sua circulação aconteceu até 1992. Também foi em 1989 que estiveram a pleno vapor os preparativos para a comemoração dos 30 anos de fundação da EBDSC. A programação incluiu palestras, apresentação de pesquisas desenvolvidas, depoimentos de ex-alunos, exposição fotográfica, venda de publicações e adesivos, almoço e jantar de confraternização na Churrascaria Tabajara. Fazendo parte da comemoração, vários artigos sobre a Escola foram publicados nos jornais locais, bem como o evento foi divulgado pelos veículos de comunicação, como rádio e televisão. 22 A solenidade de abertura, realizada em 15 de abril, contou com a presença de várias autoridades, professores, alunos, ex-alunos, e bibliotecários da cidade, e foi marcada pela palestra do Prof. Alfredo Américo Hamar, que relembrou aspectos interessantes registrados durante a trajetória da Escola. Em 1990, além do curso matutino que existia desde a criação da Escola, começaram a ser ofertadas vagas para o curso no período noturno, sendo que as 80 vagas totais foram divididas entre dois turnos, manhã e noite com 40 vagas cada. Cabe destacar que a partir desse ano somente as vagas ofertadas para o período noturno foram preenchidas. A pesquisa também foi uma preocupação e houve um grande incentivo à ela com recursos do Conselho Nacional de Informação Científica e Tecnológica – CNPq, para trabalhos de iniciação científica e de aperfeiçoamento10. Também foram realizados nesse ano o curso de Gerenciamento de Documentação e Informação, promovido pela empresa DOCUMENTAR, de Belo Horizonte; e dois Encontros de Avaliação de Ensino, cujo público-alvo envolvia docentes e alunos da EBDSC e profissionais da área, em conjunto com a Associação Paulista de Bibliotecários (APB). Em relação a outros tipos de cursos oferecidos destacou-se os de Difusão Cultural e de Extensão Universitária ofertados nos últimos anos de funcionamento da Escola: em 1990, Biblioteca e Ação Cultural, Organização e Métodos no Contexto Biblioteconômico, Avaliação de Coleções de Monografias, Criatividade e Serviço de Informação, Edição de Textos em Microcomputador; em 1991, Introdução ao IBM/PC – Edição de Textos em Microcomputador, Serviços Cooperativos em Bibliotecas, Reprografia, Serviço de Referência em Bibliotecas Universitárias, Informação Científica e Tecnológica no Brasil, Hora do Conto; em 1993, Preservação de Documentos. A Escola promoveu, em 1991, o ciclo de estudos Novas Tecnologias. Nesse mesmo ano, foi instituída uma Comissão para proceder à análise do currículo e elaborar uma proposta de reformulação, aprovada em reunião 10 Foram contemplados com bolsas de iniciação científica os projetos de Adriana Regina Onofre (1989), sob orientação de Elisabeth Márcia Martucci; Edivânia Cássia Ditomaso (1990), sob orientação de Sonia Maria Trombelli de Hanai; Silmara Heloisa Gorni (1990), sob orientação de Elisabeth Márcia Martucci; Marta Alves de Souza (1990), sob orientação de Rosemeire Marino Nastri; Elisabete de Jesus Monteiro (1991), sob orientação de Rosemeire Marino Nastri; Heloisa Aparecida Pallone (1992), sob orientação de Sonia Maria Trombelli de Hanai; Célia Regina de Oliveira Rosa (1992), sob orientação de Sonia Maria Trombelli de Hanai; Clélia Junko Kinzu Dimário (1993), sob orientação de Rosemeire Marino Nastri; Ana Valéria Marioto (1993), sob orientação de Rosemeire Marino Nastri; Jandira Ferreira de Jesus Rossi (1994), sob orientação de Nilma Helena França Gibertoni; e Valéria Maria Campaneri (1995), sob orientação de Maria Christina de Almeida Nogueira. Com bolsa de aperfeiçoamento foi contemplado projeto de Marta Alves de Souza, sob orientação de Rosemeire Marino Nastri. 23 da Congregação de 6 de setembro do mesmo, só sendo implantado em 199311. Em 1992 foi estabelecida parceria da Escola com o Parque de Alta Tecnologia de São Carlos (ParqTec) para o desenvolvimento de trabalhos de assessoria e desenvolvimento de projetos financiados pelo PADCT/CNPq. Este projeto contou com a participação de alunos, sob a coordenação da Profa. Sonia Maria Trombelli. Também foi nesse ano que surgiu uma publicação que mereceu destaque: o Guia das Bibliotecas do Município de São Carlos, elaborado pelas professoras Elisabeth Márcia Martucci e Rosemeire Marino Nastri, com a colaboração de outros professores, bibliotecários e alunos da escola. Os 37 anos de funcionamento da Escola foram marcados pelo grande entusiasmo de sua comunidade acadêmica. A semana de 20 de abril de 1996 começou com a publicação nos jornais locais de artigos dos professores e dos alunos, e, nessa mesma data, foi comemorado o seu aniversário em solenidade festiva que contou com exposição fotográfica sobre a trajetória da Escola, organizada pela Profa. Sonia Maria Trombelli, e um almoço de confraternização. O auge das festividades aconteceu com palestra ministrada pela Profa. Eunice Diva Garcia, uma das fundadoras da Escola. Estiveram no evento várias pessoas e autoridades, com destaque para a presença do Sr. Raul Rodrigues Pereira, representando o Prefeito Municipal Rubens Massucio Rubinho, do Sr, José Fernando Porto, presidente do Conselho Diretor da FESC, e da Diretora Executiva da Fundação, Profa. Vera Lúcia de Mello Fragiácomo12. Após a palestra houve uma homenagem a três dos quatro13 fundadores da escola e a inauguração de uma fotografia do Prof. Alfredo Américo Hamar, afixada no recinto da biblioteca que levou seu nome. 11 12 13 Este currículo, com duração de quatro anos, tinha a seguinte estrutura Curricular: Administração de Bibliotecas, Aspectos Sociais, Políticos e Econômicos do Brasil Contemporâneo, Automação de Bibliotecas, Bibliometria, Catalogação, Classificação, Comunicação, Disseminação da Informação, Documentação, Educação Física, Estudo de Problemas Brasileiros, Estudo de Usuário, Fontes Bibliográficas, Formação e Desenvolvimento de Coleções, História da Cultura, Indexação, Informação aplicada à Biblioteconomia, Introdução à Computação, Língua Inglesa, Língua Portuguesa, Literatura de Língua Portuguesa, Literatura infantil, Lógica, Métodos e Técnicas de Pesquisa, Organização de Arquivos, Organização dos Registros do Conhecimento, Produção dos Registros do Conhecimento, Referenciação Bibliográfica. , Teoria da Administração de Bibliotecas, Teoria da Leitura. Além destas autoridades, também estavam presentes membros da comunidade da EBDSC: a Diretora, Profa. Maria Christina de Almeida Nogueira, a Vice-Diretora, Profa. Sonia Maria Trombelli de Hanai, a Sra. Iná Bentim, a Sra. Maria Angélica Hamar, representando seu saudoso pai, o Prof. Alfredo Américo Hamar, as professoras Rosemeire Marino Nastri, Nilma Helena França Gibertoni, Lilia Maria Soares Marmorato, Lourdes de Souza Moraes, e as ex-professoras Lourdes Aparecida dos Santos, Maria Isabel Santoro, Maria Christina Girão Pirolla, Maria Salette Ramalho de Almeida, Elisabeth Márcia Martucci, Eliana Tolentino Ferraz Sampaio, além de alunos e bibliotecários da cidade. A Sra. Terezinha Abs não esteve presente na ocasião. 24 Em 11 de maio de 1993, por meio de convênio assinado pelo Prefeito Rubens Massucio Rubinho e pelo Prof. Dr. Newton Lima Neto, Reitor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), a incorporação da EBDSC foi efetivada pela Universidade, sem que fossem para a mesma professores e alunos. Só mais tarde alguns professores da EBDSC prestaram concurso na UFSCar, dentre eles Elisabeth Marcia Martucci (efetiva) e Sonia Maria Trombelli (substituta). Em razão da passagem do curso, a Fundação não abriu vagas para o vestibular de 1994, e manteve em seu quadro discente apenas os alunos dos três últimos anos do curso. A EBDSC sempre se orgulhou em ter seus ex-alunos atuando em todo o território nacional, quer seja em entidades federais, estaduais, municipais ou em empresas privadas. Como consequência da atividade dinâmica e entusiasmada de seu corpo docente, esta Escola foi incluída entre as melhores escolas do Brasil, o que deu muito orgulho à sua comunidade. Isso se deve pela participação em diferentes instituições normativas e profissionais, tais como a Associação dos Bibliotecários Sãocarlenses, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), o Conselho Federal de Biblioteconomia (CFB), o Conselho Regional de Biblioteconomia – 8ª Região (CRB8) e a Associação Brasileira de Escolas de Biblioteconomia e Ciência da Informação (ABECIN). Também em todos os anos de luta, a Escola procurou manter um alto padrão de ensino, tendo marcado sua presença em inúmeros eventos, congressos, encontros, com seu corpo docente e discente. Seus professores, bem como seus alunos, proferiram palestras nas escolas e nas rádios locais; apresentaram artigos em jornais locais; confeccionaram vitrines e fizeram exposições, por ocasião da Semana Nacional do Livro e da Biblioteca, entre outras atividades. Dada a sua característica de Escola pioneira no interior do Estado de São Paulo, houve condições, por meio de seus ex-alunos, para a criação de outros cursos de Biblioteconomia, tais como: Curso de Biblioteconomia da UNESP de Marília, Curso de Biblioteconomia da Universidade Estadual de Londrina, Escola de Biblioteconomia e Documentação de Catanduva (extinto), de Mococa (extinto), de Lorena e do Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal de Santa Catarina, em Florianópolis. 25 Passaram pela Escola vários professores14, bibliotecários ou de outra formação, que batalharam desde o início da Escola para levar o ensino que oferecia entre os melhores padrões de qualidade. Nesta trajetória, a EBDSC graduou até 1996, ano de conclusão de sua última turma15, 1020 alunos. Referências HANAI, Sonia Maria Trombelli; NOGUEIRA, Maria Christina de Almeida. A Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos: 1959-1997. São Carlos: [s.n.], 1997. 14 15 O número deles é bastante expressivo: Adalberto Pacheco de Toledo (falecido), Ademil Lopes, Albertina Wellichan, Alfredo Américo Hamar (falecido), Ana Antonia Prelorenzo, Ana Maria Soares Marmorato, Angela Barros Leal Farias, Antonio Carlos Villela Braga (falecido), Cândida Elisa Godoy Pantalena, Carmem Sylvia Motta Franco de Lacerda, Carminda Nogueira de Castro Ferreira (falecida), Cecília Brasilizia de Carvalho e Silva (falecida), Cibele Bertolino, Daniel Martins Sotelo, Dirce Gobato, Diva Maria Gallucci, Eliana Fazzari Tolentino, Elisabeth Márcia Martucci, Ercília Maria de Andrade Zavaglia, Eunice Diva Garcia (falecida), Eva Marsíglio Corrêa Contim, Fátima Catalano, Iná Bentim (falecida), Irene Zanette de Castañeda, Itacy Vianna Salgado Basso, Jamir Leoncio Schiavone (falecido), Jacy Giongo, José Augusto Vaz Valente (falecido), José do Prado Martins, Laila Haddad, Leda Almada Cruz de Ravagni, Leila Maria Lenk, Leusa Aparecida de Lourenço, Lígia Gullo Daumichen, Lilia Maria Soares Marmorato, Lourdes Aparecida dos Santos (falecida), Lourdes de Souza Moraes, Lúcia Helena Zerbetto Fabrício, Luciana de Mello Gomide Foina, Luzimar Grosso Bianco, Maria Alice Vaz Macedo (falecida), Maria Antonia Ribas Pink Belford de Mattos (falecida), Maria Aparecida Leite de Oliveira, Maria Cecília Villani Purquério, Maria Christina de Almeida Nogueira, Maria Christina Girão Pirolla, Maria Eli Arnodi, Maria Helena Camargo Pinto Ferraz, Maria Helena Luchesi Prantera, Maria Helena Taddei Abritta, Maria Isabel Santoro, Maria Lúcia Corrêa de Paula, Maria Lúcia Pacheco de Toledo (falecida), Maria Salette Ramalho de Almeida (falecida), Maria Teresa Ferreira Rebello (falecida), Maria Teresa Miceli Kerbany, Maria Terezinha Dagnone, Marielza Ortega Roma, Marilza Ap. Rodrigues Tognetti, Mário Tolentino (falecido), Mauro Carlos Romanatto, Marta Alves de Souza, Maura Guislotti Duarte de Souza, Miriam Mani Zambel (falecida), Mirjam Schiel, Neusa Elisa Mossi, Nilma Helena França Gibertoni, Norberto Antonio Dinucci (falecido), Norma Machado Porciúncula, Oscar Manoel de Castro Ferreira, Oswaldo Caron (falecido), Paulo Pires da Silva (falecido), Regina Célia Silva Baptista, Regina M. S. Puccinelli Tancredi, Rita de Cássia Bettini, Rosemeire Marino Nastri, Ruth Carol Solon Bruno (falecida), Sandra Camargo Pinto Ferraz, Sonia Custódio Corrêa, Sonia Mara Salgado Gonçalves da Silva, Sonia Maria Trombelli, Telma L. Peggorelli Olivieri, Terezinha Abs, Valéria Assumpção Pereira de Silva, Vanderlice Vieira Jayme de Mello, Vera Aparecida Lui Guimarães, Vicente Paulo de Arruda Camargo (falecido), Wilma Maffei (falecida). Algumas alunas que ficarem com disciplinas em regime de dependência, concluíram o curso no primeiro semestre de 1997. 26 Foto: Sílvia Moura PROCESSO DE INCORPORAÇÃO DO CURSO DE GRADUAÇÃO DA ESCOLA DE BIBLIOTECONOMIA E DOCUMENTAÇÃO DE SÃO CARLOS (EBDSC) DA FUNDAÇÃO EDUCACIONAL SÃO CARLOS (FESC) PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS (UFSCar) ELISABETH MÁRCIA MARTUCCI* Palavras iniciais Escrevo este texto sobre períodos consecutivos e inter-relacionados, vivenciados há muito tempo, em comunhão com tantas outras pessoas e para isso faço da memória e de meu arquivo pessoal companheiros desta pequena viagem ao passado. O primeiro período, enquanto docente e diretora da Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos, quando tive oportunidade de participar, muitas vezes como protagonista, outras vezes como expectadora, do processo de luta e construção da possível absorção dos cursos de Biblioteconomia e Educação Física da Fundação Educacional São Carlos pela UFSCar. O segundo, com a formalização das condições acordadas para a transferência, por meio de uma declaração de intenções, que culminou na celebração de um convênio entre as partes; com a definição do perfil profissio- * Doutora em Educação (UFSCar), Mestre em Ciência da Informação (PUCCAMP) e Bacharel em Biblioteconomia (EBDSC). Docente no curso de Biblioteconomia e Documentação da EBDSC no período de 1974 a 1994 e docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar no período de 1994 a 2001. Contato: beth@ufscar.br. 28 nal e da proposta curricular do novo curso e realização de concurso público de provas e títulos para contratação dos docentes. E, o terceiro, dos desafios vividos no momento inicial de implantação do novo e inovador curso. O sonho acalentado: vislumbrando um caminho para o futuro A EBDSC iniciou seu funcionamento em 1959, tendo funcionado até o ano de 1973 como estabelecimento de particular de ensino. Nesse ano, foi incorporada à FESC, fundação municipal de ensino, criada pelo Município de São Carlos, por meio da Lei Municipal no 6.890, de 29 de dezembro de 1971, com o objetivo imediato de amparar os dois estabelecimentos de ensino superior existentes no município, que passavam por dificuldades de ordem financeira para sua manutenção: a Escola de Educação Física de São Carlos (EEFSC) e, como dito, a EBDSC, consideradas orgulhos da comunidade são-carlense! Porém, o orçamento da FESC, proveniente das mensalidades sociais pagas pelos alunos dos cursos e do aporte de recursos pela Prefeitura Municipal de São Carlos, também não conseguiu ter o equilíbrio necessário para arcar com as despesas de custeio e investimentos da instituição mantenedora e de seus dois cursos de graduação. Assim, em 26 de abril de 1979, não muito tempo após a implantação da FESC, o processo de discussão da incorporação das suas duas unidades de ensino à UFSCar foi iniciado, por iniciativa da Prefeitura Municipal de São Carlos. O Processo 091/79-SOC, da Universidade Federal de São Carlos1, registrou esses passos iniciais: o Prefeito Municipal de então, Antonio Massei, enviou ofício ao Prof. Dr. William Saad Hossne, então Reitor da Universidade Federal de São Carlos, solicitando um estudo “sobre a integração das Escolas à universidade, tendo em vista os percalços de natureza financeira e outros, que refletem no nível de ensino oferecido à população escolar” e, que, ainda, “a Fundação Educacional São Carlos não poderá subsistir por suas próprias forças e a insistência em mantê-la nas precárias condições em que vem funcionando, seria tremendamente prejudicial aos padrões de ensino desejáveis para uma instituição implantada numa cidade que se orgulha do renome que 1 Conforme consta do Documento Final da Comissão Interinstitucional FESC / UFSCar, nomeada pela Portaria GR nº. 102, de 2 de abril de 1986. São Carlos, outubro 1986. 29 desfruta como centro educacional de primeira grandeza”. A solicitação do Prefeito Municipal de São Carlos foi encaminhada à Câmara de Graduação do Conselho de Ensino e Pesquisa da Universidade (CEPE), que manifestou sua intenção de promover discussões, no mesmo ano, visando à criação de novos cursos, o que englobaria a análise da demanda do Município. Dessa primeira iniciativa, que não prosperou, não tenho qualquer lembrança pessoal, mesmo exercendo (desde 1973) a docência na EBDSC, compreendendo que, na ocasião, não houve envolvimento significativo da comunidade da FESC. Apesar disso, a ideia da federalização dos cursos foi se tornando um sonho para a nossa comunidade interna, objeto de muitas conversas e reflexões, como um caminho viável para o futuro dos dois renomados cursos de graduação. A Universidade Federal havia sido criada em 1970, com grande apoio e participação da comunidade são-carlense, estando ainda em fase de implantação, com o que haveria maior possibilidade da incorporação dos cursos, liberando o Município desse significativo compromisso com a manutenção do ensino superior, fortalecendo os laços com a sociedade e ampliando o acesso ao ensino público e gratuito. Após um interregno de alguns anos, o assunto foi retomado no início da gestão do Prefeito João Octávio Dagnone de Melo (1983-1988), em junho de 1983, quando encaminhou ao então Reitor da UFSCar, Prof. Dr. Pedro Magalhães Lacava, o Requerimento nº 543, da Câmara Municipal de São Carlos, que também solicitava estudos sobre a possibilidade de integração das duas escolas à UFSCar. Novamente, a demanda foi encaminhada ao Conselho de Ensino e Pesquisa, que, após a emissão de parecer de um de seus membros, em abril de 1984, cria uma comissão encarregada de estudar a proposta de incorporação. Nessa ocasião, em 1984, fui eleita pela comunidade e nomeada pelo Executivo Municipal como Diretora Pedagógica da EBDSC e participei ativamente desse processo de federalização dos cursos até 1992, quando encerrei meu segundo mandato de quatro anos na gestão da instituição. Nesse período, o sonho acalentado encontrou um fértil terreno para se fincar, se firmar e alavancar o início de ações junto à Prefeitura Municipal de São Carlos, à Câmara Municipal de São Carlos e ao Conselho Diretor da FESC, lideradas pela EBDSC e amparadas pelo comprometimento que seus docentes tinham pela escola, pelo curso e pela profissão de bibliotecário. Em decorrência da não emissão de parecer ou de relatório da referida comissão, a comunidade escolar da Escola de Biblioteconomia e da Escola de 30 Educação Física, em maio de 1985, lançaram a “Campanha Pró-Federalização da FESC” e o “Manifesto da Comunidade Escolar da Fundação Educacional São Carlos”, documento que apresentava algumas considerações: 1) as sérias dificuldades administrativas e pedagógicas das escolas, decorrentes das limitadas condições oferecidas pela mantenedora; 2) o endividamento da FESC perante as obrigações trabalhistas (INSS e FGTS); 3) o apoio da Prefeitura Municipal, desde 1983, com o aumento das dotações orçamentárias, ainda insuficientes diante das reais necessidades da instituição; 4) a priorização da administração pública municipal com o ensino infantil e fundamental; 5) o expressivo apoio da Prefeitura Municipal na implantação da Universidade Federal, inclusive com a desapropriação do terreno; 6) a conquista da Universidade Federal pela comunidade são-carlense e sua responsabilidade na resolução de problemas locais; 7) o inaceitável contraste existente entre as condições de ensino e pesquisa da UFSCar e da FESC, ambas instituições públicas de ensino superior; 8) a necessidade e o interesse da Universidade na abertura de novos cursos de graduação para seu fortalecimento e desenvolvimento; 9) e, por fim, a qualidade e relevância da formação oferecida pela EBDSC e pela EEFSC, que são de conhecimento e respeitabilidade públicas. Com essas considerações, o manifesto reivindica: “a incorporação plena da Fundação Educacional São Carlos à Universidade Federal de São Carlos para melhoria das condições de ensino e pesquisa das Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos e da Escola de Educação Física de São Carlos”. Um formulário de adesão vinha anexado ao texto, com campos em branco para preenchimento do nome, cargo, entidade, endereço e assinatura da pessoa ou autoridade que apoiasse a reivindicação da comunidade expressa no Manifesto, além de endereço para remessa pelo correio, se fosse o caso. Obteve-se considerável apoio de autoridades locais, instituições de ensino similares e entidades de classe. A memória me falha em relação ao encaminhamento dos formulários de adesão preenchidos, que ou foram encaminhados para a Prefeitura Municipal de São Carlos ou diretamente para a UFSCar. Como resultado, a comissão designada pelo CEPE/UFSCar, presidida pelo Prof. Dr. Péricles Trevisan, encaminhou seu parecer ao então Reitor, Prof. Dr. Munir Rachid, em outubro de 1985: “entende a Comissão que, em princípio, a Universidade Federal de São Carlos deve manifestar-se favoravelmente à incorporação [...] e que, ao assim proceder, estaria, de um lado, dando conteúdo a sua posição de princípio em defesa do ensino público e gratuito, e por outro, oferecendo condições efetivas de garantia da continuidade de funcionamento daquelas escolas e de elevação da qualidade de ensino ali dispensado”. 31 Após conhecimento do citado parecer, o Magnifico Reitor, por meio da Portaria GR nº 102/86, de 2 de abril de 1986, constituiu um “Grupo de Trabalho Interinstitucional”, encarregado de definir o mais concretamente possível os procedimentos da incorporação, composto por três representantes da UFSCar (Prof. Dr. Ricardo Martucci, Presidente, representante do Conselho de Ensino e Pesquisa, Prof. Dr. Eduardo Olívio Ravagni Nicolini, representante da Câmara de Graduação e Prof. Dr. Carlos Alberto Andreucci, representante do Centro de Educação e Ciências Humanas) e três da FESC (Enaldo Nunes Marques, representando o Conselho Diretor da FESC, Profa. Elisabeth Márcia Martucci, representando a EBDSC e Profa. Haydée Pozzi Semeghini, representando a EEFSC), que apresentou relatório final dos trabalhos em outubro de 1986. Em síntese, essa primeira proposta formalizada para a incorporação dos cursos foi a seguinte: • A incorporação abrangeria apenas as escolas e seus cursos de graduação. • A UFSCar assumiria os encargos escolares referentes ao corpo discente das escolas com o curso em progresso, utilizando suas instalações físicas. • Os currículos vigentes nas escolas seriam mantidos, com abertura de vestibulares com 30 (trinta) vagas para o curso de Biblioteconomia e 60 (sessenta) para o curso de Educação Física. • No caso do curso de Biblioteconomia, conforme currículo mínimo vigente no país, as matérias/disciplinas de fundamentação geral seriam alocadas nos departamentos acadêmicos já existentes no Centro de Educação e Ciências Humanas (CECH). E, no caso do curso de Educação Física, as disciplinas não profissionalizantes, também constantes do currículo mínimo vigente, seriam alocadas nos departamentos existentes no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS) e as de formação pedagógica nos departamentos existentes no Centro de Educação e Ciências Humanas. • Dois novos departamentos acadêmicos seriam criados para abrigar as disciplinas específicas das novas áreas de conhecimento: um, no CECH – Biblioteconomia, e outro no CCBS – Educação Física. • O acervo da biblioteca da FESC seria incorporado à Biblioteca Central da UFSCar, assim como os equipamentos e material esportivo utilizado para as aulas práticas do curso de Educação Física. 32 • Os arquivos da Secretaria da FESC também seriam incorporados à UFSCar, considerando o caráter comprobatório da documentação escolar arquivada. • A absorção ou não dos docentes das escolas, responsáveis pela oferta de disciplinas não profissionalizantes, seria definida pelos departamentos acadêmicos da UFSCar, nas quais as disciplinas fossem alocadas. • Haveria a incorporação, em tempo integral e dedicação exclusiva, dos docentes das escolas, responsáveis pelas disciplinas específicas de formação profissional, após análise curricular feita por comissão específica. • Para suprir necessidades decorrentes da criação dos novos departamentos e do aumento de trabalho nos órgãos suplementares da Universidade, poderiam ser incorporados funcionários da FESC alocados em setores funcionalmente equivalentes. • O documento ainda apresentava estimativas de custo para a construção das edificações dos novos departamentos, para a contratação de 20 (vinte) docentes em tempo integral e dedicação exclusiva e de 3 (três) servidores técnico-administrativos por departamento, para a aquisição de bens móveis (mobiliário e equipamentos) e para despesa anual de custeio. Nas considerações finais, foi indicado que o relatório do grupo de trabalho seria encaminhado para análise dos órgãos colegiados da Universidade e da Fundação Educacional São Carlos e, que, em caso da concretização da incorporação deveriam “ser admitidos imediatamente os três docentes mais titulados de cada escola, os quais em conjunto com os professores da UFSCar procederão às adaptações administrativas e didáticas necessárias ao funcionamento dos cursos na UFSCar”. Para redigir o presente texto, esteve ao meu lado uma cópia desse documento final da Comissão Interinstitucional, já muito envelhecida pelo tempo de guarda, com suas folhas amarelecidas e ainda datilografadas em papel sulfite timbrado da Secretaria dos Órgãos Colegiados da UFSCar (SOC). Após mais de 30 anos, tive a oportunidade de relembrar o esforço do grupo de trabalho em construir uma proposta que, na época, se julgou passível de implementação. Com essa releitura, constato que a proposição de incorporação construída, desejada ou esperada, também era a expectativa dos membros da comunidade escolar da FESC, uma incorporação praticamente plena dos 33 cursos e de seus currículos, dos alunos, dos professores, do acervo bibliográfico e documental, apenas tendo como exigência a análise curricular dos docentes, a ser realizada por comissão específica, com base em critérios e parâmetros da Universidade, para seu aceite e contratação em regime de tempo integral e dedicação exclusiva. O sonho virando realidade – Parte 1: formalizando a transferência do curso Depois de uma lacuna de quase três anos, quando parece ter ocorrido gestões e trabalho envolvendo a alta administração da Universidade, da Prefeitura Municipal e da Fundação Educacional, há registro de que uma nova etapa do processo havia sido concluída. Em 27 de setembro de 1989, ocorreu a assinatura do documento “Declaração do Prefeito Municipal de São Carlos e do Reitor da Universidade Federal de São Carlos em relação aos cursos da Fundação Educacional do Município”, assinada por Neurivaldo José de Guzzi, Prefeito Municipal de São Carlos, e pelo Prof. Dr. Sebastião Elias Kuri, Reitor da UFSCar, cujo texto esclarecia que, “com vistas a viabilizar a solução do problema representado pela solicitação de incorporação dos cursos da Fundação Educacional São Carlos pela Universidade Federal, vinham a público declarar que ambas instituições têm a intenção de, no menor prazo possível, envidar todos os esforços para que a solução desse problema seja obtida, nos termos da análise que se segue”. Essa análise detalhada envolveu dez itens do documento, que incluíram ampla justificativa para a incorporação: a) resgatou o histórico do processo que, uma década depois da primeira manifestação do Município, mesmo com a instalação de comissões e o surgimento de debates, não havia chegado a um resultado definitivo, o que indicava a necessidade de nova abordagem e diferentes estratégias; b) reiterou a onerosa e ineficaz manutenção dos cursos de graduação pela FESC, com situação deficitária e endividamento que se acumulava, com restritas condições de funcionamento dos cursos e aumento progressivo da evasão escolar, e que, mesmo diante das dificuldades enfrentadas têm conseguido formar profissionais de reconhecida competência, satisfatoriamente absorvidos pelo mercado de trabalho; c) evidenciou, ainda, que o ensino de nível universitário é obrigação maior das esferas dos governos federal e estadual e que o Município deve incumbir-se do ensino básico. 34 Estes argumentos justificavam a manutenção desses cursos na estrutura da UFSCar, que ofereceria condições institucionais altamente satisfatórias para seu aprimoramento (redução do número de vagas, infraestrutura física e material adequada, contratação de professores em tempo integral e incentivo a atividades de pesquisa). Nos três últimos itens do documento, foram apresentadas as novas estratégias definidas em conjunto: 1 A realização de duas medidas imediatas, a autorização do Ministério da Educação para a abertura e manutenção dos cursos na UFSCar e a elaboração de um convênio entre a Prefeitura e a Universidade. 2 Apresentação do conjunto das seguintes condições operacionais acordadas: • A UFSCar incorporaria apenas os alunos ingressos por vestibular próprio e definiria o currículo de cada curso. • A FESC cessaria de realizar exames vestibulares a partir da realização dos mesmos pela UFSCar. • A FESC seria responsável pela continuidade de atendimento aos alunos selecionados em seus exames vestibulares. • Os professores da FESC continuariam a ser seus funcionários até a conclusão de curso de seus alunos. • As atividades escolares dos alunos da FESC seriam realizadas integralmente nas instalações da UFSCar, mediante realização de convênio. • A UFSCar definiria as instalações a serem utilizadas para as aulas dos alunos da FESC, bem como os horários de utilização. • A Prefeitura tornaria os cursos da Fundação gratuitos a partir da realização dos vestibulares pela UFSCar e da cessão das instalações para suas atividades escolares. • A restauração e reforma de algumas das instalações necessárias para as atividades didáticas dos cursos e das atividades administrativas seriam objeto de exame e acordo entre a UFSCar e a Prefeitura, assim como as despesas para a manutenção dos cursos. • A Prefeitura e a Universidade seriam responsáveis pelas condições de vigilância, segurança, transporte, biblioteca e outras para os cursos noturnos a serem ministrados na UFSCar. 35 • Os alunos da FESC teriam direito aos mesmos serviços disponíveis aos alunos da UFSCar. • Havendo vagas ociosas no curso da UFSCar, os alunos remanescentes nos cursos da FESC poderiam ser transferidos para os cursos da UFSCar. • Os docentes e funcionários técnico-administrativos da Fundação deveriam prestar concurso público para possível ingresso na UFSCar. • Os equipamentos e materiais da FESC, de uso para o desenvolvimento dos cursos, seriam objeto de negociação entre a FESC, a UFSCar e a Prefeitura Municipal. • Os terrenos e as instalações da FESC reverteriam para a Prefeitura Municipal. • A FESC se responsabilizaria, em conjunto com a Prefeitura, pelo pagamento das dívidas contraídas. Com esta Declaração conjunta ficaram definidas as condições para a incorporação dos cursos de graduação da FESC pela Universidade. Cada instituição seria responsável pelos seus cursos, alunos e professores, porém uma preocupação louvável foi pensada e viabilizada com o funcionamento de ambos os cursos no campus da Universidade: a integração, a troca, o convívio, a parceria entre os dois cursos, entre seus alunos, entre seus professores e servidores. Não uma ruptura, mas a continuidade harmoniosa de uma história de formação. Também vale destaque a preocupação com os alunos das turmas remanescentes da FESC, cujos cursos passariam a ser gratuitos, com suas aulas realizadas nas instalações da UFSCar e com acesso aos mesmos serviços dos alunos da UFSCar. Na sequência, como previsto, a Lei Municipal nº 10.359, de 14 de setembro de 1990, autorizou a incorporação dos cursos da Fundação Educacional São Carlos pela Universidade Federal de São Carlos, em conformidade com a declaração de intenções e o documento também foi aprovado pelo Conselho Universitário da UFSCar. A complexidade da questão, que envolvia a análise colegiada interna, a expansão sustentada da Universidade, dependente de negociações junto ao Ministério da Educação para aprovação dos recursos necessários (prioritariamente, a contratação do corpo docente) e o inicio da oferta de cursos noturnos na instituição, dependente de adequações internas (especialmente o funcionamento noturno das unidades envolvidas, o fortalecimento dos pro- 36 cedimentos de vigilância e a ampliação dos horários do transporte público) fez com que o processo tivesse encaminhamentos que requereram um tempo mais prolongado de tramitação. Nesta etapa de construção dos termos do convênio e de muitas negociações políticas, eu já havia encerrado minha segunda gestão na direção da EBDSC (1992), porém acompanhei o que ocorria como pude e guardo na memória algo inacreditável que fiz: soube que haveria uma reunião sobre o assunto no Gabinete do Prefeito Municipal e, mesmo sem ser convidada, lá fui e participei como ouvinte. Um deslize ético, em nome de uma justa causa! Os termos do convênio praticamente obedeceram às condições operacionais acordadas na declaração de intenções, com poucas alterações. Porém, como registro neste texto, suas cláusulas são sintetizadas, mesmo com o risco da repetitividade. É preciso evidenciar que houve um aumento das responsabilidades de Prefeitura, que arcaria com as reformas necessárias no parque esportivo da UFSCar e cederia funcionários para apoio administrativo e vigilância. Em primeiro lugar, no texto constam as necessárias considerações iniciais sobre: o interesse da FESC e da Prefeitura pela incorporação dos cursos desde 1979; o acordo entre as partes em proceder a referida incorporação, manifesto em documento aprovado pelo Conselho Universitário da UFSCar e pela Câmara Municipal de São Carlos; e a autorização do Ministério da Educação para que a UFSCar pudesse proceder à contratação de docentes para viabilizar a incorporação dos cursos. O convênio foi redigido com onze cláusulas: 1 A primeira, sobre seu objetivo: a absorção dos cursos de Biblioteconomia e Documentação e de Educação Física da Fundação Educacional São Carlos pela Universidade Federal de São Carlos, de acordo com o documento “Declaração do Prefeito Municipal e do Reitor da Universidade Federal de São Carlos em relação aos cursos da Fundação Educacional do Município” e com a Lei Municipal nº 10.359/90, que autorizava a incorporação dos cursos da FESC pela UFSCar. 2 A segunda, sobre as condições operacionais gerais: • A absorção dos cursos seria iniciada a partir do 1º. semestre de 1994. • Os cursos absorvidos seriam oferecidos no período noturno. 37 • Seriam absorvidos os alunos que prestarem vestibular pela FUVEST e/ou de acordo com as exigências estabelecidas pela UFSCar, que também definiria o currículo de cada curso a ser desenvolvido em seu âmbito. • A implementação progressiva da absorção seria feita com o ingresso das novas turmas por meio dos exames vestibulares promovidos pela UFSCar. • Os alunos da UFSCar teriam cursos gratuitos. • A FESC deixaria de realizar exames vestibulares, a partir do momento que a UFSCar fosse autorizada a realizar exames vestibulares para os cursos. • A Prefeitura tornaria os cursos da FESC gratuitos a partir do momento em que a UFSCar cedesse suas instalações para as atividades das turmas remanescentes. • Os terrenos e as instalações da FESC seriam revertidos para a Prefeitura. • As dívidas da FESC não seriam incorporadas, permanecendo sob a responsabilidade da mesma e da Prefeitura. • O acervo de material e equipamento de uso para o desenvolvimento dos cursos seria de uso comum e, após a incorporação completa, cedido à UFSCar. 3 A terceira, referente aos alunos remanescentes: • A FESC continuaria a atender os alunos ingressos pelos exames vestibulares que realizou, até sua conclusão do curso. • Havendo vagas ociosas nos cursos absorvidos pela UFSCar, alunos remanescentes nos cursos da FESC poderiam ser transferidos para os cursos da UFSCar. • Os alunos da FESC poderiam ter suas atividades realizadas integralmente nas instalações da UFSCar, quando esta iniciar as atividades dos cursos absorvidos. • Os estudantes da FESC, desde que as aulas sejam realizadas no campus da UFSCar, teriam direito aos mesmos serviços disponíveis para os alunos da UFSCar. 38 4 A quarta, relativa ao corpo docente e técnico-administrativo: • Os docentes e funcionários da FESC, que se interessarem em compor o quadro da UFSCar, deveriam prestar concurso público. • Os professores e funcionários que não ingressassem na UFSCar, continuariam a ser funcionários da FESC, só usando as instalações da UFSCar para a realização de atividades afetas aos cursos da FESC, até a completa absorção deles. • A UFSCar definiria as instalações e horários a serem utilizados para ministrar as aulas das turmas remanescentes da FESC. 5 A quinta, sobre a responsabilidade das partes: • À UFSCar caberia: coordenar o processo de absorção dos cursos, definir os departamentos que seriam responsáveis pela oferta das disciplinas, contratar (a partir de 1993) os docentes das áreas específicas, que integrariam a equipe de trabalho responsável pelo planejamento curricular dos cursos e definição dos perfis profissionais dos mesmos, promover vestibulares para ingresso dos alunos no 1º semestre de 1994, fornecer condições de infraestrutura para funcionamento dos cursos e das turmas remanescentes que venham a desenvolver suas atividades na UFSCar e custear as despesas de pessoal dos novos cursos. • À Prefeitura caberia: responsabilizar-se em melhorar o transporte público para alunos UFSCar e FESC no trajeto campus-cidade-campus, auxiliar a UFSCar (recursos e mão de obra) a instalar um sistema de iluminação adequado para as atividades didáticas no período noturno, custear melhorias no ginásio de esportes, campo de futebol, pista de atletismo, piscina e vestiários, quadra poliesportivas, quadras de areia, pavilhão de ginástica e mini-campos de futebol, alocar funcionários administrativos da FESC na UFSCar para suprir as necessidades até a absorção completa dos cursos, fornecer funcionários da Prefeitura para serviços de segurança e vigilância na UFSCar no período noturno. 6 A sexta, explicitou as etapas do processo de absorção: 1ª etapa: contratação de docentes da área de Biblioteconomia e Educação Física; 2ª etapa: 39 definição dos perfis profissionais e currículos dos cursos; 3ª etapa: definição da alocação dos cursos na estrutura organizacional da UFSCar e definição dos departamentos responsáveis pelas disciplinas a serem oferecidas nos cursos; 4ª etapa: adequação das condições da infraestrutura física necessária para funcionamento dos cursos no período noturno; 5ª etapa: adequação da infraestrutura administrativa e de apoio para o desenvolvimento dos cursos; 6ª etapa: realização dos exames vestibulares para os cursos absorvidos; 7ª etapa: início do desenvolvimento dos cursos na UFSCar; 8ª etapa: transferência das turmas remanescentes da FESC para a UFSCar. 7 A sétima, apresentava o cronograma das ações. • • • • No 1º semestre de 1993 – até a 3ª etapa. No 2º semestre de 1993 – da 4ª a 6ª etapas. No 1º semestre de 1994 – 7ª etapa. No 2º semestre de 1994 – 8ª etapa. 8 A oitava, do prazo de vigência do convênio: 4 anos, a partir da data de assinatura. 9 A nona, referente aos casos omissos, que seriam resolvidos em comum acordo entre as partes. 10 A décima, sobre a possibilidade de rescisão, no caso de infração comprovadas de suas cláusulas. 11 A décima primeira e última, definindo o foro de São Carlos para dirimir questões oriundas do instrumento. O convênio foi assinado pela Presidente da FESC, Profa. Maria Salete Ramalho de Almeida, pelo Prefeito Municipal de São Carlos, Rubens Massucio Rubinho, e pelo Prof. Dr. Newton Lima Neto, Reitor da UFSCar, em solenidade realizada na Câmara Municipal de São Carlos, no dia 11 de maio de 1993, às 20 horas. Pasmem! Dia do meu aniversário! Foi um presente e tanto! Tudo havia dado certo, após mais de quatorze anos! Comparecemos em peso, com muita alegria! Aplaudimos muito! Tiramos fotos para registrar! 40 Merecia comemoração! Após a solenidade, fomos jantar no charmoso restaurante do Hotel Vila Rica! Mesa grande e feliz, onde compartilhamos o significado de um sonho concretizado. O sonho virando realidade – Parte 2: planejando o novo curso da UFSCar Após a celebração do convênio, a Universidade Federal passou a tomar as necessárias providências para a operacionalização da absorção dos cursos, conforme etapas e cronograma previstos. Algumas poucas notícias chegavam à EBDSC, de maneira muito esporádica. Também chegavam (não se sabia de onde) comentários desabonadores sobre a EBDSC, de que teria um curso tradicional, voltado apenas para bibliotecas e que seus professores não teriam voz e vez no inovador curso da UFSCar. Seguimos firmes, mantendo o foco na importância do processo. A “Comissão de Implantação do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação” foi designada pela direção do Centro de Educação e Ciências Humanas, sendo composta por três membros docentes, das áreas de Letras, Ciências Sociais e Educação, presidida pela Profa. Dra. Helena Rosa Vieira Lima, com a responsabilidade de definir o perfil profissional dos egressos e a grade curricular do curso. Havia, no seio da comunidade da EBDSC, a expectativa de que nesse processo de planejamento haveria um trabalho conjunto com a Comissão, considerando sua história de formação desde 1959 e sua ativa participação, ao longo da última década, em pesquisas e encontros sobre o tema, realizados sob os auspícios da então Associação Brasileira do Ensino de Biblioteconomia e Documentação (ABEBD, hoje Associação Brasileira de Educação em Biblioteconomia e Ciência da informação – ABECIN), que havia resultado em proposta curricular (implantada na EBDSC a partir do ano letivo de 1993), com marco referencial na Ciência da Informação (LANCASTER, 1989), abrangendo todos os componentes do ciclo de transferência da informação2. Nessa perspectiva, eu e a Profa. Rosemeire Marino Nastri fomos designadas pela Congregação da Escola representantes do corpo docente da EBDSC junto à 2 Formalizada no Projeto Político-Acadêmico da Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos. São Carlos, novembro de 1992. 41 Comissão de Implantação do Curso, recebendo a incumbência de elaborar uma proposta curricular preliminar, advinda da nossa experiência institucional, que servisse de base para uma discussão conjunta. Entretanto, a Comissão de Implantação do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar realizava o processo de planejamento curricular em outra direção, com a colaboração de renomados especialistas da área, como Jaime Robredo e Johanna Smit, entre outros. Mesmo sabendo desse encaminhamento, julgamos que tínhamos a responsabilidade e o compromisso de entregar a proposta como forma de colaboração. Assim, entramos em contato com a presidência da Comissão e tivemos a oportunidade de efetivar sua apresentação, em reunião realizada em 10 de agosto de 1993. Não cabe aqui detalhar o conteúdo do documento, mas sim destacar a inovação curricular proposta: a implantação de ênfases, para o aprofundamento de conhecimentos ou especialização profissional ainda no curso de graduação, considerando estudo feito sobre a função social da profissão (MUELLER, 1989), que identificou três funções exercidas pelos profissionais em nosso país: a função de preservação (suporte à preservação da memória), de educação (suporte à educação formal e informal) e de apoio à pesquisa (suporte à ciência e tecnologia). O currículo proposto teria um tronco comum de disciplinas e três ênfases eletivas: “Informação Histórica”, “Informação Social” e “Informação Científica e Tecnológica”, cada uma com 360 (trezentos e sessenta) horas, o que corresponderia a 6 (seis) disciplinas de 60 (sessenta) horas-aula ou de 4 (quatro) créditos cada uma, oferecidas ao longo do curso, do 3º ao 8º semestres, com divisão das turmas em apenas um dia letivo na semana, o que proporcionaria a troca de conhecimentos e experiências entre toda a turma nos demais dias letivos da semana. Após oito meses de trabalho, a comissão concluiu a proposta de implantação do curso, definindo o perfil profissional do egresso, um profissional com visão interdisciplinar, diferenciado, atento a mudanças e desafios, comprometido com o acesso à informação, que atenderia, “de forma inovadora a demanda tradicional dos centros de informação pública (bibliotecas públicas e escolares), mas, principalmente competentes em informação especializada, fatia de mercado que vem sendo ocupada por outros profissionais”, nas indústrias de grande, médio e pequeno porte. Neste ponto, a Comissão acatou em parte nossa sugestão, com o currículo possuindo duas opções de formação: “Informação Pública” e “Informação Tecnológica e Industrial”, que seriam cursadas ao final do curso, nos 7º e 8º semestres. O documento 42 expressava que: “o aluno terá contato com um conjunto de disciplinas de formação geral, que se orienta tanto para sua atuação em centro de informação pública como em centro de informação especializada. Posteriormente, no sexto semestre, passará um período de estágio nos dois tipos de centro de informação, que deverão ensejar-lhe a reflexão necessária para orientá-lo em sua opção de formação”. O Parecer nº 31/94, de 2 de fevereiro de 1994, do Conselho Interdepartamental do Centro de Educação e Ciências Humanas aprovou a proposta de implantação do curso, bem como o Parecer nº 552/94, de 5 de abril de 1994, da Câmara de Graduação do Conselho de Ensino e Pesquisa. A formalização da criação do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação se deu posteriormente, em 7 de julho de 1994, por meio da Resolução nº 224/94, do Conselho Universitário da UFSCar. O curso ficou alocado administrativamente no Núcleo de Biblioteconomia e Ciência da Informação do Departamento de Letras (DL/CECH) e a Profa. Dra. Helena Rosa Vieira de Lima foi designada Coordenadora do Curso. Considerando o cronograma de operacionalização do convênio, constata-se que a etapa de definição do perfil profissional e do currículo havia demandado um pouco mais de tempo do que o previsto e havia sido feita a opção pela não contratação inicial do corpo docente específico para realizar essas atividades. Com isso, as etapas seguintes seriam a realização dos exames vestibulares e dos concursos públicos para a contratação dos professores. Foram abertos cinco concursos públicos de provas e títulos para contratação de Professores Auxiliares, em tempo integral e dedicação exclusiva, nas áreas de “Análise Documentária”, “Informática Documentária”, “Disseminação da Informação”, “Informação Pública” e “Informação Tecnológica e Industrial”, conforme editais publicados no Diário Oficial da União, em 29 de dezembro de 1993. Me lembro que, na ocasião, houve questionamento do Conselho Regional de Biblioteconomia – 8ª Região – São Paulo sobre a não exigência de Graduação em Biblioteconomia aos candidatos de todas as áreas e que a UFSCar arguiu sobre sua autonomia universitária e a necessidade de um corpo docente multidisciplinar para a formação de um profissional com perfil inovador, estabelecendo a exigência apenas para a área de “Disseminação da Informação”, que possuía conteúdos considerados específicos de Biblioteconomia. Fiz minha inscrição na área de “Disseminação da Informação”, área de minha atuação docente, em 21 de fevereiro de 1994, quando entreguei a 43 documentação formal necessária, meu Plano de Atividades de Ensino, Pesquisa e Extensão e os documentos comprobatórios de meu curriculum vitae, meticulosamente coletados e organizados em caixas-arquivo. Pasmem! 296 documentos anexados! Os colegas da EBDSC fizeram suas inscrições, de acordo com as áreas que atuavam, porém, concorrendo com profissionais com outras áreas de formação. Empreendi uma considerável jornada de estudos, de janeiro a abril, dia e noite estudando!: li toda a bibliografia recomendada e muito mais, estudei a fundo os seis temas escolhidos para sorteio da prova escrita e didática, elaborei a aula a ser ministrada para cada um deles, com apoio de transparências: Informação e Sociedade no Brasil; Normalização Documentária; O Processo de Referência; Estudos de Uso e Treinamento de Usuários; Orientação Bibliográfica; Uso da Informação: características das diferentes comunidades. Meu concurso foi realizado em final abril de 1994, com a participação de cinco candidatos (dois inscritos se ausentaram), sendo a banca constituída pelos professores: Prof. Dr. Ramón Peña Castro, Profa. Regina Célia Baptista Beluzzo e Profa. Maria Carmem Romcy de Carvalho, e constou de quatro provas – prova escrita, prova didática, análise curricular e entrevista. Fui aprovada em primeiro lugar e vi recompensado o grande esforço que havia empreendido, com muito estudo e muita dedicação para alcançar esse objetivo. Porém, a alegria foi embaçada pela não aprovação das minhas companheiras professoras da EBDSC, que passaram a compreender que o sonho acalentado como um caminho futuro para o curso da EBDSC havia sido concretizado, porém que esse caminho seria trilhado por outras pessoas e não por elas. A elas couberam, a relevante tarefa de dar continuidade às turmas remanescentes e presenciar a trajetória de encerramento das atividades da EBDSC. A mim, coube vivenciar uma nova e desafiadora experiência profissional, implantar, em conjunto com novos colegas e novo cenário institucional, o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar, colaborar para construir sua identidade inovadora, porém trazendo na bagagem os inestimáveis valores que permearam a história da EBDSC e os conhecimentos adquiridos na experiência vivida. 44 A realidade do sonho: implantando o novo curso da UFSCar No concurso vestibular da FUVEST de 1994, foram abertas 40 (quarenta) vagas para o curso noturno de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar e, nesta primeira oferta, o índice foi de 1,6 candidato por vaga. Um índice elevado se comparado com a demanda que existia para o curso da EBDSC nos últimos anos. Com esse vestibular, a UFSCar inaugurava a oferta de três cursos noturnos: Biblioteconomia, Educação Física e Letras (que também tinha aulas no período vespertino). Infelizmente, como estava previsto no convênio, a realização das atividades escolares dos alunos das turmas remanescentes da EBDSC no campus da UFSCar não se concretizou. As turmas continuaram a ser atendidas na sede da Fundação Educacional São Carlos e a cobrança das mensalidades escolares teve continuidade. Cada curso seguiu seu caminho, sem iniciativas de integração ou de cooperação. Por outro lado, também não se concretizaram as melhorias que seriam realizadas pela Prefeitura Municipal de São Carlos no parque esportivo da UFSCar, bem como a alocação de funcionários para serviços e segurança e vigilância noturna na UFSCar. As atividades do curso de BCI da UFSCar foram iniciadas no primeiro semestre de 1994, com uma turma de 38 (trinta e oito) alunos, com aulas de disciplinas oferecidas pelos departamentos de Letras e de Computação, considerando que os concursos para a contratação de professores estavam em andamento. O curso possuía oito semestres letivos, com aulas de segunda-feira a sexta-feira no período noturno e aos sábados no período matutino, com 24 (vinte e quatro) créditos por semestre. Fui contratada pela UFSCar no início do mês de julho, período em que acredito que os demais colegas também o foram: Maria Cristina Piumbato Innocentini Hayashi (Informação Pública), Ariadne Chloe Mary Furnival (Informação Tecnológica/Industrial), Maria Cristiane Barbosa Galvão (Análise Documentária) e Márcio Merino Fernandes (Informática Documentária), que logo solicitou exoneração para realizar capacitação no exterior. Posteriormente, o grupo de docentes foi ampliado, no primeiro semestre de 1995. Uma vez empossados, os docentes assumiram as disciplinas do 2º semestre de 1994, que eram ministradas em salas de aula do prédio AT-1, na área sul do campus. Fomos pioneiros e enfrentamos as dificuldades inerentes à primeira oferta de um curso noturno: 1) o sistema de iluminação ainda precário para a locomoção nas vias do campus até as salas de aula. Os alunos costumavam 45 transitar em grupo no trecho entre o ponto de ônibus até a sala de aula e vice-versa, assim como para se dirigirem até a Biblioteca Comunitária ou até o laboratório da Secretaria Geral de Informática, na área norte, onde também eram realizadas atividades didáticas; 3) falta de transporte interno no período noturno; 4) fragilidade da segurança no período noturno; 5) às vezes, o sistema de energia elétrica caía e ficávamos no escuro, o que foi resolvido com um kit de emergência na bolsa de cada um – vela, fósforo e lanterna para uma mínima iluminação. Se demorasse a voltar, as aulas eram encerradas; 6) O Núcleo de Biblioteconomia e Ciência da Informação ocupava duas salas no prédio do Departamento de Letras e tínhamos que dar uma boa caminhada e enfrentar duas escadarias para carregar o retroprojetor até a sala de aula e quando as aulas terminavam o equipamento era colocado em nosso carro particular para devolução no dia seguinte, pois o campus ficava um tanto deserto no horário de término das aulas (ali pelas 23h) para devolver o equipamento no local. Ao longo do tempo, tudo foi se resolvendo e o aumento das turmas trouxe uma boa movimentação no período noturno, além dos muitos jogos que eram realizados nas quadras poliesportivas. Nesse período inicial, o grupo de professores realizou estudo de adequação curricular do curso de quatro para cinco anos, para atendimento à recomendação da Câmara de Graduação, que julgou que a diminuição do número de créditos oferecidos nos semestres letivos proporcionaria melhores condições de aproveitamento escolar. Me lembro que utilizamos como parâmetro a oferta de 20 (vinte) créditos semestrais, com eliminação das aulas aos sábados. Foi um momento ímpar, de muitas reuniões, de socialização, de troca de experiências, de reflexões conjuntas, ora de consenso, ora de divergência de ideias. Como resultado, o currículo foi aperfeiçoado pelo grupo, com a revisão da nomenclatura das disciplinas, de seus objetivos, conteúdos, carga horária e periodização, que refletiu a identidade inicial do grupo e do curso. As ênfases também foram objeto de alterações, passando a serem denominadas “Informação Social” e “Informação Tecnológica/Empresarial”, com redefinição de suas disciplinas. Esse currículo foi executado nas turmas ingressantes em 1995 e 1996, quando novamente foi objeto de mudança, voltando a ser de quatro anos, a partir do ano letivo de 1997, considerando nova recomendação feita pela Câmara de Graduação, em decorrência da baixa demanda no vestibular de 1996, do aumento do índice de evasão escolar, do esforço docente exigido para um currículo de maior duração, da equivalência de aproveitamento escolar entre a turma de quatro anos e as de cinco anos. 46 A grande dificuldade vivenciada nessa fase inicial de implantação do curso foi decorrente das limitações orçamentárias impostas pelo governo federal ao ensino superior, que retardou algumas ações previstas: a aquisição da bibliografia básica do curso, de equipamentos audiovisuais e de informática e de ampliação do quadro docente, o que dificultou o afastamento dos docentes para capacitação. Em 1996, a última turma remanescente da EBDSC concluiu o curso e, em 1997, os docentes tiveram seus contratos de trabalho rescindidos e a EBDSC encerrou suas atividades, quando seu acervo bibliográfico e a documentação acadêmica foram incorporados aos acervos da UFSCar. O convênio celebrado entre a Fundação Educacional São Carlos, a Prefeitura Municipal de São Carlos e a Universidade Federal de São Carlos em 11 de maio de 1993 tinha prazo de vigência de 4 (quatro) anos e encerrou-se em 11 de maio de 1997. Em 1996, foi criado o Departamento de Ciência da Informação (DCI) na estrutura do Centro de Educação e Ciências Humanas. Em 1997, o DCI é instalado em local próprio, no piso superior do Edifício Central do CECH, recém-reformado. No mesmo ano, a primeira turma do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar concluiu o curso. Estava encerrado, por completo, o processo de incorporação do curso de Biblioteconomia da Fundação Educacional São Carlos pela Universidade Federal de São Carlos. Referências LANCASTER, F.W. O currículo de Ciência da Informação. Revista de Biblioteconomia de Brasília, Brasília, DF, v.17, n.1, p.1-20, jan./jun. 1989. MUELLER, S.P.M. Perfil do bibliotecário, serviços e responsabilidades na área de informação e formação profissional. Revista de Biblioteconomia de Brasília, Brasília, DF, v.17, n.1, p.63-70, jan./jun. 1989. 47 Foto: Sílvia Moura A MEMÓRIA É UMA ILHA DE EDIÇÃO: COM AS LEMBRANÇAS ATRAVESSO O MAR, VOU ME PERDER, VOU ME ENCONTRAR... ARIADNE CHLOE MARY FURNIVAL* Dizem que são eventos únicos os que mudam a vida da gente. No meu caso, me referindo especificamente ao pontapé do meu percurso profissional como docente na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), esse evento foi um churrasco, e eu nem era carnívora na época! Pois é: eu costumava aceitar convites a churrascos para só comer, com muito gusto, vinagrete, pão e mandioca. Neste churrasco em particular, em São Carlos no ano 1993 acho que foi, um assunto que pintou na conversa de fim de tarde foram os novos cursos recém-incorporados na UFSCar da “antiga” Fundação Educacional de São Carlos, os cursos de Biblioteconomia e Educação Física. A migração destes foi considerada uma conquista, liderada pelo então Reitor da UFSCar, Professor Newton Lima Neto e reivindicada pelos estudantes do antigo campus da Fundação. Então, era esse o teor da conversa do churrasco, e que – o fato mais relevante para mim, recém-chegada no Brasil e de certo modo desempregada – tinham sido publicados os editais para concursos públicos para a contratação de docentes para estes “novos” cursos da UFSCar. Não sendo formada em Educação Física e tampouco em Biblioteconomia, à primeira vista, não me via como potencial candidata, mas ao conversar melhor com um camarada presente no churrasco, que já * Doutora em Política Científica e Tecnológica (UNICAMP), Mestre em Computação (University of Manchester), Mestre em História (Universidade de Warwick), completou o curso de Librarianship (University of Sheffield), Graduada em Comparative American Studies (Universidade de Warwick). Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 1994. Contato: chloe@ufscar.br. 49 era professor na UFSCar, foi me explicado melhor como era a ideia do novo curso proposto de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Para mim, as duas áreas eram novas, embora, sendo inglesa, eu tivesse alguma familiaridade com a nomenclatura em inglês: Library and Information Science – LIS. Eu tinha tido contato com a área lá na Europa em três momentos: primeiramente, porque minha tia tinha voltado, na década 70, para sua carreira de bibliotecária depois de um gap de vários anos para criar seus filhos, e me lembro ela contando como tinha que se atualizar totalmente porque os computadores tinham “tomado conta” de quase tudo da profissão, tornando-a quase irreconhecível da década 50. Isto era uma situação semelhante para Doña Inez meu segundo momento de contato indireto com a profissão. Ela era uma mãe para quem trabalhei como au pair – mistura de babá e professora de inglês – em Sevilha, Espanha, durante minhas férias longas de verão, como universitária, na década de 1980. Lembro-me dela bastante ansiosa para a volta ao seu emprego como bibliotecária na Universidade de Sevilha, pelo mesmo motivo daquele da minha tia: insegurança diante das mudanças avassaladoras que tinham reconfiguradas totalmente a profissão. Para essas duas mulheres – minha tia Beryl e Doña Inez – a nova face da profissão bibliotecário foi a tela de microcomputador, lembrando que, naquela época, a tela ainda era escura (os dias do MS-DOS), com o mero piscar de um cursor à espera dos comandos digitados pelo usuário – ou seja, nada intuitivo! Não era por nada que ambas as mulheres se assustaram um pouco com as suas respectivas voltas à profissão. Basta dizer que ambas se readaptaram bem, sendo, como a maioria dos bibliotecários que conheço até hoje, extremamente flexíveis, abertas e prontas para aprender e incorporar as tecnologias computacionais nos seus espaços de trabalho. O terceiro momento de aproximação à profissão de bibliotecário que tive foi antes de me formar na University of Warwick, Inglaterra (1987). Como qualquer outro formando das Humanidades, passei horas na Careers Library, folheando os dossiês de organizações e empresas do Reino Unido, à procura de uma carreira! Ao folhear os dossiês de empregos nas universidades, a carreira de bibliotecário universitário me chamou a atenção, e logo percebi que era uma carreira altamente disputada, com o requisito mínimo de se realizar um ano de “estágio” numa biblioteca universitária antes de ingressar no curso, que naquele país somente existe em nível de pós-graduação. A disputa acirrada era, então, de conseguir um dos poucos estágios pré-curso nas universidades oferecendo-as. Acabei não seguindo esse caminho pois resolvi 50 ficar na universidade mais um tempo para fazer meu mestrado. Basta acrescentar que minha experiência da biblioteca enquanto estudante universitária pode ser caracterizada como “imersão total”. Era comum os estudantes “encontrarem seu lugar na biblioteca” no início do dia, deixando suas bolsas, casacos etc. na cadeira, poltrona, mesa e se estabelecer lá para o resto do dia, apenas saindo para as lectures (literalmente, “palestras” que era como eram chamadas nossas aulas), ou para almoçar, tomar um chá. A biblioteca era nossa grande (e quentinha!) sala de estudos, e ficávamos lá (frequentemente dormindo nos sofás e poltronas espalhadas pelos andares) o dia e, às vezes, a noite toda. Também meu contato com bibliotecas antes de ingressar na universidade como estudante tinha sido constante. Quando crianças, minha mãe rotineiramente levava a mim e a minhas irmãs para a biblioteca pública no bairro de Londres onde morávamos. Naquela época, a biblioteca era ainda o lugar de silêncio, e então não muito atraente para crianças, mas emprestávamos livros frequentemente, e ficávamos fascinadas com as etiquetas, o catálogo de fichas, o carimbo da data de devolução, a tal ponto que brincávamos de Going to the Library: criamos nosso fichário, e grudamos etiquetas nos livros de casa, escrevemos datas de devolução na folha afixada com fita durex no fim do livro, e avisamos uma à outra, gravemente, que se não for devolvido a tempo, haveria uma multa a ser paga! Ou seja, todos os procedimentos e práticas que tínhamos testemunhado “do outro lado do balcão”, como jovens usuárias da biblioteca. Quando minha família se mudou para uma região mais rural, no meio de País de Gales, a biblioteca e leitura ainda fazia parte importante na vida cotidiana: ou esperávamos a library van (bibliobus) aparecer mensalmente, ou minha mãe nos levava para uma cidade em torno de 40 km de casa, com o motivo único de irmos à biblioteca lá. Mais tarde, meu primeiro emprego “de verdade” na Inglaterra foi na cidade de Liverpool, no norte do país, onde gastei muitas horas do meu tempo livre no imponente prédio da biblioteca central da cidade – prédio evocativo dos tempos do império britânico (Liverpool é uma cidade construída pelos lucros oriundos do tráfico de escravos e canaviais no Caribe). Muitos anos depois, morando na mesma cidade enquanto meu então marido fazia seu pós-doc lá, eu levava meu primeiro filho para a mesma biblioteca central em Liverpool que sempre tinha uma agenda agitada de atividades voltada às crianças. Avançando no tempo, para 1993: confesso que, então, quando ouvi, no churrasco do concurso público na UFSCar para o novo curso de Bibliotecono- 51 mia e Ciência da Informação, tinha uma ideia de que tratava a primeira parte do nome, mas não da segunda parte. Talvez eu deveria ter ouvido falar mais da parte de ciência da informação, já que eu tinha acabado de terminar um curso de pós-graduação em computação na UMIST – University of Manchester Institute of Science & Technology. E, realmente, o conteúdo das minhas anotações das disciplinas daquele programa me ajudou consideravelmente quando sentei para estudar para o concurso público da UFSCar. A minha aplicação aos estudos pagou: fui classificada em primeiro lugar. Depois disso, era só esperar (no caso, esperei em torno de 6 meses, dando aulas particulares de inglês!) ser chamada para tomar posse no meu novo lugar de trabalho: a Universidade Federal de São Carlos! Ingressei na UFSCar quando as aulas do novo curso noturno de Biblioteconomia e Ciência de Informação já tinham começado, com professores do Departamento de Letras ministrando disciplinas relacionadas à área, mas ficamos sabendo que a primeira turma aguardava ansiosamente a chegada do corpo docente concursado. Logo após ter tomado posse, a primeira coordenadora do curso, a dinâmica e muito competente Professora Dra. Helena Rosa Vieira Lima do Departamento de Letras, convocou uma reunião com o novo corpo docente (éramos apenas em 5: Maria Cristina P. Innocentini Hayashi, Maria Cristiane Galvão, Márcio Merino Fernandes, Elisabeth Marcia Martucci e eu), e instruí-nos a sentar com a proposta do curso (que tinha sido elaborada com a assessoria de um grupo de docentes da ECA-USP, antes de ser encaminhada para o MEC), analisar as ementas, os planos de ensino, o encadeamento das disciplinas, e propor quaisquer ajustes que achamos pertinentes! Seguiu-se uma série de reuniões de trabalho intensas e exaustivas, com as coitadas das professoras Beth Martucci e Cristiane Galvão pacientemente explicando ao resto de nós os pormenores da biblioteconomia, pois eram as únicas duas bibliotecárias contradadas naquele primeiro momento – fato que evidentemente não foi bem recebido pelas Associações de Classe da profissão, pelo menos uma das quais entrou com um processo contra a UFSCar pelo fato. Mas nosso Reitor de então, Newton Lima Neto, nos deu amplo apoio, sempre enfatizando que a ênfase no curso seria na “Ciência da Informação”, em sintonia com a vocação muito badalada na mídia da cidade de São Carlos ser a “capital da tecnologia”. Aliás, o professor Newton estava interessado no curso se chamar Bacharelado em Ciência da Informação desde o seu início, mas logo foi nos esclarecido que não existia um profissional a se formar com o título de “cientista de informação”. E como nosso compro- 52 misso social foi o de, antes de qualquer coisa, formar profissionais aptos a ingressar no mercado de trabalho em pé de igualdade de outros profissionais semelhantes, não arriscamos apostando nessa nova denominação do profissional de informação. Sentíamo-nos seguros dessa decisão, pois a própria constituição do minúsculo corpo docente nos primórdios do curso já tinha uma “cara” muito multidisciplinar e representativa das vertentes da área de ciência da informação nas respectivas formações acadêmicas de cada docente. Também sentíamo-nos seguros pelo fato de que íamos imprimir o marco da ciência da informação no conteúdo do curso, sempre respeitando neste, o lugar primordial e legítimo do conteúdo de Biblioteconomia. Nestes primeiros anos do curso de BCI, éramos justamente isso: um curso de BCI, cuja “casa” era o Núcleo de Biblioteconomia e Ciência da Informação – o NBCI – dentro do Departamento de Letras (DL) do Centro de Educação e Ciências Humanas (CECH). Mas éramos, sem dúvida, invisíveis, um corpo estranho naquele departamento bem mais consolidado. A infraestrutura era composta dos gabinetes compartilhados dos docentes (no mínimo, 2 docentes por sala) numa parte de um corredor do atual Departamento de Psicologia e uma salinha donde trabalhava arduamente nossa secretaria da época, a TA Simoni Aparecida Perrucino Campos (atual secretaria do curso de Linguística), e um LIG – Laboratório de Informática de Graduação, além, claro, das salas de aulas nos AT1 e AT2. Também usamos com frequência, para aulas, um laboratório de informática no prédio da SIn, “lá em cima” na área norte, fato nada trivial quando lembramos que éramos (junto com a Educação Física e Imagem e Som) os primeiros cursos noturnos da UFSCar. Naquela época, a infraestrutura básica no campus não era configurada para atender alunos de cursos noturnos, então uma simples “subida no morro” até a SIn parecia mais como uma expedição de coragem e valentia na escuridão da escada ao lado do RU! Simplesmente não havia luz no campus, fato duro que levou aos estudantes dos cursos noturnos a organizar várias marchas de protesto à luz de vela para o prédio da Reitoria com as suas reivindicações, que na verdade, representavam as reivindicações de todos nós trabalhadores noturnos no campus. Depois de alguns semestres, a lanchonete na área sul começou a ficar aberta à noite (sim, inacreditável, mas no inicio, não abria) e surgiram os postos Xerox que também estenderam seu horário de funcionamento. Mesmo assim, temia-se quando chegava a sua vez para ministrar aula sextas à noite: a área sul parecia um verdadeiro deserto, salvo os gatos e cachorros como o famoso “Podrão”. Cabe lembrar que não existia, naquela época, o exército 53 de trabalhadores terceirizados que hoje fazem parte íntegra da paisagem da UFSCar noturna, até altas horas: seguranças, faxineiros, jardineiros – todos eram funcionários públicos, concursados. Mas essa configuração da força de trabalho do campus foi se mudando alarmantemente rápido durante o governo FHC e o então ministro de Educação, o falecido Sr. Paulo Renato. Agarrando oportunidades boas enquanto existiam, perdemos um docente, o Prof. Márcio, que alguns meses depois de assumir o cargo de docente dedicação exclusiva em nosso curso, recebeu uma oferta boa para fazer seu doutorado em computação na Escócia. Naquela época, também não existia a possibilidade de conseguir um afastamento integral para cursar o Doutorado, mesmo sendo a titulação um sine qua non para se progredir e se manter na carreira docente. Então, eram opções binárias: capacitação na pós-graduação ou docência, e Márcio (que hoje é docente do DC da UFSCar) fez a coisa certa e optou pelo doutorado, temporariamente abrindo mão da carreira na docência universitária. Com um corpo docente tão diminuto, e com todo ainda a ser construído, nem foi nos colocada a possibilidade de ter um afastamento, mesmo parcial, para nos capacitarmos. Logo no início de 1995, ingressaram mais docentes em nosso NBCI: a Luzia Sigoli Fernandes Costa, Nádea Regina Gaspar e Sérgio Luiz da Silva, dando-nos um pouco mais de “folga” em termos da divisão do cargo didático e administrativo. Todos nos éramos “apenas” mestres – professores “Assistentes”, portanto – mas todos evidentemente tinham seus respectivos planos para ingressar num programa de doutorado. Mas primeiro, era necessário embarcar no caminho de aprender a ser docente num curso noturno em tempos de greves, cortes e com uma crescente dependência dos professores substitutos. O fato de sermos um corpo docente diminutivo (de 7) suscitou o impacto imediato de termos que aceitar ministrar disciplinas não estritamente dentro do alçar da área para as quais tínhamos sido contratados. Mas no espírito da interdisciplinaridade da área, de querer aprender sobre a área mesma, e principalmente, em prol de nossa responsabilidade diante das turmas de estudantes, que muitos dos quais sacrificavam muito para chegar à faculdade no fim de um dia de serviço nos seus respectivos empregos, assumimos disciplinas francamente, nas primeiras vezes de ministrá-las, fora de nossa zona de conforto. Eu tinha prestado o concurso para a área “Informação Tecnológica e Industrial”, e então, ao longo dos anos, ministrei disciplinas obrigatórias à área como “História da Ciência e Tecnologia”, “Políticas de Informação 54 Científica e Tecnológica” e “Transferência da Tecnologia”, além de outras como “Os fundamentos de lógica para BCI” e “Indexação e Resumos”. Criei e ministrei disciplinas optativas, uma que tinha muito a ver com minha pesquisa de doutorado, “Informação para o desenvolvimento sustentável”, e outras sendo “um rol” de disciplinas para o ensino da língua inglesa para nossas turmas de alunos. Para nós mestres o grande desafio, além de ter que estudar intensivamente para preparar aulas, era o de conciliar o tempo como docente (e cargos administrativos assumidos, ou projetos de extensão em andamento) com uma “volta à sala de aula” como “aluno” de pós-graduação. A titulação como doutor era ponto compulsório, mas o desafio era de encontrar um Programa de Pós-graduação “pertinho” de São Carlos para poder manter em pé as atividades na UFSCar enquanto se estudava e pesquisava para o título. Na minha época, nem recebíamos bolsa de “ajuda de custo” para se deslocar de São Carlos (fiz meu doutorado na UNICAMP): este tipo de bolsa tinha sido cortado pelo governo FHC no ano em que ingressei no doutorado, então eram necessários investimentos pessoais de tempo, energia e dinheiro. Recebíamos dias de afastamento por semana para participar de aulas de pós, e só. Acho que não seja coincidência que não me lembro de quase nada daquela época da minha vida: quatro anos em que pegava a estrada para Campinas, durante dois desses anos participando de aula como aluna de dia, e dirigindo de volta para São Carlos para dar aula na UFSCar à noite! Não me ajudou o fato de também estar grávida de meu segundo filho. Por um tempo, naquela época, também fui Coordenadora de Curso (pela segunda vez), e me lembro nitidamente de argumentar com o SRH da UFSCar que certamente eu não poderia estar parcialmente afastada e ser Coordenadora de curso ao mesmo tempo. Mas a resposta que vinha do SRH da UFSCar sempre era “pode, sim”. Acho que é por isso que somente recordo daquela época como a mais estressante e cansativa da minha vida! Mas com o apoio moral e substantivo (na forma de me representar em reuniões, dar minhas aulas entre outras atividades) dos meus colegas do DCI, consegui me titular em Política Científica e Tecnológica da UNICAMP no final de 2001. Logo após isto, assumi a Chefia do Departamento de Ciência da Informação, uma experiência que, confesso, me ajudou descobrir, no dia-a-dia, como não sou uma pessoa feita para a Administração! Por isso, nem entrarei nos pormenores daquela época. Basta dizer que as crises “macros”, nacionais, têm um impacto direto no cotidiano de nós professores: a impossibilidade de contratar pessoal técnico-adminis- 55 trativo significou que passei meu tempo como chefe departamental sem uma secretaria, que fez a experiência traumática. Naquela época, a questão acerca de como podemos, todos nós, contribuir à melhoria do meio ambiente e à instauração de práticas sustentáveis, permeava meus interesses (pessoais e profissionais), e então eu procurava relacioná-los às minhas atividades de pesquisa, de ensino e extensão. Meu ponto de partida foi que, tanto para termos consciência dos problemas ambientais quanto para tomar decisões acerca de como melhor trabalhar na direção de solucioná-los, é preciso munir-se da informação certa. E “munir-se” da informação passava pelas questões de saber onde encontrá-la, acessá-la, e recuperá-la, entendendo como ela se encontra organizada. Ter em mãos a informação “certa” passava pelas competências de sua avaliação, organização pós-recuperação, análise e reapresentação em formatos pertinentes à situação. Me interessavam tanto a questão de como políticos podem melhor tirar proveito do conhecimento (organizado em informação formal) especializado gerado nas universidades, quanto como os membros do público em geral se apropriam da informação técnica e científica para poder participar democraticamente dos processos de tomada de decisão política, temática esta que se enquadra na grande área de “compreensão pública da ciência e tecnologia”. Nesse sentido, estou convencida que o profissional de informação que formamos na UFSCar deve ter também uma postura ética e comprometida socialmente para poder agir como intermediário entre os grandes estoques de informação existentes, sejam estes físicos ou digitais, e as comunidades de usuários (oriundos de todos os grupos sociais e profissões) que potencialmente possam se beneficiar do acesso e uso deles. Nas disciplinas que ministrei e ministro até hoje, sinto que tenho contribuído a esta dimensão da formação de nossos estudantes do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Um projeto de extensão que coordenei durante alguns anos (entre 2002 e 2006), e que particularmente me ajudou a encontrar um ponto de intersecção desses valores foi um realizado na antiga “Casa Aberta” na Rua Padre Teixeira. Entramos com uma proposta mais “clássica” de estabelecer uma biblioteca lá, o que realizamos com duas bolsistas do curso de BCI, durante 2 anos: um projeto intitulado “Organização do Acervo e das Atividades da Biblioteca da Casa Aberta”. Depois dessas primeiras execuções, continuamos por lá, realizando atividades de leitura e de despertar interesse em ações culturais no geral com o projeto extensão “(In)formação e cultura para adolescentes em situação de risco” sendo que nesta segunda etapa, contamos 56 com o engajamento valiosíssimo e muito dinâmico de uma bolsista do curso BCI, e outro do curso de Educação Física. Nosso envolvimento no dia-a-dia na Casa Aberta (e procuramos ir lá todos os dias da semana) despertou em mim uma admiração enorme pela profissão de Assistente Social. Percebi que queria manter o vínculo com o lugar em outros projetos, então, quando surgiu a possibilidade de com um grupo da APASC (a Associação de Proteção Ambiental de São Carlos – a primeira ONG ambiental do Brasil) montarmos uma horta orgânica, realizá-la na Casa Aberta pareceu ser uma opção natural, até porque o local dispunha de um amplo espaço verde. Conseguimos... mas isto é outra história! Mas o que sinaliza é como o trabalho na UFSCar suscita oportunidades para se engajar em projetos além “dos muros” da academia, para se fazer novas parcerias e amizades, e, o mais importante de tudo, ter contato direto com realidades que fazem parte íntegra da sociedade brasileira. Meu envolvimento nesses projetos consolidou meu apoio resoluto para a então incipiente proposta das Ações Afirmativas para a UFSCar. Um comentário casual de um dos adolescentes da Casa Aberta, ao planejarmos uma visita para o campus da UFSCar, “Dona, mas não podemos entrar lá (UFSCar); não é para gente como nois”, me confirmou como temos que trabalhar continuamente para “explicitar” o direito que todos têm de ter acesso à educação superior, pública, gratuita e de qualidade. Como nossa memória hoje fica muito atrelada aos, e dependente dos, dispositivos e recursos digitais! Ao escrever estes fragmentos de memória, às vezes queria consultar registros que não existem, pois, por incrível que pareça para a geração atual de docentes, o currículo Lattes não existia quando ingressei na carreira, e quando foi lançado em 1999, a noção de que o Lattes era o equivalente do seu “RG acadêmico” demorou para arraigar-se. Ou seja, naquela época e durante alguns anos, era possível criar seu Lattes e não colocar absolutamente nenhuma informação sobre cargos administrativos ocupados, TCCs orientados, disciplinas ministradas, projetos de extensão realizados. A noção da “obrigatoriedade” de estar sempre atualizando “seu Lattes” (!), como um ato de responsabilidade à coletividade institucional (principalmente para as avaliações pelos órgãos externos), ainda era distante. Outro sistema que dá para consultar para encontrar nossas “pegadas históricas”, nesta instituição é a Proexweb – mas tenho a impressão que este sistema também veio a existir somente vários anos depois do meu ingresso na UFSCar. Algo que descobri, mas não em nenhum sistema digital, mas “fuçando” nos meus arquivos físicos, é que, em 2003, foi criada uma Comissão 57 de Criação do Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação, presidiada pela colega Wanda Machado Hoffmann, e vários de nós designados participantes. Sempre almejávamos criar tal Programa, mas naquela época, nossa vontade não vingou, devido ao fato, sempre reocorrente para nós, que não éramos suficientes em número de doutores da área de Ciência da Informação. No meio tempo, então, atuamos para criar e consolidar, com colegas de várias partes da UFSCar, o Programa de pós-graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade, que hoje já formou 190 mestres e 30 doutores. Quase como se fosse um “presente” por ter contribuído substancialmente à história desse outro Programa (CTS), finalmente foi criado, no ano de 2016, nosso Programa de pós-graduação em Ciência da Informação, do qual sinto imenso orgulho de fazer parte! Post scriptum Certamente, minha convicção sobre a relevância das Ações Afirmativas surgiu antes da minha chegada ao Brasil, mas foi se consolidando desde o início da carreira na UFSCar, pois dar aula em curso noturno às vezes equivale-se a testemunhar a mobilidade social “em ação”: desde o início do curso em 1994, já entramos em contato com alguns estudantes oriundos de situações socioeconômicas precárias. Não há nada melhor de que ver estes alunos passando pela Universidade, mudando, amadurecendo, se empregando, estudando mais na pós-graduação, até se tornando professores universitários, em vários casos. Hoje, tenho colegas de outras federais que eram alunos meus, e isto é muitíssimo gratificante! Uma orientanda minha de iniciação científica, que recebeu bolsa IC FAPESP, hoje é professora e pesquisadora na América do Norte, e me lembro dela me contando, no dia em que ela se formou, dos sacrifícios que ela passava somente para poder chegar a São Carlos para estudar. Quando penso em todos os alunos da BCI – do passado e do presente – posso afirmar, sem sentimentalismo, que são eles que fizeram e fazem minha história aqui na UFSCar. 58 Foto: Waldeck Schutzer FRAGMENTOS DE HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DE UMA TRAJETÓRIA NO CAMPO DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO MARIA CRISTINA PIUMBATO INNOCENTINI HAYASHI* A guisa de introdução A celebração de um convênio, em 1993, entre a UFSCar e a Fundação Educacional São Carlos para incorporação do curso de Biblioteconomia e Documentação existente naquela instituição constitui o marco institucional das origens do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) da UFSCar. Após a realização de estudos por uma Comissão de Criação e Implantação – composta por docentes das áreas de Letras, Ciências Sociais e Metodologia do Ensino e designada pelo Centro de Educação e Ciências Humanas (CECH) – em julho de 1994 o Conselho Universitário da UFSCar aprovou a criação e implantação do curso de BCI na UFSCar. Desde então já se vão vinte e seis anos, e na esteira dessa efeméride cabem algumas reflexões sobre as atividades desenvolvidas como docente do curso. Por limitações de espaço, é praticamente impossível relatar aqui desde os desafios iniciais que enfrentamos até as atuações mais recentes1. Assim, denominei esse relato de “fragmentos” buscando na memória elementos que permitissem recuperar o fio da 1 Esse texto é um recorte do memorial apresentado em novembro de 2015 para a banca examinadora do concurso de Professora Titular do Departamento de Ciência da Informação da UFSCar. * Doutora e Mestre em Educação (UFSCar) e Bacharel em Ciências Sociais (UNESP). Docente do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 1994. Contato: dmch@ufscar.br. 60 história de minha inserção e atuação no curso de BCI na UFSCar. Procurei também dar ênfase às atividades de pesquisa que desenvolvi, não só por entender que sem ela o ensino e a extensão perdem sentido em termos de qualidade, mas principalmente porque se constitui no fio condutor de minha trajetória acadêmica na UFSCar2. As palavras do mestre Paulo Freire traduzem essa caminhada: “Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino, continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade” (FREIRE, 1996, p. 16). Os anos iniciais do curso de BCI da UFSCar As atividades do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação começaram em 1994 com o ingresso da primeira turma de alunos. Inicialmente atuavam como professores três docentes da UFSCar das áreas de Letras (Helena Rosa Vieira Lima), Ciências Sociais (Marly de Almeida Gomes Vianna) e Educação (Álvaro Rizzoli). Os concursos para contratação de novos docentes aconteceram em abril daquele ano. Obtive o primeiro lugar da vaga docente para atuação na ênfase de Informação Social e junto com Elizabeth Márcia Martucci, que concorreu para a vaga da área de Disseminação da Informação, fomos as primeiras a serem contratadas. A posse oficial aconteceu em 1º. de junho de 1994, e logo em seguida já estava em sala de aula para assumir a disciplina “História da Cultura e dos Registros do Conhecimento”, até então ministrada pela Profa. Dra. Marly de Almeida Gomes Vianna. Entre 1994 e 2004 ministrei várias disciplinas no curso de BCI, entre elas “História da Ciência e da Tecnologia”; “Políticas de Informação Social”; “Informação e Movimentos Sociais”; “Informação para Educação”; “Informação, Arquivo e Memória”; “Sociedade do Conhecimento”, além de ofertas semestrais de “Trabalho de Conclusão de Curso” e “Estágio em Centros de Informação”. Com a reformulação da grade curricular do curso, em 2004, a ênfase “Informação Social” passou a se chamar “Discurso e Leitura, Ciência e Socie2 É válido mencionar que estou vinculada à UFSCar desde maio de 1980, pois além de cursar o mestrado e doutorado nessa instituição, até 1994 exerci o cargo de socióloga. 61 dade”, e desde então fui responsável pelo oferecimento das duas novas disciplinas que propus: “Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia” e “Conhecimento Científico e Produção Científica”, ofertas que se mantiveram até hoje, mesmo que na última reforma curricular de 2011 a nomenclatura da ênfase tivesse sido novamente alterada para “Informação, Ciência e Sociedade”. Nas discussões que ocorreram entre 2005 e 2007 essas duas disciplinas serviram de embrião para a proposição do Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade (PPGCTS/UFSCar), e em particular da linha de pesquisa “Dimensões Sociais da Ciência e da Tecnologia”. Entre março de 1995 e outubro de 1996 exerci a vice-coordenação do curso de BCI. Naquela época, ainda não existia o Departamento de Ciência da Informação (DCI), mas sim um “Núcleo de BCI” vinculado ao Departamento de Letras, que funcionava como um Departamento – este só veio a ser criado no final de 1996. A primeira turma do curso, composta por 38 alunos, ingressou em 1994. Como a grade curricular previa a realização de trabalho de conclusão de curso, iniciei as orientações de graduação com duas monografias: a de Alexandre Masson Maroldi (atualmente docente da Universidade Federal de Rondônia, e que cursou o doutorado sob minha orientação no PPGE/UFSCar) sobre políticas culturais e internet; e a de Alessandra Veronese (bibliotecária da Unidade Especial de Informação e Memória – UEIM/UFSCar), sobre o papel do bibliotecário como agente cultural. Além desses também orientei outros trabalhos com temáticas muito variadas, ainda que de certo modo estabelecessem um elo em comum com as pesquisas que realizava nos campos da memória histórica: memória arquitetônica; memória ferroviária; memória do movimento negro; memória teatral de São Carlos; memória empresarial; memória científica e tecnológica; arquivos pessoais; acervos fotográficos e museológicos; arquivos médicos; arquivos de movimentos sindicais; patrimônio histórico e arquitetônico de São Carlos, Araraquara, e Franca; praças e monumentos públicos; cartões postais; álbuns fotográficos de família; história religiosa (santinhos e igrejas); história oral; terceiro setor; xiloteca (coleção de madeiras selecionadas); medicina popular; ação cultural; políticas culturais. A partir de 1995, com a segunda turma de ingressantes no curso de BCI, também iniciei as primeiras orientações de iniciação científica, com bolsas da FAPESP e CNPq. De certa forma esses trabalhos eram resultados de pesquisas que eu já desenvolvia no acervo do Arquivo de História Contemporânea (AHC) da UFSCar, e posteriormente no Arquivo Ana Lagôa, que foi criado em 1996. Essa foi 62 uma ótima oportunidade para que eu pudesse desenvolver pesquisas sobre a ditadura militar no Brasil, propiciando também a orientação de alunos. Dentre essas orientações, destaco a de Márcia Regina da Silva – atualmente docente do Departamento de Educação, Informação e Comunicação da Faculdade de Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – sobre fontes de informação sobre o período militar no Brasil; e a de Maria Regina da Silva Milani – atualmente gerente administrativa do Sindicato dos Docentes em Instituições Federais de Ensino Superior dos Municípios de São Carlos, Araras e Sorocaba – ADUFSCar Sindicato – sobre a história do movimento sindical. sindical.docente na UFSCar. Posteriormente, essas pesquisas resultaram em capítulos do livro organizado por Zélia Lopes da Silva, Arquivos, patrimônio e memória: trajetórias e perspectivas, e publicado pela Editora da UNESP. Notei, portanto, que envolver os alunos de graduação do curso de BCI na organização de acervos históricos propiciava uma oportunidade ímpar para unirem teoria e prática e daí extraírem temas de interesse para elaboração de suas monografias de final de curso. Além disso, também ofereci na graduação as disciplinas optativas “Informação, Arquivo e Memória” e “Informação e Comunicação na Gestão de Arquivos e Documentação”, que proporcionavam uma fundamentação teórica básica sobre os princípios que regem a organização de acervos arquivísticos. Essa iniciativa também se constituiu em uma oportunidade para ampliar a formação dos alunos para além da visão instrumental de tratamento biblioteconômico, adentrando, portanto, nos campos da Arquivologia e da Museologia, que não estavam representados em disciplinas da grade curricular do curso. A seguir dou continuidade à narrativa das pesquisas desenvolvidas no âmbito do curso de BCI da UFSCar e busco enfatizar como a interdisciplinaridade, inerente ao campo da Ciência da Informação, permite um diálogo fértil e enriquecedor com outras áreas de conhecimento. Fertilizações cruzadas entre a Ciência da Informação e outros campos de conhecimento A partir de 2000, juntamente com Carlos Roberto Massao Hayashi, também docente do DCI, estabelecemos uma profícua parceria com nossos colegas do Departamento de Educação, Amarilio Ferreira Júnior e Marisa Bittar, no âmbito da pesquisa “Produção Científica em Educação Jesuítica no Brasil 63 Colonial” que produziu um estado da arte sobre a educação jesuítica a partir do mapeamento, identificação, organização e sistematização das fontes de informação sobre a temática existentes no país e no exterior, e também para dar visibilidade ao acervo que ambos haviam reunido sobre o tema no curso de suas pesquisas. Assim, passamos a orientar alunos de graduação e pós-graduação que nos procuravam para desenvolver pesquisas sobre a temática da educação jesuítica. Os resultados dessas atividades estão consolidados em uma significativa produção científica composta por artigos e capítulos de livros, e trabalhos em eventos nacionais e internacionais. Cabe ressaltar que a metodologia adotada nessas pesquisas foi a análise bibliométrica. Contudo, o meu interesse e atuação no campo da Bibliometria é anterior a essa época e situa-se no horizonte temporal de 1997 coincidindo com o desempenho de minhas atividades administrativas como Coordenadora de Pesquisa da Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa da UFSCar, quando realizei com o apoio da FAPESP a pesquisa “Construção de indicadores de ciência e tecnologia para a gestão da informação científica e tecnológica na UFSCar”. Busquei no campo dos Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia3 a fundamentação teórica para compreender os indicadores de C&T como elementos constitutivos da política científica e tecnológica de uma instituição investigando as gerações da Bibliometria e da Cientometria, e de como se deu o processo de produção de indicadores científicos na América Latina e no Brasil. A metodologia de construção de indicadores de C&T foi desenvolvida mediante a adoção do modelo teórico da Cientometria e da apreensão de conceitos sobre ciência e tecnologia plasmados nos indicadores de insumo – os recursos financeiros para C&T e a formação de recursos humanos na pós-graduação e pesquisa – e indicadores de resultados, isto é, a produção científica e técnica vinculada à pós-graduação e aos grupos de pesquisa. Nessa época, também orientei o primeiro trabalho de conclusão do curso de BCI sobre bibliometria e cientometria, que foi realizado por Marta Aparecida da Silva. 3 Como campo de conhecimento interdisciplinar os Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia podem ser caracterizados como a fusão de duas correntes acadêmicas que emergiram na segunda metade do século XX: uma, que se dedica a analisar “a natureza e as práticas da ciência e da tecnologia, enquanto instituições sociais que possuem distintos compromissos normativos, estruturas práticas e discursos que variam ao longo do tempo e de acordo com os diferentes contextos culturais; e a outra que se preocupa com os impactos e o controle da ciência e da tecnologia, com foco nos riscos que essas representam para a sociedade” (JASANOFF, 2010, p. 192). Na atualidade as pesquisas nesse campo englobam estudos qualitativos da ciência, tecnologia e inovação – com abordagens voltadas para as análises das dimensões sociais do conteúdo da ciência – e quantitativos, frequentemente associados aos estudos cientométricos, sendo que os pesquisadores das duas vertentes operam de forma isolada uns dos outros, não obstante as exceções (HAYASHI, 2014). 64 Desde então tenho orientado alunos em pesquisas de graduação e pós-graduação que utilizam as abordagens bibliométricas e cientométricas, além de oferecer disciplinas com essa temática na UFSCar, tais como: Bibliometria, Cientometria e Epistemologia ofertada no PPGCTS/UFSCar e concomitantemente ao PPGE/Unicamp, que enfocou os pressupostos teóricos e metodológicos dessas abordagens articulados com os aspectos epistemológicos da ciência; e, Métricas sobre gênero na ciência e tecnologia, que aborda os indicadores de gênero em CT&I oferecida no curso de BCI/UFSCar. Formação de pesquisadores e produção de conhecimento Ao refletir sobre a pesquisa enquanto produção de conhecimento e eixo transversal de uma proposta político-epistemológica, Paulo Freire não só expressa a preocupação com a prática da pesquisa por parte de quem educa, mas deixa claro que não há aprendizagem sem pesquisa. Como já referi anteriormente, na minha trajetória acadêmica a pesquisa sempre foi a atividade principal. E a pós-graduação, no meu entendimento, é o lugar por excelência para essas práticas de pesquisa. No entanto, nos final dos anos 1990, o Departamento de Ciência da Informação ainda era relativamente novo, e como a maioria do seu corpo docente ainda estava em processo de capacitação para obtenção de seus títulos de doutorado, a proposição de um programa de pós-graduação nessa área era um projeto a ser cultivado, o que só se concretizou recentemente, em 2015 com a aprovação do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PPGCI). Assim, a partir de 2000 inicio a atuação no Programa de Pós-Graduação em Educação Especial (PPGEEs), em 2007, no Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE), em 2008, no Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade (PPGCTS), e em 2009 no Programa de Pós-Graduação em Terapia Ocupacional (PPGTO) todos da UFSCar. No PPGEEs e no PPGCTS exerci por dois mandatos a função de vice-coordenadora e posteriormente, de coordenadora. A oportunidade de participar da gestão acadêmica e administrativa de programas de pós-graduação ampliou a minha visão sobre o seu funcionamento, e foi fundamental para que, em outras oportunidades também pudesse colaborar com a proposição e implantação de outros programas de pós-graduação na UFSCar. Desde então, as pesquisas que desenvolvo têm 65 como foco comum a adoção da abordagem bibliométrica para analisar a produção científica nesses e em outros campos de conhecimento de interface, tais como a Ciência da Informação, a Sociologia da Ciência, a Educação e a Saúde. Desde então já conclui 122 orientações, sendo 52 monografias de conclusão de curso de graduação, uma de curso de especialização, 26 de iniciação científica, 15 de mestrado, 18 de doutorado e 10 supervisões de pós-doutorado. Além disso, desde 2010 desenvolvo a pesquisa Fertilizações cruzadas entre a Sociologia da Ciência, a Bibliometria e a Cientometria com o objetivo de refletir teoricamente sobre esses campos de conhecimento buscando compreender e sistematizar as interfaces que se configuram na análise da produção científica. A pesquisa também estabelece relações com os aspectos epistemológicos envolvidos na produção do conhecimento científico e busca em autores clássicos do campo da Sociologia da Ciência, da Ciência da Informação e dos Estudos Sociais da Ciência – entre outros, Robert Merton, Derek Solla Price, Pierre Bourdieu, John Ziman, Richard Whitley, Paul Wouters, Blaise Cronin – elementos para compreender como a dinâmica interna da comunidade científica pode ser afetada por fatores históricos e sociais internos e externos à ciência. Participam desse projeto Camila Carneiro Dias Rigolin e Carlos Roberto Massao Hayashi, ambos docentes do DCI/UFSCar e do PPGCTS/UFSCar, além de Maria Teresa Miceli Kerbauy (FCLAr/UNESP) e Márcia Regina da Silva (FFCL/USP-Ribeirão Preto). A rica interlocução com esses colegas tem propiciado o fortalecimento das pesquisas que realizamos no Laboratório de Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia (LESCT) sediado no Departamento de Ciência da Informação da UFSCar. As inquietações intelectuais que atualmente motivam a realização de minhas pesquisas nos campos da Ciência da Informação e da Sociologia da Ciência são os agradecimentos em trabalhos científicos. Compreendido como um ato voluntário em que um autor reconhece a contribuição de outro ao seu próprio trabalho, o agradecimento remete a uma rede de relações sociais e cognitivas, e sua compreensão pode revelar as práticas de colaboração e influência nas comunidades científicas. Com base nesses pressupostos tenho desenvolvido pesquisas com esse enfoque, individuais e em colaboração com outros pesquisadores, todas contando com o apoio de agências de fomento à pesquisa, como CNPq, FAPESP e CAPES, bem como tenho orientado alunos de graduação e pós-graduação e supervisionado pesquisas de pós-doutorado que buscam investigar esses aspectos da comunicação da ciência. Entre elas, destaco a seguir as mais recentes. 66 A dinâmica da colaboração científica: um estudo dos agradecimentos presentes em dissertações e teses. (CNPq/CAPES – 2011-2013) – Ancorada teoricamente nos campos de estudos da Ciência da Informação e dos Estudos Sociais da Ciência essa pesquisa buscou respostas para as seguintes questões: qual é a função social e o significado cognitivo dos agradecimentos formulados em teses e dissertações acadêmicas? Qual é o padrão dos agradecimentos presente nas teses e dissertações de diferentes áreas de conhecimento? Influmetria: a prática e o papel dos agradecimentos na dinâmica da comunicação científica (CNPq/Bolsa de Produtividade em Pesquisa – 2012-2015). Nessa pesquisa as práticas e o papel dos agradecimentos na dinâmica da comunicação científica foram investigados tendo com questões norteadoras: qual é o padrão dos agradecimentos presente nos artigos publicados em periódicos científicos de diferentes áreas de conhecimento? Quais são as visões de pesquisadores a respeito dos motivos que os levam a incluir ou não agradecimentos em artigos científicos? Há uma conexão entre o número de autores e o número de agradecimentos realizados nos artigos científicos? O triângulo de recompensa nos campos da Ciência da Informação e dos Estudos Feministas e de Gênero – (CNPq/Bolsa de Produtividade em Pesquisa – 2012-2018). O tema da pesquisa são os agradecimentos presentes no processo de comunicação científica, porém com um recorte de gênero, no contexto de dois campos de conhecimento: a Ciência da Informação e os Estudos Feministas e de Gênero. A seguinte questão norteia o estudo: o constructo teórico do “triângulo de recompensa” da ciência – agradecimentos, autorias e citações – pode revelar débitos intelectuais, alianças entre pares, genealogias, influências e estratégias de posicionamento e pertencimento no interior desses campos de conhecimento? A hipótese norteadora é a de que os agradecimentos permitem compreender as relações sociais, as estruturas de poder, os códigos simbólicos, as regras e convenções que operam no processo de comunicação científica. Perspectivas de gênero no campo da bibliometria no Brasil (CNPQ – 20152017) – Nos campos da Sociologia da Ciência e da Ciência da Informação a relação da autoria científica com a questão de gênero na ciência é um tema de interface. Contudo, na perspectiva dos estudos bibliométricos brasileiros essa questão não tem sido suficientemente examinada, o que motivou a realização de uma investigação que pretende responder à seguinte questão: como se configura a relação entre gênero e autoria nos estudos bibliométricos realizados no Brasil? Evidências bibliométricas do reconhecimento científico no campo dos estudos feminista e de gênero em resenhas, entrevistas e obituários acadê- 67 micos – (CNPq/Bolsa de Produtividade em Pesquisa – 2018-atual). Esse estudo busca por novos temas e objetos de estudo no âmbito dos estudos métricos da informação, como forma de contribuir para o alargamento do conhecimento nesse campo científico, dirigindo o foco de sua atenção para a análise de outros tipos documentais, tais como as resenhas de livros, as entrevistas e obituários presentes nos periódicos científicos, com o objetivo de analisar as evidências bibliométricas do reconhecimento científico em textos acadêmicos dos estudos feministas e de gênero. Antes de encerrar esse tópico penso ser relevante mencionar duas atividades de extensão originadas das redes de colaboração científica que construí no campo da Ciência da Informação e da Sociologia da Ciência, ou seja, a organização de dois eventos científicos de abrangência nacional realizados na UFSCar: o 2º Encontro Brasileiro de Bibliometria e Cientometria (2º. EBBC – 2010) e o 1º Seminário Brasileiro de Ciência, Tecnologia e Sociedade (1º. SBCTS – 2011). Entre outros aspectos, o 2º. EBBC permitiu observar, que a área da Bibliometria e Cientometria no Brasil é composta por uma pequena, mas atuante comunidade científica multidisciplinar, enquanto que a realização do 1º. SBCTS ampliou os espaços para diálogo e troca de experiências entre diferentes áreas do conhecimento e instituições que se dedicam aos temas dos Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia. Como resultados desses dois eventos foram publicados quatro livros, sendo três deles sobre Bibliometria, e outro sobre os fundamentos teóricos da Sociologia da Ciência, os quais contribuem para o alargamento da interface entre os Estudos Sociais da Ciência e a Ciência da Informação, conforme aparecem listados nas referências ao final desse texto. Por último, mas não menos importante, as pesquisas que desenvolvi ao longo desses anos resultaram em inúmeras publicações, a maioria das quais em periódicos científicos nacionais e internacionais, livros e capítulos de livros, a maioria delas em colaboração, comprovando que o verso do poeta John Done, além de permanecer atual, também é válido no ambiente acadêmico: no man is an island, entire of itself; every man is a piece of the continent, a part of the main. Ensaiando uma conclusão Ao longo desse texto procurei mostrar como a atuação interdisciplinar no campo da Ciência da Informação pode propiciar um fértil e estimulante 68 diálogo com outras áreas de conhecimento, entre elas a Sociologia da Ciência, a Educação e a Saúde. Com base nessa visão, minha atuação no curso de BCI da UFSCar ao longo dos 26 anos de sua existência propiciou a descoberta de novos temas e objetos de pesquisa, e o diálogo com teorias e metodologias antes não experimentadas. Aliado a isso, a minha formação no campo das Ciências Sociais me forneceu uma base sólida para construir um eixo temático de pesquisas no campo da Ciência da Informação, ancorado na Bibliometria e na Sociologia da Ciência que visam à compreensão e análise da produção científica, bem como sobre o processo de construção do conhecimento científico. O que desejar para o futuro do curso de BCI, para os que por aqui ainda passarão? Que venham muitos e melhores anos para o ensino, a pesquisa e a extensão no campo da Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar. Como diz o poeta, músico e compositor Bob Dylan, prêmio Nobel de Literatura de 2016, the times, they are a-changin’. Referências BARTHES, R. Image-music-text trans: essays select and translated by Stephen Heath. London: Fontana Press, 1977. DONE, J. Meditations XVII. In: DONE, J. Devotions upon emergent occasions. [S. l.], 1623. Disponível em: http://www.online-literature.com/donne/409/. Acesso em: 20 out. 2016. DYLAN, B. 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São Carlos: Pedro & João Editores, 2013. HAYASHI, M. C. P. I.; RIGOLIN, M. C. P. I.; KERBAUY, M. T. M. (org.). Sociologia da ciência: contribuições ao campo CTS. Campinas, SP: Alinea, 2014. JASANOFF, S. A field of its own: the emergence of science and technology studies. In: FRODEMAN, R.; THOMPSON, J. K.; MITCHAM. C. The Oxford Handbook of Interdisciplinarity. Oxford: Oxford University Press, 2010. p.190-205. LOBO, E.; CAPINAN, J. C. Ponteio. [S. l.], 1977. Disponível em: https://www.youtube. com/watch?v=NJ8T64nAAHg. Acesso em: 20 out. 2016. ROSA, J. G. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. 70 Foto: Waldeck Schutzer A GÊNESE E TRAJETÓRIA DO CURSO DE BCI NA UFSCar: HISTÓRIAS ENTRELAÇADAS LUZIA SIGOLI FERNANDES COSTA* Iniciei este relato histórico desde onde consegui o primeiro registro oficial e fui discorrendo e pontuando com tantos outros documentos e com os fragmentos da minha própria memória. Na dúvida, de como deveria a ser a forma discursiva deste texto, me decidi enveredar pelo caminho do “realismo fantástico” numa narrativa, às vezes real e por vezes imaginária, num vai e vem entre as fronteiras da ciência e da tradição, a exemplo do que o fizeram Louis Pauwels e Jacques Bergier para falar do século XIX, quando já viviam no século XX. O inspirador livro de Pauwels e Bergier (1960), publicado pela primeira vez na França em 1960, intitulado “O Despertar dos Mágicos” me foi apresentado por uma colega de turma do Curso de Biblioteconomia e Documentação, Maria Auxiliadora Andrade Echegaray (Cizinha), nos idos anos de 1970. Desse livro segui, também, o conselho de que para compreender o presente é necessário se projetar em direção ao passado e em direção ao futuro. Assim como eles, também acredito que é na própria realidade que a inteligência, por muito pouco exercitada que seja, descobre o fantástico como resultado da lembrança do vivido, não filtrado pelo intelecto, pelo preconceito ou conformismo. Desse modo, começo a contar a história do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde junho de 1975, quando o Prof. Dr. Sergio Mascarenhas Oliveira, como membro do Con- * Doutora em Ciência da Informação (UNESP), Mestre em Engenharia de Produção (UFSCar) e Bacharel em Biblioteconomia e Documentação (EBDSC). Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 1994. Contato: luziasigoli@gmail.com. 72 selho de Curadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), fez uma “Proposta de criação do Curso de Bacharel em Biblioteconomia e Ciências da Informação”, na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Esta proposta foi encaminhada pelo secretário daquele Conselho, Durval Augusto de Ulhôa Cintra, ao então Magnifico Reitor, Luiz Edmundo de Magalhaes e veio a se concretizar somente quase 20 anos depois. Aqui se revela o mito fundador, ou seja, aquilo que está no cerne da construção de algo. A origem do Curso de Biblioteconomia e Ciência da informação da UFSCar estabelece uma ligação “perpétua” com o presente – e com o futuro – dando-lhes forma e sentido. Cada história se desenvolve de forma particular e única. Sendo assim, os atores envolvidos ou responsáveis por iniciar uma nova história provavelmente constroem um mito fundador que lhe dará a forma de ser, diferente do que lhe é semelhante (CHAUÍ, 1995). A minha história de vida e profissional está entrelaçada pela história da Biblioteconomia em São Carlos em dois momentos. O primeiro foi quando cursei Biblioteconomia, na Escola de Biblioteconomia de São Carlos (EBDSC), da Fundação Educacional de São Carlos (FESC), e o segundo, quando ingressei como docente do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, na UFSCar. Sobre o primeiro momento, penso que tudo começou assim: quando ainda jovem e de uma origem socioeconômica que não me permitia ter grande expectativa de escolha profissional, fui incentivada – por uma grande amiga, uma das mais respeitadas poetisas de São Carlos, Cybelli Bizarro Wanderley – a cursar Biblioteconomia e Documentação1 na antiga Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos – EBDSC. Assim o fiz no período de 1977 a 7979. Convencida a perseguir e a ser perseguida pelos livros e por tantas outras formas de registro do conhecimento, não poderia imaginar o quanto estes me levariam à descoberta de mundos tão fantásticos. Estou falando da década de 1970, momento em que, se por um lado a crise do petróleo levou o Brasil, juntamente com outros países, a uma grande recessão, por outro surgiam novos movimentos musicais, crescia a defesa do meio ambiente, o feminismo e se consolidavam outras revoluções comportamentais, surgidas em décadas anteriores. Além disso, no Brasil, os movimentos estudantis se 1 Esse Curso deixou de receber novas turmas em 1994. Com a criação do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação na Universidade Federal de São Carlos houve vestibular para ingresso dos estudantes e concurso para a formação do corpo docente. 73 apresentavam como forma de resistência à Ditadura Militar, época compreendida entre os anos de 1964 a 1985, e que pude viver intensamente. Nesse cenário, crescia o meu interesse por temáticas e problemas afetos à complexidade que envolve os conflitos entre os desejos dos seres humanos e a adversidade, principalmente política, do espaço onde habitam. A participação em movimentos comunitários, na periferia de São Carlos, em prol da criação de praça pública num local onde o poder municipal impunha a sua vontade de expandir um cemitério me fazia perceber a força do coletivo. Com o distanciamento temporal, em direção ao passado, posso melhor compreender que aquele movimento tinha um significado político, social e ao mesmo tempo ecológico, pois, as ações de plantio de árvores, capazes de reunir homens, mulheres e crianças na calada da noite, apresentavam obviedades advindas do conhecimento de uma comunidade sobre a história local, pela memória dos moradores, o que legitimava a necessidade de apropriação dos espaços públicos. Isso fez com que, naquela comunidade, aflorassem sentimentos de pertencimento e apego a um local que os recrutavam para a luta por uma praça que até hoje não existe, oficialmente, mas lá – ao lado do Cemitério Santo Antônio de Pádua – estão algumas árvores frondosas como testemunhas de que o cemitério, também, não foi ampliado. Naquele momento, como ainda acontece, o tempo dos jovens filhos de operários se fragmentava entre trabalho, estudo, militância e outras lutas pela sobrevivência. Exatamente nessas circunstâncias, tive que encontrar motivação para a minha trajetória pessoal, acadêmica e profissional. Já era final da década de 1970, estava prestes a me formar em um curso que mudou a minha vida. Foram muitas as oportunidades ainda enquanto estudante, como a participação em Projeto Rondon, em 1978, me propiciando um mês de atuação e convivência em uma comunidade longínqua, Itapicuru, um dos municípios mais antigos do Estado da Bahia, criado em 16482. Depois disso veio o desafio de elaborar o Trabalho de Conclusão de Curso, o temido TCC. Empreitada que tive o privilégio de ter como orientadora a profa. Elisabeth Márcia Martucci, que se dispôs a me acompanhar na aventura de tentar mapear a localização e a problemática das comunidades indígenas no Brasil. Nesse momento, pude perceber que no Brasil a história de qualquer lugar deveria começar por descrever sobre aqueles que ali habitavam, antes da chegada 2 A Operação Zero do Projeto do Projeto Rondon foi realizada em julho de 1967 e se manteve até 1989. Em 1990 esse Programa foi interrompido e retomado a partir de 2005. 74 dos colonizadores. Em meio a isso tudo, percebia o quanto a luta pela “federalização” – como era chamada – do Curso de Biblioteconomia e Documentação germinava do desejo latente de professores e alunos da EBDSC, o que viria acontecer quase 15 anos depois. Em 1979 me formei Bibliotecária Documentalista. E agora, o que fazer? Naquele momento, a condição de ser a primeira a se formar em curso superior, entre tantos filhos e netos de meus avós, do lado italiano da família, não podia imaginar que por muito tempo também seria a única e quanta responsabilidade isso me traria. Pois, junto com a formatura se descortinavam possibilidades profissionais não imaginadas por alguém de quem era esperado que se tornasse mais uma operária da família. Assim, iniciei a minha carreira profissional, na área, na cidade de Goiânia, Estado de Goiás, no Instituto de Planejamento de Goiânia (IPLAN), atuando com informação estratégica para planejamento urbano, formação de acervo e geração de conteúdo de apoio à tomada de decisão, participando e coordenando projetos de cadastramento de áreas verdes, guia de logradouros, levantamento documental para a realização de pesquisa histórica, além da realização de estudos analíticos de possíveis impactos ambientais ou culturais, ocasionados por projetos de intervenção no município. Talvez, o mais abrangente desses projetos tenha sido o estudo dos impactos – percebidos pela população das proximidades – da proposta de construção do Terminal Rodoviário de Goiânia, inaugurado em 1987, tal como foi projetado pelo escritório de arquitetura goiano Grupo Quatro e pelo premiado arquiteto Paulo Mendes da Rocha. Nesse momento, pude perceber quão diversificada, ampla e complexa é a cadeia que vai da geração ao uso da informação, perpassada pelas dimensões humana, ética, política, econômica, social, dentre outras, fazendo-me sentir a importância de exercitar o aspecto multidisciplinar da profissão de Bibliotecária. Ainda estou falando do início dos anos de 1980, a chamada “década perdida” pelos economistas latino-americanos, diante da estagnação econômica e da inflação descontrolada e tantos outros fatores que levavam a grandes incertezas. Mesmo assim, como bibliotecária oportunidade de trabalho não me faltou. Além de atuar no serviço público municipal, fazia um terceiro turno numa Biblioteca Universitária de uma faculdade particular (Faculdade Anhanguera de Goiânia). A profícua experiência de Goiânia, no período de 1980 a 1984, me auxiliou na atuação em terras mais longínquas, em Porto Velho, na Secretaria de Planejamento do recém-criado Estado de Rondônia, que, em 1983, deixou 75 sua condição de Território. Durante esses anos, de 1984 a 1989, dedicados ao trabalho na Região Amazônica, muitos fatos aguçaram ainda mais as minhas antigas inquietações e novas questões emergiram. Atuei no registro da degradação de rios em consequência da utilização do mercúrio em atividades de garimpo. Ao contaminar a água e o solo, o mercúrio provocava a morte de peixes, um dos principais meios de sustento das populações ribeirinhas e dos próprios garimpeiros que atentavam, não só contra o meio ambiente, mas contra suas próprias vidas que, contraditoriamente, refutavam a informação e a lei em prol da promessa de enriquecimento rápido. Estes contextos empíricos me convenceram da importância e, ao mesmo tempo, da fragilidade do trabalho informativo, no que se refere à informação sobre o meio ambiente, que continuou me instigando3. Enquanto eu me construí como profissional em outros espaços, em São Carlos se produzia um manifesto, datado de 21 de maio de 1985, onde a comunidade da Fundação Educacional de São Carlos faz uma “Campanha pró-federalização da FESC” (encaminhado, oficialmente, à UFSCar em 16 de dezembro do mesmo ano), onde expõem a situação em que se encontrava a Fundação e clamava por melhores condições que se previa com a incorporação plena da Fundação Educacional de São Carlos pela Universidade Federal de São Carlos para melhoria das condições do ensino e da pesquisa. Essas manifestações, certamente, surtiram efeito anos depois. Em 6 de outubro de 1985, o presidente de uma comissão encarregada de estudar a incorporação das escolas de Biblioteconomia e de Educação Física, o Prof. Dr. Péricles Trevisan, em Oficio que encaminha relatório ao Reitor Munir Rachid, esclarece que a comissão se ateve apenas aos aspectos acadêmicos. Em 7 de novembro desse mesmo ano, com base no relatório final dessa comissão, o Conselho de Ensino e Pesquisa (CEPE) aceita a possibilidade de incorporação das escolas de Biblioteconomia e Educação Física e delibera sobre algumas medidas, dentre elas, a necessidade de obter assessoramento jurídico, de constituir Grupo de Trabalho Interinstitucional, de criação de Comissão para avaliar os custos da incorporação, além da definição, pelos colegiados, das condições para essa incorporação. 3 Tive participação no projeto Ambientalização Curricular do Ensino Superior, dentro do Programa América Latina – Formação Acadêmica (ALFA), mantido pela União Européia, e oportunidade de participar da Rede Paulista de Educação Ambiental (REPEA) e da Rede de Universidades e Programas de Educação Ambiental (RUPEA). Nesse momento, pude compreender os diferentes contextos, filosofias e dinâmicas em que se operacionalizam as redes de conhecimento. O meu interesse pela temática ambiental foi se mantendo e em 2001 assumi a coordenação do Programa de Educação Ambiental (PEAm) da então Coordenadoria Especial para o meio Ambiente (CEMA) da própria UFSCar. 76 Uma carta, datada de 27 de junho de 1987, traz informes sobre o andamento da discussão interna sobre incorporação das escolas de Biblioteconomia e de Educação Física e faz menção sobre alguns acontecimentos. Primeiramente, informa que o CEPE em sua 105ª Reunião, realizada em 17/12/86, analisou documento final do Grupo de Trabalho Institucional, encarregado por definir os passos e procedimentos para incorporação, pela UFSCar, das escolas de Biblioteconomia e Educação Física, pertencentes à Fundação Educacional de São Carlos. Na sequência, em dezembro de 1986, a Câmara de Graduação (CaG) do CEPE, deliberou por constituir uma Comissão composta pelos seguintes professores doutores: Paulo Adão Monteiro, Dirceu Costa e Francisco de Paula Nunes Sobrinho para analisar os perfis dos cursos de Biblioteconomia e Documentação e Educação Física, identificando unidades na UFSCar que tivesse aderência com os perfis dos cursos Biblioteconomia e Educação Física e que pudessem contribuir com o oferta de disciplinas. Depois de concluído os estudos, da referida Comissão, o CaG/CEPE enviou, em 27/02/87, documento expondo os perfis e o rol de disciplinas, bem como as unidades identificadas como possíveis colaboradoras solicitando que expusessem, de forma clara e objetiva, suas necessidade para absorver disciplinas e alunos, decorrentes da possível incorporação. Demanda esta, reiterada em 1 de junho de 1987, devido ao baixo retorno da comunidade sobre o assunto. Embora, não tenha sido possível analisar o conteúdo do referido estudo da Comissão, pelo que indicam as respostas enviadas por algumas unidades, não havia posições declaradamente contrárias à incorporação dos cursos em questão, apenas ponderações, frente realidade vivida naquele momento. Como, por exemplo, no documento que responde a solicitação, enviada ao Arquivo de História Contemporânea (AHC)4, o seu então Coordenador Prof. Dr. José Claudio Barriguelli se pronunciou como sendo favorável devido ao ensino superior não ser uma atribuição do município e sim do estado e da união, com a ressalva de que haveria necessidade de refletir sobre a incorporação numa perspectiva de criação de novos cursos, fortalecimento dos existentes, definição de áreas prioritárias e recursos para esse fim, entre outros assuntos. Curioso foi o fato de ter sido aventada a possibilidade de unidades administrativas assumirem atividades didáticas. Uma carta assinada pelo Dr. Francisco de Paula sobrinho, mencionado um parecer onde consta que a dis4 Unidade extinta. Parte do seu acervo foi incorporada pela Unidade Especial de Informação e Memória (UEIM) da UFSCar. 77 ciplina Editoração poderia ficar a cargo da Editora da UFSCar (EDUFSCar). Naquele momento, a Editora alegou não ter condições de ministrar a disciplina, inclusive pela exigência de conhecimento técnico e teórico específicos, mas que colocava a disposição as suas futuras instalações e o pessoal para interagir com os profissionais de biblioteconomia e editoração em benefício da comunidade. Outras disciplinas como, por exemplo, “Metodologia da Informação I e II” para foram demandadas para o Departamento de Educação que alegaram semelhança as disciplina “Métodos e Técnicas de Estudo” e, portanto, passiveis de serem ofertadas ao novo curso em questão, conforme expõem o chefe do Departamento de Educação, em documento de junho de 1987. O assunto continuava em pauta e ainda pairavam muitas dúvidas sobre a incorporação dos cursos de Educação Física e Biblioteconomia, ofertados na Fundação Educacional São Carlos (FESC), pela UFSCar, dentre elas: como seriam supridos os recursos necessários para essa incorporação? Haveria a possibilidade de redução do número de vagas ofertado? Pois, a Fundação ofertava 430 vagas anuais entre os dois cursos. Será realizado estudo do currículo? Serão contratados servidores docentes e técnicos administrativos por concurso? Diante de tantas questões, houve sugestão para se estabelecer debate no campus para esclarecer as vantagens de desvantagens dessa incorporação. Dois anos depois, enfim, o parecer no 102/89, de 05/10/1989, deliberou a favor da absorção dos cursos de Educação Física e Biblioteconomia da Fundação Educacional São Carlos, nos termos e condições da declaração conjunta do Prefeito Municipal de São Carlos e Reitor da UFSCar, que dentre outros argumento, registra que os cursos mantidos pela Fundação, ao longo do tempo têm formado profissionais de reconhecida competência, absorvidos pelo mercado de trabalho desde o âmbito local até o nacional e que a qualidade do trabalho desempenhado tem sido motivo de elogios. E, que assim se justificava ganhar uma nova estrutura que pudesse oferecer melhores condições para o aprimoramento desses profissionais. Vale aqui lembrar o importante papel que desempenhou a Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos (EBDSC), criada em 1959, por quatro jovens bibliotecários visionários: Alfredo Américo Hamar, Iná Bentim, Eunice Diva Garcia, funcionários da Escola de Engenharia de São Carlos e Therezinha Abs da Odontologia de Ribeirão Preto. Em seus anos de existência (de 1959 a 1997), graduou mais de 1000 profissionais que atuaram e atuam em todas as regiões do Brasil. Em 1994, a Universidade Federal de São Carlos 78 abriu o primeiro Vestibular para o curso de Biblioteconomia e a EBDSC encerrou as suas atividades em 1997, após formar as turmas remanescentes. Esse curso teve como principal objetivo, segundo Sonia Maria Trombelli de Hanai5, a interiorizar a profissão de bibliotecário para atender as necessidades das inúmeras escolas superiores que estavam sendo criadas no Estado de São Paulo. A primeira aula inaugural do curso foi ministrada pelo Prof. Mário Tolentino, em 20 de abril de 1959. Ou seja; a história do ensino de Biblioteconomia em São Carlos antecede a própria fundação da UFSCar. O Curso de Biblioteconomia e Documentação pertencia a uma Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos (EBDESC) que posteriormente, em 1973, foi incorporada pela Fundação Educacional de São Carlos (FESC), que passou a ofertar, também, o Curso de Educação Física. E, só em 1989 começaram as reuniões para a integração do curso à UFSCar, o que aconteceria por meio de convênio assinado entre as partes, em 1993. Retornei a São Carlos em 1988 e, ao mesmo tempo, à cidade de Goiânia atendendo ao convite para organizar um acervo documental, oriundo dos registros de atividades multidisciplinares que envolviam o cuidado com as vítimas de um acidente, ocorrido em setembro de 1987, provocado pelo abandono de uma cápsula contendo Césio l37, material altamente radioativo, e de seu indevido manejo. No meu retorno a São Carlos senti que gostaria de atuar na educação e me dispus a trabalhar na direção de uma escola infantil, Dedo Verde, de 1999 a 2004. Foram cinco anos de baixa remuneração, mas de grande satisfação. A escola, inspirado no livro “O menino do dedo verde” de Maurice Druon, foi fundada por mim e mais dois idealistas, Roberto Menezes e Rosanna Menezes. Nesse momento descobri o prazer de ensinar e convivi com pessoas (pais de alunos) que, embora não soubesse, num futuro próximo seriam meus colegas na UFSCar e, inclusive no próprio curso de BCI como é o caso da professora Ariadne Chloe Mary Furnival, é como se o tempo estivesse preparando uma parceria para muitos projetos. Nesses entrelaçamentos históricos, também vale citar o caso da profa. Nádea Regina Gaspar, que foi minha contemporânea de curso e anos depois o reencontro como docentes do curso de BCI. 5 Trabalho elaborado por de Sonia Maria Trombelli de Hanai com a colaboração de Maria Christina de Almeida Nogueira sob o título de “A Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos: 1959 / 1997”. Exemplar disponível na Biblioteca Municipal de São Carlos. 79 A história prossegue e em 11 de setembro de 1989, uma declaração conjunta, assinada pelo Prefeito municipal de São Carlos, Neurivaldo José de Guzzi e o Reitor da UFSCar, Sebastião Elias Kuri, veio a público as intenções de, no menor prazo possível, envidar todos os esforços para solucionar os problemas relativos à implantação dos cursos de Biblioteconomia e ciência da Informação e de Educação Física na UFSCar. Em agosto de 1993, a Diretora da Fundação Educacional de São Carlos, Maria Cristina Almeida Nogueira, encaminha ao atual Reitor da UFSCar, Prof. Dr. Newton Lima Neto, uma “Proposta curricular para implantação do Curso de Ciência da Informação e Biblioteconomia”. Respaldado num convênio firmado, em 11 de maio de 1993, entre a Fundação Educacional de São Carlos, a Prefeitura Municipal de São Carlos e a UFSCar, com o propósito de definir a operacionalização da absorção dos cursos de Biblioteconomia e Documentação e Educação Física pela UFSCar dá-se inicio, em 1994, ao Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, no período noturno. Neste convênio ficam acordadas as condições de oferta dos cursos na UFSCar com ingresso dos alunos pelo vestibular realizado pela FUVEST e de acordo com o novo currículo definido pela UFSCar, e cedendo as instalações do campus para as classes renascentes. Esse fato torna-se marcante na vida da Fundação Educacional de São Carlos, fundada em 29 de dezembro de 1971, um pouco depois da fundação da própria UFSCar e ao longo de sua existência, de 1959 a 1997. O curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação na UFSCar nasce com uma proposta curricular com ênfases para atender as novas exigências do mercado profissional diferenciando-se dos cursos tradicionais existentes no país. Esse aspecto inovador do curso lhe trouxe algumas exigências, como pode ser constatado pela consulta feita, pela presidente da Comissão de Implantação do Curso, Profa. Dra. Helena Rosa Vieira Lima, a Procuradoria Jurídica da UFSCar em que pede parecer jurídico ao então Procurador Jurídico da UFSCar, Dr. Lauro Teixeira Cotrin para contratação de um corpo docente multidisciplinar para atua no curso, ou seja, a abertura de concurso público para contratação de docente que não se restringisse aqueles graduados em Biblioteconomia. Enfim, em 24 de novembro de 1995, o MEC homologa o parecer da Câmara de Educação Superior transfere a mantença dos cursos de Biblioteconomia e Documentação e Educação Física da Fundação Educacional de São Carlos para a Universidade Federal de São Carlos. 80 O Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) teve início na UFSCar em 1994, Em 1973 a escola foi incorporada pela Fundação Educacional de São Carlos (FESC). E, só em 1989 começaram as reuniões para a integração do curso à UFSCar, o que aconteceria por meio de convênio assinado entre as partes, em 1993. O Curso de BCI e o da Educação Física foram os pioneiros no ensino noturno da federal, datados de 1994, dando início a visão por um lado de inclusão de uma maior parcela da sociedade a universidade, e por outro para melhor ocupar a infraestrutura da universidade no período noturno, já que a maioria dos alunos trabalhava durante o dia e estudava a noite. Por serem os primeiros, enfrentaram muitos problemas, principalmente de segurança que aos poucos foram sendo minimizados com a expansão da universidade e o aumento da oferta de cursos noturnos. O curso BCI foi o primeiro também a ter aula aos sábados na UFSCar. No cenário brasileiro da biblioteconomia, o Curso da UFSCar com suas duas ênfases: Informação tecnológica empresarial; e Informação Social, trouxe uma visão diferenciada dos cursos já existentes no Brasil, devido também à interdisciplinaridade do seu corpo docente, com formação em várias áreas do conhecimento, como: Biblioteconomia, Engenharia (Mecânica, Elétrica e Produção), Letras, Educação, Ciência da Informação, Linguística, entre outras. Além do fato de ser o primeiro a ter Ciência da Informação no nome do curso, foco de inúmeras discussões na área. Desde que foi criado, em 1994, o curso passou por 4 reformulações em seu projeto pedagógico, com o objetivo de resolver ou minimizar os problemas relatados nas avaliações, e também para melhor atender seus alunos e as demandas da sociedade. Também ao longo dos seus primeiros anos de atuação houve a aprovação de algumas politicas voltadas para o ensino da biblioteconomia, as quais foram usadas para fazer as adaptações no currículo do curso. No começo, o curso ficou vinculado e alocado junto com o Departamento de Letras (DL) e iniciou suas atividades como Núcleo de Biblioteconomia e Ciência da Informação, só mais tarde, em 1996, foi criado o Departamento de Ciência da Informação (DCI). Em 1995, ingressei na carreira acadêmica como docente no Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação na UFSCar. Desde então, venho desenvolvendo projetos de pesquisa e de extensão em temáticas ambientais e preservação do patrimônio histórico, material e imaterial. 81 Dando prosseguimento à minha formação acadêmica, em 2001 concluí o mestrado no Programa de Pós Graduação em Engenharia de Produção, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), desenvolvendo estudo na linha de pesquisa intitulada Tecnologia, Trabalho e Organização. A dissertação teve como principal objetivo o estudo dos fatores determinantes e ou condicionantes de mudanças organizacionais, biblioteca universitária. Tive o privilégio de estar sob a orientação do professor doutor Oswaldo José Serra Truzzi e pude (re)visitar as teorias administrativas, em particular aquelas que possibilitavam explicar melhor os aspectos culturais que interferem na dinâmica do mundo das organizações, contribuindo para a minha atual área de ensino, no curso, de Gestão de Unidades de Informação. Em 2008 conclui o doutorado no Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de Marília com a esperança de poder contribuir para o avanço teórico-metodológico da área de Ciência da Informação. Essas experiências, vivências e convivências tem me levado a galgar outros patamares de conhecimento, centrado em questões da Ciência da Informação, que me parecem importantes e desafiadoras. Por exemplo, o projeto Memória Virtual de São Carlos e outros projetos de extensão vem me proporcionando não só a revisão de conceitos, mas ressignificação das práticas de armazenar e recuperar conteúdos de natureza diversa, em ambiente digital. Enfim, encerro este texto com a sensação de que o Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar, com os seus 20 e poucos anos, possui muito mais a ser resgatado, lembrado e contado, mas, com o pouco que aqui relatei tenho, sem dúvida, motivo suficiente para sempre me orgulhar por fazer parte dessa história. Referências CHAUÍ, Marilena. Cultura política e política cultural. Estudos Avançados, São Paulo, v. 9, n. 23, 1995. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ea/v9n23/v9n23a06.pdf. Acesso em: 26 abr. 2017. PAUWELS, Louis; BERGIER, Jacques. O despertar dos mágicos. Lisboa: Bertrand, [1960 ?]. 82 Foto: Waldeck Schutzer 20 ANOS DE BCI – MEMÓRIAS DE UM ENGENHEIRO NAVEGANDO NAS CIÊNCIAS DA INFORMAÇÃO SERGIO SILVA* Comecei a trabalhar como docente efetivo no curso de BCI em 13 de janeiro de 1995. E lá se vão mais de 20 anos, e recebo o convite das diletas organizadoras desse livro para relembrar fatos, vivências, expectativas frustradas, e imprevistos criativos. Mexer com a memória é enriquecedor, mas não é tarefa fácil. Vêm boas lembranças repensadas, ilusões desfeitas, recordações esquecidas. Mas lançado o desafio, vamos encará-lo. Lembro que as primeiras disciplinas que ministrei na graduação foram Lógica para BCI, e História da Ciência e Tecnologia. Depois Métodos de Pesquisa, disciplinas teóricas da Administração, entre outras. Não eram disciplinas de minha formação direta, mas era um esforço docente necessário nos primeiros anos de curso, com o quadro de professores ainda incompleto. As primeiras turmas de alunos chegaram a ter professores que os acompanharam em disciplinas do primeiro ao último ano, o que se por um lado demandava certo desafio para o professor, por outro permitia acompanhar a evolução e maturidade dos discentes. Só comecei a ministrar as duas disciplinas da Ênfase de último ano do curso, para o qual fui contratado, quando a primeira turma de alunos chegou a esse momento de escolha. E desde aquele momento até hoje permaneço como responsável por essas duas * Doutor em Engenharia Mecânica (USP), Mestre em Engenharia de Produção (UFSCar) e Bacharel em Engenharia de Materiais (UFSCar). Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 1994. Contato: sergiol@ufscar.br. 84 disciplinas – Informação para a Competitividade Empresarial – ICE e Gestão da Informação e do Conhecimento nos Processos Empresariais – GICPE – que tem esses títulos atualmente, mas desde o início, mesmo com outras denominações e conteúdos um pouco diferentes do de hoje, apresentam a mesma essência e propósito, qual seja, construir com o aluno os fundamentos para que atue com certos elementos da informação e do conhecimento em ambiente industrial / empresarial. Tentarei, nas próximas páginas, descrever meus aprendizados em conduzir essas duas disciplinas, no criativo ambiente de colaboração com os alunos, que almejamos sempre existir na UFSCar. E no final dessa parte, algumas considerações breves sobre minha pesquisa e extensão, com seus reflexos na BCI. Quadro 1 – Informação para a Competitividade Empresarial – ICE Informação industrial / empresarial no curso de BCI Informação para a competitividade empresarial Gerenciamento da informação e do conhecimento nos processos empresariais “da organização para fora, sua inserção “da organização para dentro, as no ambiente externo condicionando o características do ambiente interno trabalho com as informações” condicionando o trabalho com as informações” “fontes formais e informais-redes de informação, estratégia competitiva, monitoramento / inteligência competitiva” “processos empresariais, gestão da informação e do conhecimento” Fonte – O autor (2020) Como esquematizado no Quadro 1, a disciplina de ICE visa entender e discutir as fronteiras da empresa com seu ambiente externo, os múltiplos atores com que se relaciona, colaborando ou competindo, e como isso influencia as necessidades e demandas de informação para a sustentabilidade do negócio. Tendo esse mote geral, a disciplina inicia-se introduzindo e contextualizando a temática envolvida com a questão do emprego da informação nas empresas. Relembrando o que os alunos já estudaram em disciplinas anteriores de administração de empresa, destaca que aos fatores de produção 85 clássicos – trabalho, matéria-prima, e capital – típico da sociedade industrial, cada vez mais o fator informação torna-se fundamental, critico nas relações e parcerias entre empresas e os diversos atores do cenário competitivo. Isso traz desafios novos e interessantes para os profissionais que atuam com a informação. Precisa entender quem são e como se relacionam esses atores no ambiente competitivo em que uma empresa atua. Compreender as demandas por informações, os principais tipos de fontes, sejam as formais, sejam as informais. Considerar que essa informação precisa ter adequada disponibilidade, atualidade, renovação, compatível e orientada para os objetivos da empresa e agregando valor as soluções de problemas onde se aplica. E quando falamos de informação, estamos pensando em termos amplos, todo tipo de informação que uma empresa precisa para sobreviver. Inclui tanto a mais evidente, a tecnológica que constrói os produtos e/ou serviços, como também a científica aplicada no âmbito da inovação, a econômica, contábil e financeira para os negócios, a mercadológica para decifrar os cliente e mercados, dentre outras. Para entender como uma empresa utiliza a informação para ser mais competitiva em seu ambiente de atuação, inicialmente o aluno precisa analisar e entender as possibilidades e limites das pesquisas sobre demanda por informação tecnológica / industrial / empresarial, que normalmente constitui-se de um procedimento de levantamento quantitativo amplo, entre vários setores produtivos, visando identificar as necessidades de informação. Em especial, destaca-se para o aluno o entendimento de como essa pesquisa foi realizada (o método, a amostragem nela empregada) e as questões ou pontos principais que devem ser investigados em um levantamento como esse. Esse tipo de pesquisa tem geralmente como objetivo principal suprir administradores e/ou instituições com dados acerca da demanda e necessidades de informações de conjuntos e amostras de empresas, gerando, enfim, um panorama amplo a respeito, pois não dá para saber, por esse método, a necessidade de uma empresa em particular. A ideia aqui é trabalhar com o aluno a importância desses levantamentos quantitativos (survey), entender em linhas gerais como eles são estruturados e aplicados, e como seus resultados coletados em amostras de empresas podem ser interpretados. Depois de entender as noções básicas da demanda ampla e genérica das empresas por Informação, com foco em uma análise quantitativa de diversas empresas, “horizontal”, das necessidades e usos da informação, o passo seguinte é o aluno analisar necessidades e usos, bem como dificuldades, 86 no manuseio da informação, em empresas em particular. Portanto, o foco passa a ser qualitativo-descritivo, o estudo de caso para a investigação específica de uma empresa, mais detalhado para situações específicas da empresa em análise, “vertical”. Mais especificamente na investigação de como se analisa o caso de uma empresa em particular, busca-se discutir com o aluno a importância de entender o contexto e as características produtivas, os elementos inovadores, os aspectos comerciais de dada empresa, que certamente vão influenciar suas necessidades de informação, os tipos de fluxos de informação mais valorizados, as fontes e canais de comunicação mais utilizados, e as barreiras e problemas enfrentados pelos múltiplos atores na empresa na busca, emprego e criação de informação tecnológica / industrial / empresarial. Particularmente nesse ponto da disciplina procura-se começar a mostrar ao aluno que faz mais sentido se investigar o emprego de produtos e serviços de informação, com o foco nos momentos e demandas efetivas em que ocorrem inseridos nas atividades cotidianas do funcionamento de uma empresa. Ou seja, despertar o aluno de BCI para, mais do que entender o que são e como são feitos produtos e serviços de informação – a visão do lado do produtor, da unidade de informação, perceber e entender o ponto de vista do usuário final e das suas rotinas de trabalho, em como os inúmeros problemas operacionais que vão surgindo nas várias operações em diferentes níveis da empresa vão demandar certos tipos de informações para serem diagnosticados e solucionados, e que não é só oferecer essas informações, mas saber que só serão efetivas se for devidamente direcionada, adaptada, incorporada, a esse problema operacional específico que a demanda. E quando se fala nos usos das fontes formais de informação – ou seja, aquelas registradas em suporte papel ou eletrônico – em empresas, nota-se claramente que as de maior porte trabalham bem com fontes primárias (por exemplo, uma norma técnica), enquanto que pequenas empresas priorizam fontes secundárias (simplificações e interpretações por terceiros das fontes primárias, por exemplo, um manual prático explicando como seguir o determinado em uma dada norma técnica). E para ambos tipos de empresas, há forte predominância no uso dos canais ou fontes informais (contatos e redes entre pessoas, de dentro e fora da organização). Serviços ou unidades de oferta e intermediação da informação, sejam os internos as grandes empresas, sejam os externos que apoiam as pequenas empresas, precisam se orientar por essas particularidades de seus usuários, bem como as oportunidades de atuarem 87 como gatekeepers ligando atores que desconheciam ter interesses comuns, nos mesmos tipos de informação, para resolver problemas similares, que assim juntos podem melhor colaborar e compartilhar conhecimentos. Há uma enorme diversidade dessas fontes formais, com os correspondentes desafios em seu acesso, classificação e atualização: – os diversos tipos de relatórios técnicos, de origem interna ou externa a empresa, com diferentes graus de imparcialidade da informação relatada; – os artigos (papers), derivados de pesquisas aplicadas, úteis nas revisões do estado da arte e descrição de métodos e experimentos utilizados; – as normas técnicas, que podem, pela padronização, simplificar a produção e a distribuição, assegurando uniformidade e confiabilidade, reduzindo informações desnecessárias e repetidas; – as patentes, como proteção e repositório das informações ligadas a inovação e para determinar o estado da técnica; – a diversificada literatura comercial dada pelos catálogos de produtos e serviços; – as literaturas técnicas de referência, representadas por dicionários, enciclopédias, manuais (handbooks), tabelas etc.; – os vários tipos de desenhos industriais; – as rotinas de manufatura (fabricação, montagem, manutenção etc.); – os orçamentos, contratos e documentos jurídicos; – entre outras fontes formais presentes no rico espaço e rotina cotidiana das empresas. Essas fontes formais de informação transitam no ambiente interno e nas interfaces externas da empresa por intermédio de pessoas, que fazem contatos e trocam informações e, portanto, formam redes diversas de trocas de conhecimentos. Essas redes ou fontes informais também são muito relevantes para a empresa e discute-se e alerta-se isso para o aluno de BCI, normalmente mais atento apenas as fontes formais. As redes ou fontes informais consistem em pessoas e grupos que espontaneamente transpõem fronteiras organizacionais convencionais, buscando vantagens múltiplas, principalmente rapidez e flexibilidade no compartilhamento de informações e conhecimentos. E ao mesmo tempo essas pessoas e grupos preservam sua individualidade. Redes ou fontes informais prezam, portanto, pela participação coletiva com independência individual, lideranças que se revezam na condução dos trabalhos na rede, conforme diferentes perfis de líder são demandados ao longo do tempo, e participantes com diferentes experiências, mas que participam de uma rede devido a um propósito comum construído em consenso e sendo este o principal elemento aglutinador e orientador de todos os envolvidos. Um membro normalmente catalisador de uma rede é o gatekeeper, uma pessoa com habilidade de per- 88 ceber e aproximar pessoas com uma demanda ou necessidade comum, com potencial de formar um coletivo temporário para otimizar esses esforços. Por esse olhar colaborativo da dinâmica de redes, também estudamos o poder das pequenas empresas, individualmente flexíveis mas frágeis quando sozinhas, em se tornarem mais fortes, competitivas, ao buscarem vantagens em se agrupar em arranjos ou redes de pequenas empresas, que mantém sua independência mas realizam compras coletivas, desenvolvimento de inovações e tecnologias de interesse comum, dividem a execução de grandes demandas de atendimentos a clientes, entre outras vantagens. Chegando a esse momento da disciplina, provoca-se o aluno com uma pergunta crítica: visto as sempre existentes limitações de recursos e tempo, que tipos de fontes formais e informais escolher, e como trabalhar com essas fontes, de forma que sejam mais úteis à realidade e à necessidade competitiva de uma determinada empresa (ou setor)? As possíveis respostas para essa pergunta são discutidas nas aulas seguintes da disciplina, e debatidas nos próximos parágrafos. E foram pensadas para instigar o aluno que não basta indicar aos usuários empresariais uma diversidade de possíveis fontes de informação, mas o profissional de BCI precisa ir além, entender a inserção da empresa no ambiente competitivo que atua, e, partir disso, propor as melhores formas de se escolher e usar as fontes formais e informais. Mais do que isso, fontes consultadas e utilizadas permitem entender melhor esse ambiente, que por sua vez, com esse melhor entendimento, pode-se refinar sucessivamente a seleção das fontes mais úteis e produtivas para a sobrevivência e sucesso da empresa. Para começar a responder a pergunta anterior colocada o aluno é conduzido a entender e discutir os conceitos de informação e estratégia, que estão inerentemente relacionados na análise da indústria e da concorrência. Para isso utiliza-se uma das visões mais disseminadas e respeitadas sobre esse assunto da administração de empresas: a clássica obra do autor Michael Porter, das cinco forças competitivas básicas, e das abordagens estratégicas genéricas. Há outras escolas teóricas nessa temática, até mais recentes, mas essa do respeitado autor tem algumas vantagens em uma disciplina do caráter de ICE: – para alunos que estão sendo introduzidos em discussões sobre informação e estratégia, é uma das teorias de compreensão menos complexa; – é de aplicação relativamente fácil e viável no trabalho prático final que os alunos executam em campo; – faz uma ligação efetiva entre fontes de informação com inteligência competitiva, que é o assunto final que fecha a disciplina. 89 Nesse estudo das forças competitivas, o aluno é levado a compreender que os tomadores de decisão de uma empresa devem acompanhar e levantar informações de potenciais empresas – novos entrantes no setor de atuação – que podem ser novos atores no ambiente competitivo, também analisar as diversas táticas dos concorrentes já existentes, bem como, advindo principalmente de uma inovação tecnológica e/ou empreendimento de negócio, acompanhar o risco que pode surgir de produtos (e/ou serviços) substitutos, que tem potencial de modificar totalmente a dinâmica dos negócios pela obsolescência da forma tradicional de atuação que a empresa sempre adotou. Além dessas três forças competitivas básicas, há ainda no cenário de atuação da empresa os compradores e fornecedores, atores que uma empresa possui relações diretas e normalmente intensas. Esses compradores – clientes da empresa, e seus fornecedores, possuem diferentes níveis de poder de negociação, impactando a estratégia competitiva. Informações levantadas da importância relativa das vendas e compras da empresa para esses atores são fundamentais para se entender seu poder. Várias fontes de informação formais e informais – redes – precisam ser acionadas de forma perene para a contínua compreensão de como esse cenário competitivo com as cinco forças vai se modificando ao longo do tempo. A melhor compreensão possível desse desdobramento permite que os tomadores de decisão de uma empresa optem por diferentes combinações possíveis de estratégias genéricas: – pode orientar uma empresa a atuar como liderança geral em termos de custo; – ou priorizar a ampla diferenciação; – ou visando o foco em segmentos de mercado sendo neles líder em custo e/ ou diferenciação. A escolha da estratégia genérica predominante sem dúvida orientará importantes aspectos da gestão da empresa, dos investimentos que priorizará, e, em consequência inevitável, das informações e conhecimentos mais críticos de se acompanhar e utilizar para ser bem sucedida na abordagem estratégia escolhida. Com a compreensão bem consolidada pelo aluno até aqui, das demandas e usos das fontes formais e informais, e como suas escolhas influenciam e são influenciadas pelos fatores estratégicos mencionados, o passo seguinte e de fechamento da disciplina é o estudo de práticas organizadas e sistemáticas (de coleta e análise ao longo do tempo), ou seja, um sistema de inteligência empresarial/competitiva, de acompanhamento das informações sobre os principais concorrentes (e também entrantes, substitutos, clientes, e fornecedores). Esse sistema envolve o trabalho com duas importantes fontes de 90 informação, os dados de campo (pessoas, portanto, informais), e os dados publicados (portanto, formais). Discute-se então, com os alunos, alguns elementos chaves desse trabalho sistemático de inteligência empresarial/competitiva, tais como: – determinar o que – quais fontes formais e informais – deve-se acompanhar, e o que extrair do conteúdo dessas fontes, sendo a análise da estratégia competitiva a orientação para isso; – iniciar com uma visão geral e ampla, da empresa e do ambiente em que se insere, para em seguida enfocar particularidades; – a pesquisa de campo (redes e fontes informais) e a das fontes publicadas (formal/bibliográficas) deve ocorrer simultaneamente, com os achados de uma fonte alimentando a busca e análise da outra; – cada fonte pode indicar referências para outras fontes publicadas ou para entrevistas de campo, ou seja, “uma fonte puxa outra”; – analisar pontualmente uma informação faz pouco sentido, uma informação se torna relevante e confiável se analisada em seu contexto ao longo do tempo; – os cuidados com a confiabilidade da informação coletada, particularmente na internet; – atenção a informações conflitantes/contraditórias e não acreditar em uma única versão/tendência; – as habilidades relevantes para as entrevistas de campo, como saber perguntar e observar, atenção a detalhes, habilidade para fazer anotações; – a análise financeira e estatística básica para interpretar conteúdos de informação; – a facilidade para aprendizado dos princípios gerais dos principais processos de uma empresa, que é por onde fluem as informações e conhecimentos mais relevantes. Enfim, esses são os principais, dentre outros elementos, dessa técnica com jeito de arte, que é competência em fazer a inteligência empresarial / competitiva, e aqui ao final da disciplina espera-se que o aluno esteja preparado como iniciante dessa nobre habilidade. 91 Quadro 2 – Gerenciamento da Informação e do Conhecimento nos Processos Empresariais – GICPE Informação industrial / empresarial no curso de BCI Informação para a competitividade empresarial Gerenciamento da informação e do conhecimento nos processos empresariais “da organização para fora, sua inserção no “da organização para dentro, as ambiente externo condicionando o trabalho características do ambiente interno com as informações” condicionando o trabalho com as informações” “fontes formais e informais-redes de informação, estratégia competitiva, monitoramento / inteligência competitiva” “processos empresariais, gestão da informação e do conhecimento” Fonte – O autor (2020) Essa disciplina de GICPE, como destaca o Quadro 2, procura trazer ao aluno uma forma contemporânea de se olhar o funcionamento de uma organização empresarial, na forma de um conjunto de processos, que perpassam as tradicionais áreas departamentais. Essa visão dos processos que formam uma empresa permite um melhor entendimento da sua dinâmica de funcionamento, no espaço e no tempo, e em como as informações e conhecimentos são criados, trocados, e incorporados, características fundamentais que formam a gestão do conhecimento. O mote principal, o tema chave, do trabalho prático final da disciplina, ilustra bem esse foco: “Escolha um processo na empresa em que trabalha ou faz estágio,... faça um mapeamento desse processo segundo a teoria estudada e em especial suas quatro dimensões (Estratégia, Organização, Atividades/informações, e Recursos), e incorpore a essas dimensões as quatro conversões do conhecimento (Socialização, Externalização, Combinação, e Internalização)... Ao final então será apresentado um modelo de gestão do conhecimento no processo mapeado e melhorado”. Ou seja, no enunciado que orienta a realização do trabalho final, e já apresentado na primeira aula da disciplina como desafio de aplicação dos conceitos teóricos que serão estudados, estão presentes e mesclados todos os conteúdos da teoria, motivando o aluno a considerar que somente tratando-os em conjunto, e de forma relacionada, se pode fazer uma boa gestão 92 da informação e do conhecimento nos processos que formam um ambiente empresarial contemporâneo. Então, para bem entender esses conteúdos, vamos detalha-los em seguida. Essa disciplina GICPE, bem como a de ICE, desde seus primórdios no início do curso de BCI, sempre se estruturaram em uma parte inicial mais teórica – discussões do arcabouço de artigos e capítulos de dissertações, teses, e livros com os alunos, somado a dinâmicas para consolidar essa interpretação da teoria – e uma parte final no último mês da disciplina mais prática, digamos assim, onde os alunos em grupos executam um trabalho final relativamente complexo, empregando toda a teoria estudada no diagnóstico e proposição de mudanças para um caso estudado em campo, em alguma empresa ou organização escolhida pelo grupo. A parte teórica de GICPE inicia-se com uma revisão de alguns conceitos primordiais da evolução da administração, procurando destacar ao aluno como informação e conhecimento vão sendo tratados ao longo do tempo no espaço organizacional. Para isso utilizamos principalmente trechos de livros clássicos, de Drucker, e de Womack e colaboradores, destacando como as mudanças na sociedade e na tecnologia vão impactar e mudar o pensamento que orienta a dinâmica administrativa, e consequentemente o trabalho com a informação e o conhecimento para essa finalidade. Particular atenção é dada para debater com o aluno como eram os sistemas produtivos na produção artesanal, pré-revolução industrial, das relações de aprendizagem e trocas de conhecimentos entre mestre e aprendiz, das informações pouco registradas por esses atores, da habilidade de ofício de se realizar todas as tarefas que compõem a confecção de um produto. Avançando-se na história das organizações, discute-se a produção em massa, desdobramento da revolução industrial, das tarefas bem divididas que compõem o todo a ser executado, do trabalho e habilidades especializadas, das hierarquias, da burocratização e registro intenso das informações, dos manuais e rotinas escritos e desenhados que regem a execução do trabalho. Por fim chega-se as décadas recentes, ao espaço organizacional contemporâneo, da pós-revolução industrial, da sociedade do conhecimento, da manufatura enxuta, que pode ser olhada, do ponto de vista da informação e conhecimento, como uma mescla com críticas e aperfeiçoamentos das abordagens artesanais e em massa, ou seja, muita informação a ser gerenciada em formatos cada vez mais digitais, e muito conhecimento que pode ser criado e trocado via trabalhos em equipe e ambientes estimulados de colaboração. 93 E para que o aluno entenda bem esse espaço organizacional contemporâneo, como pré-requisito para que nele possa diagnosticar e realizar intervenções em gestão da informação e do conhecimento, vamos procurar compreende-lo em termos de gestão do espaço físico, como o arranjo físico influencia a organização do trabalho, e como este trabalho pode ser organizado e projetado, visando a melhoria do conforto das pessoas que o executam, com reflexos inevitáveis em sua produtividade e estímulos para trocas de conhecimentos. Há também, no espaço organizacional, muita gestão da informação envolvida na forma como é organizado o fluxo de produção dos materiais, componentes, partes que são fabricadas, e como tudo isso é montado formando um produto final. O ordenamento e coordenação desses fluxos requerem muitas trocas de informações, seja formal ou informal, com diversos mecanismos bem interessantes do aluno de BCI conhecer, ao menos em seus conceitos básicos. E além desses fluxos rotineiro das operações, que são relativamente constantes, há também projetos ocasionais, como algum produto único encomendado que se precisa executar, ou a construção de uma nova unidade produtiva, seja uma máquina, uma célula ou linha de produção etc., enfim procedimentos esporádicos, únicos e intensos que são projetos que requerem uma gestão das informações e conhecimentos envolvidos para seu planejamento e execução, e essas noções são discutidas com os alunos em termos elementares dentro do tempo disponível. Por fim, mas não menos importante, é apresentado ao aluno as questões clássicas de planejamento, controle e administração da qualidade, nesses espaços de trabalho e nos fluxos de produção. Discute-se em essência a importância da prevenção antes da correção, a qualidade permeando todas as ações da empresa e as ações de seus atores, e, no que mais interessa a um curso de BCI, como as informações de várias operações e setores de uma empresa alimenta os sistemas da qualidade, que por sua vez disseminam conhecimentos para os atores envolvidos sempre buscarem melhorias. Não são apenas as funções e competências apresentadas nos parágrafos anteriores, obviamente, que formam um espaço organizacional, há outras também importantes e críticas, como as habilidades financeiras, logísticas, de inovação etc., de uma empresa. Porém, foram essas as funções escolhidas pois tratam bem da dimensão espaço (físico, do trabalho), temporal (fluxo de operações) e de eficiência (a qualidade), requisitos chave para que o aluno seja em seguida introduzido a compreender uma organização como constituída de processos empresariais. 94 Enxergar a empresa como um conjunto de processos, que não substitui mas sim se mescla e relaciona com a estrutura hierárquica e de funções / departamentos que convencionalmente forma a empresa, é uma tendência na gestão e administração cada vez mais presente, tanto em investigações e aplicações que visam melhor implantar sistemas de informação, como em intervenções de otimização do trabalho e relacionamento das pessoas envolvidas, ampliando o potencial das trocas de conhecimentos. Desenvolver produtos, conduzir negociações, capacitar empregados, são alguns exemplos dos vários processos que existem em uma empresa. Um processo é constituído pelas seguintes dimensões: – a estratégica – que o orienta para uma meta, o avalia, estabelece relações com outros processos e funções; – a organizacional – que trata dos atores/pessoas envolvidos, em diferentes graus e arranjos, provenientes das áreas / departamentos que contribuem para o processo; – a dimensão das atividades, que são realizadas sequencialmente ou simultaneamente no processo, com as informações que são trocadas nelas e entre elas pelos atores / pessoas; e, por fim, – os recursos, que é a dimensão que destaca os equipamentos, ferramentas, procedimentos, que apoiam essas pessoas / atores a executar as atividades para atingir as metas que se espera do referido processo. Trabalhar na forma de processo é um fenômeno natural, espontâneo, em uma empresa, desde que a estrutura hierárquica / funcional não seja excessivamente rígida, o que comprometeria essa filosofia. Processos podem ser desenhados, em parte, nos seus elementos mais palpáveis dadas pelas referidas quatro dimensões, no que se chama convencionalmente de representar via modelos de referência. Esses modelos podem ser construídos desde uma forma bem simples, pela observação do fenômeno e registro em uma folha de papel, até a realização de várias entrevistas, análise de documentos, discussão em grupos, e representação fazendo uso de sofisticados softwares de construção de modelos. Com isso se representa a situação atual (as is) do processo, e pode-se construir uma perspectiva de mudança do processo para o futuro (to be), sempre olhando as quatro dimensões e pensando em como melhorá-las. Os alunos são orientados a ler conteúdos teóricos básicos sobre essa visão de processos e sua representação, analisando exemplos de diagnósticos as is – to be feitos por profissionais e consultores mais experientes, lendo estudos de caso reportados nesse tema em empresas, que mostra a otimização obtida na gestão, de forma que posteriormente apliquem isso na disciplina, no trabalho final, já destacado no início e que será discutido adiante. 95 Essa capacidade de enxergar e modelar processos, mesmo que em um nível básico, coerente com o aspecto introdutório do tema típico de uma disciplina de graduação, é especialmente relevante para que se faça uma aplicação da gestão do conhecimento via processos na empresa, que é um enfoque mais efetivo e completo do que as abordagens convencionais de aplicação genérica da gestão do conhecimento. A disciplina é encerrada, em termos de conteúdo teórico, tratando então da gestão do conhecimento. Apresenta-se brevemente a evolução, desde seus primórdios, até se chegar à inserção contemporânea na administração da preocupação com o trabalho e os trabalhadores do conhecimento. Discutem-se os principais conceitos, as ferramentas fundamentais dessa gestão, e é dada especial ênfase a original visão da criação do conhecimento, os formatos tácito e explícito, e as quatro conversões do conhecimento provenientes da obra clássica de Nonaka e Takeuchi. É debatido com o aluno o potencial de se analisar cada uma das conversões do conhecimento – a Socialização, a Externalização, a Combinação, e a Internalização – que forma o ciclo completo de gestão do conhecimento, na especificidade de um processo empresarial, e não genericamente na empresa, nos seus departamentos e áreas. Como cada processo é o que efetivamente agrega valor a empresa e aos seus clientes, torna-se mais efetivo aplicar a gestão do conhecimento nele, otimizando a ocorrência de cada conversão do conhecimento nos elementos que forma a dimensão estratégica, organizacional, das atividades, e dos recursos, de um dado processo escolhido para uma intervenção e melhoria. Portanto, otimiza-se um processo pela transformação de As-Is para To-Be em suas dimensões, e adiciona-se a isso também o repensar da ocorrência das conversões do conhecimento nessas dimensões melhoradas. E assim, é justamente essa habilidade de mapear ou modelar um processo, vislumbrar possibilidades de transforma-lo, melhorando suas práticas e também as ocorrências das conversões e gestão do conhecimento, que constituem o trabalho prático final, em grupo, da disciplina, já apresentado no início de nossa descrição páginas acima. Os alunos escolhem o processo – em um local que trabalham ou de estágio, planejam a ida a campo para a coleta de informações via análise de documentos e entrevistas, apresentam para professor esse plano de ação em campo, vão para um piloto com o plano pré-aprovado, apresentam resultados preliminares para professor, retornam a campo para finalizar esse plano, fecham o trabalho com a redação final e a 96 apresentação para a classe. Depois, na prova de encerramento do curso, que é todo o conteúdo teórico e prático discutido, além do aluno ter estudado esse assunto nas aulas teóricas, participado de debates e práticas de cada aula, acessa conteúdos selecionados de trabalhos feitos por turmas passadas, e vai também estudar e comparar os trabalhos finais dos demais grupos com o seu. Foi a participação na construção da extensão universitária em informação tecnológica e industrial, mais especificamente como membro do primeiro quadro de formação do NIT/Materiais, de 1993 a 1996, que contribuiu com algumas das competências para iniciar a estruturação da área de ênfase do curso de BCI, ligado a informação científica, tecnológica, industrial e empresarial. Decifrar o pouco que havia de estudos e práticas nesses campos no Brasil, nos anos 90, e as experiências internacionais, e tentar aplicar em um serviço pioneiro que a UFSCar e a Engenharia de Materiais estavam implantando na época, foi um valioso exercício e campo de experimentação para o recém-formado engenheiro de materiais e mestrando em engenharia de produção, que na época sequer sonhava em ser docente universitário. Mas a abertura a novas e imprevistas oportunidades profissionais que cruzam nosso caminho fez com que o engenheiro se tornasse professor efetivo em um curso de Biblioteconomia, com o desafio de contribuir para um curso novo na UFSCar e com um curriculum original que repensava a formação do profissional bibliotecário, incorporando habilidades de trabalho em novos temas, atuações do profissional em novos espaços, dentro das emergentes possibilidades e desafios da sociedade e ciência da informação. Mais especificamente, minha principal meta nesse contexto era em pensar e estruturar um dos eixos de uma das áreas de ênfase do curso, das disciplinas de foco em informação industrial e empresarial, que resultaram nos conteúdos das disciplinas de ICE e GICPE já descritas. A pesquisa e a extensão, indissociável do ensino, foram influenciadas pelas minhas vivências e observações nos primeiros anos na BCI, ainda enquanto montava as primeiras ofertas das disciplinas na área para o qual fui contratado, e mesmo em outras áreas em que emergencialmente ministrei disciplinas devido ao quadro docente incompleto nos primórdios do curso. Meses depois da minha efetivação como docente do curso, em 1995, concluí meu mestrado, com uma dissertação que possuía uma temática não tão próxima à área de Ciência da Informação. Isso não ocorreria na empreitada seguinte de minha formação como pesquisador, o doutorado, onde consegui mesclar a temática que já havia adquirido experiência no mestrado, a 97 inovação tecnológica e o desenvolvimento de produtos, com uma área emergente no campo da gestão e na Ciência da Informação naquele momento: a Gestão do Conhecimento. Esse grande campo que explorei e desenvolvi originalmente no doutorado desdobra-se, desde sua defesa no ano de 2002, em múltiplos trabalhos de pesquisa e extensão, ao orientar alunos de graduação e pós, ministrar disciplina optativa no curso de BCI, como a de Gestão de Projetos em Unidades de Informação, e Gestão do Conhecimento e Aprendizagem Organizacional em cursos de especialização, e mesmo na produção de artigos e livros. A mescla da gestão do conhecimento com a inovação, o desenvolvimento de produtos e projetos, é a linha mestra que baliza desde então minhas atividades de pesquisa e extensão. Em tempo, uma atividade de extensão que em princípio não tem ligação direta com essa trajetória intelectual, mas foi fundamental para a formação humanística e visão social deste professor, é o projeto Rondon. Participando quatro vezes em editais do Rondon nacional, realizando o trabalho de professor coordenador de equipes de universitários de diferentes cursos da UFSCar (inclusive BCI), em atuações em pequenas cidades de baixo IDH – índice de desenvolvimento humano – no interior dos estados do Amazonas, Paraíba, Alagoas, e Pará, além de uma atuação como convidado do Rondon regional da UnB, no estado de Goiás, essa atividade extensionista, se foge do convencional nas minhas pesquisas e extensão, é por outro lado uma das lembranças mais marcantes nessa minha trajetória docente, seja por conhecer o dito Brasil profundo, seja pela intensa atividade com alunos de graduação nos locais mencionados, durante as duas semanas de cada missão. Uma palavra final. O autor formal e responsável por todo esse depoimento é esse que vos escreve, mas há cúmplices fundamentais nessa longa história. Todos os alunos e alunas que dividiram comigo as noites, e alguns sábados de manhã, nas salas ora quentes ora frias dos ATs. Mesmo muitas vezes cansados depois de um dia de trabalho ou estágio, foram pacientes com as minhas exposições e intervenções em aula, e sempre participativos. Desse efetivo e afetivo envolvimento, surgiram muitas das propostas, conteúdos, melhorias nas disciplinas, anteriormente relatadas. Meu muito obrigado a todos. Os feedbacks, mensagens recebidas ao longo de todos esses anos, de ex-alunos, parecem apontar para mais acertos do que erros nessa minha trajetória docente no curso de BCI. Mas sempre precisamos nos sentir incomo- 98 dados, não acomodados, e visar a novas criações, melhorias, repensar as práticas, de ensino, como também pesquisa e extensão. Que os próximos vinte anos sejam construídos nesse bom alicerce formado até aqui, mantendo e ampliando diálogos com ex-alunos, alunos, e colegas docentes de BCI e outras áreas afins, da UFSCar e de outras universidades. 99 Foto: Sílvia Moura DAS CIÊNCIAS NATURAIS AOS SABERES INDÍGENAS: UM RELATO DE VIAGEM MARIA CRISTINA COMUNIAN FERRAZ* Em comemoração aos vinte anos do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), trago para a apreciação de você, leitor, um relato de viagem ou deveria dizer, uma descrição sucinta dos caminhos e motivos que me levaram a dedicar quatorze anos de minha vida à formação de bibliotecários e a trabalhos de pesquisa e extensão na área de Ciência da Informação. Espero poder mostrar a você, que me honra com a leitura desse texto, que o sucesso desses projetos não se justifica, exclusivamente, à minha dedicação ou mesmo competência, mas sim a uma característica especial da área: a de conseguir dialogar perfeitamente com outras áreas do saber. Digo isso, pois, profissionais de diferentes áreas que procuram parcerias; pessoas que vivem em diferentes contextos sociais e que buscam a sua ajuda, encontram nela um porto seguro. Pretendo, com esse texto, agradecer à área de Ciência da Informação por ter me recebido tão bem e me ajudado a ser a profissional que hoje sou. O gosto pela ciência surgiu quando ainda menina, incentivado pelo meu pai, amparado pela minha mãe e estimulado pelos bons professores que tive. Nesse caminho, encontrei pessoas que amavam ciência e outras que não a apreciavam tanto, pois acreditavam que o conhecimento científico e a racionalidade fariam com que o homem perdesse a capacidade de sonhar. Entretanto, a Física, que me fez entender a difração de raios X, nunca tirou a minha vontade de * Doutora em Ciências (USP), Mestre em Física Básica (USP), Especialista em Administração e Análise de Negócios (CESSC) e Licenciada em Física (UFSCar). Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar no período de 2002 a 2016. Contato: cristina@ufscar.br. 101 admirar um céu estrelado; as linguagens matemática e computacional que aprendi, nunca interferiram em minha paixão por uma outra linguagem como a música. O prazer de viajar através da literatura nunca diminuiu face aos estudos que fiz sobre o espalhamento de elétrons por átomos. Marie Curie (CURIE, 2001, p. 341), grande mulher da ciência, nos ensina que a ciência encanta: A scientist in his laboratory is not only a technician: he is also a child placed before natural phenomena which impress him like a fairy tale. We should not allow it to be believed that all scientific progress can be reduced to mechanisms, machines, gearings, even though such machinery also has its own beauty. Neither do I believe that the spirit of adventure runs any risk of disappearing in our world. If I see anything vital around me, it is precisely that spirit of adventure, which seems indestructible and is akin to curiosity […] Ao resumir a minha vida acadêmica tenho a dizer que efetuei minha graduação no Departamento de Física da UFSCar e cursei o mestrado e o doutorado no Instituto de Física e Química da Universidade de São Paulo. Dediquei-me a estudar Física Matemática, Eletromagnetismo, Física Atômica e Molecular, Mecânica Quântica, Física do Estado Sólido, na universidade, entretanto, a música e literatura, por paixão e por empenho puramente passional e solitário. Enquanto o estudo disciplinar me transformava em uma especialista, o casamento entre ciência e literatura ampliava horizontes. A título de exemplo, segue um trecho de um belíssimo texto chamado O Fim do Mundo, onde o autor expõe, de forma impar, a perplexidade que sentiu aos sete anos de idade quando da passagem de “um cometa mal-humorado”. É impossível não se encantar com a visão do menino Carlos Drummond de Andrade (2002, p. 82): O cometa de Halley apareceu mais nítido, mais denso de luz e airosamente deslizou sobre nossas cabeças sem dar confiança de exterminar-nos. No ar frio, o véu dourado baixou ao vale, tornando irreal o contorno dos sobrados, da igreja, das montanhas. Saíamos para a rua banhados de ouro, magníficos e esquecidos da morte, que não houve. Nunca mais houve cometa igual, assim terrível, desdenhoso e belo. O rabo dele media [...] Como posso 102 referir em escala métrica as proporções de uma escultura de luz, esguia e estelar, que fosforeja sobre a infância inteira? No dia seguinte, todos se cumprimentavam satisfeitos, a passagem do cometa fizera a vida mais bonita. Em um determinado momento de minha carreira, entretanto, passei a me preocupar com o funcionamento da sociedade onde eu estava inserida, mais do que com os fenômenos físicos. Entender os mecanismos de geração, transferência e comercialização de novas tecnologias, os sistemas de gestão da propriedade intelectual, os problemas relacionados ao mau uso do conhecimento científico e tecnológico passaram a ocupar grande parte de meu tempo. A ciência, agora, deixava de ser uma ciência exclusivamente encantadora. Como exemplo do lado perverso do homem, trago um pequeno trecho do livro Il Sistema Periodico do químico Primo Levi (2014, p. 131), obra escrita em vinte e um capítulos, cada um com o nome de um elemento químico da tabela periódica, relatando fatos da vida do autor, alguns deles vividos em um campo de concentração. Um texto escrito por um ser humano sem nome, e sim um número: Che io chimico, intento a scrivere qui le mie cose di chimico, abbia vissuto una stagione diversa, è stato raccontato altrove. A distanza di trent´anni, mi riesce difficile ricostruire quale sorta di esemplare umano corrispondesse, nel novembre 1944, al mio nome, o meglio al mio numero 174517. Dovevo aver superato la crisi piú dura, quella dell´inserimento nell´ordine del Lager, e dovevo aver sviluppato una strana callosità, se allora riuscivo non solo a sopravvivere, ma anche a pensare, a registrare il mondo intorno a me, e perfino a svolgere un lavoro abbastanza delicato, in un ambiente infettato dalla presenza quotidiana della morte, ed insieme reso frenetico dall´avvicinarsi dei russi liberatori, giunti ormai ad ottanta chilometri da noi. La disperazione e la speranza si alternavano con un ritmo che avrebbe stroncato in un´ora qualsiasi individuo normale. Noi non eravamo normali perché avevamo fame. La nostra fame di allora non aveva nulla in comune con la ben nota (e non del tutto sgradevole) sensazione di chi ha saltato un pasto ed è sicuro che non gli mancherà il pasto successivo: era un bisogno, una mancan- 103 za, uno yearning, che ci accompagnava ormai da un anno, aveva messo in noi radici profonde e permanenti, abitava in tutte le nostre cellule e condizionava il nostro comportamento. Mangiare, procurarci da mangiare, era lo stimolo numero uno, dietro a cui, a molta distanza, seguivano tutti gli altri problemi di sopravvivenza, ed ancora piú lontani i ricordi della casa e la stessa paura della morte. Ero chimico in uno stabilimento chimico, in un laboratorio chimico (anche questo è già stato raccontato) e rubavo per mangiare. Se non si comincia da bambini, imparare a rubare non è facile; mi erano occorsi diversi mesi per reprimere i comandamenti morali e per acquisire le tecniche necessarie, e ad un certo punto mi ero accorto (con un balenio di riso, e un pizzico di ambizione soddisfatta) di stare rivivendo, io dottorino per bene, l´involuzione-evoluzione di un famoso cane per bene, un cane vittoriano e darwiniano che viene deportato, e diventa ladro per vivere nel suo “Lager” del Klondike, il grande Buck del Richiamo della Foresta. Rubavo come lui e come le volpi: ad ogni occasione favorevole, ma con astuzia sorniona e senza espormi. Rubavo tutto, salvo il pane dei miei compagni. Ao trilhar esse novo percurso, cursei Especialização em Administração e Análise de Negócios, e me dediquei a estudos ligados à gestão da inovação, culminando com pesquisas que tangenciavam temas relacionados à proteção do trabalho intelectual. Nessa hora surgiu a oportunidade de atuar como professora da UFSCar, na ênfase Informação Tecnológica e Empresarial no Curso de BCI, uma viagem que se iniciou em 2002 e que me permitiria em pouco tempo, ocupar, durante dois anos, o honroso cargo de coordenadora do curso. Iniciei meus trabalhos com estudos centrados na proteção do trabalho intelectual, com ênfase em patentes de produto e processo. Não sei dizer a você, leitor, quais os reais motivos que me levaram a alterar meu caminho. Algumas pessoas diriam que as decepções e as tristezas que encontramos no percurso da vida, sãos as responsáveis por desejarmos recomeçar em outro lugar. Eu prefiro acreditar que o desconhecido me motiva e encanta. Como diz Jorge Luis Borges (BORGES, 2008), descobrir o desconhecido não é uma especialidade de Copérnico. Todo homem é um descobridor. De coordenadora de curso de graduação, passei à coordenadora dos vestibulares da UFSCar em um momento singular da instituição. Nessa época foi criado o curso de Medicina, o campus da UFSCar em Sorocaba e o Pro- 104 grama de Ações Afirmativas que previa o ingresso, por reserva de vagas, de estudantes de escolas públicas, negros e indígenas. Os saberes indígenas, conhecimento tradicional estudado por mim quando das pesquisas sobre Propriedade Intelectual, iriam ingressar na instituição, trazidos pelos próprios povos indígenas brasileiros. Deparei-me com a chance de ter uma rara e grande oportunidade de aprendizado. A presença de representantes indígenas na universidade me deu forças para estudar e trabalhar em prol da proteção de seu legado. O entendimento do sistema brasileiro de propriedade intelectual, um campo de estudos que requer conhecimentos básicos na área jurídica, aos quais por muito tempo me dediquei, passaria agora a exigir de mim estudos mais detalhados de obras das áreas de Antropologia, História, Geografia. Uma nova visão de ciência surgiu, a ciência indígena, e a necessidade de leitura e releitura de autores, como Pierre Bourdieu, Boaventura de Sousa Santos, Paulo Freire, Vandana Shiva, Darrel Posey, dentre outros, se fez presente. A Ciência da Informação, que me recebeu em 2002 como professora para trabalhar com problemas relacionados à informação científica e tecnológica, me acolhia agora como pesquisadora de uma temática ainda não completamente explorada pela área. Trabalhar com a informação oralmente transmitida, preciosa para suas comunidades de origem, e, ao mesmo tempo, valiosa para diversos ramos da indústria e do comércio nacional e internacional, passou a ser, naquele momento, o meu novo desafio. Tratar da informação registrada era tarefa fácil para a área que me recebeu de braços abertos. Ao longo de vários anos de existência, a Ciência da Informação construiu um rico arcabouço teórico e metodológico, e desenvolveu ferramentas importantes para a seleção, a organização, a representação, a gestão, a disseminação, a recuperação e o uso da informação registrada em diferentes suportes, com o objetivo de atender às necessidades de públicos diversos. Uma ciência social aplicada, focada no atendimento de demandas informacionais de grupos que vivem em diferentes contextos sociais e que, por respeitar outras áreas do saber, conseguia dialogar com diferentes profissionais. Todavia, trabalhar com a informação não registrada, inovadora, transmitida oralmente por pessoas de culturas distintas, em situações muito diversas, ainda se apresentava como um campo novo de estudos. As pesquisas focadas no entendimento da problemática da proteção dos valores indígenas, que demandam metodologias distintas daquelas utilizadas nos trabalhos realizados por mim até então, foram sempre muito bem 105 recebidas pela área. Sob tão favoráveis circunstâncias – a possibilidade de trabalhar com alunos indígenas e com professores de diferentes áreas, as ferramentas da Ciência da Informação ao meu alcance, o apoio institucional sempre presente – meu trabalho com a informação não registrada avançou. Infelizmente, a falta de diálogo com algumas instituições responsáveis pelo aperfeiçoamento dos instrumentos e normas legais que regem a proteção desses saberes não me permitiu continuar neste mesmo ritmo, em especial na análise dessa problemática, penso que teria conseguido contribuir de forma mais efetiva nas discussões que dizem respeito ao uso desses bens coletivos, porque não dizer inovadores. Em vários momentos dessa jornada foi necessário voltar ao passado para tentar identificar as causas da visão equivocada que muitos têm sobre o que é ser indígena no Brasil hoje. Iniciei estudos sobre as viagens de expansão política, religiosa e científica que ocorreram nas Américas entre os séculos XVI e XIX e percebi que o século XVI ainda estava vivo na mente de muitas pessoas. A violência relatada nos textos do passado ainda estava presente nos dias de hoje. Para ilustrar minha preocupação, trago um trecho dos Diários da Descoberta da América (COLOMBO, 1984, p. 59): Tenho certeza, sereníssimas Majestades – diz o Almirante -, que sabendo a língua e orientados com boa disposição por pessoas devotadas e religiosas, logo todos se converteriam em cristãos; e assim confio em Nosso Senhor que Vossas Majestades se determinarão a isso com muita diligência para trazer para a Igreja tão grandes povos, e os converterão, assim como já destroçaram aqueles que se recusaram a professar a fé no Pai e no filho e no Espírito Santo. Na obra intitulada Viagem à Terra do Brasil de Jean de Léry (2007, p. 205), encontra-se, no capítulo intitulado Religião dos Selvagens da América, a visão do outro, descrita por um viajante que tinha como referência apenas os seus iguais: Embora seja aceita universalmente a sentença de Cícero, de que não há povo, por mais bruto, bárbaro ou selvagem que não tenha idéia da existência de Deus, quando considero os nossos tupinambás vejo-me algo embaraçado em lhe dar razão. Pois além 106 de não ter conhecimento algum do verdadeiro Deus, não adoram quaisquer divindades terrestres ou celestes, como os antigos pagãos, nem como os idólatras de hoje, tais os índios do Peru, que, a 500 léguas do Brasil, veneram o sol e a lua. Não tem nenhum ritual nem lugar determinado de reunião para a prática de serviços religiosos, nem oram em público ou em particular. Ignorantes da criação do mundo não distinguem os dias por nomes específicos, nem contam semanas, meses e anos, apenas calculando ou assinalando o tempo por lunações. Não só desconhecem a escrita sagrada ou profana, mas ainda, o que é pior, ignoram quaisquer caracteres capazes de designarem o que quer que seja. No que tange aos relatos de viagens científicas, merece destaque as obras do grande viajante Alexander von Humboldt. Cientista prussiano, escritor, poliglota, dedicou sua vida ao estudo da Botânica, Geologia, Química, Astronomia, dentre outras áreas. Apesar das leituras que fiz de suas obras terem sinalizado que Humboldt não conseguiu mudar sua visão eurocêntrica de mundo quando de sua viagem à América Espanhola entre 1799 e 1804, em nenhuma outra obra científica eu consegui encontrar tanta poesia. Segue um belíssimo fragmento do texto intitulado Estepes e Desertos, do livro Quadros da Natureza (HUMBOLDT, 1950, p. 28): Assim é que o homem, quer se vá buscar ao ínfimo grau de selvageria animal, quer aos ápices da civilização, prepara sempre para si mesmo uma vida cheia de provações. É assim que o viajante, percorrendo a superfície do globo, se vê perseguido, por mar e por terra, como o historiador no seu percurso através dos séculos, pelo espetáculo uniforme e desolador das dissensões da raça humana. Por isso aquele que, testemunha das lutas encarniçadas que dividem os povos, aspira aos gozos aprazíveis da inteligência, descansa com prazer o olhar na vida serena das plantas e nas molas misteriosas da força que fecunda a natureza; ou, cedendo à curiosidade hereditária que, há já milhares de anos, inflama o coração do homem, eleva os olhos, cheios de pressentimentos, para os astros que prosseguem, com harmonia inalterável, a sua eterna carreira. 107 Como é sabido por todos, em diversos momentos da história, muitos homens perderam sua liberdade ao ponto de não mais terem a condição de seres humanos. Esta versão, a da vítima, nem sempre chega ao conhecimento de todos. O contato com os alunos indígenas, grandes homens e mulheres sobreviventes, herdeiros de um período violento de nossa história, não me trouxe, apenas, a visão de uma outra ciência. Deu-me condições para compreender melhor um pouco da história de meu país. E para mostrar a você, leitor, alguns de meus trabalhos na área de Ciência da Informação, relacionados direta ou indiretamente à proteção e valorização dos saberes dessas comunidades, trago algumas ações realizadas com sucesso: a) Oferta de disciplinas de graduação – No que tange às disciplinas de graduação, quatro delas merecem destaque: Atividade Curricular de Integração entre Ensino, Pesquisa e Extensão denominada Propriedade Intelectual, aberta a todos os cursos de graduação da UFSCar, que trata de conceitos básicos relacionados à propriedade industrial e ao conhecimento tradicional, passando pelo direito autoral e pela proteção de outros ativos intangíveis; a disciplina Educação, Ciência e Tecnologia Indígenas que trabalha com as semelhanças e diferenças entre os saberes advindos da aplicação do método científico (da ciência hegemônica ocidental), e os saberes ditos tradicionais, oriundos das comunidades locais brasileiras; Transferência e comercialização de tecnologia, que tem como objetivo analisar os problemas relacionados à geração e comercialização de tecnologia e seus diferentes mecanismos de proteção; a disciplina Informação para Negócios Sustentáveis, que é focada na análise dos conflitos socioambientais relacionados aos processos de inovação tecnológica e seus diferentes mecanismos de disseminação, proteção e uso, objetivando a construção de uma sociedade sustentável (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS, 2014). Todas essas disciplinas trabalham direta ou indiretamente com questões relacionadas à gestão da ciência e da tecnologia, com o uso responsável do conhecimento científico e com o respeito a outras formas de saber. b) Criação de um grupo PET (Programa de Educação Tutorial) exclusivo para alunos indígenas – O “Grupo PET/Saberes Indígenas” criado em 2010, foi o resultado de um longo trabalho de construção pedagógica que se iniciou quando da entrada dos primeiros alunos indígenas 108 em 2008. Submeti uma proposta da criação de um Grupo PET focado na proteção e na valorização dos saberes das diferentes culturas indígenas brasileiras em atendimento a um edital do Ministério da Educação e fui aprovada, alcançando o terceiro lugar dentre os projetos apresentados. O Grupo PET Saberes Indígenas completa seis anos de existência em 2016 tendo recebido indígenas dos povos Mayoruna, Terena, Piratapuya, Pankararu, Atikun, Umutina, Xukuru de Ororubá, Xavante, Surui, Baré, Kaingang, Kalapalo, Tukano, Rikbaktsa, Kambeba, dentre outros. c) Organização de eventos sobre conhecimento tradicional indígena – Com relação a eventos, o projeto intitulado Outras Sociedades, Outros Saberes iniciou suas atividades em 2012. Escolas públicas, bibliotecas universitárias, creches e outros espaços culturais receberam alunos indígenas para uma conversa sobre o que é ser indígena no Brasil hoje. Contação de histórias indígenas em português para crianças até seis anos, contação de histórias em língua indígena para jovens estudantes da educação básica, exposição sobre os direitos dos povos indígenas, dentre outros assuntos, atingiram um público que, em sua maior parte, desconhecia que o Brasil possuía culturas indígenas ainda vivas. Depois de mais de dez anos de trabalho considerei que minha atuação na graduação estava consolida. Faltava-me, apenas, uma atuação mais efetiva na pós-graduação. Com a criação do Programa de Pós-graduação em Gestão de Organizações e Sistemas Públicos da UFSCar, pude vislumbrar a possibilidade de retomar projetos de meu interesse, agora na área de Administração. Nesse novo programa de pós-graduação, onde tive o privilégio de ser a primeira coordenadora eleita, criei a disciplina Propriedade Intelectual, que analisa no âmbito da Administração Pública, a proteção do trabalho intelectual de diversos grupos, inclusive daqueles culturalmente ricos, mas economicamente desfavorecidos. Com o ingresso nesse programa de pós-graduação, dei por encerrada esta minha jornada. Para finalizar esse relato, agradeço imensamente à área de Ciência da Informação por ter me acolhido nesses últimos quatorze anos de minha vida profissional. Tenho clareza que o sucesso que tive não foi devido exclusivamente à minha dedicação e capacidade. A área que me recebeu com carinho tem uma característica singular: é capaz de dialogar com profissionais de vá- 109 rias áreas, pois respeita as diferentes formas de ver, sentir, entender, viver e contemplar o mundo. Como pode perceber não penso em jogar fora o passaporte nem desarrumar as malas, quero ainda a chance de poder continuar transitando em outras áreas, e espero ser tão bem recebida por elas como fui pela área que hoje homenageio. Desejo que você, caro leitor, também possa ter a possibilidade, se já não a tem, de trabalhar com aquilo que gosta, e seguir não apenas um, mas vários caminhos ao longo da vida, sempre que possível, na companhia de pessoas queridas. Pois não importa o destino ou rota – uma linha reta sem obstáculos, ou um caminho cheio de curvas, subidas e descidas – tudo será muito mais agradável se você tiver ao seu lado pessoas que sintam prazer em estar com você. Com elas, e por elas, é possível percorrer qualquer caminho. Referências ANDRADE, Carlos Drummond. A bolsa e a vida. Rio de Janeiro: Record, 2002. BORGES, Jorge Luis. Atlas. Buenos Aires: Emecé, 2008. COLOMBO, Cristóvão. Diários da descoberta da América: as quatro viagens e o testamento. Porto Alegre: L&PM, 1984. CURIE, Eve. Madame Curie: a biography. New York: Da Capo Press, 2001. HUMBOLDT, Alexander von. Quadros da natureza. São Paulo: W. M. Jackson, 1950. v. 1. LÉRY, Jean de. Viagem à terra do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 2007. LEVI, Primo. Il Sistema Periodico. Torino: Einaudi, 2014. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS. Projeto Pedagógico de Curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da informação da UFSCar. São Carlos, 2014. Disponível em: http://www.prograd.ufscar.br/projetoped/PPP_BCI_UFSCar.pdf. Acesso em: 11 set. 2016. 110 Foto: Sílvia Moura ENTRE O QUERER SER E O SABER: TRAJETÓRIA DE UMA VIDA, UMA PROFISSÃO, UMA PAIXÃO LUCIANA DE SOUZA GRACIOSO* Era uma vez, em um reino não muito distante, um vilarejo chamado Flórida Paulista. Localizada no oeste do Estado de São Paulo, com pouco mais de 10.000 habitantes. Cidade tipicamente do interior. Praça, sorveterias, algumas carroças circulando entre os carros, quermesse na igreja, escolas públicas. Nasci e cresci lá! E lá também morou minha madrinha, Zélia Nilva, bibliotecária. Ela havia se formado na UNESP em Marília, na primeira turma daquele curso. Estava deslumbrada com a área e com as oportunidades de emprego que teve. Não precisou muito para ela me convencer a prestar o curso quando entrei na adolescência. E assim, aos 17 anos, fiz o vestibular e no ano seguinte, arrumei as malas para me mudar para Marília. Ficaram em Flórida, minha mãe Jocelina (in memorian), meu pai João Dalberto, meu irmão Juliano (in memorian) e minha irmã Ana Maria (in memorian). Todos, cada qual a sua forma, me incentivaram e me fortaleceram para esta jornada. Minha mãe que me motivou acreditando que eu estaria construindo minha liberdade. Meu pai que me motivou acreditando que eu estaria garantindo meu futuro. Meu irmão mais velho que me motivou acreditando que eu seria uma cientista e minha irmã mais nova, que possuía uma síndrome degenerativa, que me motivou simplesmente com seu olhar. Passado o período de estranhamento típico de qualquer grande mudança, nasceu o que viria a ser * Doutora em Ciência da Informação (IBICT), Mestre em Biblioteconomia e Ciência da Informação (PUCCAMP), Especialista em Uso Estratégico das Tecnologias de Informação (UNESP) e Bacharel em Biblioteconomia e Documentação (UNESP). Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 2004. Contato: luciana@ufscar.br. 112 uma de minhas maiores paixões: a biblioteconomia. Fiz tudo o que pude para aproveitar o curso e nessa busca constante de entender e me envolver com a área, cheguei aos estudos da linguagem. Fiz meu trabalho de conclusão de curso sobre a avaliação de linguagens documentárias na Base de Dados Lilacs, sob orientação da Profa. Mariangela S. L. Fujita, minha primeira fonte inspiradora. Foi um caminho sem volta. Nunca mais deixei de me intrigar com as sutilezas e as forças da linguagem. Nunca mais consegui pensar a informação, o documento, o individuo e a sociedade, sem considerar a linguagem como sendo um dos seus elementos estruturantes. Depois de formada, rapidamente consegui um emprego, em uma faculdade privada. E foi aquela compulsão: construir, arrumar, organizar, selecionar, atender, registrar, avaliar. Tudo ao mesmo tempo agora. Foram 11 visitas do MEC em dois anos de trabalho. Bibliotecários de faculdades privadas entenderão. Mas foi uma alegria. Era isto, alegria. Fiz neste tempo uma Especialização na UNESP, sobre uso estratégico de tecnologias da informação. Sentia que não conseguia largar a pesquisa. Algo tinha acontecido durante o processo de produção de minha monografia. Algo tinha acontecido com a minha forma de querer saber das coisas. E assim, com 21 anos, entrei no mestrado em Biblioteconomia e Ciência da Informação, na PUC/Campinas. Desenvolvi uma pesquisa sobre a produção e a disseminação das estatísticas públicas no Brasil, orientada pelo Prof. Paulo Martino Jannuzzi, grande pesquisador e professor. Outro caminho sem volta. Agora, além de investigar os mecanismos que regem os usos da linguagem para produzir e sistematizar as estatísticas públicas, passei a ponderar também, sobre os impactos sociais decorrentes dos usos destas estatísticas a partir do uso que se faz da linguagem. Neste tempo, tive outra experiência decisiva em minha vida: o estágio de docência no ensino superior. Tive a honra e a oportunidade de ser orientada e motivada pela Profa. Dra. Nair Kobashi, e assim entrei em uma sala de aula no ensino superior, como docente, pela primeira vez. Já havia sido professora de catequese entre os 14 e 16 anos, também sou filha de professores de escola pública. Sentia-me cobrada por mim mesma, a fazer tal teste. Eis que se inicia mais um caminho sem volta. Oscar Wilde disse uma vez que escolhia seus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Teria que ter brilho questionador e tonalidade inquietante. Pois bem, senti isto ao entrar na sala de aula. Aqueles olhares... Senti ao mesmo tempo medo, adrenalina, insegurança, ansiedade. Não foi fácil e ainda não é. Mas encontrei aquilo que nem sabia muito ao certo que estava procurando. Acho 113 que encontrei minha vocação, seja lá o que isto for. Havia feito aqueles testes psicológicos na escola, para verificar minhas aptidões... não quis acreditar neles. Tinha recebido como resultado: carreira – Magistério e também Terapia Ocupacional. Fazia sentido, era meu contexto de vida, minhas experiências mais próximas, minha realidade. E eis que quando entrei em sala de aula pela primeira vez, tudo pareceu fazer um grande sentido. Depois deste estágio inicial na docência passei a assumir, como professora contratada da PUC, as disciplinas do eixo de Representação Temática. Ao mesmo tempo, já tendo finalizado o mestrado, entrei no concurso como bibliotecária da Unicamp, no instituto de biologia. De dia era Bibliotecária, de noite era Professora. Nos intervalos, era aluna especial e aluna ouvinte de disciplinas do Instituto de Estudos da Linguagem da UNICAMP. Fiz três disciplinas lá. Estava estudando o que gostava, trabalhando no que gostava e dando aula do que gostava. Plenitude, era isto. Mas depois de dois anos neste movimento, passei a ponderar que precisaria fazer uma opção para me dedicar melhor a uma destas frentes. Decisão difícil, complexa. Lembro ter feito a novena de Nossa Senhora Desatadora dos Nós na época. Me ajudou! Em 2004 abriu uma vaga excepcional na UFSCar, para o Departamento de Ciência da Informação, para o eixo de disciplinas de representação temática. Minha primeira visita a São Caros foi no dia do concurso. Me perdi. Mas cheguei em tempo. Era o momento. E deu certo! Dois meses depois de assumir a vaga, em abril de 2004, lembro-me do colega Prof. Sérgio Silva, que era o chefe de Departamento da época, dizer: – Agora precisa entrar no doutorado, e sorriu. Eu, quase chorei. Vamos então. Neste mesmo ano, 2004, abriu um processo seletivo no IBICT/UFF no meio do ano para mestrado e doutorado. Cogitei arriscar. Mas precisava identificar aquele que viria a ser o problema central e aglutinador de todos os demais questionamentos que eu já vinha desenvolvendo em relação às práticas profissionais e de pesquisa na área, para escrever meu projeto, a minha Tese. A única certeza que tinha é que esta problematização estaria vinculada aos estudos da Linguagem. Mais quais? Comecei uma peregrinação literária revisitando e conhecendo autores e teorias. Passando pelas teorias de aprendizagem de J. Piaget e L. Vygotsky, pela Semiótica de C.S. Peirce, pela Linguística de F. Saussure, pelo Discurso de Foucault, e tantos outros. As semanas passavam, os prazos apertavam. Eu já estava cega, não conseguia mais enxergar possibilidades. Fui até a feira do livro da Edufscar, daquele ano, passear nos corredores. E neste 114 passeio aleatório, mas interessado, encontro o que seria, não mais um caminho sem volta, mas o meu ponto de não retorno. Encontrei as obras de L. Wittgenstein. Estava com dinheiro para comprar apenas um livro, e optei pelo Tratactus-Logico-Philisophicus (1921). Foi uma leitura compulsiva, agonizante e reveladora. Dúvidas, muitas dúvidas e algumas intuições. Investi em seu segundo livro dias depois: As Investigações Filosóficas (1953). Foi muita desconstrução. Via nitidamente as relações destas duas correntes do pensamento de Wittgenstein relacionadas às principais correntes de pesquisa da Ciência da Informação. Não conseguia explicá-las. Senti a angústia típica e necessária para configurar uma problematização de pesquisa. Comecei a investigar então, sobre Wittgenstein. E mal sabia eu, recém chegada na UFSCar, que estava em um dos principais polos de pesquisa sobre o autor, na América Latina. Comecei deliberadamente a participar de palestras, de congressos, de lançamentos de livros, e até mesmo tive a honra de assistir algumas aulas com o Prof. Bento Prado Júnior. As angústias e as dúvidas só aumentavam. Havia uma lacuna muito grande no meu repertório. Faltavam-me conceitos, faltava-me elasticidade, faltava-me ar. Tive então que usar o pouco que tinha para redigir o projeto, juntar todas as peças que vinham se formando ao longo dos anos desde a graduação. E assim, elaborei um Projeto sobre “Filosofia da Linguagem e Ciência da Informação”. Fiz a maratona do Processo Seletivo no Rio de Janeiro e em Niterói. Foram 5 dias de provas, cada uma em uma semana, cada prova em uma faculdade, todas as etapas eliminatórias. Mas deu certo. Passei! Em primeiro lugar! Porque contar isto? Porque isto me pesou – foi um misto de alegria e insegurança. De não corresponder às expectativas e de saber o quanto eu não sabia sobre o que eu teria me disposto a saber. Mas mais um encontro foi providencial. Pude ter a honra mais uma vez, de ter como guia e norte, a Profa. Dra. Maria Nélida González de Gomez. Viajava todos os domingos, às 22h, com o ônibus da empresa Reunidas, para o Rio de Janeiro. Ficava no Rio de Janeiro, hospedada em albergues, todas as segundas, terças e quartas, para assistir as aulas. Ficava em São Carlos todas as quintas, sextas e sábados, para dar aulas. O percurso estava pesado, cansativo, caro. Foram mais de 100 viagens ao Rio de Janeiro. No final do percurso, consegui um afastamento direto, que me permitiu finalizar a Tese, com alguma dignidade. Passados 10 anos da defesa do Doutorado, segui então, para o pós-doutoramento, feito junto a Universidade de Coimbra, na Faculdade de Letras, sob a supervisão da competente amiga Dra. Maria da Graça 115 Melo Simões (in memorian). Lá, nos mares de Camões e Pessoa, continuei a aprender sobre a Linguagem. Nestes percursos, desde a graduação, muitas coisas aconteceram, coisas boas, e fatalidades, como a morte de minha irmã ao final de minha graduação a morte de meu irmão ao final de meu doutorado, a morte de minha mãe, durante o pós-doutorado. Fatalidades que também serviram de dispositivo para continuar meu percurso. Vida, pesquisa, trabalho, Sentimentos. Admiro aqueles que conseguem separar bem tudo isto. Eu não. Hoje sou Mãe da Ananda e de Alanis, as flores que colorem e perfumam minha vida, e casada com o Davi, grandes amores. Mas ao mesmo tempo agora sou professora na UFSCar, no Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação e professora no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação na UFSCar. Estas coisas acontecem juntas. Desde 2004, ano em que ingressei na UFSCar, foram muitos os aprendizados, muitas as disciplinas ofertadas, muitos estudantes queridos, muito trabalho. Foram quatro anos a frente da Coordenação do Curso de graduação, anos que me proporcionaram uma releitura maravilhosa sobre nossa área, sobre os seus limites e alcances, sobre sua ideologia e missão. São muitos os conflitos também. Mas tudo bem, também. Fato é que acredito plenamente na sincronicidade de todos os movimentos do universo, de todos os encontros e desencontros, no encontro de todos os saberes, nos cabendo apenas estar atentos aos sinais e as oportunidades que nos permitam fluir e alimentar o fluxo de todas as ações. Deste modo, hoje, a UFSCar, é o melhor lugar que tenho para estar. Assim, dedico agora algumas páginas, a descrever de modo um pouco mais técnico, as ações que tenho desenvolvido nesta instituição, e que são o reflexo e também a projeção de todo este percurso ora apresentado. Sobre os Estudos da Linguagem e a Ciência da Informação Quando nos dispomos a fazer uma Ciência da Informação, nos propomos, ao mesmo tempo, nos envolver diretamente com as Ciências e as Filosofias da Linguagem. Da mesma forma com que precisamos nos dedicar, enquanto cientistas da informação, a compreensão dos fenômenos, dos processos, dos fatos e das relações envolvidas com a informação, de modo amplo, homogêneo, horizontal e articulado, sem nos atermos a correntes es- 116 tabelecidas a priori, também precisamos desvendar e alcançar as mais variadas compreensões sobre a linguagem. A linguagem é o instrumento que nos permite dizer sobre dados, informação e conhecimento. Ela é transversal a todos estes conceitos. É instrumento que subsidia as pesquisas e a construção de ferramentas de apoio a representação da informação seja em uma abordagem temática ou descritiva. É recurso para a construção de linguagens documentárias, para classificação de assunto, para construção de ontologias e folksonomias. Serve como de dispositivo para a busca de fontes de informação, para os cálculos bibliométricos e cientométricos. É elemento mediador que vincula o serviço de referência ao usuário. É principio, meio e fim. Este preâmbulo se faz necessário, pois esta compreensão interdisciplinar e elástica sobre as relações da linguagem com os estudos da informação é que sustenta atualmente a vinculação da disciplina “Estudos da linguagem em Biblioteconomia e Ciência da informação” (ELBCI) na área de Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação, prevista no Projeto pedagógico de Biblioteconomia e Ciência da informação da UFSCar de 2013. Assim o escopo desta parte do texto girará em torno da tentativa de apresentar o percurso de construção de uma disciplina (ELBCI), descrevendo seu contexto de criação, sua atual estrutura e condução na graduação, seus desdobramentos e relações em Grupo de pesquisa e Projetos de extensão e por fim, sua abertura e ampliação de oferta junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PPGCI) da UFSCar. Tudo isto, tendo como base toda uma trajetória de vida anteriormente apresentada, que mesmo subjetivamente deve ter interferido nas formatações que serão apresentadas. Sobre os estudos da linguagem no Curso de Biblioteconomia e Ciência da informação da UFSCar Os estudos da linguagem fazem parte da matriz interdisciplinar da Ciência da Informação. Ora com maior ou menor ênfase, as relações entre a linguística, a semiótica, o discurso e a informação são refletidas nas grades curriculares dos Cursos de Biblioteconomia e nas Pós-graduações em Ciência da Informação no Brasil. Em pesquisa recente sobre “As relações interdisciplinares refletidas na literatura brasileira da ciência da informação”, Bicalho (2009) identifica e quantifica a ocorrência de pesquisas em periódicos da CI, sobre Semiótica/Semiologia e Linguística/ Terminologia no campo da CI. 117 Bufrem, em 2005, apresenta uma análise sobre “A relação inescusável entre linguística e documentação” feita a partir da obra de Moreiro González (2004). Enfatiza, em sua análise, a função da linguagem nos estudos da informação: “Seja utilizada livremente, como na linguagem natural, seja controlada por um sistema que a legitima para representar conceitos, a palavra converte-se em fim e meio para o autor, o leitor e o analista” (BUFREM, 2005, p. 89). Silva em 2010, faz uma análise das grades curriculares dos então 33 cursos de graduação em Biblioteconomia no Brasil e categoriza enquanto eixo interdisciplinar de ensino na categoria Linguística, Línguas, as seguintes disciplinas identificadas: Linguística Aplicada a Documentação; Linguística e Documentação; Semiótica e Ciência da informação; Língua Francesa; Língua Inglesa; Espanhol. Já Saldanha e Cervo, em 2014, desenvolvem pesquisa voltada a identificar e discutir a presença da linguagem nas matrizes curriculares dos cursos de pós-graduação brasileiros. Em 2006, Tálamo e Lara, elucidaram as relações da linguagem com a CI no artigo: O Campo da linguística documentária, sendo que o termo “Linguistica documentária” (ou linguística documental) foi originalmente cunhado por García Gutierrez em 1990 e esta centrado na proposição de transformar “conteúdos registrados em elementos estruturados” (TÀLAMO; LARA, 2006). Kobashi em 2008, descreve os “Fundamentos semânticos e pragmáticos da construção de instrumentos de representação da informação”. Neste trabalho a autora não só situa a linguagem como instrumento para representar o conhecimento inscrito como também a coloca como elemento essencial para promover interação entre usuário e dispositivo de informação (KOBASHI, 2008). As pesquisas até então citadas não almejam representar a totalidade das correntes já desenvolvidas no que tange as relações entre os estudos da linguagem e a informação. Trata-se de pesquisas que se dedicaram a olhar para o campo da CI seja no contexto da Graduação, da Pós-graduação ou das linhas de pesquisa, analisando o escopo e a abrangência destas relações. Esta construção nos alicerça para podermos justificar a proposta feita de alteração de disciplina na matriz curricular do Curso BCI UFSCar, ocorrida em 2013, convertendo a disciplina “Linguística e Documentação” a disciplina “Estudos da linguagem em Biblioteconomia e Ciência da Informação”. O propósito desta reformulação disciplinar esta intimamente calcada a compreensão e também comprovação científica, de que não só a linguística, como também outros ramos dos estudos da linguagem, se relacionam com a informação, e não somente com a documentação. A seguir apresentamos as 118 ementas das disciplinas tal como apresentadas nos Projetos Pedagógicos do Curso de Biblioteconomia e Ciência da informação em 2004 e em 2013: Quadro 1 – Comparação de ementas das disciplinas nos Projetos Pedagógicos. Grade curricular 2004 Grade curricular 2013 Linguística e Documentação Estudos da linguagem em biblioteconomia e ciência da informação Ementa Ementa: Teoria da comunicação, linguagem natural Linguística; sociolinguística, filosofia e linguagem artificial, sistema lingüístico: da linguagem, teoria da comunicação, Níveis de análise lingüística, convenção linguagem natural, linguagem artificial; e signo lingüístico, sincronia e diacronia, signo, significante, significado, contexto, sintagma e paradigma, funções da referência, funções da linguagem, sintaxe, linguagem, referência, sentido, denotação, semântica e pragmática, relações de conotação, campos semânticos, polissemia sentido. Linguagem como artefato cultural, e ambigüidade, relações de sentido: comunicativo e tecnológico (PROJETO hierárquico, de equivalência, associativa PEDAGÓGICO, 2013). (PROJETO PEDAGÓGICO, 2004). Fonte – A autora (2016). É possível identificar, a partir do conteúdo das ementas das grades de 2004 e de 2013 que a Linguística continuou sendo considerada, mas somada a outras abordagens de estudo da linguagem, que estão além da perspectiva estruturalista. Isto por corroboramos com a ideia de que a linguagem esta intrinsicamente relacionada com todas as disciplinas que alinham e formalizam o campo da CI. Outro aspecto a se ponderar nesta transição é o fato de que até então, antes da reformulação curricular, a disciplina Linguística e Documentação foi majoritariamente ofertada pelo Departamento de Letras, por docentes de Letras. Este aspecto, que por um lado reforçava a qualidade do ensino da disciplina e de suas especificidades, também restringiam em alguma medida, as discussões e estabelecimento de relações com as problematizações e aplicações na BCI. Neste sentido, antes mesmo da formalização da reformulação curricular, a disciplina passou a ser ministrada pelo DCI, sob responsabilidade da Profa. Nádea Regina Gaspar e a partir da reformulação curricular e da concomitante aposentadoria da referida docente, passou a ser ministrada por mim, que tinha acabado de retornar do doutorado, defendido no IBICT/UFF, 119 sob orientação da Dra. Maria Nélida Gonzalez de Gomez, na linha de Epistemologia e estudos históricos da Ciência da Informação. A tese defendida, intitulada: “Filosofia da linguagem e Ciência da Informação: jogos de linguagem e ação comunicativa no contexto das ações de informação em tecnologias virtuais” foi dedicada a defender a conexão entre os estudos da linguagem e os estudos da informação. Neste contexto, assumir o eixo de disciplinas dedicadas aos Fundamentos da Biblioteconomia, aos Estudos da linguagem e a Leitura e a Cultura, pareciam um percurso natural. Contudo é a disciplina ELBCI que conecta os interesses de pesquisa, de ensino e de extensão e diante disto é que nos dedicaremos a ela nesta parte do capítulo. O Grupo de Pesquisa, credenciado no CNPq, entitulado “Pragma: estudos pragmáticos em Ciência da Informação”, tem com objetivo concentrar e sistematizar a produção de trabalhos e orientações relacionadas a pragmática e sua relação com os estudos informacioanis. O contexto de pesquisa do Grupo, tal como descrito no Diretório, é o de que: Apoiados em referencial teórico da filosofia da linguagem pragmática, para refletir o contexto dinâmico e fluído de produção, registro e circulação de saberes, desenvolvemos pesquisas sobre diferentes fenômenos, objetos e ações que envolvem a informação, a tecnologia e a educação. Como campo empírico para nossas observações, análises e discussões, estudamos espaços científicos e sociais de construção e significação da informação promovidos em diferentes ambientes. Neste panorama, ações de informação de diferentes gêneros se estabelecem e distintas e interconectadas redes de informação se configuram. Estas novas configurações sugerem outras posturas epistêmicas, outras perspectivas metodológicas, diferentes caminhos de intervenção. Somente a partir de pesquisas e do desenvolvimento de atividades nestas frentes é que se promoverá o desenvolvimento de estratégias que resultem em melhorias no que diz respeito a produção, acesso e uso da informação e da educação, mediadas por tecnologias (PRAGMA, 2012). Neste grupo são reunidos alunos de graduação, bibliotecários e mestrandos e doutorandos do Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade, e os novos mestrandos do Programa de Pós-Graduação em 120 Ciência da Informação (PPGCI) iniciado em 2016. Junto ao PPGCI, o seguinte projeto de pesquisa é desenvolvido: “Filosofia da linguagem Pragmática e Ciência da informação” com a seguinte ementa: As pesquisas informacionais, nos atuais cenários sociotécnicos e multiculturais, configurados mais recentemente a partir de plataformas interativas virtuais, ficaram sujeitas às condições cada vez mais próximas do uso cotidiano da linguagem. Assim, propomos a ampliação da matriz gnosiológica da ciência da informação em direção a uma perspectiva pragmática da filosofia da linguagem que trata do entendimento da significação da linguagem a partir de seu uso social. Nesse cenário, repensamos concomitantemente, a busca informacional desvinculada exclusivamente dos ambientes sistêmicos e o reposicionamento do sujeito nas ações de informação. A partir de análises e conjecturas sobre os processos de construção de sentido da linguagem e da comunicação sugeridos por diferentes teóricos, reconhecemos que a interatividade, os processos de colaboração e de cooperação que se estabelecem entre os intersujeitos por meio do uso cotidiano da linguagem, seriam propriamente as condições de validação das ações informacionais virtuais (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS, 2016). No PPGCI, a disciplina optativa ofertada é a “Filosofia da linguagem e Ciência da Informação”, que terá sua primeira turma em 2016. No bojo desta disciplina almeja-se enfatizar o viés pragmático de estudos da linguagem relacionando-os com as problematizações dos estudos informacionais. Mas é na disciplina ELBCI, ofertada na graduação, que são introduzidas a base teórica, conceitual e metodológica dos estudos da linguagem que alicerçam todos os demais desdobramentos de pesquisa desenvolvidos sobre o assunto. Por isto, nos debruçaremos neste capítulo, a relatar os principais percursos que fazem parte de sua oferta com o único propósito de compartilhar esta experiência de aprendizagem que ainda precisará amadurecer e se aperfeiçoar constantemente. 121 Percursos dos estudos da linguagem na Ciência da Informação na graduação: compartilhando uma experiência de ensino No terceiro semestre do Curso de graduação BCI, é ofertada a disciplina ELBCI – “Estudos da Linguagem em Biblioteconomia e Ciência da Informação”. De modo geral, procura-se apresentar nesta disciplina, em uma perspectiva teórica e também aplicada, algumas das principais correntes que perpassam os estudos de linguagem, para que ao longo das discussões em sala, e calcados em pesquisa do campo BCI, sejam estabelecidas as relações com os estudos da informação. No que diz respeito ao conteúdo, em um primeiro momento, são apresentados alguns trechos de alguns dos diálogos de Platão que tiveram a linguagem como ponto central: Assim, o convencionalismo foi discutido a partir de “Crátilo”; a natureza da proposição a partir do “Sofista”, a retórica, a partir de “Górgias e a escrita, a partir de “Fedro”. Na sequência são apresentados alguns dos textos de Aristóteles enfatizando três de suas principais concepções: a Retórica (comunicação), a Poética (metáfora) e a Política (poder). Ao final deste preambulo também são feitas discussões sobre a natureza do signo em Santo Agostinho enfatizando os problemas que dizem respeito à interpretação. Em um segundo momento, são apresentadas as principais teorias de aprendizagem que vigoram no campo da pedagogia e da psicologia principalmente. A ideia, neste momento, é a de apresentar as principais correntes, teorias e autores que já se dispuseram a pensar os caminhos que levam o ser humano a desenvolver e a utilizar a linguagem no processo de construção de seu conhecimento e de sua socialização. Como ponto de partida é apresentado o Behaviorismo e suas principais premissas lançadas e confirmadas, até certo ponto, por Burrhus F. Skinner. Em conjunto, é introduzida a hipótese do inatismo enquanto premissa de desenvolvimento da linguagem, proposto por N. Chomsky. Diferentes experiências são discutidas a luz destas hipóteses, no que diz respeito a serviços, produtos e instrumentos desenvolvidos nas práticas biblioteconômicas. Como exercício de fixação, os estudantes são convidados a analisar o Filme biográfico sobre Heller Keller, que detalha o processo de aprendizado de um tipo de linguagem desenvolvido especialmente para atender suas necessidades especiais. 122 Ainda no contexto das teorias da aprendizagem, são apresentados e discutidos dois outros autores, considerados antagônicos na literatura, mas que, ao mesmo tempo, são tidos como as principais referências sobre o assunto: J. Piaget e L. Vygotsky. Em Piaget damos ênfase ao seu cognitivismo construtivista e a sua epistemologia genética. Em Vygotsky apresentamos sua psicologia histórico-cultural ou psicologia socio-interacionista, com aprofundamento no conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal. Estas duas hipóteses são ventiladas em sala, de modo relacionado a exemplos cotidianos dos estudantes e, principalmente, a exemplos do contexto de trabalho de diferentes unidades de informação. Frente ao uso destas teorias como aporte para diferentes estudos do campo da CBI, autores e textos deste campo são igualmente debatidos, principalmente os que versam sobre “Mediação da informação” e “Estudos de usuários”. Como exercício de fixação, é apresentado o documentário “Genie”, que relata um caso de criança que se desenvolve em total isolamento social e material. A partir deste caso, as teorias piagetianas e vygotskyanas são contrapostas e analisadas. Esta primeira fase da disciplina tem como principal objetivo sensibilizar os estudantes sobre os desafios cognitivos, fenomenológicos e epistemológicos envolvidos nos estudos da linguagem. Na sequência, em um terceiro momento, são introduzidos os principais pensadores que se detiveram com mais ênfase aos estudos da linguagem propriamente. Para introduzir este momento, é feito um recorte temporal nos estudos da linguagem, tomando-se como ponto de partida a primeira virada linguística da filosofia, momento em que a linguagem ganha destaque nas discussões filosóficas e matemáticas. Neste momento, diferentes pensadores (como G. Frege, B, Russell, L. Wittgenstein) procuraram defender a necessidade de que se desenvolvesse uma linguagem pura e ideal que servisse de instrumento para o pensamento. Filosofia analítica e Positivismo lógico são algumas das nomenclaturas atribuídas ao conjunto de teorias que fundamentaram este movimento. Neste momento da disciplina é introduzido o Estruturalismo, a Semiologia, a Linguística de F. Saussure, expondo sua principal obra: “Curso de Linguística Geral”. Dada à amplitude e o uso constante dos aportes saussureanos nos estudos e nas práticas em BCI, são dedicadas algumas aulas a obra do autor dando evidência a exercícios que permitam a compreensão, principalmente, sobre as principais dicotomias sistematizadas pelo linguista. Sequencialmente, a segunda virada linguística da filosofia é apresentada, enquanto movimento que procura alargar as fronteiras da concepção sin- 123 tática e semântica da linguagem, introduzindo a sua compreensão pragmática, comunicacional e de uso. Concomitantemente na Europa e nos E.U.A estes estudos ganham força e os autores que mais se destacam neste percurso são: L. Wittgenstein no contexto europeu e C. S. Peirce no cenário norte americano. A Semiótica de Peirce, ou seu Pragmatismo, é amplo e complexo, mas de absoluta relevância nos estudos informacionais. Para introduzir o pensamento do autor, opta-se por apresentar a sua tríade semiótica: signo, interpretante e objeto – procurando analisar os desafios de sua “aplicação” nos estudos da informação. A obra “Investigações filosóficas” de Wittgenstein, que reflete seu segundo momento filosófico, é introduzida aos alunos dando ênfase a noção de linguagem enquanto uso (Jogos de Linguagem) proposta pelo autor. Ao final desta terceira etapa, após lançadas às teorias da linguagem mais recorrentes nos estudos da BCI, são desenvolvidas análises técnicas de instrumentos de representação da informação (textual, imagético, sonoro, dentre outros) e é discutida a predominância de determinadas teorias e metodologias na concepção e no uso de tais ferramentas. Como último módulo, são apresentados dois outros pensadores, que não se ocuparam exclusivamente da linguagem, mas também se dedicaram a ela, contudo, em uma perspectiva sociológica e política: M. Bakhtin e M. Foucault. O viés social e ideológico da linguagem defendido por Bakhtin, filósofo russo, é apresentado a partir de uma breve introdução a sua obra: “Marxismo e filosofia da linguagem”. Já as relações de poder sobre o qual os discursos são produzidos e também são produtores, são ponderadas a partir de breve menção a obra “A ordem do discurso” do filósofo francês, Foucault. Considerando a amplitude e a diversidade de teorias, correntes e obras que são apresentadas ao longo da disciplina, ao final, opta-se por solicitar como trabalho final, a sistematização e apresentação, a ser feita por grupos de alunos, de uma das abordagens apresentadas em sala, seja em formato de documentário, de construção de um site, ou de produção de uma monografia sobre o recorte escolhido, sempre dando ênfase aos estudos de BCI que se relacionam em maior ou menor grau, com as abordagens analisadas. Enfim, optou-se por fazer este breve relato de uma experiência docente, de sala de aula, com o único intuito de compartilhar uma experiência que ainda não sei ainda, em que medida, ela esta dando certo. Mas mesmo assim, mesmo ela estando inacabada e pouco formatada, optei por deixar registrado este relato, neste momento, mesmo porque ele é resultado de um percurso longo de investigação e de investimento pessoal no assunto. Ele é 124 resultado da crença de que os estudos da linguagem devem cada vez mais fazer parte do escopo e da abrangência da Biblioteconomia e da Ciência da Informação. Ele reflete, em alguma medida, uma gratidão ao Curso BCI da UFSCar, que possibilitou que a construção desta relação pudesse acontecer do modo como esta acontecendo. Acreditamos que as relações da Biblioteconomia e a Ciência da informação com os estudos da linguagem, lhe conferem humanidade, lhe colocam em contato com a sociedade, a cultura e os indivíduos. Edgar Morin, em sua obra sobre os 7 saberes necessários para a educação do futuro nos alerta para a necessidade de “reaprendermos a nossa própria condição humana”. Acredito que este exercício, passe pelo entendimento da linguagem. A linguagem é o elo que conecta as pessoas entre elas mesmas, entre elas e seus meios, entre elas e os sistemas. Entendemos a linguagem ora como instrumento, como veículo, como mensagem, como recurso, como representação, ou ainda, como ação. Entendemos a linguagem enquanto informação. Qual o limite e a diferença entre a linguagem, o signo e a informação? Em que medida, termos ou não clareza sobre isto, interfere em nossas pesquisas e em nossas práticas profissionais? Por que nos importa querer conhecer a linguagem, suas origens, fundamentos, sistemas e usos? São estas as questões que lançamos no início e no final das disciplinas, sem necessariamente termos que respondê-las. Isto não é uma consideração final Esta história, que teve início no reino não muito distante, esta em plena construção. Parte de um ciclo importante de minha vida começou no momento em que optei por fazer o curso de Biblioteconomia. Nele pude encontrar espaço para reconhecer questões que me fizeram querer pesquisar e investigar. A partir da Biblioteconomia cheguei aos estudos da linguagem. A partir dos estudos da linguagem, cheguei à docência e a UFSCar. E aqui, nesta Universidade, neste curso de Biblioteconomia e Ciência da informação que encontro, diariamente, uma motivação para trabalhar, estudar, aprender e ensinar, que não sei ao certo explicar. Deve ter a ver com a sincronicidade das coisas, que criam energias que naturalmente fazem com que elas simplesmente aconteçam. Hoje, faço uma releitura sobre ser bibliotecária, diferente daquela de 1994 quando ingressei no vestibular. Não sei se melhor ou pior. Penso que ao 125 longo de décadas atribuiu-se ao profissional da informação as funções que lhe são típicas de armazenar, organizar, registrar, catalogar, indexar, classificar, recuperar a informação. Hoje algumas novas atribuições também lhe são dadas, somos analistas de redes, gestores de conteúdo, arquitetos da informação. Mas outras competências lhe são ainda mais requeridas no atual cenário tecnológico de produção informacional; temos como incumbência sintonizar, harmonizar, sincronizar indivíduos, informação e tecnologia. Somente o elemento humano é e será capaz de amalgamar toda a dispersão que o excesso de informação e conteúdos tem promovido. Sejamos, mas do que nunca, mediadores, curadores, cuidadores dos fluxos de informação. Ouvimos com frequência, entretanto, que devemos ser flexíveis, criativos e principalmente, inovadores. Há algum tempo penso nestas características e no que elas representam e significam para nossa área. Hoje compreendo que um profissional da informação atualizado deve inovar sim, mas na forma de olhar, perceber, sentir as relações humanas, comunicativas, afetivas. São estas relações humanas que modelam o que a sociedade irá conceber como informação, conhecimento, cultura. A informação é um artefato cultural e é com isto que trabalhamos. Neste contexto, acredito que um dos comportamentos mais necessários no momento atual, a qualquer profissional, é o Comprometimento e é isto que devemos ter sempre em nosso horizonte mais próximo. Aproveito a oportunidade de escrever este texto para dedicá-lo a todos os alunos que tive, pela oportunidade de tê-los conhecido, pois eles me fizeram professora. Agradecer pelo brilho questionador e tonalidade inquietante de seus olhos, que fazem do Curso BCI da UFSCar, um curso melhor. Referências BICALHO, Lucinéia Maria. As relações interdisciplinares refletidas na literatura brasileira da ciência da informação. 2009. Tese (Doutorado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Ciência da Informação, Belo Horizonte, 2009. BUFREM, Leilah Santiago. A relação inescusável entre lingüística e documentação. Encontros Bibli: Revista Eletrônica de Biblioteconomia e Ciência da Informação, Florianópolis, v. 10, n. 19, p. 89-94, abr. 2005. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/ index.php/eb/article/view/1518-2924.2005v10n19p89/5502. Acesso em: 17 out. 2016. KOBASHI, N. Y. Fundamentos semânticos e pragmáticos da construção de instrumentos de representação de informação. DataGramaZero: Revista de Ciência da Informação , Rio de Janeiro, v. 8, n. 6, dez. 2008. 126 MOREIRO GONZÁLEZ, José Antonio. El contenido de los documentos textuales: su análisis y representación mediante el lenguaje natural. Gijón: Ediciones Trea, 2004. PRAGMA: estudos pragmáticos em Ciência da Informação. São Carlos, 2012. Disponível em: http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/5781724135118999. Acesso em: 17 out. 2016. SALDANHA, G. 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Projeto político pedagógico do curso de bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação. São Carlos,2012. Disponível em: http://www.bci.ufscar.br/publicacoes/documentos/projeto-pedagogico. Acesso em: 10 ago. 2016. 127 128 Foto: Waldeck Schutzer MEMÓRIAS COMO PRESENTES ZAIRA REGINA ZAFALON* A história não se faz no presente, mas ao se olhar para o passado. Assim, com esse olhar, é que me volto para as experiências que vivi e que me trouxeram para o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar (BCI/UFSCar). Rememorar tais lembranças que, apesar de individuais, estão embrenhadas com lembranças coletivas, com o intento de colaborar para a construção da memória social do curso de BCI/UFSCar faz parte de um projeto, submetido por mim por conta da comemoração dos 45 anos da UFSCar, intitulado “Memória do curso de BCI: entre lembrar e esquecer 20 anos depois!” Muito da minha história profissional se cruza com a história do curso de BCI/UFSCar. A opção por cursar Biblioteconomia foi feita no início de 1990, apesar de ter dúvidas sobre cursar História ou Geografia. Lembro-me, também, de que fiz vestibular pela Fuvest para o curso de Zootecnia, afinal, lidava com animais, dos quais sempre gostei, e começava com a letra Z! Lembro-me de quantas brincadeiras, tão desagradáveis à época, aconteceram por conta da inicial do meu nome. Optar por Zootecnia era quase que provar para o mundo que tudo bem ter a inicial com a letra Z! Não fui aprovada no exame vestibular e fui saber mais sobre o curso de Biblioteconomia, o qual conheci por meio de uma bibliotecária, a primeira com a qual tive contato próximo e que explicou-me que era necessário fazer um curso superior: Mayra Ribeiro Porto Ferreira, bibliotecária da Escola Estadual Álvaro Guião, onde cursei o 2º grau, com * Doutora em Ciência da Informação (UNESP), Mestre em Comunicação e Semiótica (PUC/SP), Especialista em Ensino Superior (Uninove), em Administração (ESAN) e em Sistemas Automatizados de Informação em Ciência & Tecnologia (PUCCAMP) e Bacharel em Biblioteconomia e Documentação (EBDSC). Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 2007. Contato: zaira@ufscar.br. 129 Habilitação em Magistério. Mesmo depois de diplomada como professora de ensino infantil e fundamental (agora denominado Fundamental I), não me adaptei à docência para as crianças. Essa experiência mostrou-me, ainda mais, que a opção pelo Bacharelado em Biblioteconomia era mais acertada do que a de cursar licenciatura em História ou Geografia. Iniciei os estudos em 1990 na Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos (EBDSC), vinculada à Fundação Educacional São Carlos (FESC), da Prefeitura de nossa cidade. Iniciado o curso, veio o encantamento por estudar no período da noite! Isso tudo era novo pra mim por conta do rigor de meus pais e porque as aulas terminavam às 22h45! Imaginem a ousadia, visto que tínhamos a liberdade de chegar até às 22h nos finais de semana! À sala só com mulheres já estava habituada (também havia sido assim no Magistério). Se não me falha a memória eu era a segunda mais nova da turma (Ana Cristina Garcia Camilo era a mais nova de todas nós). Colegas noivas, casadas, com filhos. E eu na fase da descoberta! A Escola funcionava no Campo do Rui Barbosa (atual FESC Vila Nery), onde também era ofertado o curso de Educação Física, em outra escola vinculada à FESC. Muitas oportunidades de aprendizado ocorreram no curso: o primeiro estágio voluntário, na Escola Estadual Arlindo Bittencour (de onde sou vizinha agora!), com duração de três meses; o estágio na Seção de Periódicos da Biblioteca Central (atual Biblioteca Comunitária) da UFSCar, com a Angélica Dupas, a Alzira Pedrazzani e a Maristela Cid Gigante, no período da manhã; o estágio no Laboratório de Aeronaves, da Escola de Engenharia de São Carlos, da Universidade de São Paulo, sob a orientação do Prof. Dawilson Lucato (Chefe do Laboratório) e da bibliotecária Terezinha das Graças Coletta (da Biblioteca), no período da tarde; a atividade de representante da Caixa Econômica Federal (CEF) para divulgação, orientação e envio de documentação do Crédito Educativo junto aos alunos da EBDSC. A correria para desenvolver as atividades das disciplinas, a obrigatoriedade de se fazer o curso de Datilografia, o carinho dos professores1, a vergonha de ter sido pega com cola, as brincadeiras entre as colegas são lembranças felizes e que fazem com que me sinta uma “contadora de histórias”. No decorrer do curso estavam sempre presentes as manifestações dos diretórios acadêmicos das duas escolas da FESC para que houvesse a cha1 As lembranças dos professores: Sonia Maria Trombelli, minha professora de Catalogação, Ademil Lopes, Elisabeth Márcia Martucci, Laila Haddad, Lilia Maria Soares Marmorato, Lourdes de Souza Moraes, Maria Cecília Villani Purquério, Maria Christina de Nogueira Nogueira, Maria Sallete Ramalho de Nogueira, Maura Ghislotti Duarte de Souza, Nilma Helena França Gilbertoni, Rosemeire Marino Nastri, Telma L. Peggorelli Olivieri. 130 mada “federalização dos cursos”. Era um movimento para que os cursos de Educação Física e de Biblioteconomia e Documentação fossem “incampados” pela UFSCar. Tive a oportunidade de presidir o Diretório Acadêmico no período de março de 1992 a março de 19932. Conclui o curso, e o título de Bacharel em Biblioteconomia foi concedido em 17 de dezembro de 1993. Não tinha muitas perspectivas de atuação profissional em São Carlos, por conta da falta de vagas, e também tinha a restrição para trabalhar em outra cidade. Foi então que, em março de 1994, fui contratada, como profissional autônomo, para desenvolver atividades no Laboratório de Máquinas-Ferramenta, da Escola de Engenharia de São Carlos, onde trabalhei por 4 meses. Participei, por incentivo de minha mãe, de dois processos seletivos: no SESI e na USP, com primeira colocação em ambos. Ah! O sonho de morar em outra cidade estava mais próximo! A convocação para trabalhar no SESI3 veio primeiro. Era em Campinas. O salário não era suficiente para pagar as contas do mês e o subsídio do meu pai era imprescindível (ele, já não queria que morasse fora, ainda tinha que contribuir para as despesas da casa!). A experiência era única: montar a biblioteca, em uma unidade recém inaugurada, em 1994, na Rodovia Santos Dumont. Passados seis meses e vem a tão sonhada vaga: trabalhar na USP! Em dezembro do mesmo ano começo a trabalhar na Seção de Processamento Técnico da Biblioteca Central da Escola Politécnica da USP (EP/ USP)4, sob a supervisão da notável profissional de catalogação com quem pude trabalhar: Junko Oura! Depois de um tempo passei a trabalhar na Biblioteca Setorial da Poli Elétrica, com a Neusa Yoscimoto, a melhor bibliotecária 2 3 4 Na tentativa de identificar, minimamente, o processo de “federalização” dos cursos de Biblioteconomia e de Educação Física da FESC para a UFSCar tive acesso a alguns documentos, dos quais destaco três: a) ofício, datado de 6 de junho de 1975, enviado ao Prof. Luiz Edmundo de Magalhães, Reitor da Universidade Federal de São Carlos, por Durval Augusto de Ulhôa Cintra, Secretário do Conselho de Curadores, com o seguinte teor: “De ordem do Senhor Presidente do Conselho de Curadores da FUFSCar, e atendendo à solicitação do Conselheiro Sérgio Mascarenhas, tenho a satisfação de encaminhar a Vossa Magnificência proposta daquel Curador no sentido de ser criado na Universidade Federal de São Carlos um Curso de Bacharelado na área de Biblioteconomia e Ciências da Informação”. b) documento enviado pela FESC, intitulado “Manifesto da Comunidade Escolar da Fundação Educacional São Carlos”, assinado pela Comissão de Coordenação, datado de 20 de maio de 1985, no qual consta: “[...] REIVINDICAMOS: A incorporação plena da Fundação Educacional São Carlos à Universidade Federal de São Carlos, pela melhoria das condições de ensino e pesquisa da Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos e Escola de Educação Física de São Carlos”. c) a Portaria nº 1149, de 7 de novembro de 1996, publicada no Diário Oficial da União, que “[...] aprova a transferência de mantença dos cursos de Biblioteconomia e Documentação e de Educação física da Fundação Educacional São Carlos para a Universidade Federal de São Carlos, sediadas na Cidade de São Carlos, Estado de São Paulo”. Trabalhei no SESI de maio a dezembro de 1994. Trabalhei no período de dezembro de 1994 a julho de 1996. 131 de referência com quem trabalhei! Por ter contato com tantos estudantes e pesquisadores aumenta a ânsia por estudar e participar de eventos. Lembro-me de um evento da área que aconteceria na Argentina e que gostaria muito de participar. Era um evento próximo ao feriado de 15 de novembro, Proclamação da República, e precisaria de dispensa de um dia de trabalho para estar presente; usaria o feriado e o final de semana para os outros dias de atividade no evento. A diretora da Biblioteca da EP/USP, Maria Alice Fernandes Carreira, não autorizou a minha justificativa para a ausência neste um dia e alertou-me que, caso eu fosse, sem que houvesse a autorização dela, correria o risco de ter descontados os dias de feriado e final de semana. Apesar de todas as oportunidades que tive na Biblioteca Central e na Biblioteca da Elétrica isso me motivou a mudar de unidade. Prestei novo processo seletivo na USP, desta vez para a Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA/USP)5. Fui aprovada em primeiro lugar e quem me deu a notícia foi a própria Diretora da Poli, Maria Alice. Na Biblioteca da FEA trabalhei também no Processamento Técnico, sob a supervisão de Sandra Maria La Farina e a companhia de Gisele de Oliveira. Foi um período de grande aprendizado tendo em vista a participação no processo de migração do Dedalus, banco de dados bibliográficos da USP, de um software proprietário para o Aleph, um software israelense de gestão integrada. Houve a oportunidade de receber capacitação para trabalhar com catalogação cooperativa com a OCLC, com o Formato MARC21, e a compreensão da colaboração e a vivência de trabalho em rede de bibliotecas. O momento de mudanças por conta de aplicações tecnológicas em bibliotecas foi a motivação para voltar a estudar. Matriculei-me no curso de especialização Sistemas Automatizados de Informação Científica e Tecnológica, na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUCCAMP). O interesse em adotar tecnologias nas ações profissionais aumentavam. Por curiosidade, respondi a um anúncio de jornal que procurava bibliotecário com experiência no Aleph. Candidatei-me e, dentre outros 8 candidatos, fui selecionada para assumir a chefia da Biblioteca da Escola Superior de Administração e Negócios (ESAN)6. A mantenedora, Fundação de Ciências Aplicadas (atual Centro Universitário da Fundação Educacional Inaciana “Padre Sabóia de Medeiros”, reconhecido como Centro Universitário da FEI), havia adquirido o software, porém, ainda 5 6 Trabalhei no período de agosto de 1996 a março de 2000. Trabalhei no período de abril de 2000 a julho de 2001. 132 não havia conseguido sucesso quanto ao funcionamento. O desafio era grande, a equipe reduzida, e a necessidade de dar um retorno institucional era marcante. Fizemos mapeamento de processos, definição de fluxos, análise de estatísticas de uso do acervo, administração de jornada de trabalho, e a meta estava definida: usaríamos o Princípio de Pareto, com a regra do 80/20, para começar o processo de catalogação compartilhada, uma vez que identificamos quais eram os materiais bibliográficos (20%) que circulavam entre 80% dos usuários. As dúvidas quanto ao melhor caminho para as atividades de gestão fizeram com que eu cursasse a segunda especialização, desta vez em Administração. Passado um ano, durante o período das minhas primeiras férias na ESAN, recebi o convite para trabalhar na Diretoria de Tecnologia de Informação de outra instituição de ensino superior, o Centro Universitário Nove de Julho (Uninove)7. Apesar de não ter formação na área, a experiência com os fluxos de automação da biblioteca e o gerenciamento da implantação do Aleph chamaram a atenção da instituição e fui contratada. Novas oportunidades de aprendizado e de colaboração. Desta feita o destaque profissional vai para Jairo da Silva, o melhor programador e gerenciador de servidores que conheço! Com ele aprendi a olhar o backoffice dos sistemas e a avaliar os dados. Foi nessa instituição que também tive a oportunidade de começar a trabalhar como docente em cursos de nível superior e nova experiência de aprendizagem acontece. É chegada a vez de outra especialização: Docência no Ensino Superior. Por inúmeras vezes sou questionada sobre o porque de três especializações (pós-graduação lato sensu) e não o mestrado (pós-graduação stricto sensu). A questão é que as oportunidades profissionais me levaram a fazer as escolhas de estudo na tentativa contínua de aliar teoria e prática. Trabalhei nesta instituição por quatro anos como bibliotecária de sistemas e por três anos como docente. Passado esse tempo e a falta de formação na área de Tecnologia, que não foi impeditiva para minha contratação, passou a ser um problema para a minha continuidade. Fui dispensada. O modo pelo qual tudo ocorreu não desejo que aconteça a ninguém! Ouvir que você não “serve mais” dá o tom de que, em vez de colaboradores, éramos objetos. A recolocação profissional como bibliotecária não ocorreu e a justificativa era sempre a mesma: a questão salarial8. 7 8 Trabalhei no período de julho de 2001 a setembro de 2004, como bibliotecária de sistemas, e de março de 2002 a fevereiro de 2005 como docente. O salário recebido em 2004 para as funções de bibliotecária de sistemas era maior do que o de docente, em 2012, mesmo tendo concluído o Mestrado e o Doutorado. 133 Foi neste período também que eu havia sido aprovada como aluna do curso de Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PPGCOS/PUCSP). O ânimo para os estudos não superavam os sentimentos de derrota e, tampouco, a preocupação com o sustento do Pedro, meu filho, então com 6 anos. O desafio a ser superado teve, novamente, o alento da família, com quem pude contar emocional, fraternal e financeiramente. Reconheço que não pude dedicar-me da forma que o PPGCOS e o Prof. Eugênio Trivinho, meu orientador, mereceriam ou requeriam. Tive, inclusive, a oportunidade de ter bolsa de estudos, uma vez que os cursos na PUC são pagos. O reconhecimento do profissionalismo do Prof. Trivinho, e a gratidão que sinto por ele, são imensuráveis uma vez que foi aí que aprendi o cuidado que uma pesquisa acadêmica deve ter não só com o rigor dos métodos científicos, mas com a precisão vocabular e, mais que isso, com o respeito às ideias dos autores que subsidiam nossas pesquisas. O título de Mestre foi obtido em dezembro de 2006. Foi também em 2006, em agosto, que comecei a ministrar aulas no curso de Biblioteconomia do Unifai9, Centro Universitário Assunção, em São Paulo. Assumi a responsabilidade de ministrar disciplinas voltadas à catalogação, à normalização e ao planejamento e elaboração de bases de dados. Fui docente no Unifai ao longo de dois anos, sendo que, por um ano e meio, conciliei com as atividades docentes na UFSCar, ainda como professora substituta. Foi um período corrido, visto que ainda morava em São Paulo, semanalmente eram 24 horas-aulas no Unifai e outras 20 na UFSCar. As responsabilidades com o Pedro eram divididas com o seu pai. Assumir a docência como substituta na UFSCar trouxe novas oportunidades de aprendizado, o que me encorajou para inscrever-me para o concurso para professor efetivo. Se aprovada, seria, também, uma forma de voltar para São Carlos, de estar mais próxima de minha família, de dar condições para o Pedro viver e conviver com mais liberdade do que aquela que uma Capital permite (morar no interior com criança e adolescente é bem melhor para as relações sociais e afetivas). Seria possível, também, desenvolver atividades que iriam além do ensino na graduação, mas uma forma de voltar para a Biblioteconomia em São Carlos, de restabelecer um vínculo entre EBDSC e UFSCar que ia além da realização do estágio e da docência como substituta. Já haviam trilhado essa relação EBDSC-UFSCar mulheres fantásticas, como Elisabeth Marcia 9 Trabalhei no período de agosto de 2006 a julho de 2008. 134 Martucci (docente efetivo) e Sonia Maria Trombelli (docente substituta), que foram docentes na EBDSC, e também as ex-alunas10 da antiga Escola: Glaucia Maria Saia Cristianini (docente substituta), Juliana de Souza Moraes (docente substituta), Luzia Sigoli Fernandes Costa (docente efetiva), Maria Matilde Kronka Dias (docente efetiva), Nádea Regina Gaspar (docente efetiva). Inscreveram-se no concurso 9 candidatos, dos quais 6 foram aprovados, tendo eu sido aprovada em primeiro lugar! Tendo sido feita a convocação, assumi em 18 de agosto de 2008. Inicia-se a minha trajetória na UFSCar. Foi selada, mais uma vez, a relação com a EBDSC, não mais como egressa desta, não mais como docente substituta na UFSCar, mas como docente efetiva no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar. Atuar como docente na universidade pública faz com que você desempenhe atividades voltadas ao ensino, pesquisa, extensão e assuma cargos ligados à gestão universitária. Comigo não foi diferente. Ao longo de pouco mais de 9 anos na Universidade assumi, no curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação, disciplinas voltadas à catalogação, à normalização técnica e à automação de unidades de informação. Quando ainda estava vigente a grade curricular de 2004, apesar de também ministrar disciplinas optativas, a minha responsabilidade direta era junto às disciplinas: a) Princípios e Práticas de Representação Descritiva Ementa: Teoria da representação descritiva. Requisitos funcionais para os registros bibliográficos. Catálogo e catálogos em linha. Fluxo do trabalho de organização e tratamento de acervos. Normas internacionais para a descrição: ISBDs e AACR. Formato MARC 21 Concise. Estudo e aplicação das normas internacionais em formato MARC para livros. Organização de acervos de livros. b) Representação Descritiva de Multimeios e Recursos Eletrônicos Ementa: Estudo e aplicação das normas internacionais em formato MARC para: recursos eletrônicos, artigos de periódicos, registros sonoros e vídeos. Organização de acervos com suportes físicos diversificados. 10 Elenise Maria de Araújo, egressa da EBDSC, também teceu relação com a UFSCar, mas em momento posterior à minha chegada como docente. 135 Quando houve o processo de alteração curricular, com vistas ao atendimento às novas demandas profissionais e de pesquisa na área, fiz a proposta de ajuste da ementa destas disciplinas, a proposição de outra, e ampliação de carga horária de uma terceira: a) Catalogação I Ementa: Teoria da representação bibliográfica. Princípios internacionais de catalogação. Requisitos funcionais para registros bibliográficos. Regras internacionais para a descrição bibliográfica: ISBDs e AACR. Catálogo e catálogos em linha. Pontos de acesso ao registro bibliográfico e remissivas. b) Catalogação II Ementa: Registros bibliográficos de livros, folhetos, materiais cartográficos, manuscritos, música, gravação de som, filmes cinematográficos e gravações de vídeo, materiais gráficos, artefatos tridimensionais e realia, recursos eletrônicos, microformas, recursos contínuos e analíticos. c) Catalogação III Ementa: Formatos internacionalmente conhecidos para a representação bibliográfica. Formato MARC21 Bibliográfico, Autoridade, Comunidade, Coleção e Classificação. Formato MARC21 Bibliográfico. Dublin Core. d) Normas Técnicas de Informação e Documentação Ementa: Normas internacionais e brasileiras de informação e documentação: ISO, NBR e Vancouver. A alteração das disciplinas se deu, em linhas gerais, diante dos estudos e pesquisas desenvolvidos na área, considerando, também, a corrente teórica americana, e a prática profissional do bibliotecário, além dos estudos e pesquisas da corrente europeia. Ademais, diante das inovações tecnológicas, entendeu-se que a criação de uma disciplina voltada aos estudos de metadados e seus padrões viria ao encontro dos aparatos infotecnológicos atuais. A ampliação da carga horária da disciplina “Orientação e Normalização Documentárias”, com dois créditos (30 horas), na grade curricular de 2004, cuja 136 ementa centrava-se em “Aspectos teóricos, conceituais e históricos das normas brasileiras de documentação e das instituições normativas. Estudo da aplicação das normas técnicas de documentação”, considerou a ampliação do mercado de trabalho para além do tratamento documental, mas, de modo a contribuir com o processo de registro do conhecimento, produção editorial, e divulgação científica. No âmbito do ensino no curso de graduação, também orientei um número pouco maior de 60 trabalhos de conclusão de curso, de 25 trabalhos de iniciação científica, e outros 60 com orientações de outra natureza, tais como bolsa-atividade, bolsa de extensão, monitoria de disciplina, colaboração com a Unidade Saúde Escola da UFSCar, com a Divisão de Registros Acadêmicos (vinculada à Pró-Reitoria de Graduação). O vínculo de proximidade conquistado junto aos alunos da graduação também me rendeu o reconhecimento por parte deles em algumas oportunidades: paraninfa, patronesse e professora homenageada. Momentos como esses nos impelem a avaliar, constantemente, a responsabilidade que é assumida quando nos propomos a colaborar na formação profissional dessas pessoas. O meu vínculo com as atividades de pesquisa iniciaram-se por conta do compromisso assumido com a Universidade, como parte do regime probatório), de que iniciaria o curso de Doutorado, o que ocorreu no início de 2009, junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Unesp, em Marília, o mais bem conceituado à época. Nova jornada dupla tinha início: conciliar as atividades de estudo e de desenvolvimento da pesquisa de doutorado com as de docência na UFSCar. Aproximar-me da pesquisa também foi gratificante por vários motivos: a tese foi apresentada nove meses antes do prazo indicado pelo Programa (concluído em 2012); a Profa. Plácida Santos, mais que orientadora, tornou-se amiga; prêmios foram conquistados, em 2013: a tese foi indicada para concorrer ao Prêmio CAPES de Tese (mas não ganhou!), ao Prêmio ANCIB11 (o qual garantiu o segundo lugar), ao Prêmio Laura Russo12 (que recebeu o primeiro lugar), melhor trabalho no GT8 – Informação e Tecnologia da ANCIB. 11 12 O Prêmio ANCIB é concedido pela Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação e Biblioteconomia (ANCIB) aos mestres e doutores cujas dissertações e teses, aprovadas em instituições brasileiras, credenciadas pela CAPES e filiadas à ANCIB, tenham contribuído significativamente para o desenvolvimento da área. Em 2017 estavam credenciados pela CAPES 11 cursos de Doutorado. O Prêmio Laura Russo é concedido pelo Conselho Regional de Bibliotecnomia, 8. Região. 137 Outras pesquisas foram desenvolvidas com o envolvimento de alunos da graduação, e com mestres e doutores: Padrões de representação da informação, softwares de gerenciamento de unidades de informação e interoperabilidade; Desenvolvimento de interpretador computacional de acesso web para conversão de dados bibliográficos analógicos para o Formato MARC21 Bibliográfico (com financiamento do CNPq); e Representação documental: discussões teóricas e a práxis em unidades de informação. As atividades extensionistas na Universidade são entendidas como aquelas que promovem a interação entre a Universidade e outros setores da sociedade, que transformam ambos, e como indissociáveis do ensino e da pesquisa. São, portanto, um processo. Movida por esse princípio, por estar de volta a São Carlos, voltei-me também para atividades extensionistas. Participei de várias atividades coordenadas por colegas, mas também coordenei: a) ACIEPE13: • Aprender a ensinar deficientes visuais. • Princípios e práticas de organização de unidades de informação. • Representação dos registros do conhecimento para compartilhamento com Formato MARC21. b) Cursos de atualização, treinamento e qualificação profissional: • Adequação editorial às normas da ABNT. • Catalogação: FRBR, AACR2r, MARC. • Ferramentas automáticas para formatação do trabalho: sumário e numeração progressiva. • MARC 21 Bibliográfico e Autoridade: conceitos e aplicações. • MARC 21 Bibliográfico: conceitos e aplicações. • Metadados para ambientes digitais. • RDA – Resource Description and Access: atualização profissional. • Referencias e citações em trabalhos acadêmicos. • Requisitos dos trabalhos acadêmicos: relatórios, projetos de pesquisa, pôsteres, artigos. • Treinamento profissional e acadêmico em catalogação: RDA. 13 A Atividade Curricular de Integração Ensino, Pesquisa e Extensão (ACIEPE) é uma experiência educativa, cultural e científica que, articulando o Ensino, a Pesquisa e a Extensão e envolvendo professores, técnicos e alunos da UFSCar, procura viabilizar e estimular o seu relacionamento com diferentes segmentos da sociedade. A ACIEPE se constitui como atividade complementar inserida nos currículos de graduação, com duração semestral de 60 horas e 4 créditos. 138 c) Organização de eventos: • ConversAÇÕES: Bibliotecas Públicas e Comunitárias. • ConversAÇÕES: Leitura. • ConversAÇÕES: Softwares para automação de unidades de informação. • ConversAÇÕES: Tecnologias em Ambientes Informacionais. • I Jornada sobre Trabalhos Acadêmicos e Científicos. • II Jornada sobre Trabalhos Acadêmicos e Científicos. d) Projetos de extensão • Em instantes: espaço, cultura, ação! – PROEXT 2014. • Laboratório Virtual de Aperfeiçoamento em Biblioteconomia e Ciência da Informação. • Memória do curso de BCI: entre lembrar e esquecer 20 anos depois! • Organização, divulgação e atendimento para a Biblioteca Escolar do Curso Pré-Vestibular da UFSCar. • Organização do acervo da paróquia de São Sebastião, São Carlos, SP. • Repositório digital em educação especial como apoio à inclusão escolar. • Um click no SACI: da produção ao uso de Clippings de notícias. Em atividades administrativas vinculadas ao ensino atuei como coordenadora de estágio, e como vice-coordenadora e coordenadora no curso de graduação em Biblioteconomia e Ciência da Informação. Também tive a oportunidade de participar como membro do Núcleo Docente Estruturante e da Comissão de Reformulação Curricular. Ainda em atividades administrativas vinculadas ao ensino de graduação participei do Conselho de Graduação e como Membro da Comissão Assessora para Análise de Processos de Alunos. Em atividades administrativas ligadas à extensão participei do Conselho de Extensão, como representante do Centro de Educação e Ciências Humanas (CECH); e, em atividades da Pró-Reitoria de Extensão, como membro da Comissão Assessora Mista de ACIEPE – CoACIEPE; da Comissão de ACIEPEs da Pró-Reitoria de Extensão, representando a Pró-Reitoria de Graduação; e da Comissão de Trabalho de Projetos Temáticos de Extensão. Ainda como atividade contínua exerço a Coordenação do Programa de Extensão Divulgação Científica, Comunicação e Inclusão Social. 139 Membro do Conselho de Pesquisa e Representante do Departamento de Ciência da Informação no Comitê de Iniciação Científica e Tecnológica, foram ações vinculadas às atividades administrativas de ordem da pesquisa. Em atividades ligadas à pós-graduação participei do Conselho de Pós-Graduação como membro e também como Representante do CECH. No CECH atuei e membro do Conselho de Centro e como representante deste no Conselho Administrativo do Centro. Pude colaborar com a Secretaria Geral de Relações Internacionais como Representante institucional junto à Comissão Permanente Meios e Comunicação Universitária da Associação de Universidades Grupo Montevidéo – AUGM. Com as bibliotecas, como membro efetivo da Comissão de Avaliação de Software Gerenciador de Bibliotecas, e na Coordenação da Câmara Técnica de Tratamento da Informação do Sistema de Bibliotecas. Ações vinculadas diretamente à Reitoria foram como Membro da Comissão de Processo Administrativo Disciplinar, e na Presidência do Comitê de Editoração da Comissão Permanente de Publicações Oficiais e Institucionais. Como não poderia deixar de ser, ao longo dos anos também houve colaboração com outras instituições, associações científicas e de classe, como a Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários Cientistas da Informa, FEBAB; Associação Brasileira de Profissionais da Informação, ABRAINFO; Fundação Pró-Memória de São Carlos – Museu de São Carlos, PRÓ-MEMÓRIA. O retorno a São Carlos, depois de quase 15 anos distante, foi gratificante do ponto de vista profissional por receber ainda duas homenagens: Honra ao Mérito pela Participação no Desenvolvimento da Propriedade Intelectual da UFSCar, concedido pela Agência de Inovação da UFSCar, e Homenagem aos Integrantes da Comunidade Universitária Premiados em 2013, pela Reitoria da Universidade. Como capital social houve o recebimento do Prêmio de Bibliotecária Homenageada do Ano, concedido pela Câmara Municipal de São Carlos. Estas experiências, sem dúvida, contribuíram para a minha formação profissional e docente. Fica a lição de que essas lembranças, aqui socializadas, tornam-se presentes, como dádivas recebidas. 140 Foto: Waldeck Schutzer RELATO DE UMA TRAJETÓRIA DOCENTE NA UFSCar: RELEMBRANDO O PASSADO E PLANEJANDO O FUTURO ROGÉRIO APARECIDO SÁ RAMALHO* O Prelúdio da Trajetória Para melhor compreensão do me levou a percorrer uma trajetória acadêmica peculiar na área de Ciência da Informação na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), acredito ser necessário voltarmos algumas décadas, pois determinados fatos foram determinantes para as escolhas acadêmicas que fiz ao logo desta jornada. Apesar da inegável influência de outros fatores totalmente imprevisíveis que, na maioria das vezes, por falta de um melhor adjetivo costumamos denominar simplesmente como acaso. Ao longo da década de 1990 cursei integralmente o Ensino Médio na Escola Estadual Índia Vanuire, escola pública do município de Tupã/SP, cidade com cerca de 70.000 habitantes localizada no interior do estado de São Paulo, onde apesar das limitações tecnológicas da época, comecei a ter acesso às denominadas tecnologias digitais. Mais especificamente em 1995, tive a oportunidade de ligar um computador pela primeira vez e de imediato aquele estranho dispositivo chamou a minha atenção, desde então passei a me interessar por qualquer material relacionado com o tema. Época em que computadores ainda eram artigos de luxo e sequer existia na cidade provedores que disponibilizassem acesso por conexão discada a * Doutor e Mestre em Ciência da Informação (UNESP), Bacharel em Ciência da Computação (FAI0. Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 2009. Contato: ramalho@ufscar.br. 142 Internet, algo difícil de imaginar por uma geração que cresceu manuseando smartphones e onde o conceito conexão de internet de banda-larga torna-se algo corriqueiro e banal. Apesar de todas as limitações da época, com o apoio de minha família, consegui me matricular em um curso de informática básica e, dois anos mais tarde, com apenas 16 anos, eu já lecionava cursos de informática básica em escolas profissionalizantes na cidade de Tupã/SP, pois naquela época ainda não existiam cursos como “Licenciatura em Computação” ou “Sistemas de Informação”. Terminado o Ensino Médio não tive dúvidas em relação a qual área seguir e, no ano 2000, me matriculei no recém-criado curso de Bacharelado em Ciência da Computação oferecido pelas Faculdades Adamantinenses Integradas, no município de Adamantina/SP, instituição atualmente denominada como Centro Universitário de Adamantina, onde tive minha formação acadêmica em Computação e tive a certeza de minha intenção de fazer uma Pós-Graduação, porém embora quisesse pesquisar o uso das novas tecnologias digitais, não gostaria de fazer um mestrado puramente em Computação, pois tinha o interesse em pesquisar os impactos e desafios do uso das novas tecnologias na sociedade, foi quando eu descobri a área de Ciência da Informação. Meu primeiro contato com a área de Ciência da Informação foi quando iniciei o mestrado na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP, campus de Marília. A abordagem interdisciplinar do campo de pesquisa, a crescente relação com a temática de Tecnologia da Informação e o forte enfoque social fizeram com que eu me apaixonasse pela área de Ciência da Informação. Após a conclusão do meu mestrado dei continuidade aos meus estudos ingressando na primeira turma do Doutorado em Ciência da Informação da Unesp, campus de Marília, nesta época, meados de 2006, comecei a vislumbrar a possibilidade de tornar-me docente de uma instituição pública na área de Ciência da Informação, foi quando tive a oportunidade de iniciar minha trajetória na UFSCar, campus de São Carlos, no ano de 2009. O Início de minha trajetória na UFSCar Posso afirmar que minha trajetória na UFSCar foi influenciada pela criação do curso de Bacharelado em Sistemas de Informação, curso iniciado em 2008 e oferecido na modalidade à distância, a partir de uma parceria inédita 143 entre o Departamento de Computação (DC) e o Departamento de Ciência da Informação (DCI) da universidade. Devido às inegáveis aproximações entre as áreas de Ciência da Informação e Ciência da Computação, observou-se que a existência de um profissional com formação interdisciplinar em ambas as áreas poderia favorecer uma maior aproximação entre os departamentos e um fortalecimento tanto do curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação, quanto do curso de Sistemas de Informação. Assim, após aprovação em concurso público, no ano de 2009 iniciei minha trajetória na UFSCar como docente do curso de Sistemas de Informação, na modalidade à distância. A primeira disciplina que me tornei responsável na UFSCar teve início no ano de 2009, intitulada como “Tecnologia e Sociedade”, compõe o currículo do curso de bacharelado em Sistemas de Informação e tem como objetivo fomentar a reflexão acerca dos dilemas sociais e éticos inerentes ao desenvolvimento tecnológico, analisando de forma crítica as potencialidades e desafios do uso e desenvolvimento das novas tecnologias digitais. Tal disciplina possui um caráter eminentemente interdisciplinar e reflete as preocupações que têm direcionado minha formação acadêmica. Em 2015, parte do material audiovisual utilizado nesta disciplina foi sistematizado, dando origem ao audiolivro “Tecnologia e Sociedade: responsabilidades e desafios na Era da Informação Digital” publicado pela Editora da UFSCar – EdUFSCar (RAMALHO, 2015). Outra disciplina sob minha responsabilidade no curso de Bacharelado em Sistemas de Informação é denominada como “Gestão de Conteúdos Informacionais” e utiliza a temática de gestão de conteúdos como pano de fundo para estabelecer aproximações entre a área de Computação e Ciência da Informação, apresentando conceitos e tecnologias que são utilizadas para o gerenciamento de conteúdos em ambientes digitais e descrevendo os principais padrões de representação e intercâmbio de dados. Além das duas disciplinas mencionadas, desde o ano de 2010 até a presente data atuo como vice-coordenador do curso de Bacharelado em Sistemas de Informação. Em relação a minha atuação no curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação, no período em que ingressei na UFSCar estava em curso o processo de discussão e debate para reformulação curricular de referido curso. Assim, até o primeiro semestre de 2014 eu ministrei as disciplinas da matriz curricular vigente na época, relacionadas ao uso de tecnologias e seus impactos na sociedade, como as disciplinas “Sociedade do Conhecimento” e “Lógica aplicada à Recuperação de Informação”, além de outras 144 disciplinas de formação geral como “Introdução ao Trabalho Científico” e “Introdução à Pesquisa”. A partir do término do processo de reformulação, a nova matriz curricular do curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação entrou em vigência em 2013, favorecendo um maior fortalecimento da formação lógico-matemática relacionado às novas demandas tecnológicas da área de Ciência da Informação, possibilitando a criação de três novas disciplinas sob minha responsabilidade, conforme apresentado na próxima sessão. A implantação do novo projeto pedagógico do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação No ano de 2014, ao ministrar a disciplina “Repositórios institucionais e gestão de documentos eletrônicos” foi iniciada mais uma etapa de minha trajetória na UFSCar, particularmente no curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação, pela primeira vez iria ministrar uma disciplina que pude acompanhar desde a sua concepção inicial. Tal disciplina foi criada com o objetivo de proporcionar o ensino de conceitos e tecnologias relacionadas ao gerenciamento e gestão de documentos eletrônicos, com ênfase na utilização de softwares em repositórios e bibliotecas digitais. Na primeira oferta da disciplina “Repositórios institucionais e gestão de documentos eletrônicos” no segundo semestre de 2014, quarto semestre do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, foi observado que o fato dos alunos ainda não terem cursado a disciplina “Lógica e Base de Dados aplicados à Ciência da Informação” dificultava o entendimento por parte dos alunos que ainda não possuíam conhecimentos básicos de lógica e utilização de banco de dados, deste modo, em 2015 foi encaminhado ao Conselho de Curso uma solicitação de inversão no período de oferta de ambas as disciplinas, após a apresentação das justificativas e fundamentação, a solicitação foi aprovada e a disciplina de “Repositórios institucionais e gestão de documentos eletrônicos” passou a ser ofertada no quinto semestre do curso, enquanto a disciplina de “Lógica e Base de Dados aplicados à Ciência da Informação” passou a ser oferecida no quarto semestre. A disciplina “Lógica e Base de Dados aplicados à Ciência da Informação” foi concebida no intuito de apresentar os conceitos teórico-metodológicos que fundamentam o desenvolvimento e utilização de sistemas de banco 145 de dados, analisando as aproximações existentes entre os formalismos e teorias lógicas e as novas tecnologias de recuperação de informação utilizados no âmbito da área de Ciência da Informação. Apesar do intenso uso de base de dados no campo de Biblioteconomia e Ciência da Informação observa-se ainda uma certa dificuldade por parte de muitos profissionais da área em avaliar e compreender os conceitos que norteiam o desenvolvimento de tais tecnologias, assim a referida disciplina busca contribuir para uma maior familiarização com os conceitos que fundamentam o desenvolvimento de sistemas de banco de dados e as potencialidades oferecidas pelos novos instrumentos computacionais de recuperação de informação baseados em lógicas formais. Finalmente a disciplina “Linguagens Documentárias III” foi ofertada pela primeira vez no segundo semestre de 2015, para os alunos do sexto semestre do curso, esta disciplina possui relação direta com as pesquisas que desenvolvo no campo de utilização e desenvolvimento de tecnologias semânticas e tem como objetivo apresentar os novos conceitos e tecnologias relacionados às linguagens de representação formal de informações em ambientes digitais. À medida que as novas tecnologias de representação têm evoluído, o ambiente Web tem se transfigurado em uma rede de documentos interligados. Tal cenário contemporâneo tem influenciado a concepção de novos padrões e tecnologias de representação, evidenciando a importância dos dados e relacionamentos existentes entre os documentos. No âmbito da área de Ciência da informação observa-se a necessidade de uma reconfiguração disciplinar, no intuito de favorecer o desenvolvimento e uso de novas tecnologias informacionais que sejam capazes de incorporar as bibliotecas e unidades de informação tradicionais nessa nova e instigante rede de dados conectados. Entre os novos instrumentos de representação desenvolvidos na última década pode-se destacar as ontologias e o Simple Knowledge Organization System – SKOS, um modelo de dados para a representação formal da estrutura básica e conteúdo de Sistemas de Organização do Conhecimento (RAMALHO, 2015). 146 Assim, a disciplina “Linguagens Documentárias III” busca contribuir para um melhor entendimento das tecnologias que fundamentam o desenvolvimento e utilização dos novos sistemas de organização e representação de informações utilizados em ambientes computacionais, a partir da análise de linguagens computacionais, como Extended Markup Language (XML) e Resource Description Framework (RDF), contribuindo para o desenvolvimento de novas competências relacionadas à identificação, modelagem e representação formal de recursos disponíveis em ambientes digitais a partir da disponibilização de vocabulários SKOS ou modelagem de ontologias computacionais. Espero que esta nova etapa iniciada com a reestruturação curricular do curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação, e criação de novas disciplinas, possa contribuir para a formação de profissionais qualificados para atender às novas demandas tecnológicas de uma sociedade cada vez mais baseada em interações virtuais, de modo que os fundamentos teórico-metodológicos apresentados nestas disciplinas possam contribuir para o desenvolvimento de pesquisas relacionadas aos novos sistemas de organização e representação de informações em ambientes digitais, favorecendo o estabelecimento de raízes sedimentadas no corpus teórico da área de Ciência da Informação, capazes de suportar a fragmentação conceitual inerente a este novo campo de estudo. Relembrando o Passado e Planejando o Futuro Frente ao breve relato apresentado, descrevi sucintamente os primeiros passos de minha trajetória docente, no campo do Ensino, na tentativa de colaborar com o estudo das tecnologias de informação, buscando contribuir para que as mesmas possam ser utilizadas de forma crítica e socialmente responsável, pautando-se na unidade do conhecimento sobre os limites da Ciência contemporânea. Além de minhas atividades de Ensino, considerando a indissociabilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão, destaco também a criação no ano de 2015 do Programa de Extensão intitulado “Informação, Tecnologia e Sociedade”, o qual sou coordenador. Tal Programa foi formalizado com o objetivo de promover e sistematizar diferentes propostas de atividades de extensão relacionadas ao uso de novas tecnologias de representação e organização, contribuindo para o incremento de novos serviços, processos e produtos de informação 147 que favoreçam a integração entre discentes, docentes e profissionais da área; e o fortalecimento da inter-relação transformadora proporcionada pelo desenvolvimento de atividades de Extensão que levem em consideração as necessidades informacionais emergentes da sociedade contemporânea. No campo da Pesquisa participei da equipe de criação do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PPGCI), que teve seu funcionamento autorizado pela CAPES em 2016, com o início da primeira turma em setembro do mesmo ano. Além disso, coordeno o Núcleo de Estudos em Tecnologias de Organização e Representação de Informações (NeTORI), grupo de pesquisa certificado junto ao CNPq desde o ano de 2011, que reúne alunos de Iniciação Científica e Mestrado sob minha orientação, além de pesquisadores parceiros da UFSCar e de outras instituições. As pesquisas realizadas no NeTORI possuem como foco norteador as tecnologias utilizadas nos processos de representação, organização e recuperação de informações em ambientes digitais, investigando novas possibilidades de atuação dos profissionais da informação e os reflexos de tais abordagens no corpus teórico da área de Ciência da Informação. Assim, a partir de uma sucessão de experiências e interações pessoais vou construindo minha trajetória na UFSCar, buscando contribuir para a história de uma ainda jovem instituição de pouco mais de 45 anos e do, ainda mais jovem, curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação que recém completou 20 anos, no intuito de contribuir na preparação de uma nova geração de profissionais mais conscientes e preparados para os desafios e responsabilidades do uso das novas tecnologias no campo da Ciência da Informação. Referências RAMALHO, Rogério Aparecido Sá. Análise do Modelo de Dados SKOS: Sistema de Organização do Conhecimento Simples para a Web. Informação & Tecnologia (Itec), [s.l .], v. 2, p. 66-79, 2015. Disponível em: http://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/itec/ article/view/25995. Acesso em: 7 abr. 2016. RAMALHO, Rogério Aparecido Sá. Tecnologia e sociedade: responsabilidades e desafios na era da Informação Digital. São Carlos: EdUFSCar, 2015. 148 Foto: Waldeck Schutzer REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO “CIÊNCIA E SOCIEDADE” NO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO DA UFSCar: UM DEPOIMENTO CAMILA CARNEIRO DIAS RIGOLIN* Neste trabalho, trato da minha inserção na ênfase “Ciência e Sociedade” do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), onde atuo desde 2010, seus desdobramentos e contribuições na penúltima linha deste parágrafo em três níveis: ensino, pesquisa e extensão. Ao ingressar como docente no Departamento de Ciência da Informação da UFSCar, tinha cerca de oito anos de experiência profissional como docente de ensino superior e pesquisadora – dois anos como professora substituta na Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia (UFBA), de onde sou egressa, mais seis anos como docente em instituições privadas, além de um período concomitante como consultora da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (FIEB) e da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Governo do Estado da Bahia (SECTI), onde coordenei, por três anos, um estudo das demandas tecnológicas de complexos industriais baianos nos setores metal-mecânico, químico e petroquímico, além das demandas de arranjos produtivos locais de produção de flores e reciclagem de resíduos plásticos. Este estudo teve apoio da Financiadora de Estudos e * Doutora em Política Científica e Tecnológica (UNICAMP), Mestre em Administração (UFBA), Especialista em Formação de Agentes de Inovação e Difusão Tecnológica (UFBA), Bacharel em Administração (UFBA). Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 2010. Contato: diasrigolin@ufscar.br. 150 Projetos (FINEP), empresa pública brasileira de fomento à ciência, tecnologia e inovação. Além dos relatórios técnicos esperados, o estudo subsidiou o planejamento de ações dos órgãos que a encomendaram (FIEB e SECTI). Do ponto de vista científico, ensejou a publicação de três artigos em periódicos, um capítulo em livro publicado pela Universidade Autónoma do México (UNAM) e dezessete artigos publicados em anais de eventos. Tendo trabalhado com a literatura de Política Científica e Tecnológica no Mestrado (UFBA, 2000), na pesquisa, docência e atividade de consultoria, desejava a ampliação deste repertório e o aporfundamento teórico-metodológico neste campo, razão pela qual me candidatei ao Doutorado em Política Científica e Tecnológica da Universidade Estadual de Campinas (DPCT-UNICAMP), no final de 2004. Uma vez aprovada, mudei-me para cidade de Campinas em fevereiro de 2005, com a intenção de retornar à Bahia e às atividades profissionais das quais tinha me licenciado, assim que tivesse cumprido todas as disciplinas do doutorado. No decorrer do doutorado, os planos foram modificados. Em 2007, fiz estágio de doutorado sanduíche nos Estados Unidos, no Departamento de Antropologia da Universidade de Indiana, de onde retornei em 2008. No ano seguinte, 2009, último do doutorado, comecei a frequentar a Universidade Federal de São Carlos, pois me casei com um docente do Departamento de Física desta universidade, Gustavo Rigolin. Durante o doutorado no DPCT-UNICAMP, tive a oportunidade de me especializar em um quadro teórico e metodológico que se tornaria minha referência enquanto docente e pesquisadora: os Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia ou campo “Ciência, Tecnologia e Sociedade” (CTS), como é comumente conhecido. A inserção no grupo de pesquisa das Professoras Léa Velho e Maria Conceição da Costa (minha orientadora) me proporcionou a oportunidade de fazer pesquisa de campo internacionalmente, no Peru e nos EUA (durante doutorado-sanduíche), visto que o objeto de estudo eram os acordos de cooperação internacional de pesquisa na área de biotecnologia. Minha tese foi um dos estudos que resultaram do projeto “Natureza e Impacto de Parcerias Norte-Sul na Produção e Utilização de Conhecimento em Bioprospecção”, coordenado pela referidas docentes e financiado com recursos de uma agência internacional, o International Development Research Centre (IDRC), sediado no Canadá. Concluí o doutorado em agosto de 2009. Na semana da minha defesa de tese, tomei conhecimento da existência de uma seleção para bolsista do 151 então programa Programa de Apoio a Projetos Institucionais com a Participação de Recém-Doutores (PRODOC), no Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tcenologia (PGGCTS) da UFSCar. Primeiro vi o anúncio no portal “Jornal da Ciência” e no próprio site da UFSCar. Poucos dias depois, no dia da defesa da minha tese, o comentário sobre o anúncio foi reforçado pela Profa. Léa Velho (DPCT/UNICAMP), membro da banca. A temática do projeto, sobre participação pública em políticas de C&T, vinha de encontro à minha formação doutoral, ao campo CTS e aos Estudos Sociais da Ciência, com os quais já trabalhava. Candidatei-me à bolsa enviando documentos e um plano de trabalho, sendo chamada para uma entrevista na UFSCar, em outubro de 2009, ocasião em que conheci a Profa. Maria Cristina Hayashi (DCI/UFScar) e o Prof. Danilo Rothberg, então bolsista PRODOC, que me entrevistaram. Uma semana depois recebi telefonema do Prof. Rothberg informando que havia sido aprovada em primeiro lugar, entre três candidatos. Assumi a pesquisa em novembro de 2009, substituindo-o, uma vez este que havia sido aprovado em concurso docente na Universidade Estadual Paulista “Júlio Mesquita Filho” (UNESP). No sexto mês de vigência da bolsa PRODOC, foi publicado o Edital no “106/10 para contratação de Professor Adjunto”, com dedicação exclusiva, na área “Cultura e Discurso, Ciência e Sociedade”, subárea “Ciência e Sociedade”, no Departamento de Ciência da Informação da UFScar, campus de São Carlos. Na relação dos temas para a prova escrita e didática, bem como na bibliografia indicada, a presença de assuntos e autores clássicos dos Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia e do campo CTS, aderentes às disciplinas da referida subárea. Inscrevi-me neste concurso e simultaneamente, no concurso para professor adjunto DE na área de Administração Geral da Universidade de Brasília (UnB), cidade onde nasci e residi por quinze anos. No primeiro concurso, da UFSCar, concorri com mais três candidatos, sendo dois deles ex-colegas da pós-graduação no Departamento de Política Científica e Tenológica da UNICAMP, que conheci quando estava no primeiro ano de doutorado e eles, no último ano do mestrado. No segundo concurso, o da UnB (Edital de Abertura 89/2010), concorri com dezesseis candidatos que compareceram à prova, dentre vinte e três candidatos inscritos. Fui aprovada em primeiro lugar nos dois concursos, sendo a única aprovada e convocada para nomeação na vaga da Universidade de Brasília, conforme registrado no Diário Oficial da União (DOU) de 03/09/2010, seção 2, 152 página 18. A ida para a Universidade de Brasília, no entanto, representaria um regresso a uma área disciplinar da qual, consciente e voluntariamente, havia me desvinculado durante todo doutorado e pós-doutorado, tendo direcionado, desde 2005, meu esforço de docência, pesquisa, orientação e produção científica para outras perspectivas. Declinei da vaga, expondo as justificativas em carta encaminhada ao chefe de departamento daquela instituição. Sem embargo, optei pela inserção no DCI/UFScar, por todas as razões anteriormente elencadas: identidade com a área, possibilidade de continuidade da pesquisa e de exercício da docência, no campo em que escolhi. Em julho de 2010, entrei em efetivo exercício como docente do Departamento de Ciência da Informação da UFSCar, inserida na subárea “Ciência e Sociedade”, que posteriormente se tornaria a ênfase “Informação, Ciência e Sociedade”, após reforma do projeto pedagógico que entrou em vigor 2013. Esta ênfase parte do princípio de que a ciência e suas instituições não são neutros: o conhecimento tácito e os processos de “negociação” entre pares são parte constitutiva da ciência, que é socialmente situada. Isso equivale a dizer que suas instituições e o emprego de suas inovações estão entrelaçados com a história, as estruturas e o contexto da comunidade que as abarcam. Nas disciplinas desta ênfase, temos a responsabilidade de apresentar aos alunos os fundamentos da pesquisa científica, mas também de convidá-los, ou provocá-los, a refletir sobre as dimensões sociais da pesquisa e da produção de conhecimento. Não se trata, portanto, da formação eminentemente instrumental tendo em vista sua iniciação teórica, metodológica e prática ao trabalho científico, embora esta dimensão também esteja presente, por ser necessária em sua formação universitária e relevante para os que escolhem a pós-graduação e a carreira de pesquisa, a posteriori. Para os futuros profissionais de Biblioteconomia e Ciência da Informação, a relevância social e acadêmica da ênfase “Ciência e Sociedade” relaciona-se à uma dupla necessidade: a) provê-los com os subsídios teóricos e práticos para o enfrentamento da prática da pesquisa e seus instrumentos de comunicação científica; b) apresentá-los a elementos conceituais que proporcionem a reflexão sobre a dinâmica da produção do conhecimento, a percepção pública da atividade tecnocientífica, a construção e os impactos de políticas públicas de ciência e tecnologia, a responsabilidade social do cientista, a consciência sobre a produção e circulação de saberes, a cidadania. Nos últimos anos, tem se tornado cada vez mais presente o uso da expressão “ciência, tecnologia e sociedade” em estreita associação com a 153 dinâmica da produção do conhecimento, a percepção pública da atividade tecnocientífica, a discussão e definição de políticas públicas de C&T, o ensino de ciências e tecnologia, com pesquisa e desenvolvimento, a sustentabilidade, as questões ambientais, a inovação produtiva, a responsabilidade social, a construção de uma consciência social sobre a produção e circulação de saberes, a cidadania (GARFORTH, 2012; LISINGEN, 2007). Em síntese, com uma miríade de aspectos da atividade humana que remetem à consideração da natureza social do conhecimento científico-tecnológico em sua constituição e apropriação sociais (JASANOFF, 2010). Esta discussão tem caráter eminentemente interdisciplinar e é constituído por profissionais das mais diversas formações: cientistas da informação, sociólogos, filósofos, economistas, historiadores, físicos, químicos, biólogos, antropólogos, além de engenheiros e profissionais da computação. Na perspectiva de um de seus eixos estruturantes, os Estudos Sociais de Ciência e Tecnologia, que se desenvolveu com particular intensidade a partir da década de 1960 principalmente na Europa e nos EUA, os fatos e artefatos científico-tecnológicos, os conhecimentos e as inovações, não podem ser bem entendidos se os aspectos técnicos forem divorciados dos aspectos sociais. Ou seja, se forem separadas as dimensões cognitivas das condições sociais da produção do conhecimento. Esta perspectiva surgiu no contexto histórico das chamadas reações acadêmica, administrativa e social em oposição a uma imagem ou concepção herdada da ciência e da tecnologia e se desenvolve como um movimento crítico frente à concepção clássica de ciência. Esta reação se produz na etapa de mudança institucional da ciência e no contexto da Segunda Guerra Mundial. Posteriormente, os movimentos sociais e de contracultura do final dos anos 60 e início dos 70 constituíram-se em terreno fértil para o questionamento da visão unicamente positiva da ciência e de seus impactos. Intelectuais escrevendo a partir de diversas perspectivas sugeriam que havia externalidades negativas associadas aos resultados e aplicações da ciência e da tecnologia, contribuindo para levar ao mundo acadêmico e ao público em geral o argumento de que a ciência e a tecnologia são inerentemente imbuídas de valores (HAYASHI; HAYASHI; FURNIVAL, 2008). Estes estudos constituem hoje campo de trabalho de caráter crítico a respeito da tradicional imagem essencialista da ciência e da tecnologia. Trata-se de um campo já consolidado nos EUA e Europa, e em processo de consolidação no espaço acadêmico latino-americano e brasileiro, que já dispõe de 154 disciplinas em cursos de graduação, programas de pós-graduação, encontros regionais e nacionais (na forma de congressos e seminários) e revistas. Atualmente os estudos sobre ciência e sociedade constituem uma diversidade de programas de colaboração interdisciplinar que, enfatizando a dimensão social da ciência e da tecnologia, compartilham a rejeição da imagem da ciência como uma atividade pura e a crítica da concepção da tecnologia como ciência aplicada e neutra (LOPEZ CEREZO, 2002; DIAS-RIGOLIN, 2016). Em geral, todos esses modelos enfatizam a relação não linear entre pesquisa e produção, concebem os processos de geração e uso de conhecimento como sendo de natureza muito mais complexa, envolvendo vários atores localizados e interagindo em contextos sociais particulares (VELHO, 2011). Na graduação, tive, e continuo tendo, a oportunidade de debater com os alunos os fenômeno científico-tecnológico no contexto social, isto é, os vetores de natureza social, política ou econômica que modulam as mudanças científico-tecnológicas e que desenvolvem sua atividade em um contexto sociocultural concreto. Muito além da instrumentalização dos alunos para a construção de projetos de pesquisa e relatórios científicos, esta reflexão permeia as disciplinas “Introdução ao Trabalho Científico” e “Metodologia da Pesquisa Científica para BCI”, bem como as orientações de trabalho de conclusão de curso, de iniciação científica e outras disciplinas ministradas, a exemplo de “Informação e Sociedade”, “Informação e Movimentos Sociais” e “Tópicos Especiais em Biblioteconomia e Ciência da Informação”. Nestas disciplinas, discutimos, a partir de fundamentos teóricos clássicos e contemporâneos, as dimensões sociais da ciência e tecnologia, a dinâmica das comunidades científicas e da produção do conhecimento, a construção social da tecnologia, as controvérsias sociotécnicas, a participação pública em C&T, a percepção Pública da C&T e, nos últimos anos, com mais intensidade, a dimensão “gênero” na produção de conhecimento institucionalizado, contribuindo para a desconstrução de estereótipos e de representações naturalizantes, que pretendem atribuir causas biológicas ou “naturais” às diferenças de comportamento e/ou de desempenho entre homens e mulheres no âmbito das comunidades científicas. No campo da extensão, verificamos a oportunidade de desenvolver trabalhos que incorporassem os caráter crítico a respeito da tradicional imagem essencialista da ciência e da tecnologia. Assim, a justificativa social e acadêmica do Programa de Extensão “Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS)”, o qual coordeno, refere-se à compreensão de que é necessário oferecer a 155 comunidade interna e externa da UFSCar um conjunto elementos conceituais que adquiram concreticidade no contexto da sociedade tecnocientífica e proporcionem aos participantes a constituição de um corpo de conhecimentos que permitam refletir sobre a dinâmica da produção do conhecimento científico e tecnológico, sua natureza e impcatos sociais. Neste sentido, em 2011, justificou-se a proposição de um projeto de extensão intitulado, “Representação de temas do campo Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS): concepção, produção e divulgação de produtos informacionais e audiovisuais”. O projeto, sob minha coordenação e vinculado ao programa de extensão anteriormente referido, tinha por objetivos: a) estimular a comunidade interna e externa da UFSCar a realizar reflexões sobre as dimensões sociais dos fatos e artefatos científico-tecnológicos, bem como dos conhecimentos e das inovações; b)elaborar produtos audiovisuais que possibilitem entender os condicionantes sociais da produção e circulação do conhecimento científico e tecnológico, bem como sobre quem faz e pra quem é feita a ciência e a tecnologia; c) produzir fontes de informação sobre os temas relevantes do campo CTS, tais como, ciência e gênero, ciência e mídia, ciência e ética, ciência e risco; políticas de C&T, ciência e ambiente. O objetivo desta proposta foi a concepção, realização e disponibilização de produtos informacionais e audiovisuais para divulgação de temas e conceitos pertinentes ao campo Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS). Como tal, fizemos: a) a criação e alimentação de um Guia de Fontes de Informação Audiovisuais em Ciência, Tecnologia e Sociedade; c) a realização de dois documentários relativo às temáticas “Construção Social da Ciência” e “Gênero e Ciência”. Este projeto teve a colaboração de outros dois docentes do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (Maria Cristina Hayashi e Carlos R. Hayashi), bem como teve discentes do mesmo curso como bolsistas de extensão, além de bolsistas do Bacharelado em Imagem e Som. O projeto contemplou a divulgação dos materiais informacionais e audiovisuais junto a instituições de ensino (médio e/ou superior), centros de pespuisa, profissionais vinculados à divugação científica e demais interessados. Tais produtos tamém foram incorporados, como recursos de ensino, às atividades docentes dos cursos de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) e ao Mestrado e Doutorado em Ciência, Tecnologia e Sociedade (PPGCTS) da UFSCar. Nosso público-alvo incluía professores de ensino médio e/ou superior; alunos de ensino médio e/ou superior; pesquisadores do campo CTS 156 e afins; profissionais atuantes na esfera da divulgação científica (jornalistas, editores, outros); demais interessados. Os objetivos do projeto foram plenamente cumpridos. Foi construído um catálogo de filmes, entre títulos de ficção e não ficção, onde estão explicitados os dados técnicos das obras, bem como os aspectos relativos às dimensões sociais da ciência e tecnologia representados por palavras-chave. No que diz respeito aos materiais de divulgação audiovisuais, foram produzidos dois documentários. O primeiro deles, relativo a história da descoberta da estrutura de dupla-hélice do DNA, intitulado “DNA: a construção social da descoberta”. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=zaSzjTkaM18. Este documentário foi exibido na X Semana Nacional de Museus, no CDCC (USP-São Calos), em 2012, seguido de palestra da equipe executora. Nele são exploradas questões relativas ao sistema de recompensas e acumulação de créditos na ciência, competição, redes de atores, gênero, ética e responsabilidade social do cientista. O roteiro é original e foi construído coletivamente pela equipe do projeto. O documentário envolveu a filmagem de depoimentos/entrevistas com professores da UFSCar, dos departamentos de Ciências Sociais e Ciência da Informação. As filmagens foram realizadas em outubro de 2011, na sala da UEIM/CECH/UFSCar. A equipe de bolsistas (multidisciplinar) incluiu uma aluna do curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação e uma aluna do Curso de Imagem e Som. Cumpre observar a competência e a dedicação demonstrados dos alunos bolsistas na concepção e realização dos produtos extensionistas deste projeto, que demandaram as habilidades e conhecimentos técnico-científicos inerentes às suas respectivas áreas de formação. O documentário foi utilizado com sucesso como material didático-pedagógico em disciplinas do Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade e no curso de Bacharelado em Biblioteconomia em Ciência da Informação da UFSCar, bem como divulgado junto ao potencial público interessado, anteriormente referido. Ressalta-se, também, a exposição de pôster do grupo, com a presença das bolsistas e da coordenadora no CONEX (Congresso de Extensão da UFSCar) em 2011. Estes fatos, somados à constatação da oportunidade de continuidade e ampliação do projeto, justificaram a solicitação da sua renovação, encaminhada à Proex em outubro de 2011 e aprovada. No período 2012/2013, um novo documentário relativo ao campo CTS foi produzido, intitulado “A ciência tem gênero?” Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=4sYqMQqp40Q. 157 O filme, de cerca de 20 min, mescla filmagens e animação e seu roteiro também foi construído coletivamente pela equipe da atividade de extensão. O documentário envolveu a filmagem de depoimentos/entrevistas com professores da UFSCar do Departamento de Ciência da Informação. Adicionalmente, deu-se continuidade à alimentação do catálogo de filmes representativos de temas do campo CTS anteriormente referido, entre títulos de ficção e não ficção. Assim como o primeiro documentário produzido no âmbito do projeto de extensão, este filme também foi utilizado como material didático-pedagógico em disciplinas do Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade e no curso de Bacharelado em Biblioteconomia em Ciência da Informação da UFSCar, bem como divulgado junto ao potencial público interessado (docentes de outras instituições, professores de ensino médio, divulgadores científicos etc.). Na produção dos dois documentários, ressaltamos o cuidado da equipe em buscar respaldo legal para o uso de imagens e a necessidade de consultar as normas técnicas para a inserção correta de créditos e referências. Para que fossem respeitados todos os requisitos legais para utilização e referência de imagens no documentário, sem qualquer ofensa à legislação de direitos autorais, foi realizada consulta junto à Agência de Inovação da UFSCar, que nos orientou a respeito das possibilidades de uso de imagens produzidas por terceiros. Neste sentido, foram utilizadas apenas imagens livres de copyright, cedidas em cortesia e disponibilizadas sob a licença Creative Commons. Todas as fontes e autores tem os seus créditos reconhecidos e citados no documentário, de acordo com as disposições da ABNT. No âmbito da pesquisa, desde o primeiro ano em que ingressei no Departamento de Ciência da Informação tive projetos de pesquisa agraciados com financimento de agências públicas de fomento, todos associados a orientações de TCC, iniciação científica, mestrado, doutorado e um pós-doutorado, além de gerar produção científica vinculada. Em linhas gerais, tais projetos privilegiam as análises sociológicas do processo de construção do conhecimento científico e comunicação da ciência em diferentes instituições e comunidades científicas, com destaque para os estudos da participação feminina na ciência, nos últimos anos. Desde 2010, ano do meu ingresso no DCI/ UFSCAr, os seguintes projetos foram desenvolvidos com aprovação e financiamento de agências de fomento: Expertise, planejamento e políticas públicas: um estudo da produção científica do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) (Edital Universal 158 CNPq – no 14/2010) Coordenador: Camila Carneiro Dias Rigolin. Apoiado nos referenciais teóricos dos Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia, em especial da Sociologia da Ciência e da Sociologia do Conhecimento, e da literatura em Políticas Públicas, foram investigados os fenômenos relativos à ascendência do conhecimento especializado e certificado (expertise) no planejamento, formulação, implementação e avaliação de políticas públicas. Associou a pesquisa qualitativa (análise documental e entrevistas) à pesquisa quantitativa (análise bibliométrica) para investigar a natureza e impactos da produção do conhecimento certificado (publicações) do IPEA, entre 1994 e 2009 sobre o planejamento e avaliação de políticas públicas. Produção e Circulação do Conhecimento nos Think Tanks Brasileiros (Edital Universal CNPq – no 14/2012) Coordenador: Camila Carneiro Dias Rigolin. A pesquisa explorou a relação entre expertise, pesquisa e formulação de políticas públicas, a partir do estudo dos think tanks, organizações que operam na fronteira entre o mundo acadêmico e a esfera governamental. Investiga as condições sociais de produção e circulação do conhecimento nestas organizações, guiando-se pelas seguintes questões: que condições sociais caracterizam a produção de conhecimento nos think tanks brasileiros e quais variáveis endógenas e exógenas influenciam a circulação de suas ideias na esfera pública? Natureza e Impactos da Participação Feminina nos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia INCTs: 2012-2014 – (Edital MCTI/CNPq/SPM-PR/MDA no 32/2012) Coordenador: Camila Carneiro Dias Rigolin. A pesquisa analisou a dimensão “gênero” na pesquisa conduzida no âmbito dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs) considerando os aspectos de produção científica e tecnológica; de participação de mulheres em redes de colaboração científica e de desenvolvimento de trajetórias profissionais, padrões de hierarquia e liderança, socialização e aprendizado tácito de pesquisadoras nos grupos de investigação e campos científicos que compõem estes Institutos. Natureza da participação feminina nos think tanks brasileiros: lideranças e produção de conhecimento, 2015-2017, Coordenação: Camila Carneiro Dias Rigolin, CHAMADA MCTI/CNPQ/MEC/CAPES no 22/2014 – CIÊNCIAS HUMANAS, SOCIAIS E SOCIAIS APLICADAS. O objetivo desta pesquisa foi explorar as relações entre gênero, expertise e pesquisa aplicada à formulação de políticas públicas em um ambiente particular de produção do conhecimento: os think tanks, organizações que operam na fronteira entre o mundo acadêmico e a esfera governamental. 159 “Um estudo das empreendedoras de base tecnológica apoiadas pelo Programa PIPE/FAPESP”, Coordenação: Camila Carneiro Dias Rigolin, com fomento da FAPESP, vigência 2018-2020. Nesta pesquisa, caracterizamos o perfil das empreendoras de start ups intensivas em conhecimento científico e/ou tecnológico, contempladas pelo Programa PIPE da Fapesp. Além dos projetos onde fui coordenadora, tenho a oportunidade de participar, como membro da equipe de pesquisadores, de outros projetos coordenados por colegas do Departamento de Ciência da Informação, a exemplo do projeto “Perspectivas de Gênero no Campo da Bibliometria no Brasil” (2015-2017), coordenado pela Profa. Maria Cristina Hayashi e financiado com recursos do CNPq. A participação nos projetos de pesquisa ensejou a oportunidade de publicação de artigos científicos, livros e capítulos de livros, em colaboração com outros docentes do curso, discentes e egressos do curso de BCI que se tornaram orientandos de mestrado e doutorado. Desde 2010, ano do meu ingresso do DCI/UFScar, foram publicados vinte um artigos científicos em periódicos, vinte artigos em anais de eventos, doze capítulos de livros e três livros. De 2017 a 2019, tive a oportunidade e o desafio de exercer a chefia do Departamento de Ciência da Informação, acrescentando ao repertório acadêmico a experiência administrativa na universidade. Por fim, reforço meus agradecimentos a todos aqueles – docentes, discentes, técnicos-administrativos, egressos – presentes na minha trajetória que, de alguma maneira (mesmo que não saibam ou não possam mensurar), tiveram impacto em um dos períodos mais significativos da minha vida, tendo em vista que a última década, 2010-2020, vivida na UFSCar, é aquela que corresponde ao período de amadurecimento e consolidação das minhas escolhas profissionais, além da ampliação das responsabilidades pessoais, visto que neste decurso, em 2013, me tornei mãe da Gabriela. As limitações de espaço não permitem que sejam registrados agradecimenos nominais, um a um. Um sincero agradecimento a todos. Que venham outros muitos anos, tão positivos e produtivos quanto. 160 Referências GARFORTH, Lisa. In/Visibilities of Research: Seeing and Knowing in STS. Science, Technology, & Human Values, [s. l.], v. 37, no. 2, p. 264-285, 2012. HAYASHI, Maria Cristina P. I.; HAYASHI, Carlos R. M.; FURNIVAL, Ariadne C. Ciência, tecnologia e sociedade: apontamentos preliminares sobre a constituição do campo no Brasil. In: SOUSA, C. M.; HAYASHI, M. C. P. I. (org.). Ciência, tecnologia e sociedade: enfoques teóricos e aplicados. São Carlos: Pedro & João Editores, 2008. p. 29-88. JASANOFF, Sheila. A field of its own: the emergence of science and technology studies. In: FROEDMAN, Robert; KLEIN, Julie Thompson; MILTCHAM, Carl (ed.). The Oxford Handbook of Interdisciplinarity. Oxford: Oxford University Press, 2010. p. 191-206. LISINGEN, Irlan von. Perspectiva educacional CTS: aspectos de um campo em consolidação na América Latina, Ciência & Ensino, [s. l.], v. 1, nov. 2007. número especial. LÓPEZ CEREZO, José Antonio. Ciência, tecnologia e sociedade: o estado da arte na Europa e nos Estados Unidos. In: SANTOS, Lucy Woellner dos (org.). Ciência, tecnologia e sociedade: o desafio da interação. Londrina: IAPAR, 2002. DIAS-RIGOLIN, Camila Carneiro. Metodologias de estudos sociais da ciência e tecnologia: uma síntese. [S. l., s. d]. Disponível em: http://observatorio.fiocruz.br/ponto-de-vista/metodologias-de-pesquisa-de-estudos-sociais-de-ciencia-e-tecnologia. Acesso em: 21 out. 2016. VELHO, Léa. Conceitos de ciência e a política científica, tecnológica e de inovação. Sociologias, Porto Alegre ,v. 13, n. 26, p. 128-153, 2011 . 161 Foto: Sílvia Moura SONHOS E REALIDADE: UM PERCURSO NOS CAMINHOS DA BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO À UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS FABIANO FERREIRA DE CASTRO* Descrever em breves páginas a trajetória de um professor e pesquisador em sua área de atuação, nem sempre parece ser uma tarefa simples, mas de qualquer forma vamos trilhá-la em algumas páginas. Minha inserção na área de Biblioteconomia e Ciência da Informação acontece em 1999, iniciada com a graduação, na Universidade Estadual Paulista (UNESP/Marília). Tudo muito novo para um jovem de dezessete anos que saíra do interior das Minas Gerais para explorar o universo de possibilidades oferecido pela universidade pública. Logo nos primeiros anos do curso, o convite para dedicar-se um pouco mais ao fazer biblioteconômico acontecera na vertente de estudos da área de Organização e Tratamento da Informação, mais especificamente à Catalogação Descritiva, realizando o trabalho de conversão retrospectiva de registros bibliográficos, momento o qual a Rede de Bibliotecas da UNESP iniciava o seu processo de automação do acervo institucional. Foram quatro anos de estudo e dedicação experenciados na atividade de catalogação descritiva, na confecção, na importação e na exportação de * Doutor e Mestre em Ciência da Informação (UNESP), Especialista em Uso Estratégico das Tecnologias de Informação (UNESP) e Bacharel em Biblioteconomia (UNESP). Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 2014. Contato: fabianocastro@ufscar.br. 163 registros bibliográficos no formato de intercâmbio MARC 21, em bases de dados servidoras disponíveis, que culminou no final do curso, o trabalho de conclusão, o qual pude identificar a necessidade de ligação entre teoria e prática profissionais. Após a graduação, a dedicação ao exercício biblioteconômico acontecera durante quatro anos, a partir das experiências em bibliotecas pública e universitária, no âmbito público e privado. No primeiro caso, como bibliotecário/chefe atuando na organização e na gestão do acervo, na promoção de atividades culturais e auxílio à pesquisa aos usuários da biblioteca. No segundo, bibliotecário do ensino superior, trabalhando com a catalogação descritiva, a indexação e a classificação dos recursos informacionais técnico-científicos. Vivenciar o fazer profissional foi de extrema importância para agregar conhecimento empírico aos estudos teóricos e, consequentemente, sua explicitação no atual contexto da sala de aula. Mas algo sempre me inquietou, não bastava apenas trabalhar no ambiente de biblioteca, para mim, sempre foi necessário o aprendizado continuado na área. Em 2005, iniciei o curso de pós-graduação lato sensu em Uso Estratégico das Tecnologias da Informação e Comunicação, também na UNESP, na cidade de Marília. Esse período foi importante por se tratar de um momento que o impacto das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), nos ambientes das bibliotecas (convencionais ou digitais) acontecera de forma exponencial, e as aplicações tecnológicas relacionadas às novas abordagens da representação e da descrição de recursos informacionais em ambientes informacionais digitais, tais como a Web Semântica e as Bibliotecas Digitais culminaram ainda mais em questões e indagações sobre os novos rumos da Catalogação descritiva. A partir do primeiro artigo científico publicado no Brasil, em 2004, no periódico Ciência da Informação, intitulado “A Web Semântica e suas contribuições para a ciência da informação”, dos autores Renato Rocha Souza e Lídia Alvarenga, da Escola de Ciência da Informação, da Universidade Federal de Minas Gerais fora realizado no final da especialização, o trabalho de conclusão de curso, com um levantamento teórico das principais publicações sobre o tema Web Semântica, na perspectiva da Ciência da Informação, o qual a literatura científica mencionava um novo padrão para a representação e a descrição de recursos informacionais, nesse contexto, ora nominado MarcOnt Initiative. A relevância tanto da Web quanto das bibliotecas digitais para os diversos ramos da ciência tem impulsionado pesquisadores e comunidades 164 científicas a buscar soluções de integração, intercâmbio e entendimento semântico sobre os conteúdos que nelas circulam, a fim de proporcionar uma recuperação mais precisa, relevante e significativa para o usuário final. A identificação e a caracterização do MarcOnt foram objeto de investigação no Mestrado em Ciência da Informação (2006-2008), como um padrão de representação da informação que contempla os aspectos de forma e conteúdo em bibliotecas digitais e na Web, na busca por uma descrição bibliográfica mais completa e complexa com a possibilidade de garantir uma melhora na performance de interoperabilidade entre sistemas e ambientes informacionais digitais. Após o término do mestrado, minha dissertação intitulada Padrões de representação e descrição de recursos informacionais em bibliotecas digitais na perspectiva da Ciência da Informação: uma abordagem do MarcOnt Initiative na era da Web Semântica, fora indicada pela UNESP, para concorrer na categoria de melhor dissertação dos Programas de Pós-Graduação em Ciência da Informação, no cenário nacional, sendo contemplada no Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação (ENANCIB-2009). Esse fator reforçou mais ainda o desejo de que eu estava no caminho certo, diante disso, continuei os estudos na área de representação da informação e tecnologia, no doutorado em Ciência da Informação (2008-2012), investigando os paradigmas da Catalogação Descritiva no século XXI, tratando das questões de modelagem estrutural de ambientes digitais, à luz dos modelos conceituais propagados no domínio bibliográfico, na identificação de elementos de interoperabilidade, a partir da descrição de recursos informacionais, em ambientes informacionais digitais. Durante o doutorado, o desejo e a necessidade de colocar o conhecimento adquirido ao longo da trajetória acadêmico-científica à disposição dos sujeitos institucionais ganham força e iniciam-se os processos seletivos para investidura na carreira pública do magistério superior, vontade que sempre esteve intrínseca, bem antes da pós-graduação. Meu sonho profissional sempre foi atuar como docente e pesquisador em uma universidade pública, no estado de São Paulo, naquela época, minhas opções eram UNESP/Marília, USP/Ribeirão Preto e UFSCar/São Carlos. Nada acontecerá naquele período e os principais concursos, na área de catalogação descritiva e tecnologia foram abertos na região nordeste. O primeiro concurso que realizei foi na Universidade Federal da Bahia (UFBa), em meados de 2008, o qual fiquei em segundo lugar. Dois anos depois, em 2010, fui chamado 165 na UFBa, e havia prestado outro concurso na Universidade Federal de Sergipe (UFS), o qual fui aprovado e tomei posse em meados de 2010. Agora sim, tudo perfeito, ou quase perfeito, exceto pela localização geográfica, que pretendia atuar. Ir para Aracaju, cidade onde funciona o curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Documentação foi um grande desafio, sair da minha zona de conforto de aproximadamente dez anos de UNESP, no interior paulista, para uma capital nordestina. Uma mistura de sentimentos e emoções tomaram conta naquela ocasião, de um lado, a realização profissional almejada há tanto tempo e, do outro, as incertezas e as ansiedades ao desbravar um novo território. A experiência profissional como docente na UFS foi de grande relevância para entender além dos muros da universidade pública federal. Iniciei meus trabalhos como docente na área de Organização e Tratamento da Informação, ministrando na graduação em Biblioteconomia e Documentação, as disciplinas do núcleo duro, Representação Descritiva, Representação Temática e Linguagens de Indexação. Dentre os desafios naquela época destacam-se os de recrutar recursos (material, tecnológico, financeiro e físico) para conseguir ministrar com o mínimo de condições necessárias os conteúdos programáticos. O olhar (curiosidade, admiração, surpresa etc.) dos alunos para o professor recém-chegado, num curso recém-criado, me incitava cada vez mais a doação física/intelectual, sobretudo pelo repertório e prática discursiva que pregavam acerca do ensino no nordeste brasileiro. Uma das primeiras experiências fora a de literalmente ensinar a escrever a língua portuguesa corretamente, algo que na minha mente achava inacreditável e até mesmo questionava como tal fato poderia acontecer na universidade pública federal. O primeiro resultado nessa empreitada foi impulsionar meus seis alunos de iniciação científica a apresentarem suas pesquisas no clássico congresso de iniciação científica da Universidade Federal de Sergipe, fato esse que culminou na divulgação do curso de Biblioteconomia e Documentação e das pesquisas que a área desenvolvia em Sergipe, e até então eram desconhecidas na comunidade científica. Outro fato memorável foi o desenvolvimento do primeiro trabalho de conclusão de curso do grupo de Informação e Tecnologia, trabalhando as questões de educação continuada do catalogador, trabalho que logrou êxito com seu desdobramento no periódico científico da Ciência da Informação, 166 com o artigo intitulado Educação Continuada em Catalogação Descritiva: um olhar emergente, na revista Biblios (Lima), em 2013; e, posteriormente, no evento denominado IX Encontro Internacional de Catalogadores e II Encontro Nacional de Catalogadores, na cidade do Rio de Janeiro, com a apresentação denominada A perspectiva da educação continuada em catalogação: um estudo em bibliotecas universitárias em Sergipe. A experiência da pesquisa em Biblioteconomia e Ciência da Informação acontecerá principalmente com a criação do primeiro grupo de pesquisa do Departamento de Ciência da Informação e cadastrado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o Grupo de Pesquisas e Estudos em Representação do Conhecimento e Tecnologias da Informação e Comunicação (GPERTIC). Muitos foram os trabalhos do grupo, além do engajamento nas atividades de pesquisa desenvolvidas com os graduandos do curso de Biblioteconomia e Documentação da UFS. A promoção, por exemplo, de eventos acadêmico-científicos acontecera por meio de palestras e debates, com convidados renomados da Ciência da Informação no país, e especialistas na Representação da Informação e do Conhecimento, com as temáticas que perpassavam os novos rumos da catalogação, a Biblioteconomia na era da Web Semântica, as Linguagens documentárias e a Ética em Organização e Representação do Conhecimento. Vale destacar também nessa trajetória minha atuação enquanto coordenador do curso de Biblioteconomia e Documentação da UFS (2012-2014), o que me permitiu uma nova experiência, agora de caráter administrativo, nas atividades de gestão, de reuniões de conselho de curso, da reformulação do projeto político pedagógico do curso, realizado pelo Núcleo Docente Estruturante (NDE), como conselheiro do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da UFS etc.; e, finalmente, o reconhecimento do curso de Biblioteconomia e Documentação da UFS, pelo Ministério de Educação e Cultura (MEC), experiência muito gratificante e significativa na minha carreira profissional e pessoal, cujo resultado positivo atribuiu nota quatro ao Bacharelado em Biblioteconomia e Documentação da UFS. Passados quase quatro anos de UFS e acreditando que iria me estabelecer em Aracaju, algo inusitado acontecerá numa manhã de meados de outubro de 2013, quando recebo um telefonema do chefe do Departamento de Ciência da Informação (DCI), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), dizendo se eu tinha interesse em atuar no DCI/UFSCar, pois o conselho 167 departamental havia aventado naquela ocasião, possíveis nomes de docentes vinculados às universidades públicas federais e com perfil específico na área de Análise e Representação da Informação. Após consulta e votação do conselho, verificaram que meu perfil e currículo era o que mais se enquadrava para sanar as necessidades e as lacunas existentes no DCI. Foi uma decisão muito difícil naquele momento, primeiro por questões pessoais, mas ao mesmo tempo, um sinal providencial que retomavam meu sonho e desejo originais, de atuar como docente e pesquisador, no estado de São Paulo, sobretudo, naquela lista inicial de universidades elencadas, a qual a UFSCar estava incluída. Em fevereiro de 2014 minha portaria de redistribuição da Universidade Federal de Sergipe para a Universidade de São Carlos, fora publicada no Diário Oficial do Estado de São Paulo atuando, desde então, como docente e pesquisador da UFSCar, até o presente momento. Um novo processo de adaptação inicia-se na minha vida, de caráter pessoal, local, cultural e institucional, mas dessa vez acreditando estar no lugar certo, na hora certa e vivenciando o almejado sonho. No primeiro semestre de 2014 iniciei minhas atividades da graduação no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, ministrando as disciplinas de Organização de Unidades de Informação e Indexação e Tesauros. Experiência bastante interessante, principalmente pelo aspecto de ter sido abordado por uma aluna, logo no primeiro dia de aula, solicitando que eu a orientasse na disciplina de TCC. Os mesmos olhares, as mesmas expectativas, as mesmas inquietações, as mesmas surpresas, assim como as mesmas admirações eram percebidas e estavam estampadas na face dos alunos, novamente para o professor recém-chegado. No segundo semestre de 2014 ministrei as disciplinas de Linguagens Documentárias II, Representação Temática II e Trabalho de Conclusão de Curso para BCI I. À medida que o tempo fora passando fui me envolvendo em trabalhos de variadas naturezas na UFSCar; na atividade de gestão, fui convidado para representar o Departamento de Ciência da Informação, no conselho da PróReitoria de Extensão (PROEX), como conselheiro do Departamento de Ciência da Informação, como conselheiro do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, na área de Controle dos Registros do Conhecimento; na atividade de pesquisa, para coorientar uma pesquisa na área de metadados para preservação digital, no Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia 168 e Sociedade (PPGCTS), para participar como membro avaliador do processo seletivo para doutorado do PPGCTS, em 2014. A UFSCar foi me abrindo algumas portas e um leque de opções para atuação em distintas vertentes e colaborações, por se tratar de uma localização estratégica na região Centro-Leste do estado de São Paulo, por exemplo, com a Universidade Estadual Paulista (UNESP), na cidade de Marília, com a Universidade de São Paulo (USP), na cidade de Ribeirão Preto e com a Pontifícia Universidade Católica (PUC), na cidade de Campinas. Fato interessante que vale a pena relatar dentre as experiências vivenciadas na UFSCar foi o posicionamento de um aluno de graduação do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, ao questioná-lo com uma pergunta que costumo fazer logo no primeiro dia de aula, com os alunos novos, sobre o porquê da escolha pela Biblioteconomia. Ele imediatamente me respondeu dizendo que detestava o curso, estava fazendo porque queria ter qualquer formação superior, que não iria exercer jamais a profissão e também porque alguém o havia sugerido. Como desafio lançado interiormente, disse para mim mesmo: esse menino ainda irá mudar de opinião! Terminadas as disciplinas em 2014 e primeiro semestre de 2015, o mesmo aluno, agora com semblante totalmente descarregado e sereno, se reporta até mim, com a seguinte fala: “professor Fabiano, quero agradecê-lo por me abrir os olhos para a Biblioteconomia, vou me esforçar para ser um bom aluno, e mais do que isso, exercerei minha profissão, custe o que custar”. Muito gratificante e principalmente responde aos meus questionamentos internos de que estou no lugar certo, na profissão certa, fazendo a coisa certa e contribuindo de alguma forma, para mudar, influenciar ou ampliar opiniões e conhecimento. Ainda em 2014, numa reunião informal a priori com um pequeno grupo de professores, discutíamos e questionávamos os motivos de um curso de quase vinte anos não possuir um Programa de Pós-Graduação na área de Ciência da Informação. Dessa maneira, subsequente à essa reunião, formamos um grupo de trabalho para desenvolver um projeto político pedagógico para o curso de mestrado acadêmico em Ciência da Informação. Trabalho esse que fora executado durante quase um ano e meio e encaminhado em meados de 2015 ao comitê das Ciências Sociais Aplicadas, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), para avaliação e apreciação. Para mim fora um enorme desafio, mas mais do que isso, a oportunidade por contribuir de alguma maneira com todo o conhecimento adquiri- 169 do ao longo dos anos na área de Biblioteconomia e Ciência da Informação e um compromisso social com a comunidade científica. Em dezembro de 2015 tivemos a resposta da avaliação de forma bastante positiva, sendo aprovado para iniciar o novo Programa de Pós-Graduação em Ciência da UFSCar em agosto de 2016. Cabe ainda relatar mesmo que brevemente, minha curta e rápida passagem pela coordenação do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação de agosto de 2015 a maio de 2016, experiência essa que é marcada pela aprovação e renovação de reconhecimento da graduação em Biblioteconomia e Ciência da Informação pelo MEC, conferindo a nota máxima cinco, ao curso da UFSCar, segundo os critérios de excelência, no cenário das universidades brasileiras. Todos esses fatos até aqui pontuados mostram e me fazem perceber cada vez mais que o trabalho, deixa de ser encarado como obrigação, à medida que suscita emoção, gosto, prazer e o despertar para um novo, com a esperança de superação constante diante dos novos desafios postos pela instituição pública federal. Na continuidade das atividades acadêmico-científicas encontram-se a docência na graduação em Biblioteconomia e Ciência da Informação nas disciplinas de Catalogação II e III e Automação de Unidades de Informação e no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, as disciplinas ministradas giram em torno dos temas Epistemologia em Ciência da Informação, Formas de Representação da Informação: dos catálogos aos repositórios digitais e Catálogo bibliográfico e ontologia, que estão alocadas na linha 2 Tecnologia, Informação e Representação do PPGCI/UFSCar. Além disso, as orientações no mestrado concluídas e em andamento, a saber: Perfil de aplicação de metadados baseado em FRBR e RDA: contribuições do domínio bibliográfico; Metadados de preservação digital em Cloud Services; A identificação de padrões de metadados para a preservação digital (concluídas); Diretrizes para a adequação de dados bibliográficos ao Linked (Open) Data e O uso de padrões de descrição para a representação de jurisprudência. No Grupo de Pesquisas e Estudos em Representação do Conhecimento e Tecnologias da Informação e Comunicação (GPERTIC), as pesquisas têm se concentrado no estudo das TIC e na modelagem de ambientes informacionais digitais, sob o enfoque dos padrões de representação e de descrição de recursos informacionais, ontologia, metadados e a iniciativa linked open data e estão sustentadas metodologicamente pela Revisão Sistemática da Literatura. 170 Uma das facetas de contribuições diretamente relacionadas à comunidade da UFSCar está no repasse das experiências vivenciadas diretamente no eixo de disciplinas ministradas na graduação e na pós-graduação, para a formação profissional que são indissociáveis às pesquisas desenvolvidas no interior do grupo de pesquisa para o fortalecimento da área de Ciência da Informação. Quero finalizar dizendo que descrever essa experiência e trajetória sem dúvidas é algo complexo e inacabável. Comemorar os vinte anos do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), nos convida a revisitarmos fatos, histórias, emoções e cultura de uma comunidade estabelecida que se perpetua ao longo do tempo. A palavra para representar esse momento é gratidão, não é o Departamento de Ciência da Informação, o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, o Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, ou ainda, a comunidade acadêmica que recebe o presente, mas este docente e pesquisador que tem o privilégio e a oportunidade de desfrutar de um acontecimento célebre e contribuir com suas memórias para o passado, o presente e quiçá o futuro da Universidade Federal de São Carlos. 171 Foto: Sílvia Moura MINHAS LEMBRANÇAS NA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO ANA CAROLINA SIMIONATO ARAKAKI* Cada um dentro dos afazeres diários adquire experiências de diversas maneiras, mas muitas delas não são compartilhadas, ou tão pouco, há a oportunidade em compartilhar. Por essa razão, o resgate das memórias e contribuições de diferentes pessoas e em vários momentos do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) constitui de uma ação muito valiosa e única. Parabenizo as organizadoras, Zaira e Paula pela ideia tão especial na organização desse livro. Realizar o exercício de buscar momentos importantes até o meu ingresso ao BCI UFSCar remete a algumas lembranças nostálgicas. Desde o início de minha graduação ao exercício da função de docente com a pesquisa e a extensão, foram muitos desafios, frustrações e alegrias, cada um em seu momento. A cada passo dentro da minha vida profissional, a presença da minha família foi marcante, principalmente as orientações de meu pai Agostinho. Acredito que tenha usufruído ao máximo que consegui de seus conselhos e me despertaram clareza e cautela de minhas ações, com serenidade e leveza. Mas durante a composição desse capítulo, meu pai Agostinho sofreu um grave acidente e despediu-se desse mundo. Para mim, é um momento profundo e que durante esse relato, suas falas ainda estão presentes e me fazem relembrar ocasiões importantes da minha vida profissional. Até o momento de ingresso no curso de Biblioteconomia, carregava comigo mais incertezas do que decisões. Após entender um pouco mais do que seria * Doutora e Mestre em Ciência da Informação (UNESP), Bacharel em Biblioteconomia (UNESP). Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 2015. Contato: acsimionato@ufscar.br. 173 a profissão, revejo que o meu primeiro contato com a Biblioteconomia, foi criado pelos meus pais. A ação de organizar ou categorizar, em minha família sempre foi muito presente, uma obrigação. Independente do material, documentos, roupas, dispensa do mercado, tudo deveria ser organizado. Mas especialmente com os livros essa relação foi singular desde muito pequena, minha mãe Roseli me ensinou a categorizar, guardá-los pela cor ou pelo tamanho de cada um. Meus pais são professores do ensino médio, por essa razão, eu sempre fui cercada por livros, eram inúmeros nas prateleiras do quarto de lições de casa. Livros didáticos de português, física, matemática, geografia e história que meus pais utilizaram para a preparação de suas aulas. Embora meus pais pouco se dedicavam a leitura de estilos literários diferentes dos didáticos, o incentivo à leitura aos filhos era frequente. Na infância em Santo Antônio do Jardim no estado de São Paulo, lembro que outro contato com a área, foi na biblioteca da escola estadual que minha mãe lecionava pela manhã. Quando eu era pequena, nem sempre minha mãe conseguia deixar meus irmãos e eu com alguém, ela precisava trabalhar e às vezes, me levava para a escola. Em determinadas aulas não era possível que ficasse em sala, em avaliações por exemplo, e eu ficava esperando-a na biblioteca. A biblioteca era uma pequena sala com estantes e livros em todas as paredes, mas lá estava a Eulina, professora readaptada para a biblioteca, que fazia dos mágicos os momentos na biblioteca e me apresentava a todos os livros ilustrados que existiam por lá, as histórias e a possibilidade de ter outra realidade dentro dos livros sempre me chamaram atenção. Me lembro que em uma dessas perguntas de adulto, o que você será quando crescer?! Com a experiência mínima em bibliotecas e com a Eulina, eu respondi que gostaria de cuidar de livros. No entanto, a reação da pessoa que me perguntou, foi de espanto. “– Ah, mais você deve fazer algo mais comum, como ser dentista, médico, advogado ou engenheiro, não existe uma faculdade para cuidar de livros”. Assim, minha pequena ilusão de cuidar dos livros ficou adormecida por um bom tempo e foi substituída por outros interesses. Me encantei por várias outras profissões, medicina, arquitetura, odontologia, veterinária, direito e pedagogia, cada hora, era uma escolha diferente. Até ao final do ensino fundamental, meu ensejo correspondia a ser uma pesquisadora, não importava qual graduação fosse cursar. Essa opção inusitada deve-se pelas tentativas que meu pai fez em ingressar no mestrado. 174 Mesmo meu pai não sendo aprovado, a motivação que ele possuía me entusiasmava e acabei comprando o sonho da carreira acadêmica. Não fazia a menor ideia do que seria uma carreira acadêmica, mas pensar em continuar meus estudos após uma graduação me intrigava. Seria a primeira da minha família a ter uma pós-graduação strito sensu, ou mesmo, criar novas possibilidades e caminhos. Independente disso, a minha prioridade era passar em universidade pública, pois, meus pais não teriam condições de me ajudarem em uma faculdade particular. No processo de definição da profissão optei erroneamente pelo critério de afinidade, a medicina. E prestei alguns vestibulares no final do terceiro ano do ensino médio, mas sem sucesso. Fiz um ano de cursinho, mas a auto cobrança e a pressão em casa para entrar em uma faculdade logo, foi muito grande. Na época, não iria prestar o vestibular da UNESP por não ter uma cidade próxima a minha cidade, mas meu pai acabou insistindo tanto, que acabei prestando um dos primeiros cursos. Selecionei a Biblioteconomia sem saber o que significaria a profissão ou mesmo se iria cursá-la caso fosse aprovada. O resultado foi que consegui ser aprovada no vestibular da UNESP e nos outros vestibulares que fiz a opção pela medicina, fiquei em uma lista de espera que eternamente aguardaria a ser chamada. Bom, aprovada no vestibular decidi viajar para o outro lado do estado, em Marília para cursar Biblioteconomia. Meus pais ficaram desesperados de preocupação, “– É isso mesmo que você quer fazer?” Mas naquele momento, era algo impossível de se dizer e o desejo de ir e descobrir coisas novas era muito maior. Durante o período pré-vestibular e de escolha da profissão, criamos muitas barreiras e monstros para escolher o que faremos, e ainda pensamos que é a última oportunidade para fazer algo. Comigo não foi diferente, quando ingressei na faculdade em 2007, na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Faculdade de Filosofia e Ciências de Marília/SP eu precisei passar por muitas adaptações. Principalmente no primeiro ano de curso, os desafios longe de casa e da minha família, todas as novidades e tarefas de uma nova rotina foram uma boa experiência para quem inicia a vida adulta. O que mais me afligia nos primeiros semestres foi a indefinição quanto ao curso, até o quarto semestre as disciplinas não apresentavam as características reais e possibilidades da profissão. As disciplinas eram bem amplas, o que geravam muitas incertezas quanto ao mercado de trabalho ou possibili- 175 dades de pesquisa. Para amenizar as dúvidas sobre a profissão, tentei envolver com o que a faculdade oferecia. O primeiro contato foi um estágio voluntário na biblioteca do Campus, não tinha muitas funções, guardei vários livros, mas conheci todo o acervo principalmente o da área, o que me surpreendia era livros sobre tecnologia na bibliografia básica no curso. Essa relação só fez sentido mais tarde, quando a professora Dra. Plácida L. V. A. da Costa Santos na disciplina de Catalogação convidou a todos alunos a participarem de algumas atividades do Grupo de Pesquisa “Novas Tecnologias em Informação” (GP-NTI). Bom, me inscrevi junto de alguns colegas de classe. A professora Plácida havia acabado de criar o projeto Grupo de Estudos de Catalogação Automatizada (GECA) e buscava alunos interessados em desenvolver estudos em temas de catalogação, com a finalidade de divulgação do tema, e consequentemente, para a participação de outros interessados nos temas abordados e possa gerar a constituição e ampliação de uma rede informacional sobre Catalogação Automatizada. Pouco tempo depois, a professora Plácida também criou o grupo uma rede de informação colaborativa experimental no interior do Grupo de Pesquisa – Novas Tecnologias em Informação, inserido a linha de pesquisa Intersemioses Digitais. A Comunidade Ciência da Informação, Arte e Mídia (CIAM) foi enriquecedor por estudar as estruturas da imagem e a relação entre a informação textual e a sintaxe imagética. Além disso, a Comunidade ofereceu momentos enriquecedores em explorar novas concepções para os objetos informacionais, por meio de muitas atividades de leitura, apresentações de textos e atividades culturais e artísticas, o que me ajudou a desenvolver ainda mais meu interesse pelas fotografias. A fotografia é muito mais do que uma imagem capturada, é possível sentir, descobrir, viajar e recordar. Com isso, iniciei a escrever meu primeiro projeto de pesquisa com o título “Catalogação de imagens digitais: busca por um sistema eficiente” que foi aceito pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo FAPESP 08/06844-8, com vigência de novembro de 2008 à outubro de 2010, sob a orientação da professora Plácida. Durante a pesquisa, pude observar a pouca quantidade de literatura para descrição de imagens no Brasil e ampliar meus conceitos em relação às imagens digitais, incluindo fotografias, xilogravuras, entre outros audiovisuais. 176 Ao final do quarto ano do curso de Biblioteconomia, minha orientadora convidou todos os seus orientandos para participarem de uma reunião. Nessa reunião, ela apresentou um conjunto de artigos e pediu que elaborássemos uma forma de organizá-los. Após algumas horas ela retornou e apresentamos uma forma de organização e então ela nos propôs que iniciássemos uma biblioteca para estudos e aplicações de metadados no interior do GP-NTI, que denominaria de Biblioteca de Estudos e Aplicação de Metadados (BEAM). Com pouco tempo para o encerramento das atividades do ano letivo e da minha formatura, trabalhamos intensamente em seis meses para estruturar a criação e desenvolvimento de uma biblioteca, fazendo diversas reuniões para discutir quais instrumentos seriam melhores para estruturação de nossas atividades. Foi designado a mim, algumas atividades como a definição dos metadados e o processamento técnico, tanto na parte temática quanto descritiva. Entretanto, a atividade que mais me marcou foi a definição de metadados para artigos científicos para nossa biblioteca e que posteriormente resultou em um artigo científico (SANTOS; SIMIONATO; ARAKAKI, 2014). Apesar de estar já quase formada, foi a primeira vez que pudemos tomar decisões em escolher os instrumentos que iríamos adotar e quais seriam os procedimentos adotados. Mas como todo final de ciclo, crescem as incertezas do que virão depois. Após o fim da graduação, participei de vários concursos para o cargo de bibliotecário e também o processo seletivo para o ingresso no mestrado. Fui aprovada nos concursos e no mestrado, no entanto, minha preocupação na época era caso não conseguisse uma bolsa. Minha primeira opção seria assumir o concurso da minha cidade, Espírito Santo do Pinhal no estado de São Paulo, e tentar conduzir o tempo com o mestrado em Marília, aproximadamente 800 quilômetros de distância para ida e volta, em todas as semanas. No final, tudo ocorreu da melhor forma, em 2011 ingressei no mestrado acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista, no Campus de Marília e com o financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e FAPESP, com dedicação exclusiva. Cursei muitas disciplinas e pude aprender muito com o aprofundamento teórico de cada uma. A pesquisa foi uma continuação da pesquisa de Iniciação Científica, com o projeto de mestrado “Metadados para representação das imagens digitais”, processo FAPESP 2010/13367-1, com vigência de agosto de 2011 à julho de 2012. Durante o mestrado, meu interesse aproximou cada vez mais dos estudos da Ciência da Computação e dos modelos de referência da Ciência da 177 Informação. Dessa forma, baseado nos Requisitos Funcionais de Registros Bibliográficos (FRBR) minha dissertação apresentou um modelo conceitual específico para imagens digitais, nomeado de Requisitos Funcionais para Dados Imagéticos Digitais (RFDID). Com as disciplinas cursadas e feito o direcionamento com o tema do projeto, grande parte da dissertação já estava pronta, optei em adiantar o mestrado e prestar o processo seletivo do doutorado. Nesse momento, eu não tive apoio de muitos de meus colegas, pois, eles me aconselhavam a permanecer com a bolsa, ainda teria mais um ano do período total. Mesmo assim, todo o trabalho já estava pronto e os créditos cursados, me incomodava a ideia de protelar ainda mais o tempo, e defendi meu mestrado em 6 de julho de 2012. Devido ao encerramento da dissertação e da bolsa do mestrado, precisava de algum trabalho, pois o início do processo seletivo do doutorado na época era demorado e as inscrições começavam em agosto e o resultado só saía em dezembro. Assim, enviei vários currículos para trabalhar como docente ou bibliotecária em várias cidades, até que fui chamada para uma entrevista em uma faculdade especializada em cursos semipresenciais na cidade de São Paulo. Por um lado, fiquei muito feliz por conseguir essa vaga, mas por outro, fiquei muito preocupada em morar na cidade de São Paulo e novamente as dúvidas tomaram conta. Por um momento, não sabia se realmente estava preparada para tantas novidades, entretanto, após refletir muito em toda minha formação encarei o desafio de morar em uma nova cidade. Quando assumi o cargo na UniSEB Interativo, me deparei com um cenário que poderia aplicar na prática meus conhecimentos da profissão. Era a única bibliotecária para todo o polo semipresencial da faculdade e trabalhava conjunto a sede, em razão da faculdade possuir um ensino a distância com vários polos semipresenciais no país. Logo nas primeiras semanas, fui informada que não poderia fazer o tratamento técnico dos livros da biblioteca em que trabalhava, pois havia uma rede central na unidade sede, responsável pela catalogação centralizada. A princípio fiquei muito decepcionada, pois, minha formação toda era focada na catalogação e não iria fazê-la. Entretanto, existiam outros desafios e tarefas naquela biblioteca. Com um acervo fechado de aproximadamente 10 mil livros e periódicos, a biblioteca estava muito tempo sem um bibliotecário, então pouco alunos conheciam e/ou frequentavam a biblioteca, além da falta de incentivo e da dificuldade de permanência dos alunos em uma faculdade com cursos 178 semipresenciais. Após muitas conversas com a coordenadora pedagógica do polo, firmamos diversas parcerias para fazer os alunos conhecessem e frequentassem a biblioteca e seu acervo. Nos currículos dos cursos, os alunos precisavam de horas complementares, que decidimos explorar com atividades na biblioteca. Então, elaboramos uma campanha de anistia na biblioteca dos livros atrasados ou perdidos pelos alunos, além de atividades voluntárias para arrecadação de livros infantis para Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) da cidade de São Paulo. Além dessa campanha, realizei serviços para orientações e referências aos alunos, incluindo a auxílio à pesquisa, normalização de trabalhos acadêmicos, levantamento bibliográfico. Em pouco tempo, a coordenação do polo percebeu a mudança na rotina da biblioteca e com isso, ganhamos um espaço maior. A biblioteca passou de um espaço de apenas 25 m² para mais de 40 m² e ainda com adequações que garantissem a permanência do aluno, por meio de mesas individuais grupo, conexão para internet, abertura do acervo para consulta. O resultado foi que os alunos gostaram daquele espaço e criaram o hábito de chegar ao polo antes do período de aulas para entender o conteúdo ou mesmo utilizar o espaço para trabalhos. As mudanças com os alunos e com o uso da biblioteca, foram nítidas e fiquei satisfeita com o meu trabalho. No entanto, eu sentia que minhas necessidades profissionais eram maiores. Antes de sair o resultado do processo seletivo do doutorado, em 2013, prestei outros processos seletivos para o cargo de bibliotecário na cidade de São Paulo mesmo, mas após a aprovação e o início das aulas no doutorado, eu não tive tempo suficiente para assumi-los. Ingressei em março de 2013 no doutorado no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista, no Campus de Marília, e como já havia participado do processo seletivo de bolsas CAPES, ingressei com uma bolsa. Mas logo em abril, surgiu a oportunidade em prestar o processo seletivo de docente colaborador da Universidade Estadual de Londrina (UEL), no departamento de Ciência da Informação. Fui aprovada em segundo lugar, mas como havia duas vagas, houve uma convocação bem rápida. Em praticamente dois meses, morei em três cidades: São Paulo, Marília e Londrina, no estado do Paraná. Mudanças de rotina e costume tiveram que ser muito rápidas. O processamento descritivo, com a “Catalogação” e a “Catalogação de recursos informacionais” foram as principais disciplinas que lecionei no curso 179 de Biblioteconomia da UEL, além delas também trabalhei com disciplinas de “Laboratório de Orientação e Normalização Bibliográfica”, “Fontes de Informação” e “Recursos de Informação para a Pesquisa Científica” para cursos totalmente diversificados, Arquivologia, Biblioteconomia, Relações Públicas, Letras, Secretariado Executivo e na especialização de Docência Superior do curso de Pedagogia. Além do aprendizado constante com as disciplinas, no Departamento de Ciência da Informação da UEL consegui tecer parcerias para projetos de pesquisa e extensão, uma delas, originou-se o Grupo de Pesquisa Organização e Representação da Informação e do Conhecimento de Recursos Imagéticos (ORICRI) com a professora Dra. Ana Cristina de Albuquerque. Com a construção do grupo ORICRI, realizamos uma parceria com os cursos de Design Gráfico e de Moda, criando assim, uma Material-teca. A Material-teca seria um laboratório prático e integrado de ensino, pesquisa e extensão, entre os cursos envolvidos. Nossa primeira ação, foi a organização do acervo dos Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) dos alunos do curso de Moda e Design Gráfico, conjunto aos alunos do curso de Biblioteconomia e um trabalho conjunto das disciplinas que envolviam o tratamento temático e descritivo de recursos informacionais, como a catalogação, classificação e indexação. Ao final do período letivo, iniciamos o tratamento com as amostras de tecidos, mas que seriam realizados ao decorrer do próximo ano. No início da docência e com as disciplinas da que estava cursando do primeiro ano do Doutorado, estava sobrecarregada. Entre todas as dificuldades consegui eliminar todos os créditos logo no primeiro ano e faltava apenas a tese. Para a definição do tema da tese foi conturbado, o projeto inicial era proposto a criação de um modelo para que os dados de imagem conjugassem a iniciativa Linking Open Data, mas a cada orientação, minhas opções aumentavam, o que acabava completamente a minha pesquisa. Ao longo do segundo ano de doutorado, a estruturação da tese e dos capítulos já estava bem encaminhada. Com a aproximação com curso de Arquivologia o viés da tematização aliou-se a necessidade de entender melhor os princípios descritivos e a integração de arquivos, bibliotecas e museus. Dessa forma, escolhi ampliar o RFDID para os contextos de bibliotecas arquivos e museus, denominado de Digital Image for Library, Archives and Museums (DILAM). O DILAM é uma proposta de uma integração dos princípios descritivos da Arquivologia, da Biblioteconomia e da Museologia, por meio de elementos do domínio e a estrutura do ambiente na descrição das caracterís- 180 ticas dos recursos. O modelo conceitual DILAM possui requisitos funcionais baseados nas tarefas dos usuários, além do mapeamento dos atributos de diversos padrões de metadados. Na qualificação em dezembro de 2014, minha intenção na época era delinear o futuro do meu trabalho o quanto antes para um doutorado sanduíche. No entanto, na mesma época saiu o edital de um concurso na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) para concurso efetivo de docente. Decidi investir no concurso, pois, mesmo caso não fosse aprovada em primeiro lugar, eu prepararia para uma aprovação e uma boa colocação, caso surgisse outras oportunidades, conseguiria ter tempo necessário para finalização da tese. Além disso, caso fosse aprovada, a cidade de São Carlos é próxima a cidade de minha família e isso me permitiria vê-los com maior frequência. A preparação para o concurso da UFSCar foi bem intensa até o final de fevereiro de 2015, período de sua realização. Na mesma semana, o resultado: aprovada em primeiro lugar. Foi muita felicidade em ser aprovada em um concurso efetivo, mas em consequência, após a aprovação procurei lutar contra o tempo. Durante o processo do concurso, a banca comentou que a convocação seria logo e que caso aprovasse precisaria defender logo. Por essa razão, o período após o concurso trabalhei intensamente para finalizar a tese. Muitas noites sem dormir e fins de semana quase sem parar. Mas consegui finalizar a tese e defender em março de 2015, ou seja, novamente consegui antecipar a defesa da pós-graduação, foram dois anos de duração após ter ingressado no doutorado. Nos momentos que precisei parar a dedicação da tese, foram para organizar desvinculação com a UEL e preparar a mudança para a cidade de São Carlos. Após a finalização da tese, atingi um sonho meu e da minha família, conjuntamente, novos desafios. No final de abril fui nomeada e convocada para assumir a vaga de docente no Departamento de Ciência da Informação da UFSCar. Novamente enfrentei um período de adaptação da cidade e da cultura do Departamento, cada um possui a sua. Acredito que ainda esteja enfrentando esse período de adaptação, mesmo com um ano após assumir a vaga, e tentando aprender a cada dia de trabalho. As disciplinas, mesmo sempre ter trabalhado com a catalogação, na UFSCar encarei o desafio de assumir as aulas de Linguagens documentárias. Sempre me interessei com os sistemas de classificação, mas nunca tive a oportunidade de trabalhar com ela. Acredito que minha maior contribuição para 181 área seria envolver um pouco mais de tecnologias nesse tipo de processo. Além de trabalhar a ênfase “Discurso, história e memória” como um meio que os alunos possam aliar a teoria e prática da Biblioteconomia e Ciência da Informação, repensando os patrimônios culturais com a extensão universitária. Há pouco tempo assumi a coordenação do curso, o que está sendo uma grande responsabilidade repleta de tarefas que diluem em todas outras tarefas do ensino superior. Entender os processos administrativos da Universidade e amenizar conflitos e atender as necessidades dos alunos, envolve dedicação. É o que tenho enfrentado nos últimos meses. Me sinto feliz em ter conseguido passar no concurso e hoje participar do crescimento do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar conjunto a todos docentes, e agora com a continuidade por meio da Pós-graduação em Ciência da Informação. Vejo que as dificuldades de todo o processo de ensino, pesquisa e extensão é parte do aprendizado que possuímos diariamente. Espero que a construção do BCI UFSCar seja cada vez mais coletiva e que o curso continue atendendo as necessidades do mercado e para à pesquisa. Referências SANTOS, P. L. V. A. DA C.; SIMIONATO, A. C.; ARAKAKI, F. A. Definição de metadados para recursos informacionais: apresentação da metodologia BEAM. Informação & Informação, [s. l.], v. 19, n. 1, p. 146, 25 fev. 2014. Foto: Waldeck Schutzer MEUS CAMINHOS NA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO: ENTRE PALAVRAS E LEMBRANÇAS PAULA REGINA DAL’EVEDOVE* Quando ainda menina, observei o esforço da minha mãe Luzia (in memorian) para adquirir conhecimento e uma educação formal. Diante das inúmeras dificuldades vivenciadas por uma mulher nascida e criada na roça e mãe de sete filhos, aos 56 anos de idade ela concluiu o ensino médio. Para muitos, uma conquista ínfima. Para mim, o exemplo maior de vontade e querer! Na maioria das vezes, seu conselho e exemplo pessoal eram direcionados à importância que eu deveria dar ao estudo como fonte de crescimento pessoal e profissional. Como resultado natural, construí a minha jornada terrena consciente de que a busca pelo conhecimento deveria ser uma meta de vida. Minha mãe partiu cedo demais para ver os caminhos que percorri no âmbito profissional. Não obstante, fui docemente agraciada com a companhia do meu esposo Thiago Sales dos Santos e dos meus filhos Thomas e Theodoro, ou simplesmente Tom e Theo – amores que desde o início tornam os meus passos mais leves e cheios de energia. Caminhar com vocês por toda a eternidade é um privilégio! O começo na Ciência da Informação deu-se com a escolha da minha profissão. Aos dezessete anos prestei o meu primeiro vestibular para o curso de Arquivologia na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), em Marília, minha cidade * Doutora e Mestre em Ciência da Informação (UNESP), Tecnólogo em Gestão de Pessoas (UNIVEM) e Bacharel em Biblioteconomia (UNESP). Docente no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar desde 2015. Contato: p.dallevedove@gmail.com. 184 natal. Por conta do falecimento recente da minha mãe, passei a morar sozinha e a me deparar com novos desafios. Fui convocada, mas não efetuei a matrícula. No ano seguinte, prestei novamente o vestibular na UNESP, desta vez para o curso de Biblioteconomia, por ver em minhas irmãs bibliotecárias, Solange e Roberta, uma profissão que me traria satisfação pessoal e profissional. Sim, minhas irmãs exerceram grande influência nesta decisão. Sou imensamente grata por isso! Iniciei meus estudos no ano de 2004. As dificuldades logo surgiram. Ao término do meu primeiro ano na Biblioteconomia não conseguia me reconhecer no curso; anseio vivenciado por muitos dos meus colegas, naquela época, e agora, por meus alunos. Como tantos outros colegas de profissão, quando criança não aspirava administrar a informação, apesar de hoje perceber-me uma bibliotecária por vocação! Os estágios realizados na Biblioteconomia tornaram o curso mais empolgante. Até que uma outra angústia surgiu: os burburinhos acerca do Trabalho de Conclusão de Curso. Para amenizá-los, no final do segundo ano prestei processo seletivo para atuar como bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) da UNESP/Marília com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sob orientação da Profa. Dra. Mariângela Spotti Lopes Fujita. Durante a Iniciação Científica fui, paulatinamente, envolvida pelos encantos da pesquisa científica e as diversas possibilidades de investigação no campo de conhecimento das ciências da Informação. Passei a integrar o Grupo de Pesquisa Análise Documentária e a frequentar reuniões de pesquisa na casa da professora Mariângela. Nestes encontros, fui agraciada com as experiências de colegas queridas, em especial da Milena Polsinelli Rubi e da Vera Regina Casari Boccato (in memorian). Destes, nasceu o interesse por questões relacionadas à subjetividade e suas implicações na representação de assunto. Consciente de que a leitura documentária incorpora complexidades, iniciei meus primeiros estudos e publicações na Ciência da Informação. Estratégias para o ensino de indexação: o uso do protocolo verbal interativo como recurso de aprendizagem de indexadores aprendizes e O estudo da cognição profissional pelo protocolo verbal de catalogadores de assunto em contexto de biblioteca universitária: uma abordagem sóciocognitiva pela análise de domínio foram os meus primeiros projetos de pesquisa. Diante de críticas e indagações de diversas naturezas e contrariando uma sociedade que prega a busca pela ascensão profissional como prioridade 185 de vida, casei-me em julho de 2007, último ano da graduação. Essa foi, sem dúvida, a melhor escolha que fiz, pois com ela formei minha família. Desde então, jamais o meu sorriso foi o mesmo! Conclui a graduação em Biblioteconomia com a defesa do Trabalho de Conclusão de Curso, fruto das pesquisas conduzidas na Iniciação Científica. Lembro-me do momento com bastante carinho, pois nesta ocasião fui encorajada a cursar uma pós-graduação. Aceitei o desafio. Optei pela carreira acadêmica e tracei minha trajetória profissional. Em 2008 iniciei meus estudos no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP/Marília, também sob orientação da Profa. Dra. Mariângela Spotti Lopes Fujita. As diversas disciplinas cursadas ampliaram minha visão acerca do campo científico e profissional da Ciência da Informação, reforçando ainda mais o meu interesse por questões relacionadas à organização e à representação da informação e do conhecimento. Dediquei-me integralmente aos estudos durante os dois anos do Mestrado, tendo sido contemplada com bolsas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). A pesquisa conduzida neste momento obteve amparo no seguinte questionamento: A partir do levantamento de interesse, grau de informações, atitudes, visões e conhecimentos dos profissionais bibliotecários ligados à atividade de tratamento temático da informação é possível obter subsídios que contribuam para uma sistematização do processo que alie o “saber” (aportes teóricos) e o “fazer” (prática cotidiana), visando diminuir incoerências ou omissões e dar maior consistência para a criação de produtos informacionais? Mediante tal indagação, o objetivo da pesquisa foi identificar a percepção profissional sobre o processo de tratamento temático da informação realizado no âmbito de bibliotecas universitárias, visando oferecer subsídios para a elaboração de uma política de indexação condizente para a realização do processo pela perspectiva profissional. Recordo-me com satisfação das minhas bancas de qualificação e de defesa da Dissertação intitulada A perspectiva sóciocognitiva no tratamento temático da informação em bibliotecas universitárias: aspectos inerentes à percepção profissional; ocasião em que os professores doutores José Augusto Chaves Guimarães (UNESP) e Vera Regina Casari Boccato (UFSCar) teceram importantes contribuições para a conclusão da pesquisa. Além disso, a presença da minha família tornou tudo mais especial e significativo! 186 Em março de 2010, mesmo mês em que conclui o Mestrado, fui aprovada no processo seletivo do PPGCI/UNESP para o Doutorado. Lembro-me do meu esposo dando a notícia da minha aprovação em primeiro lugar na Linha 2 “Produção e Organização da Informação”. Que surpresa! Apesar da imensa alegria, eu sabia que novos desafios viriam. Em junho do mesmo ano engravidei do meu primeiro filho. Thomas veio ao mundo no dia 15 de março de 2011 e, desde então, tudo ganhou mais significado e beleza. Após o seu primeiro ano de vida retomei as disciplinas e a pesquisa, dessa vez com mais motivação e propósito. Neste período, alguns questionamentos passaram a figurar em meio às inquietações que cercam o universo científico da área de Organização e Representação do Conhecimento na busca por uma consolidação científica e legitimação social, sendo estes: de que forma e a partir de quais aspectos teóricos e metodológicos é possível circunscrever as ações subjetivas dos profissionais bibliotecários que atuam em processos de representação temática da informação? Como atribuir valor às informações construídas por meio de práticas sociais? Quais aspectos cognitivos, sociais e culturais devem sustentar uma política direcionada ao processo de tratamento temático da informação no âmbito de domínios contemporâneos? Estes questionamentos deram corpo à minha pesquisa no Doutorado. Em 2013 fui surpreendida com uma das decisões mais difíceis da minha vida: realizar um doutorado-sanduíche com bolsa CAPES pelo Programa de Doutorado-sanduíche no Exterior (PDSE) na Universidad de Murcia, sob a supervisão do Prof. Dr. Isidoro Gil Leiva e, paralelamente, cursar um Doutorado em Gestión de la Información y de la Comunicación en las Organizaciones. Difícil, porque seriam meses distante da minha família, em especial do meu filho que acabara de completar 2 anos de vida. Foi a primeira vez que pisei em terras distantes... muito distantes para o coração de uma mãe. O período em que estive na Espanha foi enriquecedor para a minha pesquisa e formação acadêmica. Vivenciei a rica cultura europeia, partilhei novas experiências e passei a almejar a carreira acadêmica. Nesta época, os concursos na área de Organização da Informação foram abertos na região nordeste do país. Em maio de 2014 prestei concurso público de provas e títulos para a carreira do Magistério Superior na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). O resultado da minha aprovação saiu dias antes da defesa da minha Tese de Doutorado intitulada A perspectiva sóciocognitiva no tratamento temático da informação em bibliotecas universitárias: aspectos inerentes a percepção profissional, tendo como banca examinadora os professores Mariângela Spotti Lopes Fujita 187 (orientadora), Isidoro Gil Leiva (coorientador), Walter Moreira, Brígida Maria Nogueira Cervantes e Marisa Brascher Basílio Medeiros. Ingressei como Professora Adjunta no Departamento de Ciência da Informação vinculado ao Centro de Artes e Comunicação em 25 de agosto de 2014, dia em que assinei o termo de posse. Dia após dia busquei meios de me tornar um pouco daquilo que eu desejava encontrar em um professor, tarefa nada fácil. Afinal, isso não me foi ensinado durante os anos na pós-graduação. Sim, experienciei a prática da sala de aula durante os estágios de docência realizados no Mestrado e Doutorado. Ainda assim, nada comparável quando somos, de fato, responsáveis por ministrar disciplinas para salas repletas de mentes inquietas e que nos desafiam a sermos melhores. E que bom que as coisas são dessa maneira, de outro modo tudo seria muito corriqueiro e inerte. Fiquei responsável por cinco disciplinas do eixo Organização da Informação, que ministrei para os cursos de Biblioteconomia e de Gestão da Informação. Parcerias e amizades surgiram, em especial com a Profa. Dra. Májory Karoline Fernandes de Oliveira Miranda, com quem compartilhei disciplina, e a Profa. Dra. Sônia Aguiar Cruz Riascos, na condução de Projetos de Extensão, pelas quais nutro um profundo carinho! Apesar das belas praias e dos encantos de Recife, a vontade de ficar próxima da minha cidade natal e propiciar ao meu filho o convívio com os avós, fez-me aspirar uma universidade no Estado de São Paulo. Ao término do meu primeiro semestre como docente, surgiu a oportunidade da redistribuição para a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Foi um período de grande expectativa para a minha transferência, a qual se concretizou em junho de 2015 quando passei a integrar o corpo docente do Departamento de Ciência da Informação vinculado ao Centro de Educação e Ciências Humanas e atuar no Curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) e no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação. Como em muitas outras ocasiões da minha vida, o começo na UFSCar também foi desafiador. A adaptação ao Departamento e às questões administrativas da universidade foram inevitáveis. Neste processo, conheci a Profa. Dra. Zaira Regina Zafalon, companheira desde então. No campo da vida, os momentos felizes que compartilhamos falam por si só! No campo profissional, alguns projetos surgiram, como a materialidade deste livro destinado ao registro e à preservação da memória social e institucional daqueles que contribuíram para a consolidação do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação na UFSCar. 188 Em atenção ao cenário complexo e diversificado que envolve a representação da informação, criamos o evento científico Encontro de Representação Documental – EnReDo que, em sua primeira edição, contou com auxílio do Programa de Apoio a Eventos no País (PAEP/CAPES). O objetivo do evento é reunir em mesas temáticas pesquisadores brasileiros e internacionais para a troca de experiências acadêmico-científicas no escopo da organização e representação de recursos informacionais, bem como os processos de gerenciamento de dados em meio automatizado e seu uso. No final de 2015 solicitei afastamento parcial para desenvolver estágio pós-doutoral junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP/Marília. Realizei atividades sob a supervisão da Profa. Dra. Mariângela Spotti Lopes Fujita, em virtude de sua grande contribuição nacional e internacional para os estudos relacionados à indexação de assuntos. Esta parceria viabiliza a continuidade da construção de conhecimentos acadêmicos e científicos no âmbito da representação de assunto; benefícios de grande valia para a minha formação profissional. Como fruto desta parceria, criamos em 2016 o Grupo de Pesquisa Representação Temática da Informação, cadastrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do Brasil, mantido pelo CNPq. As ações realizadas visam contribuir com pesquisas e estudos teóricos, epistemológicos e práticos relacionados à organização e representação temática da informação em diferentes ambientes informacionais. Reflexões e discussões de abordagem teórico-conceituais e prático-aplicadas que envolvem os processos, produtos e instrumentos de representação do conhecimento, considerados em sua complexidade, são amparados pelas tecnologias de informação e articuladas com diferentes áreas do conhecimento em razão dos aspectos históricos, cognitivos, culturais e sociais correlacionados aos fundamentos teóricos e prática profissional. Vinculado à UNESP, o Grupo de Pesquisa centra suas atividades sob os eixos: Organização e Representação da Informação; Tecnologia e inovação; e Tratamento Temático da Informação. Nestes, são conduzidos trabalhos técnicos e pesquisas científicas no âmbito das dimensões teórica, aplicada e social da área de Organização e Representação do Conhecimento. Iniciei o meu Pós-Doutorado em fevereiro de 2016 com a condução da pesquisa O ensino da indexação no Brasil (CNPq/Bolsa de Pós-Doutorado Júnior – 2016/2017). Diante das peculiaridades da Indexação, um dos grandes desafios é proporcionar aos alunos o domínio das competências específicas que envolvem a prática do bibliotecário indexador. Por decorrência, conside- 189 rei importante empreender esforços para investigar o ensino da Indexação ofertado em universidades públicas do país, a partir dos elementos dispostos nos planos de ensino da disciplina, como forma de se conhecer as teorias, princípios, fundamentos, métodos e instrumentos trabalhados no contexto acadêmico com implicação no âmbito profissional. No decurso, fui abençoada com o meu segundo filho. Theodoro veio ao mundo no dia 7 de março de 2017, reafirmando-me o real sentido da palavra amor! Como docente do núcleo de disciplinas que integram a formação específica do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, no eixo Organização do Conhecimento, sou responsável pelas disciplinas Linguagens Documentárias II e Indexação e Resumos, ofertadas no quarto e quinto períodos do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, respectivamente. Nelas, tenho a possibilidade de discutir e aplicar os resultados advindos com as minhas pesquisas conduzidas no Mestrado e Doutorado, além das questões clássicas presentes na literatura nacional e internacional de Biblioteconomia e Ciência da Informação. A atuação na Ênfase “Informação, Cultura e Discurso”, especificamente com a oferta da disciplina Análise das práticas culturais e discursivas, em que são trabalhados e discutidos os modos diversos de aplicação das teorias do Discurso no campo de conhecimento da Ciência da Informação ensejou a vontade de trabalhar com a Análise do Discurso também nas atividades de pesquisa. Além das disciplinas mencionadas, oferto as optativas Organização de Unidades de Informação e Tópicos Especiais em Biblioteconomia e Ciência da Informação, sempre motivada pelo exercício de uma docência humanizada, tendo a dialogicidade como prerrogativa de minhas ações. Além do ensino na graduação, realizo atividades de orientação de Estágios em Centros de Informação, Trabalhos de Conclusão de Curso e Iniciação Científica. Intrinsicamente relacionada ao ensino e à pesquisa científica, a extensão universitária se materializa até o ano de 2019 com a coordenação dos seguintes Projetos de Extensão: Revitalização da Unidade Especial de Informação e Memória (UEIM): conectando saberes biblioteconômicos, busca-se fomentar a organização, divulgação e a popularização das coleções históricas presentes no acerco da Unidade Especial de Informação e Memória (UEIM), localizada no Centro de Educação e Ciências Humanas (CECH) da UFSCar. A proposta é promover a curadoria do acervo a partir das concepções teóricas e metodológicas trabalhadas na área de Biblioteconomia e Ciência da Informação mediante o uso de recursos tecnológicos apropriados. 190 Diretrizes para a divulgação da produção técnico-científica da SEaD/ UFSCar visa contribuir para a visibilidade da produção técnica e científica produzida pela Secretaria Geral de Educação a Distância a partir do estabelecimento de uma política de publicações específica para o órgão; Proposta de sistema de organização do conhecimento no domínio Tecnologia Assistiva em que se elabora um Tesauro no domínio Tecnologia Assistiva mediante os princípios teóricos e metodológicos da Biblioteconomia e Ciência da Informação que favoreça a representação, recuperação, acesso e visibilidade em meio digital aos materiais produzidos pelo curso de Licenciatura em Educação Especial; Acompanhamento de Egressos do Curso de BCI/UFSCar acompanha e contribui com a inserção do egresso da graduação no mercado de trabalho, mediante as seguintes ações: a) traçar o perfil profissional dos bibliotecários formados na instituição, b) prospectar as áreas de atuação dos egressos, c) identificar as principais habilidades e competências requeridas nos diferentes ambientes profissionais, d) ampliar as formas de divulgação profissional e, em paralelo, a própria divulgação do curso, e) favorecer a comunicação entre os atuais alunos com egressos e profissionais, e f) diagnosticar necessidades formativas que ampliem as possibilidades dessa inserção e contribuam para a melhoria e consolidação do Curso; Organização e manutenção de acervos bibliográficos, culturais e memoriais da UEIM promove ações curatoriais no conjunto documental da Unidade Especial de Informação e Memória (UEIM) subordinada ao Centro de Educação e Ciências Humanas (CECH) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Para isso, o projeto de extensão contempla o desenvolvimento e aplicação de técnicas de gestão e organização documental no contexto arquivístico, biblioteconômico e museológico; Humanização de crianças autistas por intermédio da leitura visa, mediante o incentivo e promoção da leitura, contribuir para a humanização da saúde de crianças com autismo e de seus familiares no âmbito do Projeto Espaço Azul/ Grupo Amais de São Carlos, sendo conduzidas atividades lúdicas de leitura com fins terapêuticos e a revitalização da brinquedoteca da instituição; Gestão e organização de documentos arquivísticos do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação promove o tratamento curatorial pela perspectiva arquivística aos documentos de arquivo da Coordenação de Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Além disso, foram promovidas muitas outras atividades extensionistas que demarcam a necessidade de contribuir ativamente com uma formação profissional que tenha entrelaçada a dimensão social da Biblioteconomia 191 e da Ciência da Informação, quais sejam: Jornada de Iniciação Científica de Biblioteconomia e Ciência da Informação; Estágio Vivo/BCI UFSCar; Semana Inaugural BCI/UFSCar; Semana de Pesquisa em Biblioteconomia e Ciência da Informação; Seminário de Integração: graduação e pós-graduação em Ciência da Informação; Saber Profissional; Ciclo de Estudos em Biblioteconomia e Ciência da Informação; Redes Sociais Digitais e Ciência da Informação; Ciclo de visitas técnico-pedagógicas em unidades de informação; Saber Profissional; Mulheres Cientistas do Departamento de Ciência da Informação; Código de Ética e Deontologia do Bibliotecário Brasileiro; Da Ciência da Informação à Ciência de Dados; Formação de Pesquisadores e Escrita de Artigos Científicos de Alto Impacto; e Evento em Comemoração ao Dia do Bibliotecário. As atividades extensionistas encontram respaldo no âmbito do Programa de Extensão “Informação, Educação e Justiça Social”, coordenado por mim e que é dedicado à promoção da cultura, educação e inclusão social, tendo a informação como peça de sustentação e alavanca para a construção de uma sociedade mais inclusiva. O objetivo é contribuir com a dimensão política e social do campo da informação, mediante discussão, diagnóstico e ações intervencionistas que versem sobre os desafios e perspectivas que se colocam para os profissionais da informação na busca de sociedades democráticas e inclusivas. Trabalha o cunho humanístico na formação e atuação do profissional da informação com vistas à criação de recursos e serviços informacionais eficazes e transparentes, em consonância com os avanços científicos e mudanças tecnológicas presentes na sociedade da informação e do conhecimento, além de fomentar uma prática profissional socialmente responsável. Na atividade de gestão, como parte das atribuições do docente no Magistério Superior, tenho a grata satisfação de atuar como representante em diversos conselhos. Essas atividades administrativas reforçam o importante papel político a ser desempenhado por todos no ambiente universitário na defesa do ensino superior público, gratuito e de qualidade. Dentre as principais atividades exercidas por mim estão: Membro do Conselho Departamental (2015 - Atual); Membro do Conselho do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (2015 - Atual); Membro do Núcleo Docente Estruturante (2015 - 2018); Coordenadora dos Trabalhos de Conclusão de Curso (2016 - Atual); Vice-Coordenadora do Curso (Gestão 2016-2018); Coordenadora do Curso (Gestão 2018 - Atual); Presidente do Núcleo Docente Estruturante (2018 - Atual); Representante da Linha 2 “Tecnologia, Informação e Representação” no Conselho do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (2019 192 - Atual); Representante Titular do Departamento de Ciência da Informação no Conselho da Pró-Reitoria de Extensão (2016-2020); Membro do Conselho Científico da Unidade Especial de Informação e Memória (2016 - Atual); Representante Titular do Conselho de Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação no Conselho de Graduação (2018 - Atual), dentre outros. No âmbito da pesquisa, contribuo com a formação de pesquisadores e produção de conhecimento no âmbito da Linha “Tecnologia, Informação e Representação” do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação. Atualmente, ministro a disciplina Representação Temática em Contextos Informacionais Contemporâneos, na qual são encaminhadas discussões acerca das teorias em organização do conhecimento; temas e questões contemporâneas da organização da informação; desenvolvimento científico e social das correntes teóricas do tratamento temático da informação; aspectos teóricos, práticos, normativos e pedagógicos da Indexação em perspectiva interdisciplinar; representação e recuperação por assuntos em ambientes informacionais digitais; e acessibilidade temática na perspectiva de usuários e profissionais da informação na sociedade global. Além disso, contribuo com a oferta das disciplinas obrigatórias Seminários de Dissertação e Epistemologia em Ciência da Informação. No segundo semestre de 2016, atuei como docente convidada no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP/Marília para ministrar a disciplina Indexação e Representação em Sistemas de Informação para alunos de mestrado e doutorado, em colaboração com a Profa. Dra. Mariângela Spotti Lopes Fujita. A disciplina foi ministrada em debates acerca dos aspectos teóricos e metodológicos do processo de indexação para representação em sistemas de informação, tendo como objetivos: a) estudar aspectos teóricos e práticos da representação em sistemas de informação; b) refletir sobre o processo de indexação no contexto dos sistemas de informação; c) aplicar metodologias de indexação para a compreensão dos processos de análise e representação de conteúdos documentais; e d) realizar a representação de conteúdos documentais para a compreensão da finalidade de recuperação da informação. Os desdobramentos e contribuições na pesquisa científica são observados com a publicação de diversos estudos no campo de conhecimento da Ciência da Informação, a partir da condução e conclusão dos seguintes Projetos de Pesquisa: O ensino da Indexação no Brasil: da literatura científica à prática pedagógica (2016-2017), no qual foram discutidas as bases teóricas e metodo- 193 lógicas que fundamentam o ensino da Indexação como disciplina formativa nos cursos de graduação em Biblioteconomia das universidades públicas brasileiras, e como elas sustentam as questões relativas à prática profissional; e Ensino de indexação na América do Sul: uma abordagem comparativa (20172019) mediante o encaminhamento de reflexões acerca do ensino da Indexação como disciplina formativa nos cursos de graduação em Biblioteconomia é uma vertente investigativa bastante salutar para a área de Organização e Representação do Conhecimento, de modo a se conhecer a literatura científica utilizada para fundamentar os aspectos teóricos e metodológicos e, também, a prática pedagógica dos docentes e suas estratégias de ensino-aprendizagem para a formação do bibliotecário indexador. Atualmente, vigora o Projeto de Pesquisa Representação e recuperação por assunto em repositórios institucionais (2018 – Atual), no qual busco contribuir com perspectivas teórico-metodológicas que favoreçam o estabelecimento das melhores práticas de organização do conhecimento no contexto dos repositórios institucionais, considerando a análise e a representação de assunto como componentes centrais das discussões. De modo específico, são consideradas as seguintes problemáticas: a) Situação e perspectivas futuras dos repositórios institucionais na perspectiva da Ciência da Informação, com atenção às práticas contemporâneas de representação temática da informação no contexto digital; B) Impacto e desafios do autoarquivamento para representação e recuperação por assuntos em repositórios institucionais; b) A qualidade do metadado assunto em repositórios institucionais, visando o aprimoramento do tratamento/da representação temática da informação documental e da recuperação por assuntos. Neste cenário, os esforços são direcionados à condução de estudos e práticas inovadoras para a representação e recuperação por assuntos em repositórios institucionais, em atenção às perspectivas contemporâneos introduzidas pelas humanidades e tecnologias digitais. As atividades de pesquisa são conduzidas no âmbito do grupo de pesquisa Representação e Humanidades Digitais criado e liderado por mim, o qual desenvolve estudos teóricos, epistemológicos e aplicados de natureza interdisciplinar que buscam refletir sobre a organização, representação, recuperação e acesso de recursos informacionais em tempos de humanidades e tecnologias digitais, tendo como objetivo final contribuir para o desenvolvimento de sociedades democráticas e inclusivas. Quando recordo do início da minha trajetória como pesquisadora e professora, sinto-me agraciada por ter convivido com pessoas que edifica- 194 ram os meus alicerces e nutriram a minha alma e mente com palavras de incentivo e exemplos de profissionalismo. É com grande satisfação que contribuo com lembranças quase encobertas da minha jornada pessoal e profissional nos caminhos da Biblioteconomia e Ciência da Informação, em meio a tantas outras memórias de colegas de profissão. Narrar esta trajetória foi um exercício salutar, em que pude reviver momentos significativos e felizes, tendo na mente o entendimento de que muitos outros passos devem ser dados na busca constante pelo conhecimento para mim e, outra vez, entender que muitos outros passos serão precisos na busca constante pelo aprender. Concluo este breve depoimento certa de que a docência universitária surgiu em minha vida e nela fez morada. Por quantos anos estarei entrelaçada a ela não sei. Mas, de certo, esta escolha faz-me feliz desde então. 195 Foto: Waldeck Schutzer CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO: ENTRELAÇAMENTO ENTRE APRENDER E ENSINAR MARCIA REGINA SILVA* Recebi com satisfação o convite para fazer parte deste projeto de resgate da memória social do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade Federal de São Carlos. No entanto, fazer escolhas e selecionar o que relatar é uma tarefa um tanto quanto complexa, já que é preciso compartilhar histórias que tenham sentido no seu todo em não somente no desígnio particular. Por sua vez, compartilho da concepção de que o docente só é capaz de modificar suas práticas após uma reflexão sobre si e sobre sua formação (CUNHA, 2006). Então, ao relembrar o processo para minha formação acadêmica, é possível retomar pontos que certamente contribuirão também para o aperfeiçoamento de minha carreira profissional. Traçar uma linha do tempo individual pode ser o caminho mais lógico para a representação de fatos e constructos que possam colaborar no estabelecimento de uma linha do tempo coletiva, interesse da presente obra. Os marcos dessa trajetória serão apresentados em narrativa, da graduação até o período atual. A ideia é identificar as mediações fundamentais, enquanto estudante do curso Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade Federal de São Carlos, que contribuíram para o direcionamento de minha carreira como docente no curso * Doutora em Educação (UFSCar), Mestre em Educação Especial (UFSCar), Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 1999). Docente na Universidade de São Paulo (USP) desde 2010. Contato: marciaregina@usp.br. 197 de Biblioteconomia e Ciência da Informação da Faculdade de Filosofia, Ciência e Letras da Universidade de São Paulo (BCI/ USP). Em 1994, foi o primeiro ano que a UFSCar ofereceu o curso de Bacharelado em Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI). Antes dessa data, o curso intitulado Biblioteconomia e Documentação pertencia desde 1973 à Fundação Educacional de São Carlos (FESC). Cabe lembrar que a Escola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos foi fundada em 1959. Do curso oferecido na Fundação, destacaram-se muitos profissionais que ocuparam e ocupam espaços importantes na área de Biblioteconomia e Ciência da Informação no Brasil como, por exemplo, as professoras Solange Puntel Mostafa da USP e Mariângela Spotti Lopes Fujita da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Faço parte, então, da segunda turma do curso BCI. Uma turma composta por estudantes de diversas cidades do Estado de São Paulo, tais como: São Paulo, Piracicaba, Bebedouro, Pirassununga, Analândia e, grande parte da própria cidade de São Carlos. A escolha do curso, para muito de nós, teve relação com o próprio nome do curso que havia incluído a Ciência da Informação. A ideia de um diploma de cientista da informação foi atraente, é o que me lembro da apresentação da turma de 1995 no anfiteatro do Bloco Didático AT2. Nessa ocasião, tivemos acesso à matriz curricular do curso que previa cinco anos de duração, porém, as turmas seguintes já alcançaram o currículo de quatro anos. Para adequação, nosso curso teve duração de quatro anos e meio, com aulas aos sábados para reposição. A turma de 1995 era composta por grande parte de mulheres. Formávamos um grupo animado e participativo, frequentávamos os Encontros Regionais e Nacionais dos Estudantes de Biblioteconomia, Documentação, Ciência da Informação e Gestão da Informação (EREBD/ENEBD). O XXII ENEBD de 1999 foi organizado com participação de alunos de nossa turma. A atuação dos egressos dessa turma espelha o caráter interdisciplinar do projeto pedagógico do curso. Dos colegas que ainda tenho contato, cito os seguintes campos de atuação: Biblioteca Universitária; Biblioteca escolar; Biblioteca pública; Centro de Documentação de empresas privadas; Gestão de documentos eletrônicos e; Docência. Vários colegas ocupam hoje espaços importantes como bibliotecários e/ou docentes, ressalto a atuação da egressa Elaine Paiva Mosconi, hoje professora da Université de Sherbrooke, Canadá. O corpo docente era formado por professores do Departamento de Ciência da Informação (DCI), Departamento de Letras (DL) e Departamento de 198 Computação (DC). Exclusivamente do DCI, entre 1995 e 1999, faziam parte os seguintes professores: Ariadne Chloë Mary Furnival, Carlos Roberto Massao Hayashi, Eliane Serrão Alves Mey, Elizabete Márcia Martuci, Helen de Castro Silva, Luzia Sigoli Fernandes Costa, Maria Cristina P. Innocentini Hayashi, Maria Cristiane Barbosa Galvão, Maria Matilde Kronka Dias e Sérgio Luis da Silva. Esses docentes exerceram papel importante na história do curso de BCI, pois foram precursores ao comporem um curso com uma nova proposta na UFSCar e de natureza tradicional na cidade de São Carlos. Tiveram que elaborar diretrizes, criar e adequar disciplinas, acolher e direcionar alunos que tinham necessidades diversas. Enfim, os idealizadores repensaram todo o curso com vistas à formação de um profissional com competências para enfrentar a conhecida “era da informação” que se iniciava em fins do século passado. No que se refere a UFSCar, destaca-se seu pioneirismo no oferecimento de projetos de acesso e, principalmente, de permanência, por meio de diversas bolsas de estudos voltados a estudantes de baixa renda, maioria absoluta dos alunos do curso. Eu e muitos dos colegas fomos beneficiados com bolsas que contribuíram significativamente para nossa permanência na universidade, isso porque, muitos optaram por esse curso pela possibilidade de trabalharem durante o dia, porém, nem todos conseguiram colocações e tiveram que recorrer aos programas assistenciais da Instituição, cuja contrapartida era rendimento acadêmico e cumprimento das atividades. No meu caso, fui contemplada com uma bolsa atividade logo no primeiro semestre, fiquei responsável pela organização do acervo do Departamento de Metodologia de Ensino (DEME/UFSCar). Embora não tivesse conhecimento aprofundado das ferramentas para catalogação (ainda no formato manual), fui muito bem orientada pelos professores e pude aplicar, “na prática”, todo aquele conhecimento recebido em sala de aula. Tal experiência, além foi importante para o entendimento de algumas atribuições da profissão. Com relação à matriz curricular, a formação previa um direcionamento de ênfase no último ano do curso. A opção era ou pela ênfase social ou tecnológica. Dentre as disciplinas cursadas ressalto as disciplinas de catalogação ministradas pela professora Eliane Mey. Após cursá-las, formamos um grupo de alunos e saímos distribuindo panfletos pelo campus, oferecendo assessoria para organização de acervos. Várias demandas surgiram, mas após algumas experiências, entendemos que não conseguiríamos dar conta dos projetos sem prejudicar o andamento do curso. Esse espírito empreendedor também advinha das disciplinas da área de Gestão ministradas pelo professor 199 Sérgio Luis da Silva. Outro destaque que considero importante sobre a grade curricular foi o cumprimento das horas obrigatórias de estágio. Felizmente, a cidade de São Carlos, na ocasião, dispunha de vagas de estágios remunerados em diversos setores, o que contribuiu efetivamente para a escolha do setor de atividade de muitos colegas. Quanto ao direcionamento de minha carreira como docente enfatizo, principalmente, a participação em um projeto de Iniciação Científica (IC) desenvolvido durante a graduação. Fui bolsista de IC em um projeto para organização do acervo Ana Lagoa, pertencente ao Departamento de Ciências Sociais e orientado pela professora Maria Cristina P. Innocentini Hayashi. O incentivo da professora para apresentação dos resultados do projeto em eventos científicos foi fundamental. Participamos em vários eventos em Marília, Assis e São Carlos, inclusive com a publicação de um capítulo de livro com a temática do projeto. O desenvolvimento da pesquisa no Arquivo Ana Lagoa culminou também com o meu Trabalho de Conclusão de Curso que consistia em apresentar uma biblioteca digital com a representação do conteúdo do acervo de recortes de jornais referente ao período militar. Tal parceria com a professora Cristina Hayashi permanece até hoje, tendo como resultado o desenvolvimento em colaboração de projetos e pesquisa e a publicação de artigos científicos. Ainda durante a graduação, tive contato com a Bibliometria por intermédio também da professora Cristina, do professor Carlos Roberto Massao Hayashi e do professor Leandro Innocentini Faria, hoje também docente do curso (BCI). À época, o professor Leandro já utilizava o software Vantage Point para o gerenciamento de dados bibliométricos. O estudo dessa métrica, na ocasião ainda pouco explorada no Brasil, deu sequência, mais tarde, em minha dissertação de Mestrado e Tese de Doutorado, defendidas em Programas de Pós-Graduação também na UFSCar. Minha dissertação de mestrado foi apresentada no Programa de Pós-Graduação em Educação Especial e minha Tese de Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Educação, ambos da UFSCar. A escolha por dar continuidade à minha formação na UFSCar está fortemente relacionada ao vínculo com a mesma desde a graduação. Minha trajetória para chegar à docência na área de Organização da Informação e do Conhecimento também está entrelaçada com as disciplinas cursadas na graduação e com a prática profissional. Na época do oferecimento das disciplinas de organização da informação, o foco ainda era na catalogação manual, o que nos rendeu muito trabalho com os desdobramentos das fichas-matriz de catalogação. A professora Mey era rigorosa com o ensino 200 das regras e pontuação contidas no Código de Catalogação Anglo Americano (AACR), tal rigor foi importante para a memorização das principais regras e manuseio do Código. Em julho de 1999, encerramos o curso e, logo no meu primeiro trabalho como bibliotecária, fui responsável pela gestão do acervo de uma biblioteca universitária de uma instituição particular na cidade de Jaboticabal (1999), posteriormente, bibliotecária-chefe também em uma biblioteca universitária de uma instituição particular em Ribeirão Preto (2000-2005) e concursada como bibliotecária da Biblioteca Central da Universidade de São Paulo, campus Ribeirão Preto (2005-2010). Em todas essas instituições desenvolvi trabalhos relacionados a gestão, processamento técnico e ao serviço de referência. Tais experiências enriqueceram meu conhecimento sobre o processo de catalogação o que definiu a área de escolha para minha atuação como docente em 2011, após concurso público para provimento do cargo de professor doutor do curso de Ciências da Informação e da Documentação (nome do curso na época) da USP/Ribeirão Preto. Conforme realçado, por mais de dez anos exerci a profissão de bibliotecária no setor privado e público da Educação Superior. Essa área ainda hoje é um espaço de atuação significativo para atuação do bibliotecário. As bibliotecas universitárias de instituições privadas acabam tendo um forte direcionamento do Ministério da Educação, já que este órgão é responsável pela avaliação dos cursos de graduação, tendo a Biblioteca um peso importante para a atribuição das notas. Sendo assim, participei do processo de desenvolvimento de coleções, processamento técnico, informatização de acervos, gestão de coleções, atendimento ao usuário etc. Essas atividades exigiram aprimoramento das competências adquiridas durante a graduação. Já minha atuação como bibliotecária em biblioteca universitária de instituição pública aconteceu em um momento que já tinha experiências profissionais anteriores, o que ajudou no desenvolvimento de atividades mais direcionadas ao atendimento de demandas específicas de informação, mediando a formação dos estudantes no que se refere a aquisição de competências informacionais. A Biblioteca Central da USP de Ribeirão Preto faz parte de uma rede de bibliotecas e de uma rede de catalogação cooperativa, possui assinaturas de bases de dados de periódicos científicos e de e-books, possui um programa de capacitação dos bibliotecários, com o oferecimento de cursos para o aperfeiçoamento e atualização profissional etc. Dessa forma, minha atuação nessa instituição também foi um aprendizado. 201 Desde 2011 ministro, no curso de Biblioteconomia e Ciências da Informação e Documentação (BCID), disciplinas da área de Organização da Informação e do Conhecimento, mais especificamente, as disciplinas obrigatórias: Representação Descritiva 1 e Representação Descritiva 2; ministro também algumas disciplinas optativas, como por exemplo, a disciplina “Estudos Métricos da Informação”. Essa disciplina foi a primeira relacionada às métricas para avaliação da produção científica oferecida no curso. Minha didática volta-se para o alinhamento do ensino teórico e prático, no entanto, a cada semestre percebo que as disciplinas mais aplicadas exigem cada vez mais o ensino por meio de exercícios desenvolvidos em sala de aula com a mediação do docente. Busco levantar discussões e indicar leituras que sejam voltadas a resolução de problemas relacionados ao conteúdo das disciplinas. Tal organização da disciplina é moldada de acordo com o perfil de cada turma. Além da docência, somos incentivados na Universidade ao desenvolvimento de projeto de extensão e de pesquisa. Tais projetos enriquecem a formação dos nossos graduandos. Atualmente faço parte do projeto “Centro de Documentação dos Serviços de Comunicação e Atividades Culturais da USP de Ribeirão Preto/SP (CEDOC-USP/RP)” que tem como objetivo implantar um Centro de Pesquisa e Documentação, que visa a resgatar e preservar a história dessa unidade e sua importância para a comunidade uspiana. Nesse projeto orientamos bolsistas de projetos de extensão e pesquisa no desenvolvimento de atividades relacionadas a conservação documental, a digitalização e a catalogação do acervo CEDOC-USP/RP. Hoje, minha produção científica abrange os estudos métricos da informação científica aplicados nas diversas áreas do conhecimento, além das temáticas relacionadas às questões da área de Biblioteconomia e Ciência da Informação, mais especificamente, à Organização da Informação e do Conhecimento (OIC), advindas de uma demanda de orientações de iniciações científicas e trabalhos de conclusão de curso do curso BCID. A carreira acadêmica traz inquietações devido ao modelo de produtividade adotado, porém, traz recompensas “simbólicas” constantes, tais como a formação de profissionais, publicações que favorecem o avanço da área, projetos de extensão à comunidade etc. Por isso, sinto-me realizada com a escolha dessa carreira e também orgulhosa pela instituição a qual faço parte. A construção do perfil docente dá-se além do capital cultural e social, conceitos bourdianos, pela formação acadêmica, particularmente, pela gra- 202 duação. Concordo com Maria Isabel da Cunha (2006, p. 258) ao falar da carreira docente, mais especificamente do ensino: especialmente o ensino de graduação, é entendido como decorrência das demais atividades, assumindo uma forma naturalizada de exercício. A naturalização da docência refere-se à manutenção dos processos de reprodução cultural como base da docência, ou seja, o professor ensina a partir da sua experiência como aluno, inspirado em seus antigos professores. Embora a identidade do docente seja formada por suas vivências e leituras, não há como negar que além da formação prévia, os anos despendidos na Universidade influenciam o desempenho e o rendimento profissional. É justamente esse aspecto que gostaria de enfatizar nessa narrativa. Referências CUNHA, M. I. da. Docência na universidade, cultura e avaliação institucional: saberes silenciados em questão. Revista Brasileira de Educação, [s. l.], v. 11, n. 32, p. 258-371, maio/ago. 2006 203 Foto: Waldeck Schutzer VIVA À VIDA DE UNIVERSITÁRIA VÍVIAN LUCIANE DE MORAES MACHADO* O ano era 1995, vestibular para Fuvest 1996, a escolha foi UFSCar, curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, período noturno, assim eu tinha a possibilidade de trabalhar durante o dia. Afinal, sou de Jundiaí/SP, cidade a 182 km de São Carlos. O primeiro dia de vestibular foi em 19 de novembro de 1995, com provas de Física, Português, Química e Inglês. O segundo dia ocorreu em 3 de dezembro de 1995, com provas de Geografia, Matemática, Biologia e História. A segunda fase aconteceu nos dias 7, 8, 9, 10 e 11 de janeiro de 1996. Passei! Euforia, preocupação, sonhos. Na UFSCar, outro processo seletivo, agora para moradia, alojamento estudantil. Num primeiro momento, fiquei em uma casa alugada pela Federal, eu e mais 14 meninas. Era um sobrado no centro da cidade. Depois de seis meses, fui para quitinete com mais duas colegas de quarto. A quitinete era bem ajeitada, um portão, um corredor com quatro quartos, com banheiro e pia para cozinha. No segundo ano me mudei para os apartamentos novos dentro da Federal. Posso dizer que fui uma aluna que usei de todos os auxílios do Programa de Assistência Estudantil da UFSCar. Moradia estabelecida inicia-se o curso. De imediato me apaixonei! * Especialista em Gerência de Sistemas e Serviços de Informação, Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 1999). Contato: vilumor@gmail.com. 205 Éramos a terceira turma do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade Federal de São Carlos. O primeiro ano na Federal foi de adaptação, novos amigos, nova casa, administrar horários de estudo, trabalhos. Aulas no prédio da Babilônia, restaurante universitário, Biblioteca Comunitária, muitos alunos que sobem e descem da área sul para área norte, DCE, pôr do sol no lago, flores primaveras. Tenho várias fotos nesses lugares. Foi um ano de muitas lágrimas, saudade da família e do namorado, mas o sonho de me formar era maior. Meu primeiro e-mail foi criado na disciplina Introdução à informática. O meu acesso a Internet crescia ao passo que ela se desenvolvia no Brasil. Até então, eu só usava um programa desenvolvido em DOS para um Laboratório de Análises Clínicas em que eu trabalhava antes de entrar para Federal. As disciplinas eram introdução aos registros da informação, fundamentos de biblioteconomia e ciência da informação, indexação e resumos, formação e desenvolvimento de coleções, enfim, paralelo a isso, nesse primeiro ano fui bolsista atividade na Secretaria da Coordenação do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Conheci melhor os professores, alunos. Vivenciei a rotina burocrática dentro da Universidade. Ainda em 1996, teve uma greve por 22 dias, de 29/04/1996 a 20/05/1996. E não seria apenas essa greve durante os quatro anos que fiquei em São Carlos. Muita coisa acontecendo junto! Muitas palestras para participar. Nesse primeiro ano consegui ir a um Colóquio Internacional sobre Estudos Linguísticos e Literários na UNESP em Araraquara. Participei como ouvinte no IV CIC – Congresso de Iniciação Científica, na própria UFSCar. Eu era uma aluna que queria estar a par de tudo. Fiz aula de natação, fiz disciplina optativa em musicalização, tirei minha habilitação em São Carlos. O segundo ano, foi mais tranquilo, eu já tinha me adaptado à vida em São Carlos, laços de amizades construídos. A comida do restaurante universitário não me agradava muito, tinha dia que era uma delícia, mas outros nem tanto. Lembro que gostava do fricassê de frango e odiava o kibe de forno. A alimentação de quem está na faculdade não é muito balanceada, para muitos dias o macarrão instantâneo resolvia. 206 Nos finais de semana, era um pouco melhor, nos reuníamos nos apartamentos e caprichávamos no cardápio. Macarrão com frios e molho branco, um bife ou frango grelhado. Em 1997 fui selecionada para auxiliar de biblioteca na EESC Escola de Engenharia de São Carlos – USP. Trabalho temporário de nove meses, para processamento técnico de periódicos e livros. Foi de grande aprendizado. Acesso a um sistema computadorizado Dedalus, o que eu aprendia nas disciplinas de representação descritiva eu aplicava no trabalho, analisar as fichas catalográficas, resumos e indexação. Na USP, participei de vários cursos, com temas relacionados à OCLC, Internet, Dedalus, Base de dados nacionais e internacionais, informação e tecnologia. Cada vez mais me interessava pela Biblioteconomia. Foi um ano de disciplinas técnicas, e para mim não ficava só na teoria. Nesse ano, participamos do XX ENEBD – Encontro Nacional dos Estudantes de Biblioteconomia e Documentação em São Luís, Maranhão. O tema foi os cenários da Biblioteconomia em face da globalização da informação. Muitas palestras para participar e uma cidade histórica para conhecer. Consegui fazer um pouco de tudo. Ficamos acampados em uma escola, assim como muitos alunos de outras faculdades. Tenho que comentar dos arrastões, uma turma animada, que canta para que os outros não durmam. Afinal, não é só estudar. Estudar com alegria! “Pode dormir, poder cochilar, nós não queremos seu sono atrapalhar”. Uma aventura e tanto! Fomos com o ônibus da Federal, demoramos quase três dias. Arrecadamos dinheiro, fazendo pizza e vendendo na esquina, entre amigos, família. Ufa! Cheguei em 1998, terceiro ano na Federal. As disciplinas cada vez se refinando mais. Conhecimento sendo adquirido. Nesse ano participei de uma equipe de organização do Centro de Documentação do CCDM, Centro de Caracterização e Desenvolvimento de Materiais da UFSCar. Eu me despertava para o interesse em informação tecnológica. Depois, organizei artigos de periódicos científicos do Laboratório de Neurociências do Departamento de Fisioterapia da UFSCar, um projeto da Fapesp. Usei o software ProCite. 207 No segundo semestre de 1998 iniciei como bolsista Iniciação Científica (PIBIC-CNPq/UFSCar), desenvolvendo o projeto intitulado “Demandas de informação tecnológica: uma análise da literatura sobre estudo de usuários”. No final da bolsa, esse projeto foi apresentado no VII CIC – Congresso de Iniciação Científica – UFSCar em 1999. Paralelo a essa bolsa fiz estágio na Biblioteca Comunitária da Federal, no setor de referência, para a disciplina Estágio em Centros de Informação. O tempo não era só para trabalho e estudo. Tinham algumas festas em repúblicas, TUSCA, palquinho do DCE. Fiquei muitos finais de semana em São Carlos, tive aulas aos sábados pela manhã, então era meio inviável viajar até Jundiaí. Para falar com a família, usava o orelhão. Fui ter um celular no último ano. Eu viajava de ônibus de Jundiaí até Campinas e de Campinas até São Carlos, não conseguia ler muito, pois passava mal. Eu sempre pensava que poderiam inventar uma TV que coubesse na palma da mão ou um aparelho com muitas músicas. E hoje temos os celulares modernos, com acesso a livros, revistas, músicas, e-mail, internet, tudo na palma da mão. Em época de provas e entrega de trabalhos, ficávamos depois da aula, no nosso laboratório de informática, tínhamos autorização para isso, e entrava madrugada a turminha lá! Era um sufoco para todos usarem a impressora contínua, era que o tínhamos. Nos anos de 1997, 1998 e 1999 fui monitora na Fazenda Conde do Pinhal, acompanhava as visitas, contava a história da fazenda e do acervo raro deles. Eu adorava esse trabalho. Subir e descer a escada d´água da Fazenda, assim como fazia a condessa do Pinhal, era muito bom! Ainda em 1998 participei do EPEB – Encontro Paulista de Estudantes de Biblioteconomia e Documentação, UFSCar. E viajamos para o XXI ENEBD Florianópolis, Santa Catarina. O tema foi democratização da informação e o novo perfil do bibliotecário. Mais uma vez, muitas palestras, muito conteúdo para absorver e uma cidade linda para conhecer. Encantada com a Lagoa da Conceição, sequência de camarão, praia do Forte. Chegamos então ao último ano na UFSCar, 1999. Começava o Trabalho de Conclusão do Curso – TCC, optei pela ênfase em informação tecnológica, muitas amigas escolheram informação social, então nos separamos. Foi estranho, de repente não ter o contato todo dia, mas meu foco seguia firme e forte. 208 Meu TCC foi desenvolvido na Duratex S.A., empresa na época em Jundiaí. Intitulado A informação tecnológica em ambiente empresarial: estudo de usuários da Duratex S.A. Estudei muito, fiz muito resumo e fiquei mais tempo em Jundiaí, era uma boa desculpa, pois eu ia à Duratex coletar dados para o trabalho. Apresentei, em forma de pôster, esse trabalho no XXII ENEBD São Carlos. Em 1999, participei da organização do XXII ENEBD São Carlos, São Paulo. O tema foi Brasil 500 anos e a informação? No geral, minha equipe ficou responsável por organizar a infraestrutura do evento. Acomodações para os participantes, refeições, passeios, festas, coffee break, muita correria. Tirando a parte séria do evento, teve sim arrastão! O evento ocorreu nas férias de julho, a Federal estava bem tranquila. Usamos o Restaurante Universitário para servir as refeições. Contratamos o restaurante Cantos e Contos. Foi no capricho! Nesse restaurante foi nosso jantar/baile de formatura. Eu e algumas amigas organizamos a nossa formatura. Arrecadamos fundos, contratamos empresa organizadora de eventos. Foi um ano cansativo. Um ano de finalizações, começava aquele sentimento que um dia tudo ficaria na saudade. Mas o foco era me formar para poder trabalhar, ganhar dinheiro o quanto antes. Nesse ano, fui bolsista atividade no Laboratório de Informática de Graduação do Curso de Psicologia. Em dezembro, participei de um processo seletivo para trabalhar na ALB – Associação de Leitura do Brasil, Unicamp. Eu e mais duas amigas ficamos na final. O diretor escolheu a amiga de Campinas, indicou a de Sorocaba para um local em Sorocaba e me indicou para o Senac São Paulo, trabalhar com uma bibliotecária experiente para implantar a Faculdade de Ciências Exatas e Tecnologia, no bairro da Liberdade em São Paulo. Como eles tinham uma parceria, acabei sendo contratada sem um novo processo seletivo. Acabei de me formar e já estava trabalhando, pude voltar para Jundiaí, minha terra natal. Os primeiros seis meses foram contrato temporário de seis horas/ dia. Então pude realizar outro trabalho paralelo na biblioteca da Fundação Itauclube. Depois desses seis meses, fui contratada para o Núcleo de Comunicação e Informação do Senac – Centro de Educação em Informática. 209 No segundo ano como profissional, fiz uma Pós-Graduação em Gerência de Sistemas de Informação na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Em 2002, me casei. Participei de vários eventos, palestras, sempre me informando, me atualizando. Quando minha filha Sofia nasceu, em 2005, optei por abrir mão do emprego para me dedicar a ela. Prestei alguns concursos, passei em 2º lugar na Prefeitura Municipal de Várzea Paulista, cidade vizinha de Jundiaí, mas não fui chamada, fiz trabalhos temporários na Anhanguera Educacional e Faculdades Pitágoras em Jundiaí. Em 2011, tive meu segundo filho, Davi. Hoje em dia, sou empresária, sócia proprietária da Alumiprime Esquadrias de Alumínio. Apesar de não trabalhar diretamente na área, o interesse pela leitura, pesquisa e organização da informação me acompanha no dia-a-dia. 210 Foto: Sílvia Moura UMA TRAJETÓRIA PARA RECORDAR... E CONTAR! DANIELE SPADOTTO SPERANDIO* Decidi fazer Biblioteconomia e Ciência da Informação aos 16 anos, quando planejei participar do vestibular da FUVEST como trainee, o que na época não foi possível. Prestei vestibular em 1997, aos 17 anos, repleta de objetivos e sonhos! Escolhi essa profissão pois sempre fui uma leitora ávida e muito organizada. Minha mãe sempre diz que meu passatempo predileto é passar horas organizando armários, gavetas e documentos. Para quem está lendo pensará, com certeza, que tenho TOC! Minha intenção era unir o que gostava com o trabalho diário e associar a profissão com a recente ferramenta que já estava mudando a forma de acesso à informação: a Internet que, até então, nunca havia usado! Escolher uma profissão nessa idade é uma tarefa difícil, pois ainda estamos descobrindo as aptidões e os gostos. Decidir aos 17 anos o que se quer para a vida adulta é algo que requer muito discernimento, clareza e maturidade. Mesmo com minha certeza, não me sentia totalmente segura de que estava fazendo a escolha correta. A graduação, os desafios e as dificuldades Já se passaram 22 anos desde que se iniciou minha trajetória. Entre as lembranças que ficaram dentre as que se foram, recordo-me que em meu primeiro dia * Mestrado em andamento em Educação (UEMS), Especialista em Gestão Pública (UCDB), Especialista em Gerência de Unidades de Informação (UEL), Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2002). Contato: danispadotto@ifsp.edu.br. 212 de aula não sabia onde dormiria. Recordar dessa coragem, pois hoje vejo que requer muita força e determinação para mudar radicalmente o estilo de vida, de uma pequena e pacata cidade do interior, para outra onde nada estava certo, nem a certeza de onde repousaria a cabeça para descansar durante a noite. A primeira semana de aulas estão cobertas por um véu, que não me permite recordar com clareza, pois foram muitas coisas acontecendo ao mesmo tempo, mais a preocupação do pouco recurso financeiro de que dispunha para me manter. Lembro-me da dificuldade em acompanhar as aulas, bem diferentes da escola pública que frequentei. Os primeiros trabalhos da graduação foram realizados em meio a contratempos, as descobertas de um novo mundo, às noites mal dormidas no saguão da reitoria, às novas amizades, às paralizações semanais que foram prenúncio de uma greve que durou três longos meses. O primeiro semestre do curso mostrou-se um misto de sentimentos conflitantes: as adversidades, as decepções e incertezas, o prazer pelas novas descobertas, além das novas amizades que perduram até hoje. A greve que se seguiu após um mês de aula, aproximadamente, foi responsável por me fazer ver o mundo com novos olhos e conhecer o outro lado da versão noticiada nas reportagens. Durante esse período participei de manifestações estudantis contra as privatizações das universidades federais, pela qualidade do ensino, por maior investimento em educação e melhoria na infraestrutura das universidades públicas. O ano de 1998 foi marcado por descobertas pessoais, pelas novas responsabilidades e pelo crescimento moral. No primeiro mês comecei a trabalhar na Biblioteca Comunitária da UFSCar como bolsisa; foi a oportunidade de pôr em prática as teorias que aprendia no curso. Esse trabalho e o suporte dos servidores da Biblioteca foram essenciais para o meu aprendizado, consegui me manter em São Carlos devido a Bolsa Atividade, concedida. Além disso, durante dois anos, os gastos que tive com alimentação, cópias reprográficas e transporte, foram supridos, exclusivamente, com o valor de cem reais que recebia da Bolsa Atividade no decorrer do ano letivo, correspondendo a nove meses. No entanto, é importante salientar que a bolsa era concedida apenas aos estudantes de baixa renda, que trabalhavam 12 horas semanais ou 48 horas mensais. De bolsista atividade passei, no terceiro e quarto ano do curso, a atuar como estagiária na Biblioteca Comunitária e, no último semestre do curso, prestei serviços com uma bolsa treinamento, que foi possível devido à greve 213 que ocorreu no segundo semestre de 2001, atrasando o calendário acadêmico em quatro meses. Algumas disciplinas eram o terror dos estudantes de biblioteconomia, como Representação Descritiva, com a Profa. Eliane Mey. Elaborar as fichas catalográficas para a professora que parecia saber de cor e salteado a AACR, era um trabalho deveras estressante, isso sem mencionar as provas! Além disso, o empenho era grande para elaborar corretamente as referências de acordo com a norma vigente na época, a NBR 6023:1989. Além das referências serem justificadas e alinhadas abaixo da terceira letra do sobrenome do autor, havia uma quantidade específica de espaços entre cada um dos elementos que a compunham, como autor, título, edição e local de publicação. Esse sofrimento diminuiu com a alteração da norma em 2000, passando a ter o mesmo alinhamento que é adotado atualmente. Até então, mesmo com os vários trabalhos era difícil não errar, sempre havia correções da professora Elizabeth Martucci nos trabalhos da turma. Ainda parecia distante o uso de sistemas de automação de Bibliotecas, mas enquanto algumas já adotavam o Micro Isis, como a Biblioteca Comunitária, outras Bibliotecas ainda utilizavam os catálogos manuais, precisando fazer os desdobramentos dos assuntos, título, autor e séries. O que hoje nos parece algo tão remoto, a elaboração de fichas e suas remissivas foram ensinadas no segundo ano do curso, e eram necessárias para o processo de recuperação da informação. Desejei, intimamente, não precisar adotar essa prática após o término da graduação e, a popularização dos computadores e da Internet favoreceu, em muito, a adoção de sistemas de gerenciamento de bibliotecas, entre gratuitos e proprietários. Os estágios foram fundamentais para compreender as disciplinas de Linguagens Documentárias. Era notório as dificuldades dos colegas de turma que não faziam estágio e não tinham a noção da prática, que muitas vezes parece tão diferente da teoria. Em outras disciplinas, como Introdução a Análise de Sistemas, fui perceber a importância apenas após formada, quando precisei entender o todo, para juntamente com um analista de sistemas, contribuir com as informações essenciais e necessárias para a programação de um sistema de Bibliotecas. Também foi fundamental quando fiquei responsável pela construção e manutenção do site de uma instituição onde atuei. Durante minha trajetória acadêmica, tentei aproveitar tudo o que a universidade oferecia, me inscrevendo por exemplo, em disciplinas que não 214 faziam parte da grade do curso, como foi o caso de Fotografia. Esta escolha mostrou-se importante quando organizei um grande acervo de fotografias. Já a disciplina de Introdução a Informática foi uma que tirou meu sono logo no primeiro semestre. Não sabia nada de computadores, afinal, até entrar na universidade nunca havia utilizado um! Não conseguia acompanhar o que a professora da turma ensinava... recordo-me que ela mencionava muito a palavra “diretório”. Agora parece algo bem arcaico, mas usávamos os possantes computadores 386, com os incríveis disquetes de 3,5 polegadas com a impressionante capacidade de armazenamento de até 1,44Mb! Uma de minhas constantes lutas na aula era tentar criar pastas e salvar arquivos nesses disquetes! Parece tão simples, mas eu tive muita dificuldade em entender! Não me lembro ao certo, depois de quase dois meses de aula, a professora sofreu uma parada cardíaca! Calma! Não foi por causa da minha turma! Ela ficou afastada e foi substituída por dois professores. O professor Antônio Carlos ficou responsável pelas aulas práticas e consegui entender um pouco as operações básicas, porém usar os computadores era uma surpresa constante. Quem da turma não recorda das constantes mensagens de “memória insuficiente” para quase tudo que tentávamos fazer? Fiquei de Sub, a temida prova de recuperação, junto com meia dúzia de colegas. Consegui passar na disciplina por causa das aulas teóricas ministradas pelo professor Politano, Para algumas disciplinas, conseguir a nota seis era um sonho, e para essa disciplina, pulei de alegria quando consegui míseros 3,5 na prova prática, que somados a outros três pontos da prova teórica, obtive nota para passar. Ufa! Recordar de minha trajetória acadêmica, faz-me perceber que poderia ter aproveitado mais o conhecimento dos docentes e de ter estado mais presente em algumas aulas. Alguns professores foram fundamentais na minha formação. Sempre me surpreendia quando a professora Chloe, que é inglesa, corrigia meus erros de português, principalmente no meu TCC; ou as aulas de administração com o professor Sérgio e suas temidas provas. E as aulas de indexação? Elaborar os índices de assunto davam um trabalho... Já nas aulas de linguística, costumava questionar a professora quanto ao significado de parole e parler do livro de Ferdinand de Saussure. Nessa época, o francês ainda estava “fresco” na memória. Não posso deixar de mencionar as aulas da professora Luzia, querida por todos, e da professora Matilde com a disciplina de Usos e usuários da informação. 215 Os quase quatro anos e meio na UFSCar passaram rapidamente, mas foi um tempo de aprendizado, repleto de desafios diários, com responsabilidades para com meus deveres e prazos. Muitas foram as noites mal dormidas para terminar os trabalhos dentro do prazo, e foram muito mais trabalhos do que provas! As noites em claro no antigo LIG da Biblioteconomia (Laboratório de Informática da Graduação) também fez parte dessa jornada onde eu e outros colegas fazíamos nossos trabalhos, até mesmo o famigerado TCC, que é temido em qualquer curso. Recordar da graduação é relembrar as alegrias, as tristezas, as dificuldades, os vários meses sem ver a família, o cansaço, as noites mal dormidas, os EREBDs e ENEBDs, as festas, os palquinhos livres às quartas-feiras, as refeições no RU (Restaurante Universitário), é recordar os amigos me chamando de “Onda” e, lógico, não posso esquecer das três longas greves que fez parte desse processo, a primeira em 1998, que durou três meses, a segunda em 2000, com duração de dois meses e, por fim, a terceira em 2001, que quase chegou a quatro meses e, cujo calendário acadêmico foi encerrar somente em vinte de abril de 2002. Dessa época ficou a saudade e os aprendizados que me marcaram para toda a vida. Ser Bibliotecária... um eterno aprendizado Durante a graduação o comentário geral entre os estudantes de Biblioteconomia era a facilidade de se conseguir emprego desde que estivéssemos dispostos a mudar de cidade. Não tinha esse receio, mudanças sempre me atraíram, pois serviam para abrir a mente a novos horizontes. Consegui meu primeiro emprego logo após a colação de grau, que ocorreu em maio de 2002. Mudei-me então de São Carlos para trabalhar em uma pequena faculdade no interior paulista. Esse primeiro trabalho como Bibliotecária, trouxe uma série de questionamentos: conseguiria dar conta? Seria capaz de realizar a catalogação? Manter a biblioteca organizada? E a classificação em CDU? Usar a CDU sempre foi minha maior dificuldade! Depois de aproximadamente um ano nessa faculdade, mudei de cidade e emprego, indo trabalhar numa escola técnica. O desafio foi muito maior! Muito do que havia aprendido durante o curso, não me preparou para os de- 216 safios de implementar a ISO 9001 na Biblioteca, a organizar um grande acervo vídeos e de fotografias, este abrangia material desde a inauguração da escola, do início da década de sessenta, além dos cuidados com a gestão documental, requisito fundamental da ISO 9001. Nessa época senti falta de ter cursado disciplinas sobre gestão documental e sobre arquivos. A vivência profissional mostrou a importância de se ter uma disciplina obrigatória de Arquivo no curso de Biblioteconomia, pois algumas Bibliotecas também são responsáveis pela gestão documental da instituição, que envolve a elaboração de tabela de temporalidade e o preparo técnico desses materiais para a rápida recuperação dos documentos. Aprendi muito nessa instituição, pois precisei estudar para fazer o que se exigia. A necessidade de se implementar e manter a ISO 9001 em todos os procedimentos da Biblioteca, além de pensar na qualidade do trabalho que era desenvolvido, bem como nas novas ideias para a melhoria continua. O conceito era trabalhar e aprimorar continuamente todas as atividades desenvolvidas pela Biblioteca. Um desafio diário, pois o grau de satisfação dos usuários era avaliado semestralmente e os índices precisavam ser melhores a cada avaliação. Nessa época também era responsável pela criação e manutenção da intranet e do site da instituição. O pouco que aprendi durante o curso foi desenterrado e posto em prática, porém para conseguir executar com a qualidade necessária, já que não possuía domínio em programação e linguagem HTML e em PHP, optei por fazer um curso técnico em Informática, que me permitiu adquirir mais conhecimentos para executar adequadamente essa atividade. Nesse meio tempo ministrei algumas aulas em um curso técnico de Biblioteconomia, sendo uma experiência que muito contribuiu na minha formação profissional. Ministrar aulas é estudar diariamente e aprender junto com o aluno. Em 2010, querendo novos desafios, aceitei um trabalho numa faculdade de grande porte especializada na área de direito. Nessa nova fase tive a oportunidade de gerenciar uma equipe maior, contando 15 pessoas. Essa etapa de minha trajetória profissional foi bastante desafiadora, pois não tinha nenhum conhecimento da área de direito: aprendi diariamente. O desafio se estendeu na utilização do sistema da Biblioteca que não conhecia; para entender e conseguir desempenhar meu novo trabalho, passei a primeira semana estudando os manuais do sistema para poder utilizá-lo. Precisei desenterrar o que havia aprendido sobre MARC, afinal, após o tér- 217 mino do curso , os sistemas de gerenciamento de biblioteca que utilizei não eram em formato MARC. O serviço de referência foi um aprendizado a parte. A NBR 6023 praticamente se tornou meu livro de cabeceira, pois para ajudar os alunos e pesquisadores da faculdade precisei entender um pouco mais sobre como referenciar as doutrinas, as legislações e as jurisprudências. Confesso que achei muito chato e complicado fazer essas referências. Nessa época, comecei a me interessar em prestar concursos, mas sempre tive dificuldades em programar uma rotina de estudos. Meu aprendizado sempre foi atrelado à prática, e tinha dificuldade em focar o estudo da teoria. Foram sete os concursos que prestei, entre outros que me inscrevi e não fiz a prova. Dentre esses concursos, um passei para a segunda fase, mas não me atentei a convocação da prova; em dois deles prestei por curiosidade, sem estudar, e não atingi a pontuação mínima; em outros dois fiquei relativamente bem colocada, mas não em posição para ser nomeada. Por fim, passei em segundo lugar em um e, em terceiro, no outro. Em 2011, deixei a iniciativa privada ao ser nomeada para o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), no campus Votuporanga, local em que atuo como Bibliotecária-Documentalista. O serviço público trouxe novos desafios. O IFSP estava iniciando uma fase de expansão e, com isso vários campi foram abertos e precisavam ser estruturados, o mesmo se aplicava às Bibliotecas. Nessa nova fase, houve a necessidade de praticamente iniciar a Biblioteca do zero, configurar os parâmetros do sistema de gerenciamento de acervo, elaborar as políticas de desenvolvimento de acervo e regulamentos, além de trabalhar com poucos recursos, tanto para aquisição de materiais bibliográficos, quanto para mobiliário, além da necessidade de elaborar projetos básicos para cada tipo de aquisição, sendo uma das etapas obrigatórias para o processo de pregão eletrônico. Lógico que houve outras responsabilidades, dentre elas, lidar com o livro como patrimônio! Uma situação bem inusitada, pois sempre pensei no livro como material de consumo. Para cada livro não devolvido ou desaparecido, há a necessidade de abrir processo administrativo, cuja finalidade é apurar as causas, as responsabilidades e se o servidor atuou efetivamente com o objetivo de reaver o material extraviado... imagina a trabalheira! Enfim, a dinâmica entre o serviço público e o setor privado são bem diferentes. 218 Os acidentes Em meu primeiro emprego como bibliotecária, aconteceu um “pequeno” acidente na Biblioteca: algumas estantes caíram sozinhas por causa do peso. Praticamente me senti dentro da cena do filme “A Múmia”, de 1999, quando a personagem Evelyn derruba todas as estantes da biblioteca. A diferença é que não foram tantas estantes, nem fizeram aquele efeito dominó, mas como a biblioteca era no primeiro andar, o estrondo fez vários alunos, professores e funcionários correram para a Biblioteca para verem o que havia acontecido. A cara de espanto de todos, e também incluo a minha, foi tal qual o filme! Houve vários danos, livros com capas rasgadas, bibliocantos e caixas de periódicos tortos, mesas quebradas... as estantes pareciam um monte de ferro retorcido. Foi um desafio manter a biblioteca funcionando com os livros empilhados no chão até que novas estantes, próprias desta vez, fossem adquiridas. A partir desse acidente, sempre insisti com meus empregadores sobre a importância de investir em estantes específicas para Biblioteca. Outros tipos de estantes não fornecem a mesma estabilidade e segurança, além do mais, já presenciei usuários de baixa estatura pisando nas prateleiras inferiores para poder alcançar o material desejado, ao invés de utilizar a escada. Se a estante não é própria, e dependendo do peso da mesma, a queda será apenas uma questão de tempo. Em meu segundo emprego houve nova queda de estantes, desta vez de estantes para fitas VHS. Um usuário apoiou-se na estante, que por ser do tipo aramada, não suportou o peso, caindo em seguida, resultando em várias caixas de fitas e suportes da estante quebrados. Os usuários inusitados Nada no curso de graduação nos prepara para atender alguns tipos de usuários. Em meu segundo trabalho, aconteceu alguns incidentes com usuários atípicos. Um dos acidentes ocorreu durante um final de semana, quando um gato caiu pelo forro, deixando marcas de patas sobre as mesas e muita sujeira. Como não havia sinal do intruso, deduziu-se que o felino tinha encontrado um meio de sair, de maneira que trabalhamos tranquilamente durante todo o dia e noite. A surpresa ocorreu no dia seguinte quando encontramos 219 os rastros que ele deixou durante a noite; procuramos e nada de encontrá-lo! Assim, deduzimos mais uma vez que o bichano não estava na Biblioteca. Na quarta-feira, a situação se repetiu, saímos então à caça do novo usuário e morador da Biblioteca, que a custo encontramos escondido entre os periódicos, todo arisco e magrelo. Lógico que houve alguns danos nesses periódicos, mas felizmente não resultou em perda significativa de conteúdo técnico. Nesse mesmo local, outra situação ocorreu quando, ao chegar numa manhã para trabalhar, encontramos um urubu inerte sobre uma das estantes. Novamente o ilustre visitante havia caído pelo forro. Devido a reincidência pelo tipo de acidente foi necessário fazer um trabalho de amarração dos forros, de modo a evitar outras situações similares. Os singulares visitantes causaram prejuízos em relação a perda de materiais técnico-científicos, bem como a sujeira oriunda da visita deles. No atual trabalho outros usuários inusitados são dignos de nota, como a frequência diária de passarinhos, outras menos assíduas de cães, bem como a visita de um gambá e um lagarto! Nessas horas, faz se jus a prerrogativa de que a Biblioteca é para todos! Nada nos prepara para certas situações... Trabalhar em Bibliotecas em contato com os usuários trouxe muito aprendizado e a certeza de que, entre outras habilidades, é necessário ter memória fotográfica do acervo, além é claro, ter o jogo de cintura para saber lidar com os diferentes usuários. Responder aos questionamentos mais comuns como “– Você já leu todos os livros da Biblioteca?” Ou ter o dom da adivinhação “– Quero aquele livro de capa vermelha que estava nesta estante”. Ou ainda: “– Quero aquele livro grande e grosso que meu amigo pegou”. Até mesmo: “– Quero aquele livro azul, escrito em branco que peguei esses dias”. – entende-se aqui, meses ao invés de dias. Saber lidar com daltonismo: “– Quero aquele livro verde que o professor está usando”. – depois você descobre que o livro em questão não é verde e sim cinza. A de saber investigar: “– O professor passou um livro, mas não me lembro qual”. 220 Ou a de virar professora: “– Resolvi dar uma prova para os alunos aqui na biblioteca, você fica de olho neles e depois recolhe as provas para mim? Vou estar na minha sala”. Sem falar nas situações como: “– Mas eu devolvi o livro! ” – depois de algum tempo, o usuário aparece com livro que jurava ter devolvido. “– Ah, não fui eu que molhei, já estava assim quando emprestei! ” – e o livro em questão ainda está úmido. “– Isso é um absurdo! Não vou pagar essa multa! Vou falar com a direção! ” – quando o usuário devolve o livro meses depois do que seria a data de devolução. “– Quero renovar este livro só que ele está atrasado!” – e diante da negativa, vem a resposta “– pode sim, ele está em nome de laranja, agora quero emprestar em meu nome!” – quando um usuário empresta para dar para o colega e o colega devolve com atraso. “– A biblioteca deveria ter um livro para cada aluno!” – quando os alunos reclamam que não há mais o livro disponível e precisam fazer reserva. “– Normaliza para mim?” – quando os usuários não entendem o que é serviço de referência e serviço de orientação em normalização. “– Fiz uma limpeza em casa e resolvi doar esses livros para a Biblioteca” – e entre os ditos livros, estão velhos cadernos e apostilas rabiscadas, folders, lista telefônica e outros. Esses relatos fazem parte tanto de minha experiência quanto de muitos outros bibliotecários. Situações desse tipo são comuns e nos mostram o quanto lidar com diferentes pessoas nos traz mais discernimento em relação ao que fazer. Da graduação à atualidade Ao me interessar em prestar concursos, notei que havia muita novidade na área da qual desconhecia, como Catalogação em RDA (Recursos, Descrição e Acesso), os Requisitos Funcionais para Registros Bibliográficos (FRBR), o DOI (Digital Object Identifier System), além dos avanços da Bibliometria, Cientometria, Infometria, Webmetria, Altmetria e lógico, em repositórios digitais. 221 Houve muita novidade durante esses quase vinte anos de graduada e acompanhá-las requer estudo e a certeza de que não se pode parar no tempo. Algumas disciplinas fizeram falta para ajudar no trabalho, como uma de arquivos, de bibliometria, gestão eletrônica de documentos, gestão de pessoas e resolução de conflitos. Porém, as disciplinas que abordaram vocabulário controlado ajudaram muito no processo de catalogação nas instituições em que trabalhei, principalmente quando se pensa na qualidade do serviço prestado. Comparativamente com outros profissionais que não tiveram esse conteúdo no curso, percebe-se uma certa dificuldade quanto à padronização de termos, que é bem diferente do conceito de RDA. Algumas disciplinas não contribuíram como o esperado, como geração e uso de base de dados e a de marketing, cuja abordagem não correspondeu as necessidades dos dias atuais. A base do curso muito me favoreceu, mas sempre foi necessário me atentar às atualizações e procurar por cursos complementares para auxiliar no trabalho. Cada vez mais, tornou-se fundamental acompanhar as novas tecnologias, as novas exigências dos usuários, para assim poder atendê-los. Por fim, posso dizer que não me arrependo da escolha que fiz há mais de 20 anos, amo o que faço e quero continuar atuando e aprendendo a cada dia. 222 Foto: Waldeck Schutzer A INFLUÊNCIA DO CURSO DE BCI DA UFSCar NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL E ACADÊMICA FABIO PINHO* Redigir este texto, para compor o livro, fruto do projeto “Memória do curso de BCI: entre lembrar e esquecer 20 anos depois!” da UFSCar, cujo objetivo envolve recuperar a memória social e a memória institucional daqueles que contribuíram para a consolidação do curso, não é muito simples como se pensa. Por isso, estabelecer uma relação entre a pesquisa que desenvolvo e a Ciência da Informação, requer a realização de uma reconstrução memorialística no intuito de compreender qual foi o papel do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) da UFSCar assim como a sua influência na minha vida profissional e acadêmica. Meus pais sempre primaram pela educação dos filhos e zelavam por cuidados que iam da limpeza do uniforme escolar até a realização das tarefas escolares. Por conta disso, inicio o meu relato memorialístico a partir do ensino fundamental, onde a base da escolaridade formal foi iniciada a partir de atores e acontecimentos que vieram a marcar minha vida adulta no âmbito acadêmico e profissional. De certa forma, adianto que o relato representa personagens e acontecimentos que moldaram minhas convicções. Dos cinco aos dezessete anos (ou seja, da pré-escola ao terceiro colegial) estudei em três escolas que complementaram meus estudos. Na Escola Prof. * Doutor e Mestre em Ciência da Informação (UNESP), Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2002). Docente na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) desde 2009. Contato: fabiopinho@ufpe.br. 224 Carlos Nobre Rosa, estudei do ciclo básico à quinta série (1984-1988) e guardo recordações valiosas desde a alfabetização, que fugia aos padrões do AEIOU da época para algo que hoje poderia denominar-se construtivista, passando pelo levantar da cadeira quando um adulto adentrava a sala de aula até a multiplicidade de docentes, fato esse que nos deixava mais adultos porque refletia séries mais avançadas. Entretanto, o episódio mais marcante dessa época foi a responsabilidade dada a mim em cuidar da “biblioteca” (uma estante de livros) de nossa sala de aula, registrando o empréstimo de livros aos amigos de turma. Na Escola Prof. Antonio José Pedroso, estudei da sexta à oitava série (1989-1991) e guardo recordações interessantes das atividades extraclasse de apresentação de teatro (ainda vive em minha memória a apresentação que fizemos da peça Romão e Julinha, uma adaptação de Romeu e Julieta para um país fictício de gatos), das exposições de ciências e das apresentações folclóricas. Entretanto, um fato marcou-me muito nesse período. Na oitava série a professora de OSPB – Organização Social e Política Brasileira (sim, uma disciplina que juntamente com a de Educação Moral e Cívica foram conhecidas por transmitir uma ideologia de um regime autoritário) convidou-me para dar uma aula junto com ela para a classe, o que de pronto não me trouxe medo, mas contentamento e um tremendo frio na barriga. Na Escola Prof. Aurélio Arrobas Martins, estudei do primeiro ao terceiro colegial (1992-1994) e foi um período do difícil momento de pensar no rumo profissional a ser trilhado. E assim, algumas perspectivas se apresentaram: o convite da professora de OSPB despertou em mim o interesse pela docência e o cuidado com a biblioteca da sala de aula na quinta e sexta séries, bem como a frequência à biblioteca pública da cidade revelou-me uma profissão até então desconhecida, a de bibliotecário. Como resultado, em 1999, por meio do vestibular da Fuvest, eu ingressei no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em São Carlos no interior de São Paulo. É muito gratificante estar em uma universidade e poder usufruir de todas as oportunidades que lhe são oferecidas. O espaço universitário é muito rico em oportunidades e de novas descobertas. Recordo-me do quão interessante foram, no primeiro ano do curso, as explicações de Elisabeth Márcia Martucci acerca da área, bem como de Eliane Serrão Alves Mey sobre a importância do profissional para a educação e mediação dos leitores. Nossas apresentações e estudos sobre esses 225 assuntos significaram uma realização pelo prazer da descoberta dos fatos e dos distintos pontos de vista sobre eles. Nessa oportunidade, recordo-me do convite feito a mim por Elisabeth Martucci para atuar como monitor em sua disciplina de Normalização Documentária. Com a realização da monitoria uma fascinante vertente da universidade foi desvelada: o ensino. A partir de então, senti como que algo houvera se transformado dentro de mim e a perspectiva da vida acadêmica tornou-se algo mais claro e palpável. Nesse período de vida universitária uma forte referência encontra-se na figura desses professores que em muito contribuíram para o delineamento do meu traçado profissional. Com Elisabeth Márcia Martucci tive referências seguras sobre a área e foi a partir de quem a questão da didática, notadamente no processo de ensino e aprendizagem, passou a povoar minhas aspirações profissionais. Igualmente registro em Eliane Serrão Alves Mey a responsabilidade por apresentar-me o fascinante mundo da representação descritiva e, quem veio proporcionar-me a oportunidade de trabalhar em um projeto de tutoria à distância em catalogação para o Conselho da Justiça Federal. Com Maria Cristina Comunian Ferraz a questão da pesquisa tornou-se algo mais claro e compreensível, apresentando-me a carreira acadêmica como uma perspectiva. E, com Ariadne Chloë Mary Furnival verifiquei a referência da habilidade em língua estrangeira enquanto uma complementação natural do processo de comunicação, bem como a interdisciplinaridade da área para com os problemas sociais, o que resultou na orientação de trabalho de conclusão de curso intitulado Educação Ambiental e o Bibliotecário. Igualmente em colegas como Fernanda Passini Moreno e Roniberto Morato do Amaral, dentre outros, encontrei exemplos de tenacidade e dedicação. Um ano antes de ingressar na universidade, em 1998, realizei concurso público para trabalhar como auxiliar de biblioteca na Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – UNESP – Câmpus de Jaboticabal, onde trabalhei até 5 de janeiro de 2009. Após o término do curso de graduação (que foi em 2002) pude exercer as funções de bibliotecário e de supervisor técnico da seção de referência. Portanto, foram 10 anos de trabalho em uma biblioteca universitária que me trouxeram momentos de alegria, aprendizado e desafios constantes. Nesse período, tive a oportunidade de conhecer bem o trabalho que envolve as seções da biblioteca, tanto a de tratamento da informação quanto a de referência, além de aprender sobre a organização universitária. Nessa última 226 esfera, pude participar dos órgãos colegiados como Congregação e Conselho Universitário, enquanto servidor técnico. Nesse sentido, algumas pessoas foram imprescindíveis para a minha vivência nesse ambiente: Ana Silvia Pamplona Mariano, Neli Silvia Pereira Saccani e Claudemir Soares (in memorian). Em complementaridade, pude continuar estudos de línguas estrangeiras (espanhol e francês) em aulas particulares, momento que veio a enriquecer meu repertório na literatura biblioteconômica e de Ciência da Informação. Em 2002, assim que terminei minha graduação, prestei processo seletivo simplificado para professor substituto na Universidade Federal de São Carlos o que me permitiu ter contato com a prática docente. Esse foi um momento crucial para minha decisão na carreira docente e, novamente, tive apoio dos meus mestres e, naquele momento, colegas de trabalho. Dessa forma, atuei no conjunto de disciplinas de organização da informação bem como a de referência (essa última por minha experiência profissional). Nessa oportunidade, tive o prazer de substituir minhas mestras Juliana de Souza Morais, Eliane Serrão Alves Mey e Maria Matilde Kronka Dias. Nesse período, poucos eram os concursos públicos para docentes efetivos; entretanto, após o término do meu contrato de substituto, o Departamento de Ciência da Informação da UFSCar contratou de forma efetiva a professora Luciana Gracioso. Em decorrência desses fatos, em 2004, eu iniciei o curso de mestrado em Ciência da Informação na Faculdade de Filosofia e Ciências – UNESP – Câmpus de Marília, sob a orientação do professor José Augusto Chaves Guimarães. Na ocasião, ao cursar as disciplinas, pude tomar contato mais direto com a construção do arcabouço teórico da Ciência da Informação e seus meandros interdisciplinares. Por isso, o embrião da vida acadêmica (ensino e pesquisa) continuava vivo em mim e sentia, mormente com a integralização dos créditos das disciplinas de mestrado, que esse seria meu caminho natural. Ao ingressar no mestrado da UNESP – Câmpus de Marília, eu tive a oportunidade de conhecer grandes incentivadores de minha carreira – José Augusto Chaves Guimarães – que além de orientador transformou-se em parceiro de discussões acadêmicas (e de gratificantes viagens também). Em meio a tão propício ambiente acadêmico, muito aprendi e esse fator dirigiu minhas atividades para estudos sobre a ética na representação do conhecimento, pois quando iniciei meus estudos, estava imbuído das ideias do pesquisador espanhol Antonio García Gutiérrez (que em 2005 tive a oportunidade de conhecê-lo pessoalmente e se tornou um entusiasta de minha dissertação, agraciando-me com diversas bibliografias que foram oportunamente incor- 227 poradas em meus estudos), além disso, tomei parte no grupo de pesquisa Formação e Atuação Profissional e pude, com isso, contemplar meus estudos sob a ótica da vertente francesa sobre Análise Documentária e sua influência na formação do profissional da informação. Paralelamente ao mestrado, em 2005, recebo o Prêmio Biblioteconomia Paulista “Laura Russo”, que estava em sua quinta edição, por meu projeto de educação ambiental nas bibliotecas. Projeto este resultante do meu trabalho de graduação e que atribuiu reconhecimento aos meus esforços profissionais. Assim, em 23 de junho de 2006, tendo como banca José Augusto Chaves Guimarães (orientador), Mariângela Spotti Lopes Fujita e Marcos Luiz Cavalcanti de Miranda, defendo a dissertação de mestrado intitulada Aspectos éticos em representação do conhecimento: em busca do diálogo entre Antonio García Gutiérrez, Michèle Hudon e Clare Beghtol, que se propôs, por meio de pesquisa exploratória de natureza teórico-investigativa, estabelecer, a partir dos estudos de Antonio García Gutiérrez, Michèle Hudon e Clare Beghtol, a identificação de vertentes teóricas convergentes que subsidiem as questões sobre os aspectos éticos nas atividades de representação do conhecimento. Com essa dissertação, senti como que estivesse, ainda que modestamente, dando minha contribuição para diminuir a angústia dos bibliotecários no tocante à má-representação resultante de uma atuação equivocada em relação às minorias e temas excluídos das regras e sistemas de classificação. Ainda em 2006, um artigo resultante da dissertação é escolhido como o melhor trabalho do GT2 do ENANCIB e, por isso, transformou-se em um capítulo de livro. Assim, nasceu o embrião para o doutorado, iniciado logo a seguir: a questão do eufemismo na representação do conhecimento. Recordo-me ainda de uma viagem para um evento quando José Augusto Chaves Guimarães, com a perspicácia que lhe é peculiar, “levantou a lebre” do eufemismo na representação. Naquele momento pude perceber que a ênfase dada na dissertação para tal problema, já trazia consigo um interesse latente em prosseguir na pesquisa sobre ética na organização e representação do conhecimento, vertente da qual me dedico. Então, em março de 2007 iniciei o doutorado, igualmente na UNESP – Câmpus de Marília e sob a orientação do professor José Augusto Chaves Guimarães, com o intuito de investigar o eufemismo na representação do conhecimento. 228 Se o mestrado trouxe consigo as angústias inerentes ao começo, à iniciação acadêmica, o doutorado revela-se como um período de imenso prazer, pois sua temática refletia uma indagação incipiente, mas que para a qual eu exigia de mim mesmo se não uma solução, ao menos um posicionamento. Para minha surpresa o ano 2007 revela-se um período de colheita, uma vez que dois prêmios são a mim concedidos. Um deles trata-se da segunda colocação em melhor dissertação atribuída à área pela ANCIB durante o ENANCIB realizado na Bahia, e o outro, trata-se do Prêmio Biblioteconomia Paulista “Laura Russo”, que estava em sua sétima edição, e que me deram a honra de recebê-lo novamente por minha dissertação de mestrado, enquanto um aspecto inovador nos serviços biblioteconômicos. Novamente sinto-me reconhecido e agradecido por esses incentivos, fatos esses que mobilizaram ainda mais para o meu fascínio: o ensino da Biblioteconomia. Em termos de participação em eventos e visitas técnicas, iniciou-se uma fase de ampliação da divulgação do meu trabalho, em que se destacam eventos como o ENANCIB e o IBERSID (em Zaragoza, na Espanha), o que foi possível apresentar produtos de investigação na área de organização e representação do conhecimento. Tais oportunidades tiveram como consequência, para mim, uma melhor visualização da realidade bibliotecária e, principalmente, a oportunidade de compartilhar experiências com alunos e colegas, de modo a que novos contatos fossem estabelecidos. No tocante à vida profissional, creio que esse período se caracterizou por uma consolidação de contatos e parcerias profissionais, aspecto que gerou publicações conjuntas. Sob o aspecto humano registro ainda que tais oportunidades permitiram a consolidação da minha admiração por várias pessoas no meio profissional, como Fernanda Passini Moreno, Eduardo Ismael Murguia Marañon (in memoriam), Eliane Serrão Alves Mey, Ariadne Chloë Mary Furnival, Francisco Javier Garcia Marco e Maria Carmen Augustín (Universidad de Zaragoza), Juan Carlos Fernández-Molina (Universidad de Granada) e muitos outros pelos quais guardo a mais profunda admiração. Durante os estudos no âmbito do doutorado, o governo federal viabilizou algumas políticas públicas e uma delas foi o REUNI – Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, que foi um projeto do governo federal que visou melhorar o ensino superior público no Brasil. Por conta disso, no final de 2008, submeti-me a concurso público de provas e títulos para a carreira do Magistério Superior na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), no Recife. Aprovado no concurso, eu iniciei 229 minhas atividades na UFPE como professor assistente no dia 23 de janeiro de 2009, onde desenvolvo minhas atividades até o momento. Durante o exercício das minhas atividades docentes, submeti-me à defesa do doutorado na UNESP, Câmpus de Marília, no dia 28 de setembro de 2010, tendo como banca examinadora os professores José Augusto Chaves Guimarães, João Batista Ernesto de Moraes, Eduardo Ismael Murguia Marañon (in memoriam), Miriam Figueiredo Vieira da Cunha e Juan Carlos Fernández-Molina com a tese intitulada Aspectos éticos em representação do conhecimento em temáticas relativas à homossexualidade masculina: uma análise da precisão em linguagens de indexação brasileiras. Nesse momento, foi possível consolidar toda a reflexão que iniciei desde a graduação na UFSCar, ou seja, num aspecto mais amplo, são as questões sociais e políticas inerentes à Biblioteconomia. Após a aprovação no doutorado, fui promovido na UFPE para professor adjunto. Dessa forma, minhas atividades na UFPE permearam (e continuam permeando) aspectos do ensino, da pesquisa, da extensão e da gestão. Nessa última, tive a oportunidade de atuar como subchefe e chefe de departamento, bem como, de coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação. Nas atividades de ensino destaco minha atuação nas disciplinas de indexação e resumos e linguagens documentárias alfabético-hierárquicas, podendo, nesse caso, incorporar os resultados das pesquisas no âmbito do mestrado e do doutorado, vislumbrando as questões éticas no desenvolvimento de atividades e produtos documentais. No âmbito da pesquisa, dedico-me às questões éticas na organização e representação do conhecimento e também da memória científica e tecnológica e seus resultados têm sido publicados em revistas conceituadas na área de Ciência da Informação. As publicações e a divulgação científica têm se voltado muito mais para a consolidação de duas linhas de pesquisa 1) Organização e Representação do Conhecimento e 2) Memória da Informação Científica e Tecnológica, procurando divulgar os produtos das mesmas em veículos cientificamente abalizados. Assim, destaco algumas referências que influenciaram em muito o meu trabalho de pesquisa. Além disso, essas referências proporcionaram um novo olhar para as disciplinas que ministro na UFPE. São elas: 230 BEGHTOL, C. A proposed ethical warrant for global knowledge representation and organization systems. Journal of Documentation, London, v. 58, no. 5, p. 507-532, 2002. BERMAN, S. Prejudice and antipathies: a tract on the LC subject heads concerning people. Jefferson: McFarland & Company Publishers, 1993. GARCÍA GUTIÉRREZ, A. Knowledge organization from a “culture of the border”: towards a transcultural ethics of mediation. In: LÓPEZ-HUERTAS, M. J. (ed.). Challenges in knowledge representation and organization for the 21st century: integration of knowledge across boundaries. Würzburg: ERGON-Verlag, 2002. p. 516-522. GARCÍA GUTIÉRREZ, A. Principios de lenguaje epistemográfico: la representación del conocimiento sobre Patrimonio Histórico Andaluz. Sevilla: Instituto Andaluz del Patrimonio Histórico, 1998. GUIMARÃES, J. A. C. O profissional da informação sob o prisma de sua formação. In: VALENTIM, M. L. P. (ed.). Profissionais da informação: formação e atuação profissional. São Paulo: Polis, 2000. p. 53-70. HJØRLAND, B. Fundamentals of knowledge organization. Knowledge Organization, Würzburg, v. 30, no. 2, p. 87-111, 2003. HUDON, M. Multilingual thesaurus construction: integrating the views of different cultures in one gateway to knowledge and concepts. Knowledge Organization, Würzburg, v. 24, no. 2, p. 84-91, 1997. LÓPEZ-HUERTAS, M. J. Some current research questions in the field of knowledge organization. Knowledge Organization, Würzburg, v. 35, no. 2/3, p. 113-136, 2008. OLSON, H. A. The power to name: locating the limits of subject representation in libraries. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 2002. RAFFERTY, P. The representation of knowledge in library classification schemes. Knowledge Organization, Würzburg, v. 28, no. 4, p. 180-191, 2001. SAN SEGUNDO MANUEL, R. Nueva concepción de la representación del conocimiento. In: ANTONIO FRÍAS, J.; TRAVIESO, C. (ed.). Tendencias de investigación en organización del conocimiento. Salamanca: Ed. Universidad de Salamanca, 2003. p. 395-402. 231 VAAGAN, R. W. (ed.). The ethics of librarianship: an international survey. Munchen: K. G. Saur, 2002. No intuito de consolidar minha pesquisa, associei-me ao capítulo brasileiro da ISKO – International Society for Knowledge Organization, onde o espaço de interlocução de pesquisadores da organização do conhecimento é frutífero e próspero. Nessa entidade, atuei como conselheiro fiscal e, atualmente, eu ocupo o cargo de secretário. Nesse mesmo aspecto, destaco minha participação como vice coordenador do GT2 (Organização e Representação do Conhecimento) da ANCIB – Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação. Na extensão, minhas experiências têm se voltado para o colecionismo que, no Recife, é uma prática muito interessante e possibilita que alunos e comunidade possam dar vazão à função da universidade. Destaco, aqui, o projeto “Colecionismo e memória” onde os alunos entrevistam os colecionadores da Região Metropolitana do Recife e refletem sobre as questões memorialísticas dessa prática. Além disso, um desafio de envergadura na minha carreira se deu quando em 21 de novembro de 2017 a ANCIB – Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação encerrou a consulta aos coordenadores de Programas de Pós-Graduação da Ciência da Informação e da Museologia deliberando a minha indicação para a Coordenação Adjunta da Área de Comunicação e Informação na CAPES, para a quadriênio 2018-2021, juntamente com Jonathas Luiz Carvalho Silva que, posteriormente, foi substituído por Eliezer Pires da Silva. Em resumo, poderia dizer que estes últimos anos têm, pouco a pouco, permitido um melhor clarear de algumas convicções. Por fim, já que este texto se propõe ser breve, sinalizo que esta reconstrução memorialística possui, certamente, no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) da UFSCar muita influência. A pesquisa sobre os aspectos éticos na organização do conhecimento e seu reflexo em disciplinas como indexação e resumos e linguagens documentárias alfabético-hierárquicas encontra respaldo no âmbito político e social da Ciência da Informação, onde reside toda minha gratidão nessa formação acadêmica. 232 Foto: Waldeck Schutzer BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS: ONDE TUDO COMEÇOU GIOVANA DELIBERALI MAIMONE* A descoberta da Biblioteconomia Assim como uma grande parte dos adolescentes que terminam o ensino médio, meu desejo, no ano de 1999, com 18 anos, era o de entrar para uma universidade pública em um curso que me proporcionasse um futuro promissor. Ainda meio perdida entre as profissões, comecei a prestar vestibular para diversas áreas/ cursos como: Letras, Engenharia de Alimentos, Direito, Biologia, para citar alguns. Entrei em Letras e Direito e embora fossem cursos muito interessantes, não me provocavam entusiasmo; acabei desistindo logo. A Biblioteconomia entrou na minha vida quando, finalmente, entrei para uma grande universidade pública (em 2002) e conheci a simpática e bela cidade de São Carlos-SP. A escolha por este curso se deu, em primeiro momento, pela relação candidato/vaga (relativamente baixa na época) e por se tratar de uma área ligada às Ciências Humanas, ou melhor, Sociais Aplicadas, com a qual mais me identificava. Devo confessar que a possibilidade de morar em uma cidade nova e cursar uma faculdade pública me motivavam profundamente. Embora com ideias muito vagas do que seria o curso e a profissão de bibliotecário, comecei a frequentar as aulas sempre muito atenta aos discursos * Doutora em Ciência da Informação (USP), Mestre em Ciência da Informação (PUCCAMP) e Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2005). Docente na Universidade de São Paulo (USP) desde 2014. Contato: gdmaimone@usp.br. 234 dos professores e às dúvidas e inseguranças dos colegas, que muitas vezes também eram as minhas. De início, estávamos um tanto receosos sobre o futuro que a profissão nos reservaria, sentimento que talvez recaia sobre a grande maioria dos alunos de primeiro ano dos cursos de graduação. Naquele momento o que me vinha à cabeça quando se falava em Biblioteca eram as experiências que tive na biblioteca municipal da cidade de Tietê-SP que por vezes tinha me auxiliado nas pesquisas escolares. Lembro-me com saudades do “cheiro” daquele lugar. Não tinha, porém, grandes ideias do que fazia um bibliotecário, “por trás das estantes”, pois para mim suas atividades resumiam-se ao auxílio à pesquisa escolar e ao empréstimo dos livros. Depois de um tempo, e não demorou muito, fui perceber que a atuação do bibliotecário é muito mais ampla e complexa do que “leigamente” imaginava. Já no primeiro semestre começamos a assimilar o novo paradigma que entornava a Biblioteconomia, a questão da informação. Na realidade, o bibliotecário trabalha, de modo geral, com informação1, fato que amplia significativamente seus locais de atuação. Por este motivo podemos chamá-lo também de “profissional da informação”, uma vez que, além de em empresas particulares, pode prestar serviços em museus, arquivos, bibliotecas, pinacotecas, órgãos do Estado e dos estados (Fundação SEADE, IBGE), prefeituras etc. Penso que muitos estudantes de biblioteconomia senão todos experimentam comentários curiosos e até pejorativos, começando pela indagação mais básica: – Biblio o quê? Você deve gostar muito de ler, pois deve ler todos os livros da biblioteca. – Biblioteconomia é o estudo dos livros? – Precisa estudar para ser bibliotecário? – Biblioteconomia é uma Ciência ou um trabalho técnico? No intuito de identificar a área para o futuro profissional e também para poder responder com mais solidez às perguntas acima colocadas, tivemos, desde o primeiro semestre na Universidade Federal de São Carlos disciplinas que se referiam diretamente à área da Biblioteconomia e Ciência da Informação, que traziam à tona, questões de pesquisas teóricas e práticas, métodos utilizados, objetos de estudo etc. que fundamentam o campo. Inseridos no campo da Biblioteconomia existem diversas frentes de pesquisas com temas diferentes, mas que em algum momento se complementam, sendo que a grade curricular pode variar entre os cursos distribuídos pelo Brasil, de acordo com seus interesses. 1 A informação torna-se mais importante do que o conteúdo físico no qual está “guardada”. 235 Com o passar dos semestres foi possível perceber afinidades com algumas matérias/disciplinas que eram ministrados com excelência pelos professores. Embora existisse muita discussão durante as aulas, os conteúdos eram e são, como se sabe, processados de forma individual e única por cada indivíduo. Talvez possa me referir aqui à noção de “internalização” ressaltada por Nonaka e Takeushi no livro Criação de Conhecimento na Empresa (1997). Após alguns anos de estudo e prática na área, trago comigo um objetivo principal: favorecer o encontro “informação – usuário”. Neste sentido, tal encontro pode promover, dentre outros, estes nobres benefícios: • • • • • • A geração de conhecimento. O desenvolvimento de novas tecnologias. O desenvolvimento científico. A cultura do cidadão. O prazer e o aprendizado. E o “crescimento humano” de modo geral. O profissional da informação possui, ao contrário do que muitos imaginam, uma ampla gama de atuação no mercado de trabalho já que a “informação” está contida em quase todos os lugares, contemporaneamente. Por este motivo a formação do profissional deve compor uma gama de disciplinas que possibilitem ao aluno ter conhecimento básico e geral de suas possibilidades de exercício da profissão assim como permitir a “escolha” do local de trabalho e aprofundamento no aprendizado contínuo do tratamento de materiais específicos, como é o caso das mídias audiovisuais, por exemplo. Para isso, a grande maioria dos cursos de graduação desta área, congregam uma grade com ampla interdisciplinaridade. A UFSCar, além desta característica, também possibilita a especialização do aluno em subáreas de ênfase ao final do curso – na minha época “informação social” e “informação para a indústria”. Escolhi cursar ambas, e apesar de bastante diversas, elas se encontram no dia-a-dia dos profissionais, já que o “social” está presente em qualquer ambiente. Para complementar a formação acadêmica há necessidade, e é fundamental, a vivência em estágios curriculares e extra-curriculares, que, no meu caso, muito auxiliaram no desempenho das atividades de bibliotecário e na riqueza em trabalhar com materiais diferentes e em locais tão diversos. 236 Justificando ainda a necessidade do estágio, é importante dizer que raramente os oito semestres da faculdade de Biblioteconomia são suficientes para o aprendizado prático e teórico que envolvem a área. Por este motivo é “essencial” sua realização, já que permite a aplicação prática da teoria estudada. Além disso, por ser de família pobre e com necessidade de trabalhar para ajudar um pouco nos custos da moradia/sustento em São Carlos precisei desde cedo de estagiar, embora no primeiro ano não recebi remuneração por motivo do estágio ser voluntário. Listo abaixo minhas experiências2: • Instituição de ensino “Álvaro Guião” – Biblioteca Escolar (Tombamento e Catalogação) (2002). • FADISC – Faculdade de Direito de São Carlos – Biblioteca Universitária de Direito (Tratamento e disponibilização de materiais do acervo – legislações, códigos etc., além do atendimento ao usuário) (2003). • Universidade Federal de São Carlos – Biblioteca Comunitária – setor de referência. Atendia às solicitações dos usuários, indexava e alimentava o sistema da Biblioteca (2003-2004). • EMBRAPA Instrumentação Agropecuária – São Carlos – Biblioteca especializada na área de “Instrumentação Agropecuária” que tinha por objetivo atender às solicitações dos pesquisadores ligados à empresa (2004). • Faber-Castell – São Carlos – Biblioteca com o objetivo de atender aos funcionários da empresa e ao cursinho pré-vestibular oferecido (2005). Essas experiências me proporcionaram, além de tomar contato inicial com a profissão, despertar o senso crítico sobre a área e constatar a fundamental importância do bibliotecário para o acesso à informação e ao conhecimento que proporciona, num aspecto mais amplo, o desenvolvimento geral da ciência, da sociedade e da humanidade. Desta maneira, é inerente a contribuição social, cultural e tecnológica da área para o despertar de recorrentes, novas eras. Na parte cultural por exemplo, participei, na UFSCar, de uma disciplina de Atividade Curricular de Integração, Ensino, Pesquisa e Extensão (ACIEPE) intitulada “Fazenda Pinhal”, que na época, era iniciado o 2 Todos os estágios foram supervisionados por um docente do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar, além de um profissional in loco. 237 levantamento do acervo existente na fazenda (histórica da região); foi muito prazeroso conhecer o local, aprender e aumentar ainda mais o respeito aos valores de nossa sociedade. Possuo enorme orgulho de ser bibliotecária e admiro o impacto que suas atividades podem causar, e talvez, por este mesmo motivo escolhi trilhar o caminho da docência – trabalhando de forma direta com a representação de informações. Pesquisa Científica, Docência e Reflexões Quando nos apaixonamos por algo/alguém podemos dizer que “mergulhamos” em um outro mundo. Assim também foi comigo em relação à pesquisa científica e, posteriormente, à docência pelas quais me vi seduzida, a partir de um certo momento da vida acadêmica. Da grade curricular colocada na época, as disciplinas que eu mais me identificava diziam respeito aos conceitos que envolviam a Ciência da Informação e a área de Organização da Informação e do Conhecimento, preferencialmente Representação Temática3, ministrada pela professora Luciana de Souza Gracioso. A experiência do tratamento informacional em bibliotecas e principalmente a convivência com pesquisadores foram um impulso que me levaram a desejar a pesquisa e a docência para o meu futuro profissional. Orientada pela mesma professora (Luciana) iniciei meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) sobre Representação temática, mais especificamente intitulado “Representação temática em obras de arte: perspectivas metodológicas”4. Inicia-se então uma rotina de levantamentos bibliográficos, análises de documentos, estruturação dos possíveis capítulos, redação (escreve, apaga, escreve, apaga) de texto. Era o início da formação intelectual que envolve, além da própria pesquisa, participação em congressos da área, publicações e projetos de pesquisas futuras. Trabalhar intelectualmente demanda esforço, dedicação e paciência. Por estes motivos é fundamental que o pesquisador tenha afinidade com o 3 4 Atualmente integro o quadro de docentes da linha de pesquisa “Análise Documentária” da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, tendo ministrado disciplinas como “Introdução à Análise Documentária”, “Indexação” e “Documentação Audiovisual”. Diga-se de passagem: O Trabalho de Conclusão de Curso é um dos momentos mais oportunos para se tomar gosto pela pesquisa. 238 tema que trabalha para que não desenvolva aversão à pesquisa e sim, interesse-se cada vez mais. É importante salientar também que a paixão pela pesquisa é crescente, mas frustrante, pois “Quanto mais se sabe, mais se sabe que não sabe!”. Porém, para mim, é sempre gratificante saber mais um pouco. Terminado o TCC, elaboro o projeto de pesquisa para o Mestrado e me preparo para as provas. Assim também foi com o Doutorado - anos de dedicação, deleite, superação e conquistas. Ambos trabalhos de pesquisa também versaram sobre a representação temática, porém com enfoques diferentes. Listo abaixo algumas informações referenciais5. Trabalho de Conclusão de Curso – Graduação (UFSCar) Ano de obtenção: 2005 Título: “Representação temática em obras de arte: perspectivas metodológicas” Dissertação – Mestrado (PUCCAMP) Ano de obtenção: 2007 Título: “Estudo do tratamento informacional de imagens artístico-pictóricas: cenário paulista – análises e propostas” Link para a dissertação: http://www.bibliotecadigital.puc-campinas.edu.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=345 Tese – Doutorado (ECA/USP) Ano de obtenção: 2013 Título: “Organização da informação e do conhecimento de documentos artísticos à luz da terminologia” Link para a tese: http://www.teses.usp.br/index.php?option=com_jumi&fileid=29&Itemid=158&lang=ptbr&id=2013&filtro=maimone A partir das pesquisas acima citadas é possível observar que elas se enquadram em temáticas específicas da área como: “Organização e representação da informação e do conhecimento”, “Museu como fonte de informação” e “Informação documentária”. Fazendo uma reflexão breve das minhas sensações sobre a área profissional posso dizer que o “Bibliotecário” vem ganhando espaço nos ambien5 Observação: Os trabalhos aqui descritos resultaram em publicações periódicas e apresentações de trabalhos em eventos científicos. 239 tes empresariais devido às necessidades de organizar os documentos para recuperá-los em tempo hábil. Já no espaço das bibliotecas, é lei no Brasil que se tenha, pelo menos, um bibliotecário em cada biblioteca, fato que amplia as possibilidades de emprego, embora isso nem sempre é uma realidade. Além disso, todos os espaços que necessitam de organizar informações podem contar com os serviços destes profissionais. A imagem do bibliotecário se transforma a medida que novos profissionais se formam e disseminam uma nova forma de agir e pensar. Aquele velho espaço de “acúmulo de livros”, passa a ser entendido como futuro do desenvolvimento de um país. Além disso, as experiências, tanto nos estágios como na docência permitiram meu conhecimento de alguns dos diversos tipos de públicos presentes nas bibliotecas e nos centros de informação, fato central para o bom atendimento ao usuário. Atuamos assim como “meio” entre uma informação, localizada em uma das pontas da cadeia e uma pessoa localizada na outra ponta. Confesso que conseguir auxiliar o usuário na busca de uma informação é uma das sensações mais gratificantes que um bibliotecário pode ter. Enfatiza-se aqui que todas as atividades da biblioteca devem ser pensadas tendo em conta o usuário final; assim, desde a aquisição até a disponibilização dos materiais nas estantes (locais ou virtuais) deve ser realizada com dedicação e conhecimento dos públicos da instituição. Em termos de organização e representação da informação e do conhecimento, o Brasil possui escolas de Ciência da Informação e teóricos de renome internacional que trabalham com o tratamento informacional de materiais distintos, variando de materiais impressos, visuais, sonoros, audiovisuais, entre outros. Neste sentido, existe um esforço coletivo para a integração do Brasil no cenário mundial da Ciência da Informação, observado pelo aumento dos eventos científicos internacionais da área e pelo crescimento gradual das publicações científicas em periódicos bilíngues, notadamente nas línguas – inglesa, espanhola e francesa. Ainda no âmbito internacional, principalmente nos países desenvolvidos, observo que o papel do bibliotecário que já era importante torna-se imprescindível para o acesso a informação e a geração de novos conhecimentos, que geram ciência, tecnologia e consequentemente, “lucro”. As possibilidades de cooperação internacional se expandem, principalmente com a possibilidade de trabalho on-line, arrebentam fronteiras e possibilitam o trabalho conjunto, do tratamento de acervos em comum ou com alguma semelhança. Além disso, trocas de experiências também são válidas, propiciando, em al- 240 guns casos a formação de grupos específicos de trabalhos (em geral, bibliotecas ou acervos com mesma temática e/ou com objetivos semelhantes). Assim como os estágios referentes à profissão de bibliotecário, quando escolhemos a docência também é necessário estagiar para aprender com professores mais experientes. Ressalto que estes momentos foram de fundamental importância para minha formação já que pude trabalhar diretamente com os alunos e professores auxiliando na elaboração de aulas, ministrando conteúdos, observando as diferentes didáticas etc. Analogamente ao sorriso de um usuário na biblioteca quando encontra uma informação está o interesse de um aluno em sala de aula para assimilar novas informações. A satisfação do professor é ainda maior se consegue formar pensadores críticos que debatem as questões colocadas pelas referências da disciplina. Em sala de aula ou fora dela o docente está sempre aprendendo diária e continuamente, pois esteja ele preparando aulas, estudando determinado conteúdo, trocando ideias com alunos e colegas, trabalhando conjuntamente em projetos, preparando publicações etc. sempre está experimentando universos novos; a própria atividade de orientação deixa claro tal desafio. Neste sentido, e não com a pretensão de elencar todas as atividades desempenhadas pelo docente universitário, relaciono abaixo algumas que prioritariamente devem fazer parte deste rol: • • • • • • Ensino – aulas ministradas em salas de aula. Pesquisa – projetos de pesquisa na área em que atua. Orientação de alunos de TCC, mestrado e doutorado. Participação em bancas de TCC, mestrado e doutorado. Publicações de pesquisas. Trabalhos “técnicos” – avaliação de trabalhos submetidos à congressos / emissão de pareceres para revistas científicas, etc. • Extensão (Trabalhos voltados para a sociedade). • Cargos de administração universitária (coordenador, chefe, pró-reitor etc.)6. Como visto, a vida acadêmica iniciada na UFSCar em 2002 foi a semente de um sonho semeado com entusiasmo e seriedade que floresceu e frutificou, 6 Para acessar o Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8933485589661265. 241 exemplificado pela minha atual realidade de professora e pesquisadora de Universidade Pública. Muito desta realização devo à algumas pessoas que se tornaram exemplos de profissionais e espelhos de atuação acadêmica como foi o caso da professora Luciana de Souza Gracioso da UFSCar e da professora Maria de Fátima Tálamo (Puccamp e USP), que além de minha orientadora, também foi e é fonte de inspiração e modelo. Além delas e para não correr o risco de esquecer de alguém, todos os professores e profissionais que me acompanharam, desde os bibliotecários dos estágios até os professores da pós-graduação merecem o meu profundo agradecimento. 242 Foto: Waldeck Schutzer FRAGMENTOS DA MINHA GRADUAÇÃO NO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO DA UFSCar IURI ROCIO FRANCO RIZZI* Introdução Foi com grande alegria que recebi o convite para compor um livro em homenagem aos 20 anos do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade Federal de São Carlos. A princípio, a tarefa de escrever um texto sobre o meu vínculo com a UFSCar, com uma abordagem memorialística, parecia algo simples. Mas, ao começar, senti a dificuldade não apenas de lembrar, mas de escolher o que colocar no texto, pois isto implicaria deixar de fora tantas outras. Afinal, como os estudiosos do tema ressaltam, a memória é construída tanto pela lembrança quanto pelo esquecimento. Uma segunda dificuldade foi a de falar sobre si. Não estamos acostumados, ainda mais na academia, a escrever sobre si. Somos treinados a ocultar nossa presença e subjetividade no texto acadêmico, quando muito, é aceito escrever na terceira pessoa. Em primeira pessoa, nem pensar! Algumas disciplinas, como, por exemplo, a Antropologia, já há algum tempo vêm questionando esta pretensa neutralidade científica nas ciências sociais e transformando a própria subjetividade do pesquisador em elemento de reflexão teórica e metodológica. É claro que o oposto pode também mostrar-se problemático, como o caso * Doutor em Ciência da Informação, Mestre em Ciência da Informação (UNESP), Especialista em Antropologia (UFAL) e Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2005). Docente na Universidade Federal de Alagoas (UFAL) desde 2010. Contato: iuri.rizzi@ichca.ufal.br. 244 de transformar o resultado de um estudo científico simplesmente em impressões pessoais e subjetivas. Mas isto não se aplica ao presente livro, visto que não é um relato de pesquisa e sim um livro de homenagem ao curso. Neste texto segui a orientação dos organizadores de contar a minha história na UFSCar e o meu vínculo com o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação. A linha condutora que encontrei foi a de tentar lembrar-me das pessoas que participaram deste período tão rico em experiências e aprendizado. No caso das minhas lembranças aqui incluídas, parte delas foi amparada por registros em suportes digitais, como os meus arquivos pessoais e a web, que me auxiliou na delimitação de datas e outros detalhes. Em ocasiões como esta notamos o quanto a informação registrada e os documentos podem auxiliar na construção de narrativas e fragmentos de memória. Em síntese, aproveitei a oportunidade para homenagear e agradecer às pessoas que participaram da minha trajetória acadêmica da graduação e que hoje me acompanham na minha atuação profissional, como docente do curso de Biblioteconomia. A escolha do curso Já era noite quando entrei na UFSCar, no campus São Carlos, pela primeira vez. Estava com minha família e vínhamos trazer um irmão que havia sido aprovado no curso de Terapia Ocupacional. Seguimos direto para o alojamento estudantil da universidade, que abriga alunos de outras cidades e sem condições de arcar com os custos com moradia no período da graduação. Lá, meu irmão conseguiu um lugar temporário para ficar, até dar entrada nos trâmites burocráticos. Nos despedimos e fomos embora. Foi uma passagem rápida, mas suficiente para perceber um lugar muito arborizado e tranquilo. No ano seguinte, em outra visita, pude, então, ver o campus à luz do dia e conhecer um pouco da Universidade. Estes acontecimentos me causaram uma boa impressão. Mesmo tendo olhado outras universidades, no fundo, a minha escolha pela UFSCar já havia sido feita. Quando chegou a minha vez de prestar o vestibular, ainda sem saber qual carreira escolher, li sobre todos os cursos do Guia do Vestibulando, e fiz uma lista dos que mais me interessavam. A maior parte cursos eram da área de humanas, alguns de exatas e um ou outro ligado à área ambiental. 245 Em 2000, recém saído de um curso técnico com duração de quatro anos, e com muita afinidade com a área de humanidades, prestei o curso de Ciências Sociais. Não fui aprovado. No ano seguinte, fiz o curso pré-vestibular e repensei as minhas opções. Depois de ler, assistir palestras no cursinho e conversar com bibliotecários, optei pelo curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Ingressei em 2002 e o período letivo começou em maio, um pouco atrasado devido à reposição de uma greve dos servidores. Início da trajetória Ao chegar na UFSCar me instalei no alojamento estudantil, com meu irmão, e solicitei as bolsas de assistência estudantil. Fui atendido com moradia, alimentação (que dava direito ao almoço e jantar no Restaurante Universitário) e auxílio financeiro1 (em contrapartida trabalharia oito horas por semana em atividades da Universidade). Procurei conhecer a Biblioteca Comunitária (BCo) para desenvolver estas atividades, assim como muitos de meus colegas. Depois de conhecer os diferentes setores da BCo, escolhi o das Coleções Especiais (COLESP)2, que abriga os acervos especiais (livros em formatos diferenciados, que não podem ser armazenados nas estantes comuns ou acervos particulares) e obras raras. Permaneci neste setor por um ano, sob orientação da bibliotecária Vera Lucia Cóscia, e ali iniciei o meu contato com os acervos pessoais e a preservação e conservação dos documentos. No início, a expectativa com as aulas era grande. Lembro-me de que, já na primeira ou segunda aula da disciplina Lógica aplicada à Biblioteconomia, fiquei preocupado com o fato de a professora ser estrangeira e intercalar suas aulas entre os idiomas português e inglês, seu idioma natal. “– Vai ser difícil acompanhar, pensei”. Mas foi só o susto. Ao longo do curso tive outras disciplinas com a professora Ariadne Chloe Mary Funival, e o trabalho final em uma destas foi sobre classificação, tema que eu retomaria algum tempo depois para fundamentar o meu projeto de mestrado. Mas nem todas as disciplinas me pareciam tão produtivas. Percebi logo que a universidade não poderia se reduzir às aulas do curso. 1 2 O valor da bolsa, em 2002, era de R$110,00. Atualmente denominado Departamento de Coleções de Obras Raras e Especiais (DeCORE). 246 O aprendizado no movimento estudantil Logo no início do primeiro ano tive contato com o Centro Acadêmico do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (CACIB), que, na época, ficava no prédio AT2 (Aulas Teóricas 2) e tinha um grupo engajado. Fui acompanhando e aprendendo sobre o movimento estudantil universitário, principalmente com os veteranos Heres Emerich Pires e José Carmo de Oliveira Júnior. Depois, o CACIB e outros centros acadêmicos foram transferidos, a contragosto, para um pequeno edifício que, apesar de abandonado, foi reativado para este fim. Ainda que próximo ao AT2, o isolamento foi suficiente para afastar os estudantes e desmobilizar o centro acadêmico. Também foi naquele ano que participei do Encontro Nacional dos Estudantes de Biblioteconomia, Documentação, Ciência e Gestão da Informação (ENEBD), em Belo Horizonte-MG, e da versão regional deste encontro, o Encontro Regional dos Estudantes de Biblioteconomia, Documentação, Ciência e Gestão da Informação (EREBD), realizado em Formiga-MG. Neste evento levamos a proposta de o CACIB organizar a próxima edição do evento, para ser realizada na UFSCar, dois anos depois. No segundo ano do curso, em 2003, com o CACIB, organizamos a recepção dos calouros, buscando integrar os alunos do curso e atrair novos integrantes ao Centro Acadêmico, pois a maior parte dos integrantes estava se formando. Na sequência, conseguimos reunir alguns calouros e veteranos para, juntos, organizarmos a II Semana de Biblioteconomia e Ciência da Informação3, em outubro de 2003. Com uma boa participação, inclusive com a presença de graduandos de outras faculdades, além da realização do evento em si, a ideia era a de formar um grupo e ganhar experiência para organizar o EREBD, que aconteceria no ano seguinte. Em outubro de 2004 realizamos, finalmente, o Encontro Regional dos Estudantes de Biblioteconomia, Documentação, Ciência e Gestão da Informação das regiões Sudeste e Centro-Oeste, o EREBD SE/CO. Além das atividades acadêmicas, políticas (com grupos de trabalho e plenária final) e culturais, nesta edição inovamos ao abrir para propostas de minicursos e oficinas ministrados pelos próprios alunos. Estabelecemos critérios e os interessados 3 A Comissão Organizadora da II Semana de Biblioteconomia e Ciência da Informação foi composta pelos discentes: Aline Aparecida Matias, Carlos Batista de Aguiar Rosa, Carlos Henrique Pedroso de Mello, Cristiane de Melo Shirayama, Daniela Rueda, Iuri Rocio Franco Rizzi, Jesuína Aparecida Costa, José do Carmo Júnior, Karin Gomes da Silva, Lidiane Valpassos Rodrigues, Nádia Bernucci dos Santos, Paulo César Cardoso de Campos e Rafael dos Santos Brito. 247 enviaram propostas e passaram por seleção, assim como ocorre com os trabalhos acadêmicos. Para mim, a participação no movimento estudantil e na organização de encontros foi importante por muitos aspectos, dentre os quais o desenvolvimento da capacidade de trabalhar em equipe e realizar projetos, acompanhando todas as suas etapas, desde o planejamento, a redação do projeto, a realização em si, até o fechamento e avaliação. Neste processo, complexo e rico em aprendizado e experiências, com erros e acertos, muitas pessoas colaboraram (e sem as quais provavelmente não teria seguido adiante), em especial a professora e, na época, coordenadora do curso Profa. Maria Cristina Comunian Ferraz, sempre incentivando e apoiando o desenvolvimento de projetos, e Rosângela Castilho Alcaraz Morais, secretária do curso, com imensa paciência e competência para lidar com as nossas idas e vindas à coordenação, com dúvidas e demandas as mais diversas. É claro que as atividades do Centro Acadêmico não se restringiram apenas à organização de eventos, mas ocuparam boa parte das ações naquele período e compuseram uma espécie de produto ou meta alcançada que hoje podemos mencionar e acionar como memória. Prática profissional durante a graduação Foi também em 2004 que comecei a estagiar na própria BCo, e, por isso, deixei de realizar as atividades vinculadas à bolsa-atividade e à COLESP. Fui designado para desenvolver o estágio no Setor de Referência, onde tive contato mais próximo com o atendimento aos usuários, inclusive da comunidade externa, como estudantes e moradores da região. Fiquei também umas poucas semanas no Setor de Acesso a Bases de Dados e Comutação Bibliográfica (COMUT), onde aprendi sobre as bases de dados e os periódicos científicos, bem como sobre busca e demandas dos pesquisadores. Nestes setores tive contato com muitos servidores, bolsistas e estagiários: Dayse, Tereza, Sheila, Ronildo, Lourdes entre outros. Ver os diferentes setores atuando, de forma independente, mas integrada, foi um grande aprendizado: secretaria, processamento técnico, ação cultural, referência, circulação, biblioteca digital, segurança e serviços gerais. Uma das tarefas obrigatórias e diárias, a reposição dos livros nas estantes, me fizeram ter contato com assuntos variados e, ainda, aprender, na 248 prática, a sequência de ordenamento do número de classificação das obras, tanto da CDU (Classificação Decimal Universal) quanto da CDD (Classificação Decimal de Dewey). Atualmente, como docente, em disciplinas destes instrumentos procuro desenvolver atividades práticas, além das aulas teóricas, que permitam aos alunos ter este contato prático com o ordenamento dos livros. Cabe ressaltar a importância da BCo para a minha formação, tanto profissional, enquanto bolsista e estagiário, quanto em sentido mais amplo, como usuário dos seus serviços e pelas leituras feitas ao longo dos quatro anos de graduação. Até então, a minha experiência com bibliotecas estava restrita às públicas e escolares, geralmente em condições precárias, quando existiam. Em muitas delas é possível questionar, inclusive, o status de bibliotecas de fato. Infelizmente, a realidade das bibliotecas públicas brasileiras é ainda lamentável (RIZZI, 2016). Foi na BCo, portanto, que pude aprimorar e desenvolver a minha experiência enquanto usuário de bibliotecas, o que acredito ser fundamental para qualquer bibliotecário. Tendo enveredado pelo caminho da docência, não tive experiência no exercício da profissão em si, por isso considero a experiência de usuário uma forma de me aproximar da realidade da área no âmbito da minha prática docente na formação de futuros bibliotecários. Hoje, tendo conhecido bibliotecas de diversas universidades no país, considero a BCo como uma das melhores, até mesmo como um modelo: projeto arquitetônico, inclusão da comunidade externa (com usuários efetivos), acervo bibliográfico e materiais diversos, serviços prestados, entre outros fatores. As atividades extensionistas No terceiro ano do curso conheci a Fazenda Pinhal, localizada na zona rural da cidade de São Carlos. A fazenda foi grande produtora de café no Século XIX. Por sua história ligada à formação do município e por seus conjuntos arquitetônico, paisagístico e natural foi tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), em 1987. Para manter e preservar este conjunto patrimonial foi criada a Associação Pró-Casa do Pinhal, entidade responsável por apoiar ações de preservação e divulgação. Dentre estas ações estavam os projetos coordenados pela Profa. Luzia Sigoli Fernandes Costa, voltados para a preservação e a organização dos acervos bibliográfico e arquivístico da Fazenda, como a biblioteca (com obras antigas e especiais) e o 249 arquivo histórico, este voltado para dar apoio com materiais relacionados às temáticas de atuação da fazenda. Na época, o porão da Casa Sede foi destinado a abrigar estes acervos, que formariam um Centro de Documentação contemplando materiais históricos e contemporâneos. Após iniciar nestes projetos, a particularidade do local e do trabalho com a documentação me levaram a trocar o estágio que estava sendo realizado na BCo pelo da Fazenda. Além das atividades nos projetos citados, também trabalhei como monitor, conduzindo visitas guiadas de grupos escolares, pesquisadores e demais visitantes. No ano seguinte, em 2004, houve alteração quanto à minha atuação na Fazenda: deixei o estágio para iniciar atividades do Centro de Documentação, em um projeto de extensão coordenado pela bibliotecária Maria Emilia Marchesin. Com a mudança eu teria mais tempo livre para me dedicar aos estudos e começar alguma atividade formalizada de pesquisa, com vistas à realização do trabalho de conclusão de curso. Pesquisa A partir do terceiro ano na UFSCar comecei a focar mais nas questões acadêmicas do curso. Fiz várias tentativas, tentei bolsa de iniciação científica e participar de grupos de pesquisa, mas nada deu muito certo. Foi, então, em 2004, que tive a felicidade de poder participar e colaborar na elaboração do Vocabulário Controlado para Indexação de Obras Ficcionais (VCIOF), de autoria dos professores Eliane Serrão Alves Mey e Sidney Barbosa, e da aluna Naira Cristofolletti Silveira. Rafael dos Santos Brito e eu ficamos com a responsabilidade de estudar e produzir os ícones que ilustrariam as categorias e os termos do vocabulário. Além da alegria de poder participar de um trabalho interessante, pude ver como acontece a elaboração de um livro. Também pude aprofundar mais os estudos no campo da classificação bibliográfica e do ordenamento dos livros nas estantes. Em 2005, último ano do curso, tínhamos a exigência do trabalho de conclusão de curso e continuei trabalhando com a Profa. Mey, agora como orientadora. A ideia era a de continuar com o tema do VCIOF. Entretanto, diante da impossibilidade de uma abordagem prática, ela me sugeriu como tema elaborar um catálogo das obras do pintor Fernando Dória, residente na cidade de São Carlos-SP. Pesquisei sobre a representação descritiva e temática destes catálogos. Além da digitalização e da catalogação das obras, 250 trabalhei com entrevistas para que fosse possível traçar uma breve biografia do artista. Foi quando pude ter um primeiro contato com aspectos da Museologia, discutindo sobre a catalogação das obras e a elaboração de um índice de materiais e técnicas de pintura (RIZZI, 2005). Ainda nesse ano comecei a pensar na ideia de cursar o mestrado. Dentre as possibilidades de cursos na área da Ciência da Informação havia aquele vinculado à UNESP de Marília-SP. Alguns colegas optaram pela PUC de Campinas (PUCCAMP). Tinha, também, o curso da Escola de Comunicação e Artes da USP. Acabei focando na UNESP, onde a Profa. Luzia cursava o seu doutorado, orientada pelo professor Sidney. Não tinha ainda um projeto, e fui conversar com a professora Mey, que me perguntou o que eu gostava, o que me interessava. Eu falei de um movimento da Cultura de Paz, que havia conhecido no Fórum Social Mundial, nas palestras do representante da UNESCO, David Adams, em 2005. Este movimento apoia-se em alguns preceitos e valores que delineiam uma linha de atuação. Foi então que a Profa. Mey sugeriu pesquisar a relação do movimento da Cultura de Paz na formação dos bibliotecários, isto é, nos cursos de graduação. Em novembro daquele ano, o EREBD SE/CO aconteceria justamente em Marília. Eu soube pela Profa. Luzia que seria ofertada uma disciplina concentrada, ofertada pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP, logo na sequência do evento. Pedi para assisti-la como ouvinte. Depois do evento, então, permaneci na cidade e assisti às aulas do Prof. Javier Garcia Marco, quanto que seria estudado Organização da Informação e do Conhecimento. Aproveitei a oportunidade também para conversar com o Prof. José Augusto Chaves Guimarães sobre minha ideia de pesquisa. Ele observou, porém, que aquele tema de projeto estaria mais alinhado a outros programas, como o da UFSC, em Santa Catarina, e que, mais adequado à linha de pesquisa desenvolvida em Marília, seria um projeto relacionado à linha de Organização da Informação, com foco em seus processos ou instrumentos. Eu já havia feito um curso sobre a Classificação Decimal de Dewey (CDD)4, com a própria Profa. Mey, e foi, no meio disso tudo, e, possivelmente considerando tantos outros fatores que não me vêm à memória, que surgiu meu tema para o projeto de mestrado. 4 Não tenho lembrança da data e, tampouco, tenho o certificado, com o registro desta informação. 251 Depois da UFSCar Comecei o curso de mestrado em 2006, no PPGCI da UNESP de Marília. Lá, o professor que aceitou orientar o meu projeto, foi Eduardo Ismael Murguia Marañon. Na pesquisa investiguei os instrumentos de classificação bibliográfica, particularmente, a Classificação Decimal de Dewey, criada nos Estados Unidos e considerada o sistema de classificação mais utilizado em todo o mundo. A premissa do estudo foi a de que estes instrumentos não são neutros e refletem uma visão de mundo, influenciando as pessoas que entram em contato com os mesmos. Especificamente, discuti sobre como a CDD trata os conceitos de paz e guerra, e o resultado foi o de que o instrumento não trata de forma adequada estes conceitos. E mais, a CDD não está preparada para tratar obras sobre o movimento da Cultura de Paz e tampouco a área do conhecimento Estudos para a Paz, de modo a contribuir com a perpetuação de uma cultura de guerra, presente em nossa sociedade. As bibliotecas que adotam este sistema conceitual transferem estas noções para seus usuários, influenciando sua visão de mundo e contribuindo para a formação de valores culturais. Tendo concluído o mestrado, em 2008, fui para São Paulo e morei por alguns meses novamente com minha família. No ano seguinte fui convidado a lecionar no curso de Biblioteconomia do Instituto Ensino Superior da FUNLEC (IESF), em Campo Grande-MS. No final daquele ano inscrevi-me em um concurso para docente na Universidade Federal de Alagoas, onde fui aprovado e ingressei em 2010. Na UFAL, além de ministrar disciplinas, envolvi-me, principalmente, com projetos de extensão relacionados aos acervos documentais do Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore, pertencente à própria universidade. Os acervos sob custódia neste museu encontram-se em fase de tratamento (no período em que este texto foi escrito estavam sendo desenvolvidas atividades de higienização, acondicionamento e organização). Espera-se que em breve este acervo possa ser disponibilizado para a consulta por pesquisadores, integrantes de grupos folclóricos e interessados em geral. Com os projetos de tratamento documental em andamento iniciei, em 2013, um curso de Especialização em Antropologia, ofertado pela Instituto de Ciências Sociais da UFAL e pelo próprio Museu. Com isso, passei a ter um outro olhar sobre a documentação, buscando desenvolver a partir dela uma reflexão sob uma perspectiva antropológica. Como trabalho final investiguei 252 o processo de institucionalização do arquivo pessoal de Théo Brandão, observando as relações que se estabelecem em torno do mesmo. Esta trajetória me levou a submeter um projeto de pesquisa de Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal Fluminense (PPGCI-UFF), na linha de pesquisa Informação, Cultura e Sociedade. Iniciei o curso em 2015, sob orientação do Prof. Eduardo Murguia que, por conta de seu falecimento, não pode concluir esse processo. A pesquisa, concluída em 2019, resultou na tese intitulada: “Organização de arquivos pessoais em museus etnográficos: o caso do arquivo de Théo Brandão”. Esta trajetória me levou a submeter um projeto de pesquisa de Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal Fluminense (PPGCI-UFF), na linha de pesquisa Informação, Cultura e Sociedade. Iniciei o curso em 2015, sob orientação do Prof. Eduardo Murguia. A pesquisa, ainda em fase inicial, está voltada para o arquivo pessoal do antropólogo e folclorista Théo Brandão5. Para terminar Apesar da dificuldade e do incômodo, apontados na introdução, foi um exercício interessante escrever este texto sobre minha trajetória. Talvez devêssemos fazer isso mais vezes. Não seria preciso escrever esse texto para saber que a graduação nos compõe de uma forma que mal percebemos. O problema de um texto como este, são as muitas pessoas que não pude nomear, quer seja por falta de espaço, por não conseguir incluir em uma narrativa ou por simples esquecimento. Como poderia concluir um texto como este sem mencionar a minha amiga Sônia Maria Pinheiro, tão sensível às letras e às artes, com quem muito aprendi e continuo aprendendo? Pelas ausências aqui sentidas peço desculpas antecipadas e, quem sabe, elas não suscitam outros textos, com outras narrativas. Por fim, quero dizer que a vivência na universidade, de maneira geral, e em particular na UFSCar, foi tão positiva que resolvi permanecer nesse ambiente – naquele momento não sabia ainda se trabalharia como bibliotecário ou professor. 5 Nota da organizadora: Agora, chegado o momento da publicação deste texto, o Prof. Iuri já concluiu o curso de doutorado, tendo sido defendida a tese intitulada: “Pesquisa e descrição de contexto em arquivos pessoais: um estudo de caso da documentação de Théo Brandão”, sob orientação da Profa. Lucia Maria Veloso de Oliveira. 253 Com esta narrativa da minha trajetória na graduação, que irá se somar a outros relatos, espero que tenha conseguido oferecer aos próximos graduandos uma oportunidade para conhecer outras experiências e, com isso, (re) pensar a sua própria experiência com o curso e com sua formação acadêmica e humana. Referências BARBOSA, S.; MEY, E. S. A.; SILVEIRA, N. C. Vocabulário controlado para indexação de obras ficcionais. Brasília, DF: Briquet de Lemos, 2005. RIZZI, I. R. F. As cinco leis da Biblioteconomia no Brasil. In: LUCAS, Elaine R. de O.; CORRÊA, Elisa C. D.; EGGERT-STEINDEL, Gisela (org.). As contribuições de Ranganathan para a Biblioteconomia: reflexões e desafios. São Paulo: FEBAB, 2016. p. 30-42. RIZZI, I. R. F. A elaboração de catálogos de arte: um catálogo do artista plástico Fernando Dória. 2005. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Biblioteconomia e Ciência da Informação) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2006. RIZZI, I. R. F. A paz nos instrumentos de Organização da Informação: uma análise dos conceitos de paz e guerra, da Cultura de Paz e dos Estudos para Paz na Classificação Decimal de Dewey. 2008. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) – Universidade Estadual Paulista, São Paulo, 2008. RIZZI, I. R. F.; MEY, E. S. A. A elaboração de catálogos de arte: um catálogo do artista plástico Fernando Dória. In: CONGRESSO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, 13., 2005, São Carlos. Anais... São Carlos: UFSCar, 2005. SEMANA DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO DA UFSCAR, 2003, São Carlos: CACIB. Disponível em: http://www.ufscar.br/~semanabci/. Acesso em: 10 out. 2016. 254 Foto: Waldeck Schutzer UM POUCO DA UFSCar NA UNIRIO: PEQUENO RELATO DE UMA GRANDE VIVÊNCIA NAIRA CHRISTOFOLETTI SILVEIRA* Ter sido convidada a escrever uma parte do livro destinado à comemoração dos 20 anos do Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) é muito emocionante, é uma honra. Ao ler que o título da proposta que viabilizou esse livro: “Memória do curso de BCI: entre lembrar e esquecer 20 anos depois!”, percebo que estou quase no meio desse período, pois colei grau em 2006, dez anos atrás. O subtítulo da proposta “entre lembrar e esquecer” reflete bem minha memória neste momento, me lembro de várias coisas e me esqueço de muitas outras; ou talvez seja o contrário: me lembro de muitas coisas e me esqueço de várias. Mesmo ficando entre o lembrar e o esquecer, começar um relato de experiências no curso e com o curso de Biblioteconomia da UFSCar é uma tarefa muito difícil. Não porque seja exaustiva, mas porque é seletiva e envolve uma série de emoções. Após sentir a alegria de receber esse convite e admirar a idealização dessa proposta, recaiu sobre mim o peso da responsabilidade de escrever o texto. Como selecionar as vivências e o impacto da formação na UFSCar na minha vida docente? Será que menciono os nomes das pessoas que foram e são importantes para mim e que conheci apenas porque passei pela UFSCar? E se eu me esquecer ou não conseguir escrever neste texto tudo e todos que fizeram parte * Doutora em Ciência da Informação (USP), Mestre em Ciência da Informação (PUCCAMP) e Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2005). Docente na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) desde 2009. Contato: naira.silveira@unirio.br. 256 da minha vida durante a graduação? Como descrever os momentos vivenciados sem parecer tendenciosa, nostálgica ou melodramática? Essas foram as primeiras dúvidas com as quais me deparei. Depois vieram outras que permaneceram comigo enquanto escrevia. Sem conseguir sanar nenhuma delas, optei por fazer um relato mais ou menos cronológico, elencando primeiro as minhas lembranças como aluna na UFSCar e depois a relação dessa memória com minha atuação como docente da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Portanto, este relato tem como fio condutor a minha vivência como aluna no curso da UFSCar que impacta diretamente na minha vida docente na UNIRIO, embora minhas lembranças sejam muitas, focarei apenas naquelas mais relevantes para o propósito desse livro. E, tentando fazer uma relação desse passado vivido na UFSCar com o presente na UNIRIO, estabeleci quatro tópicos para este texto: a chegada à UFSCar e a recepção dos ingressantes na UNIRIO; o percurso na UFSCar e percurso na UNIRIO; a despedida da UFSCar e colação de grau dos formandos na UNIRIO; a vivência da UFSCar na UNIRIO: palavras finais. A chegada à UFSCar e a recepção dos ingressantes na UNIRIO Como todo relato cronológico, começo pelo começo. A primeira vez que prestei vestibular para o curso de Biblioteconomia na UFSCar, ou mais carinhosamente conhecida apenas como Federal, não passei. Foi só em minha segunda tentativa que pude me matricular, em 2002, que alegria! Me lembro do dia de minha matrícula e me lembro da emoção que senti, mas me esqueci do dia da minha matrícula. As memórias são assim, possuem vontade própria, vão e vem quando apetece e, depois de vários anos, as lembranças da minha matrícula da UFSCar que permaneceram inertes afloraram com muita força em 2014, quando ocupei o cargo de substituta eventual da Escola de Biblioteconomia da UNIRIO e pude vivenciar a experiência da matrícula por outro ângulo, como docente ocupante de um cargo administrativo que acompanhou a matrícula dos ingressantes. Embora a forma de ingresso tenha sido diferente – quando eu ingressei era o vestibular, hoje essa não é mais a forma de ingresso nas universidades federais e sim o Sistema de Seleção Unificada (SISU) – naquele momento, em 257 2014, na condição de substituta eventual da direção da Escola, eu, junto com outros docentes, tive que verificar a documentação dos candidatos concorrentes às vagas destinadas aos cotistas. Em 2015 isso se repetiu, mas desta vez como coordenadora do curso de bacharelado matutino em Biblioteconomia. É impressionante como em tão pouco tempo os papéis mudam. Quando vejo os ingressantes, especialmente os cotistas, me recordo muito do meu ingresso na UFSCar. Como venho de uma família carente, fiquei isenta do pagamento do valor da inscrição do vestibular; me esqueci do valor da inscrição, mas me lembro que fui contemplada com vários auxílios estudantis, começando por essa isenção. Depois de matriculada, pude obter outros auxílios estudantis: bolsa atividade, bolsa alimentação e bolsa moradia. Ingressar na UFSCar foi o começo de uma grande virada na minha vida, que só pude percorrer porque encontrei condições que me permitissem prosseguir. Por curiosidade, entrei no site da UFSCar para verificar os nomes das bolsas e auxílios, percebi que a instância que cuidava dos assuntos estudantis se tornou uma Pró-Reitoria, no meu tempo não era uma Pró-Reitoria. O tempo passa e as estruturas mudam. Confesso, não sei exatamente o número de alunos cotistas que possuo em sala, também não sei em quais cotas eles entraram, mas sei que muitos alunos necessitam desses auxílios para ingressarem e se formarem. A minha principal ação é direcionar os alunos a essa instância e dar o suporte emocional para seguirem até o fim o seu curso. Não tenho dúvidas de que minha preocupação em direcionar os alunos às instâncias adequadas, especialmente no que se refere aos auxílios estudantis, está relacionada diretamente às experiências positivas que tive na UFSCar. Penso que ajudar os alunos da UNIRIO é uma forma de retribuir à UFSCar e à sociedade todo o investimento que depositaram em mim. Em nenhum momento vejo isso como uma obrigação, embora acredite que também seja uma obrigação do docente fazer esse acolhimento e direcionamento, essa é uma oportunidade de aprendizado para mim e uma oportunidade de criar possibilidades para os outros. Há um ensino de conteúdo, de formação profissional, e há um outro ensino, de formação cidadã, ambos devem ser considerados em uma universidade. Desde que entrei na UFSCar até hoje na UNIRIO tenho vivido experiências assim, que envolvem uma formação global, tanto a minha como a dos alunos. 258 O percurso na UFSCar e percurso na UNIRIO Comecei assim a minha vida acadêmica: morando no alojamento estudantil dentro da universidade, comendo no restaurante universitário (RU) e “trabalhando” na bolsa atividade na Biblioteca Comunitária (BCo). Acho que passei mais tempo dentro na Universidade do que em qualquer outro local da cidade de São Carlos! Sem dúvida, ficar tanto tempo dentro da Federal, morando, passando os finais de semana e compartilhando o mesmo espaço com pessoas tão distintas é uma experiência que se leva por toda a vida. O período de graduação possui significados diferentes em cada indivíduo, representa um momento muito particular, difícil de se comparar. No meu caso não sinto que a UFSCar tenha me preparado apenas para uma carreira profissional, acredito que no ambiente universitário que a UFSCar me proporcionou eu pude ter uma formação completa. Nele encontrei pessoas maravilhosas, colegas do meu curso e alunos de outros cursos, docentes e técnicos administrativos de diversos setores que sempre me acolheram e me ajudaram, no sentido humano, indo além de uma formação profissional. Essa formação global, sem dúvida é uma das lembranças mais gratificantes que tenho da Federal e tento, não sei se consigo, proporcionar esse mesmo ambiente aos meus alunos. Um ambiente que envolva não somente a formação bibliotecária, mas sim uma formação em uma universidade federal, uma formação mais humana e global, como acredito que o ensino superior deva ser. E é nesse sentido global de formação que me apego hoje para exercer a minha docência. Ingressei em 2002 na UFSCar e neste primeiro ano obtive a bolsa atividade. Me lembro perfeitamente da minha entrevista com a bibliotecária que me supervisionaria nesta bolsa, eu estava nervosa. Nervosa e angustiada, pois sem um supervisor ou orientador eu não poderia receber a bolsa. Esta mistura de nervosismo e angustia é o que vejo nos olhos da maioria dos alunos que me procuram para que eu seja a sua orientadora na bolsa de incentivo acadêmico (BIA), que corresponderia mais ou menos na UNIRIO à bolsa atividade na UFSCar, ambas são destinadas à alunos carentes. Até hoje nunca recusei nenhum bolsista BIA. A partir de 2003, incluindo os anos de 2004 e 2005, a minha bolsa atividade deu espaço aos estágios remunerados e outro tipo de bolsa. Durante a minha graduação não pude vivenciar todos os tipos de bolsas, mas convivi com alguns colegas que possuíram diversas bolsas universitárias. Como os 259 estágios são realizados sob a responsabilidade de um bibliotecário, elencarei algumas bolsas que oriento na UNIRIO como docente, para não fugir do foco desse texto. Em relação à bolsa, além da bolsa atividade fui contemplada na UFSCar com a bolsa de monitoria. Na verdade, o tempo me fez esquecer a nomenclatura exata dessa bolsa, mas poderia relembra-la aqui como sendo a bolsa de monitoria, nomenclatura da UNIRIO. Mesmo antes de saber todas as atividades que envolvem a docência, sempre tive o desejo de ser professora. Quando tive bolsa de monitoria na UFSCar, pude chegar um pouco mais perto dessa concretização. A bolsa de monitoria possibilitou uma aproximação maior com a docente da disciplina e pode ser considerada como sendo o primeiro passo para a docência, no meu caso foi o início de uma trajetória. Neste momento, com a experiência de vivenciar algumas atividades docentes pude começar a entender um pouco mais a magnitude dessa profissão. Confesso que até hoje eu ainda não tenho a real dimensão do que é de fato ser professora, mas estou caminhando. Em relação à bolsa de monitoria na UFSCar e a bolsa de monitoria na UNIRIO, na primeira fui bolsista e na segunda fui orientadora, tenho recordações maravilhosas. Esta foi a primeira bolsa que orientei. Ainda doutoranda, praticamente recém-ingressa e ainda em estágio probatório, pude concorrer ao edital de bolsa monitoria e de iniciação científica. Fiquei feliz em poder concorrer e mais feliz ainda em ser contemplada com estas bolsas em 2012. A bolsa de monitoria iniciou primeiro, em março, e a de iniciação científica teve início apenas em julho ou agosto, me esqueci o mês exato e retomo o subtítulo da proposta da construção desse livro “entre lembrar e esquecer”. Esta bolsa de monitoria me marcou muito, não somente porque foi a primeira orientação efetiva de bolsistas de monitoria, mas porque neste mesmo ano, ano de meu primeiro projeto de ensino referente à bolsa de monitoria, as bolsistas receberem o prêmio de melhor trabalho do Centro de Ciências Humanas e Sociais da UNIRIO. Imagine a minha alegria. A bolsa de iniciação científica também foi uma experiência marcante. Quando estudante de graduação na UFSCar, me lembro que uma professora submeteu uma proposta de uma bolsa de iniciação científica me indicando como bolsista, mas não fomos contempladas, fiquei frustrada com a reprovação. Esta foi a minha primeira reprovação em edital. Mas como sempre, tudo na vida a gente aprende e segue tentando. Na UFSCar não tentei mais essa bolsa, mas na UNIRIO sim. Mesmo sem o título de doutora pude concorrer ao 260 edital e fui contemplada com a bolsa de iniciação científica, tanto no edital em 2012-2013 como no edital 2013-2014. E, em 2014, tive a alegria de presenciar a minha bolsista receber uma menção honrosa pelo subprojeto de iniciação científica. Posso dizer que nunca tive a chance de ser bolsista de iniciação científica na UFSCar, mas tenho o prazer de ser uma orientadora de iniciação científica na UNIRIO. Em 2014 orientei meu primeiro bolsista de extensão e pude entender um pouco melhor o tripé ensino-pesquisa-extensão, atividades tão intrínsecas às universidades federais. A primeira vez que ouvi sobre esse tripé foi na UFSCar, mas só fui participar ativamente de todas essas esferas na UNIRIO. Devido a minha experiência como aluna, sei que o aluno que consegue bolsa durante a universidade consegue passar por experiências diferentes daqueles de quem só trabalha ou estagia. Por isso, sempre que posso (foram poucas as vezes que não pude até o momento) concorro aos editais de bolsas na UNIRIO e durante os quase sete anos de docente numa universidade federal (iniciei minha atuação em 19 de novembro de 2009), orientei os seguintes tipos de bolsa: bolsa de monitoria, bolsa de iniciação científica, bolsa de extensão e bolsa de incentivo acadêmico. Me sinto realizada quando posso dar aos meus alunos possibilidades de usufruir tudo o que uma universidade pode oferecer, que muitas vezes passa desapercebido entre os alunos e, porque também não dizer, que algumas vezes passa despercebido até mesmo aos docentes. As vivências que compartilhei até aqui foram aquelas vivida fora da sala de aula, lugar onde a maioria das pessoas pensam que é o lugar do professor. A sala de aula é o lugar do professor e do aluno, mas não é o único espaço a ser ocupado. E, foi assim que comecei a perceber a diferença entre uma universidade pública e universidade privada e a valorizar ainda mais as atividades extraclasses com os alunos, de fato, as bolsas são oportunidades de experimentação, tanto para o aluno quanto para o professor. Quando aluna, não consegui visualizar todos os espaços de atuação docente e acredito que nem mesmo consegui ter a plenitude do papel estudantil na universidade. Agora como docente percebo uma situação muito semelhante, quando penso que descobri todos as atividades que um docente pode exercer, surgem outras, portas se abrem. Percebo que a cada dia eu aprendo a ser professora, é um aprendizado constante. Atividades de ensino, pesquisa, extensão e gestão podem ser desdobradas em muitas outras, parece não ter fim. E esta é a graça de ser profes- 261 sor, aprender constantemente. Cada ciclo que se conclui não resulta em um fim, mas sim em um recomeço, inicia-se um novo. A despedida da UFSCar e colação de grau dos formandos na UNIRIO Apresentei meu trabalho de conclusão de curso de Biblioteconomia na UFSCar em dezembro de 2005 e colei grau em 10 de março de 2006. Tremi de emoção e chorei, do mesmo modo quando realizei a imposição do grau pela primeira vez de uma aluna na UNIRIO. Menos de 10 anos de formada na UFSCar, eu estava colando o grau de bacharel em Biblioteconomia na UNIRIO, na condição de substituta eventual da diretora da Escola de Biblioteconomia. Tremi, chorei e abracei aquela aluna com o mesmo carinho com que fui abraçada na UFSCar em 2006. Me emociono muito até hoje nas colações de grau nas quais participo. Também me emociono muito nas apresentações de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), sejam meus orientandos ou não, a diferença é que hoje, quase sempre, consigo segurar as lágrimas. Sobre as emoções devo incluir mais uma, a de ver a mudança que ocorre entre o ingresso na universidade e a saída da universidade ao término do curso. Me refiro as mudanças na minha própria vida e também as mudanças na vida de meus alunos. Embora a vida seja um aprendizado constante, nos quatro anos da graduação ocorrem muitas mudanças. Quando aluna, compartilhei a sala de aula com colegas de diferentes faixas etárias e experiências de vida, cada um com suas peculiaridades. Como docente, continuo em contato com pessoas muito diferentes, e isso é ótimo. O importante é que estudar e se formar em um curso superior muda a vida de qualquer individuo e também muda a vida de sua família. A vivência da UFSCar na UNIRIO: palavras finais Uma das disciplinas que ministro na UNIRIO é denominada Representação Descritiva III, cuja área atuei como bolsista monitoria na UFSCar. Esta disciplina possui como ementa o controle de autoridade para entidade coletiva, adoro usar o manual da UFSCar vestibular 2006 nesta disciplina. Além desse 262 manual se adequar à ementa da disciplina, por ser um documento emanado de uma entidade coletiva, tem uma coisa muito curiosa: este manual possui uma foto minha. Neste manual também tem fotos do alojamento, no qual morei durante a maior parte de minha graduação. Aproveito o conteúdo da aula, com a catalogação desse manual, para conversar um pouco com os alunos sobre o papel de uma universidade pública federal no país e contar um pouco da minha trajetória. Os alunos intrigados me escutam com atenção. Depois de quebrar um pouco a distância entre professor e aluno, eles se sentem à vontade para me perguntar várias coisas, entre elas, o que é necessário para ser professor e, a mais clássica de todas as perguntas, o que o professor faz além de dar aulas. Eu também não sabia dessas coisas até que um dia, enquanto eu ainda era aluna da UFSCar, alguém me explicou. Em geral, ministro disciplinas em períodos bem diversificados, alternando entre o segundo e sexto período do curso, nesse momento, busco na minha memória quais eram meus anseios enquanto aluna e direciono minhas atividades para ajuda-los a prosseguir e a concluir o curso. Ao resgatar meus anseios como aluna e buscando saídas como docente, convido meus bolsistas de monitoria e de iniciação científica para proferirem palestras nas disciplinas dos primeiros períodos, desse modo os alunos podem conhecer um pouco mais o que a universidade pode oferecer através das experiências de seus veteranos. Para alunos dos períodos mais avançados, como eles estão preocupados com seus próximos passos, convido meus orientandos e ex-orientandos de trabalho de conclusão de curso e de pós-graduação para proferirem palestras e apresentarem as suas trajetórias. Este texto apresenta um pouco da minha própria trajetória, apresenta um pouco como a universidade federal me transformou e me transforma. A primeira universidade federal que transformou a minha vida foi a UFSCar, que me deu meu título de nível superior e me preparou, a segunda foi a UNIRIO, que me abriu as portas para a carreira docente. Sou grata a ambas, pelas experiências e pelas oportunidades. Cada um tem suas próprias memórias, pois vivenciar a universidade é uma experiência muito particular. Aqui, estão parte das minhas memórias: entrei na UFSCar em 2002; permaneci por quatro anos; colei grau em 2006 no auditório Florestan Fernandes, sem beca, mas com muita emoção e a certeza que devia minha formação à sociedade. Cronologicamente, resumidamente, essa foi a minha passagens pela UFSCar, te parece pouco? Não, não foi. 263 Na UFSCar descobri meu melhor caminho dentro da Biblioteconomia, que me foi apresentado pela querida Profa. Eliane Mey. Na UFSCar ela foi minha professora, na UNIRIO, por um breve período de tempo, também fomos colegas de trabalho. Eliane Mey foi um grande presente que a UFSCar me deu, tive outros presentes também, amigos que até hoje compartilham meu caminhar, muitos deles, também como docentes em universidades públicas. Difícil citar todos os nomes, mas todos moram no meu coração. Se começar este texto não foi fácil, terminá-lo é menos ainda. Infelizmente as memórias se perdem com o tempo, há lacunas, espaços em branco que nem sempre serão preenchidos. Busquei nesse texto apresentar um pouco do muito que obtive em quatro anos de UFSCar. Os quatro anos passaram, mas até hoje, sigo com as lembranças e com a certeza que sou federal com muito orgulho; tempos atrás era federal como aluna de graduação e hoje sou federal como docente. 264 Foto: Waldeck Schutzer O PAPEL DA BIBLIOTECA NAS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS IANDRA MARIA CARLOS CARTAXO* Eva Furnari, Jorge Amado, Gabriel Garcia Marques e Audrey Wood, esses não são nomes que você aprende no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, mas farão parte do seu dia a dia quando sua área de atuação é a Biblioteca Escolar. A biblioteca é um organismo em crescimento, na verdade muito mais do que isso é um organismo vivo que provoca, fomenta, proporciona o crescimento na vida daqueles onde está inserida. Aprendemos na teoria e discutimos de forma exaustiva o que significam as 5 Leis de Ranganatham, qual seu impacto no ambiente da biblioteca, quem é nosso cliente, que papel devemos desempenhar nesse cenário. Levantamos possibilidades e hipóteses, até nos depararmos com a realidade: falta de recursos, de reconhecimento e de incentivo. E, apesar disso, transformamos nosso trabalho de todos os dias numa verdadeira cruzada, fazendo com que ao menos a realidade daqueles que nos procuram diariamente seja alterada. Uma das leis de Ranganatham diz que todo leitor tem seu livro e todo livro tem seu leitor, contudo cabe a nós, bibliotecários escolares, fazer com que nossos leitores descubram seu livro e que os livros por sua vez encontrem seus leitores, muitas vezes resistentes. Outra lei diz respeito a poupar o tempo do leitor, talvez essa lei no âmbito da biblioteca escolar não faça tanto sentido, isso porque o aluno do século XXI, da geração Y, quer rapidez e agilidade. Por que procu- * Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2009). Contato: iandra.cartaxo@gmail.com. 266 rar no sumário se eu posso dar um CRTL+F? Talvez nesse contexto, o nosso papel como mediadores deva ser o contrário: fazer com que nosso leitor pare e reflita, e assim busque a informação que ele precisa identificando as melhores fontes para a realização de seu trabalho. E porque não, perder um pouco de tempo lendo as sinopses das obras literárias antes de escolher qual levará para casa. Para Ranganatham os livros são escritos para serem lidos, na era do twitter com seus 140 caracteres convencê-los de que Dostoievski e Machado de Assis valem a pena serem lidos, mais que isso, são leituras essenciais podem ser comparadas aos Doze Trabalhos de Hércules. Neste sentido, e como dizia Italo Calvino “Um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer” isso porque estas obras dialogam com os dramas humanos, discorrem sobre nossa humanidade e são, portanto, dotadas de uma atemporalidade que as torna relevantes ao homem contemporâneo. A magnitude de certos gestos eternizados na literatura só faz sentido quando devidamente situados em seu contexto histórico. Só podemos entender a força e caráter da impetuosa Aurélia, a Senhora de José de Alencar, quando a comparamos com o ideal feminino vigente no século XIX, da mesma forma que Capitu com seus “olhos de cigana oblíqua e dissimulada” permanece ainda um mistério ao leitor do século XXI. No contexto escolar os papéis do professor e do bibliotecário se complementam, e, nesta relação simbiótica quem sai ganhando é o aluno, que tem o incrível universo da literatura descortinado à sua frente. A partir daí a escolha passa a ser dele: habitar ou não neste domínio onde as palavras podem fazer mágica. Ao contrário do que os alunos costumam perguntar, os quatro anos de curso na UFSCar, não contemplam estudos sobre literatura, tampouco lemos todos os livros da biblioteca. Ao invés disso, depois de todo embasamento teórico e técnico aprendido, escolhemos qual caminho queremos seguir: as supercitadas ênfases tecnológica ou social. Cada uma delas com um escopo delineado de forma a contemplar uma demanda específica do mercado de trabalho e de interesses dos seus alunos. Escolher a ênfase tecnológica representou conhecer um pouco mais a respeito da dinâmica do mundo acadêmico, as nuances que por exemplo, o fator de impacto podem significar na pesquisa em diferentes áreas do conhecimento, além de perceber de forma mais objetiva e tangível o papel fundamental que a informação tem em processos decisórios. Perceber o bibliote- 267 cário como agente determinante para o bom andamento deste processo foi uma das gratas consequências desta escolha. Pensando nas disciplinas que compõem essa ênfase, vimos como elas se aproximam da realidade quando a teoria aprendida é destinada a resolver problemas e demandas que surgem nos ambientes que atuamos enquanto profissionais. A abrangência dos aspectos abordados neste período permite que os mecanismos de análise sejam usados em situações reais da mesma forma que usamos com os exemplos hipotéticos em sala de aula. Isto, entre outras coisas, demonstra como o currículo está de acordo com o que o mercado de trabalho espera de nós enquanto profissionais formados. Pode escolher como chamá-la, FOFA ou SWOT (Forças, Oportunidades, Fraquezas e Ameaças), o importante é que essa metodologia de análise é amplamente utilizada na instituição em que atuo. Conhecer a teoria por trás da ferramenta faz com que seja usada de forma efetiva. De um modo geral, mesmo que alguns dos assuntos abordados não façam parte da nossa rotina, ainda sim representam um importante complemento à nossa formação. É o que nos torna profissionais completos e aptos, e podemos recorrer a esses fundamentos e teoria sempre que for necessário. É difícil determinar como um conhecimento tão técnico como os conceitos envolvidos na Bibliometria podem nos auxiliar no cotidiano. Contudo, quando analisamos o enunciado destas leis bibliométricas percebemos que Lotka já havia previsto que nossas estantes estariam repletas de livros do Nicholas Sparks, mas as obras da Harper Lee deixariam um vazio no espaço a ela destinado, afinal poucos autores possuem muitas publicações e muitos autores possuem poucas publicações. Da mesma forma, Bradford procurou delinear as revistas núcleo de uma determinada disciplina, assim também fazemos nós, ao compor o acervo de nossas bibliotecas procurando não deixar de fora obras essenciais aos nossos usuários. Procurando abranger aquelas que devem ser lidas e aquelas que os alunos gostam de ler. Os conhecimentos adquiridos na sala de aula permeiam nossa vida profissional, ainda que de forma indelével. A máxima “temos que pensar no usuário” é martelada em nossas cabeças até a exaustão, contudo ganha nova forma quando a professora em uma disciplina optativa diz: “o bibliotecário pensa que a biblioteca é dele, que vai estar ali para sempre”. Pensando nisto, a todo o momento, é possível ficar mais longe da armadilha de construir uma biblioteca a imagem e semelhança do bibliotecário, mas sim mais parecida possível com o usuário. 268 Algumas disciplinas parecem surgir de forma inesperada na nossa grade, principalmente as optativas, entretanto na minha experiência, algumas delas se mostraram essenciais para o meu desenvolvimento profissional, pois sabemos que nossa matéria prima, nosso métier é a informação, falando assim podemos imaginar uma cena de Matrix com milhares de dados correndo através de uma tela. Mas sabemos que é muito mais que isso, percorrer e explorar a história da leitura e das bibliotecas com seus nomes e personagens, lugares e datas que jazem esquecidos na memória, as peripécias e aventuras vividas por esses personagens nos ajudam a transmitir e fomentar o sentimento de quão poderoso e transformador pode ser o conhecimento. Surpreender-se encontrando o que procurava é apenas uma das recompensas, reconhecer nos livros um amigo fiel é como fazer parte de um clube ultra exclusivo. Poder assistir nossos usuários enquanto fazem essas e outras descobertas traz sentido ao nosso dia-a-dia. A trajetória acadêmica que escolhemos nem sempre coincide com o nossa atuação no mercado de trabalho. Nos estágios, temos a oportunidade de “experimentar” a teoria aprendida, sorte daqueles que além de mestres na sala de aula também os encontram no teste para a vida real. As situações vividas neste período nos subsidiam, observar como profissionais da área com alguns anos de carreira lidam com as diferentes solicitações, nos preparam para quando tivermos que assumir a responsabilidade. Assim como foi as experiências vividas na Unidade Especial de Informação e Memória, no Núcleo de Informação Tecnológica, no Departamento de Ação Cultural da Biblioteca Comunitária da UFSCar e por último na Biblioteca Bernhard Gross do Instituto de Física de São Carlos, lugares por onde passei e onde encontrei profissionais comprometidos com seu trabalho e dispostos a dividir seus conhecimentos. Uma das experiências mais valiosas durante o período da graduação foi estagiar durante dois anos na Biblioteca do Instituto de Física de São Carlos. No decorrer destes dois anos pude passar por mais de um setor da biblioteca: atendimento ao usuário e tratamento da informação, e perceber a importância de conhecer bem seu usuário, oferecendo produtos e serviços que estejam de acordo com suas necessidades. Foi neste ambiente que aprendi que espaços adequados e uma equipe preparada não bastam para uma gestão efetiva, e que a excelência nos serviços prestados só pode ser alcançada quando há um planejamento respaldando as decisões tomadas. 269 As oportunidades de estágio surgem e nos agarramos a elas (quase como um bote salva vidas), nem sempre sabemos o que esperar, pode ser que decidamos que aquela não é a área que queremos seguir e talvez seja justamente esse estágio que nos subsidiará na carreira que nos aguarda. Foi assim com o Departamento de Ação Cultural. Contar histórias, receber crianças e conduzi-las pelas diferentes exposições que sempre modificavam o espaço da BCo, apresentar aos curiosos visitantes o universo incomensurável do conhecimento foi o laboratório para o que se tornaria minha carreira. Pois é, cá estou! 10 anos trabalhando como bibliotecária escolar, já desisti de tentar salvar o mundo. Hoje concluo que as metamorfoses acontecem de forma sutil, lenta e quase imperceptível. “Quase” é a palavra-chave. Tento seguir aqui o conselho de Clarice Lispector: “Mude, mas comece devagar,/ porque a direção é mais importante/ que a velocidade”. Atualmente, qualquer profissional deve ser proativo, reinventar-se de forma contínua. Meus problemas diários não tem nada a ver com o FRBR: obra, expressão, manifestação e item. Nada disso, aqui o desafio é fazer o jovem hiperconectado estabelecer uma relação de empatia e confiança com o livro. Quando atingimos esse indivíduo tudo parece valer a pena, quando ele decide que ler “Cem anos de solidão” é um desafio ao qual está apto, não só isso, ele anseia por enfrentá-lo. Nossa missão está cumprida. O ambiente acadêmico proporciona vivências que transcendem a teoria e a sala de aula, uma vez que somos constantemente desafiados a repensar nossas práticas e romper com lugares comuns e paradigmas. Participar da organização de um evento voltado para discussões a esse respeito consistiu num significativo complemento na minha formação. Compor a comissão organizadora em duas edições da Semana de Biblioteconomia e Ciência da Informação foi um exercício que transformou nossos próprios anseios em temas de debate, as discussões foram pautadas em como realizar da melhor forma possível o trabalho para o qual estávamos nos candidatando e quais as opções que nos são oferecidas. No que tange a minha formação acadêmica, percebo algumas lacunas deixadas pelo currículo para subsidiar a atuação em bibliotecas escolares, lacunas que foram preenchidas no exercício da profissão. Com certeza é impossível que as disciplinas oferecidas abarquem todas as situações que o mercado de trabalho apresenta, mas acredito que deva ser dada uma atenção especial para essa fatia de mercado que absorve tantos profissionais, principalmente 270 quando consideramos a enorme defasagem do nosso país nas avaliações internacionais. Investimentos em educação e cultura são obrigações das entidades governamentais, porém, nós, aqui na ponta, podemos colaborar para mudar a estatística preocupante divulgadas pelo Instituto Pró Livro, em 2016, que aponta que pouco mais da metade dos brasileiros é leitor, com 4 livros lidos por ano e dentro destes 4 livros, 2 são deixados pela metade. Realidade muito diferente da França, por exemplo, onde a média de livros lidos por ano é de 11 obras, segundo reportagem do jornal Estado de São Paulo. Tendo isso em vista, pensar numa biblioteca bem estruturada e que faça parte da rotina dos alunos pode fazer a diferença na vida dos mesmos, ainda que não seja óbvio para a sociedade. Pensar num currículo de Biblioteconomia e Ciência da Informação que incorpore discussões sobre a área de bibliotecas escolares e públicas me parece uma forma de começar a mitigar essas defasagens. Pode parecer utópico, mas a mudança deve começar em algum lugar e porque não começar na formação daqueles que serão mediadores entre informação e usuário? Capacitando-os para se tornarem agentes essenciais não só em processos decisórios, ou guardiões da memória, mas agentes de transformação social. O sociólogo Hebert José de Souza, o Betinho, já vislumbrava que um modelo de sociedade justa e democrática combatia não só a miséria que milhões de brasileiros convivem diariamente, mas também aquela fome que muitos nem mesmo reconhecem: a do conhecimento. Um dos projetos idealizados pelo sociólogo e que continua após sua morte é “Natal sem fome e com livros”, uma iniciativa que possibilita uma aproximação com os livros e a leitura, meio pelo qual as transformações começam a acontecer. Ao longo da história livros foram queimados e bibliotecas foram destruídas. Isso porque destruir a memória e a história de um povo se mostrou eficiente como arma de dominação. Alexandria foi construída sob o grandioso e ambicioso sonho de possuir todo o conhecimento que já havia sido produzido na antiguidade, mas se viu reduzida a cinzas depois de um incêndio. A Santa Inquisição queimava não somente as obras, mas em alguns casos seus autores. A Alemanha Nazista queimou centenas de milhares de livros. A revolução dos bichos de George Orwell foi proibida na URSS e em outros países socialistas, pois era tida uma crítica ao socialismo e mais diretamente a Josef Stalin. Exemplos como esses não faltam na história dos livros e das bibliotecas, o que nos mostram o impacto que a leitura pode ter quando se trata transformações sociais. Fazer com que jovens entendam e incorporem a ideia 271 de que o conhecimento é o principal recurso contra a opressão e alienação é o desafio que encaramos diariamente. Jorge Luiz Borges dizia que imaginava o paraíso como uma espécie de biblioteca. Cora Coralina acreditava que “feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina”. Para Albert Einstein a única coisa que você realmente precisava saber era o caminho para a biblioteca. Isaac Asimov a definia como uma máquina do tempo capaz de nos levar ao futuro ou passado, um professor que sabe mais do que qualquer outro ser humano além de ser o acesso há uma vida mais produtiva e feliz. Monteiro Lobato julgava que um país se faz com homens e livros. Posto isso, nos resta trabalhar de modo a incorporar essas máximas em nossas práticas diárias. Talvez não esteja claro para todos o porquê da escolha de Biblioteconomia e Ciência da Informação como carreira, mas creio que todos encontramos bons motivos para permanecer na profissão. 272 Foto: Waldeck Schutzer A CONSTRUÇÃO DE UMA PAIXÃO MARISA CUBAS LOZANO* Trajetória acadêmica Minha história com a Biblioteconomia começou lá no começo do século XXI, quando já havia terminado o Ensino Médio e me preparava para meu primeiro vestibular. Li sobre o curso em um guia de estudante e identifiquei-me com a área. Prestei vestibular no final do ano de 2001 para USP, Cidade Universitária, porém não cheguei a ser aprovada para segunda fase. Paralelamente ao vestibular também participei do Vestibulinho para o curso de técnico em Meio Ambiente (uma das minhas maiores paixões) na Escola Técnica Estadual Júlio de Mesquita, no qual fui aprovada. Foi nessa época que tomei conhecimento da existência da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e que ela oferecia o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Quando terminei o curso técnico, voltei a prestar vestibular, agora para diferentes cursos, em diferentes universidades, com a exceção a UFSCar, em que prestei vestibular para Biblioteconomia duas vezes. Em 2005 alcancei minha meta ao ser chamada na UFSCar. Logo que me instalei em São Carlos, frequentava quase que diariamente a Biblioteca Comunitária UFSCar (BCo UFSCar), buscando saber mais sobre o curso a partir de leituras de livros e artigos. Também no primeiro ano, me envolvi em trabalhos voluntários na Casa Aberta e na Biblioteca Municipal Amadeu Amaral. Embora tenha sido por um curto período, foram nessas pequenas experiências que * Doutorado em andamento em Ciência, Tecnologia e Sociedade (UFSCar), Mestre em Engenharia Urbana (UFSCar) e Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2009). Bibliotecária na UFSCar desde 2016. Contato: marisalozano@ufscar.br. 274 aprendi sobre atividades de processamento físico de livros, que foram bastante úteis na minha atuação profissional. Ainda no primeiro ano tive a oportunidade de participar de um projeto de Iniciação Científica (IC) desenvolvido em uma parceria do Departamento de Ciências da Informação (DCI) e o Departamento de Engenharia Civil (DECiv), orientado pela Profa. Dra. Maria Matilde Kronka Dias (DCI) e o Prof. Dr. José Franciso (DECiv). O projeto de IC consistia na elaboração de um Estudo de Usuários para ser aplicado no Portal InfoHab (portal que reúne notícias e material relacionados à habitação, alimentado pelas universidades conveniadas). No segundo ano do curso, participei da Atividade Curricular para Integração de Ensino, Pesquisa e Extensão (ACIEPE) de Educação Ambiental. A partir desta ACIEPE, passei a desenvolver um projeto na Unidade de Gestão de Resíduos (UGR, hoje DGR – Departamento de Gestão de Resíduos) sob a orientação do Prof. Dr. Nemésio Neves Batista Salvador e coorientação da Profa. Dra. Ana Marta Ribeiro Machado. Fui contemplada com duas bolsas treinamentos (2006 e 2008) e uma bolsa de IC (2007/2008) para o desenvolvimento deste projeto, que era composto de um estudo sobre Educação Ambiental na gestão de resíduos químicos e desenvolvimento de materiais impresso (cartazes e folders) para distribuição nos laboratórios geradores de resíduos químicos da UFSCar, campus São Carlos. Este trabalho proporcionou a participação em diversos eventos, com apresentações orais e pôsteres, além de ter sido tema do meu TCC (Trabalho de Conclusão de Curso), em que abordei a atuação do bibliotecário neste contexto. No terceiro ano do curso, iniciei meus estágios obrigatórios. Comecei simultaneamente um estágio remunerado em uma escola municipal e um estágio voluntário no Cursinho Pré-vestibular da UFSCar. O estágio na biblioteca escolar da Escola Municipal de Ensino Básico Janete Maria Martinelli Lia, onde fiquei poucos meses, proporcionou-me intenso aprendizado, em que pude ter contato com a rotina de uma biblioteca escolar e com outra realidade social, já que a escola está localizada em um bairro pobre de São Carlos. Já o estágio no Cursinho Pré-vestibular UFSCar foi uma vivência um pouco mais longa. Foram 3 anos organizando o acervo, selecionando doações, oferecendo empréstimos de obras relacionadas ao vestibular, entre outras ações. 275 Ainda no terceiro ano comecei a participar da organização de atividades relacionadas à Calourada UFSCar e da Universidade Aberta (evento para divulgação dos cursos da UFSCar voltado para a comunidade externa). Também foram 3 anos de atuação, em que pude me relacionar com alunos da Biblioteconomia e Ciência da Informação de anos diferentes, alunos de outros cursos, além de outros setores da Universidade. As oportunidades de bolsas garantiram que eu pudesse vivenciar plenamente a graduação: participação em eventos diversos, atividades extracurriculares e voluntárias, entre outros; complementando a formação teórica do curso, proporcionando reflexões sobre a futura atuação profissional e abrindo caminhos para novas oportunidades, o que culminou no meu ingresso no mestrado em Engenharia Urbana. Mas essa é outra história... Vivências profissionais Optei por fazer a complementação do curso (havia feito a ênfase Social para a graduação), ficando em São Carlos mais um ano. Foi neste período que comecei a prestar concursos públicos e a estudar para o mestrado. No final do ano de 2009 tive êxito em ambos, passei em primeiro lugar no concurso para Técnico-Administrativo/Bibliotecário do Centro Paula Souza e fui selecionada no mestrado. Assim, no início de 2010, minha trajetória profissional começa na Escola Técnica Estadual Profa. Anna de Oliveira Ferraz, no município de Araraquara. Como a escola oferecia aula nos três períodos, foi possível fazer o mestrado trabalhando. Foram quase 4 anos atuando na Biblioteca da escola. Por ser a única bibliotecária da unidade, amparada eventualmente por estagiários da área de Administração, desenvolvi os mais diferentes fazeres bibliotecários: processamento técnico, processamento físico, circulação, guarda de livros, remanejamento de acervo, ação cultural etc. Tive oportunidade de participar de eventos de aprimoramento, que tiveram impacto direto no meu trabalho. Na escola tive a chance de elaborar uma politica de desenvolvimento de coleções (com critérios para doação e descarte), manuais de procedimentos, migração de bases de dados (BibLivre para PHL), estudo de usuários, orientar alunos no desenvolvimento de trabalhos escolares entre outros. 276 Tive a satisfação de fazer amigos com quem mantenho contato até hoje e que enriqueceram minha experiência na Biblioteca Escolar. Foi lá também que aprendi a ser tolerante e ser tolerada e a amar minha profissão. Por questões financeiras e geográficas, segui prestando concursos. Em 2013 fui aprovada no concurso para Analista Sociocultural, oferecida pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. No final deste mesmo ano comecei a trabalhar na Diretoria de Ensino – Região São Carlos (DER São Carlos). Minha função na DER São Carlos era cuidar da biblioteca local e acompanhar o trabalho desenvolvido nas Salas de Leitura presente nas Escolas Estaduais da região. Foram diversos desafios e aprendizados. Tive a chance de colaborar com a implementação da base de dados para a rede estadual de escolas, atuar na formação dos professores da Sala de Leitura, além de afazeres inerentes a biblioteca (processamento técnico, processamento físico, circulação, guarda de livros, remanejamento de acervo etc.), participação em projetos, entre outras. O desenvolvimento de atividades junto às escolas despertou em mim o desejo de voltar a estudar, motivando-me a fazer uma especialização a distância em Biblioteca Escolar. Novamente movida questões financeiras e agora também por flexibilidade de horário (tenho a intenção de fazer o doutorado), voltei a prestar concursos e, recentemente, fui aprovada para trabalhar na UFSCar. Iniciei minhas atividades em setembro de 2016, no Departamento de Referência da BCo UFSCar. Tinha a experiência de usuária de uma biblioteca universitária/comunitária. Voltar a BCo UFSCar como bibliotecária, para atuar com outros bibliotecários, em uma biblioteca tão grande, gerou em mim certa insegurança, superada dia a dia com a ajuda dos colegas de trabalho. Devido a uma reestruturação da BCo UFScar, após a troca da Diretoria desta, três meses depois de começar o trabalho, foi atribuída a mim a chefia do Departamento de Referência, um setor grande e que lida diretamente com os usuários. Tem sido um aprendizado diário, tanto sobre os afazeres relacionados ao departamento, quanto as relações interpessoais, a fim de garantir o bom desenvolvimento do trabalho. Temos trabalhado para modernizar alguns processos da BCo e desenvolver ações voltadas também para o público universitário. 277 Congruência entre o ensino na graduação e o percurso profissional A graduação para mim foi um momento de muita efervescência, em que o aprendizado acontecia todo o tempo e alguns conhecimentos são hoje tão intrínsecos, que é difícil determinar o que foi aprendido na graduação, o que aprendi em leituras voluntárias e o que aprendi no dia a dia, trabalhando. Ainda assim, posso afirmar que em minha atuação profissional senti falta de conhecimentos específicos relacionados à biblioteca que poderiam ter sido adquiridos durante a graduação. Talvez isso se deva ao perfil do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar, voltado para questões tecnológicas e empresariais. Pode também ter a ver com o meu perfil na época da graduação, sempre envolvida nos mais diversos assuntos e espaços acadêmicos. Por outro lado, o curso desenvolveu em mim a competência informacional necessária para buscar as informações que subsidiem minha atuação profissional. Vale destacar uma disciplina que contribuiu no desenvolvimento do meu trabalho: Representação Descritiva I, ministrada pela Profa. Dra. Eliane Serrão Alves Mey. Além de a catalogação ser uma prática nos meus dois trabalhos anteriores a BCo UFSCar, práticas passadas por ela, como o uso de recursos informacionais disponíveis para facilitar o trabalho, foram essenciais nos momentos em que eu era a única bibliotecária na unidade e tinha diversas atividades para desenvolver. No fim das contas, acho que é pouco provável que algum curso consiga formar um aluno para que esteja preparado para as mais diversas e imprevisíveis áreas de atuação no mercado de trabalho. Creio que a missão principal é formar profissionais autônomos. E em relação a isso tive a formação adequada. 278 Foto: Waldeck Schutzer BIBLIOTECÁRIO ESCOLAR: ENGAJAMENTO E PAIXÃO PELA PROFISSÃO TIAGO FERNANDES ANDRADE* Minha história com a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) começou entre final de 2005 e início de 2006, após um processo de transferência externa, havia iniciado os estudos em Biblioteconomia na Universidade Estadual Paulista (Unesp). O entusiasmo ao conversar com colegas de que o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação tinha um viés tecnológico e empresarial, me entusiasmava demais, tinha apenas 19 anos e ouvir estas palavras eram música para meus ouvidos. Logo que entrei tive uma recepção muito boa pelos veteranos, me explicaram sobre os procedimentos para aquisição de bolsas, como era a grade curricular do curso, professores e oportunidades de estágio que a cidade de São Carlos e a UFSCar ofereciam. A primeira oportunidade de aprendizagem na universidade veio em março de 2006. Fui contratado como estagiário pela Editora da Universidade Federal de São Carlos (EdUFSCar), trabalhava com organização de estoques, notas fiscais e empacotava os livros vendidos através do site da editora. Tinha uma experiência na área no estágio voluntário que realizei na biblioteca universitária da UNESP, o que me ajudou no início dos trabalhos da editora e posteriormente com as matérias de classificação e ajuda do professor Rogério a organizar os documentos fiscais que tínhamos no departamento comercial. Trabalhei neste local por quase 1 ano, e foi um período de muito aprendizado com os demais funcionários no que diz respeito a organização dos arquivos fiscais e dos livros. * Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2009). Contato: tiagobibliotecario@gmail.com. 280 Neste mesmo ano entrei para a comissão organizadora do XXX Encontro Nacional de Estudantes de Biblioteconomia, Documentação, Ciência e Gestão da Informação (ENEBD) que seria realizado em São Carlos no mês de julho de 2007. A organização do evento me trouxe uma vivência enriquecedora, pois tivemos diversos momentos de negociação de locais para realização de palestras, alimentação de estudantes e sobre a participação de docentes do curso de BCI. Este evento estudantil, trouxe a dimensão e importância das discussões acadêmicas que eram presentes nas aulas e para principalmente conhecer as semelhanças e diferenças da Biblioteconomia nas diversas regiões do país, além de ampliar o networking com os demais estudantes, posteriormente profissionais da informação. Foram meses de preparação para este evento (ENEBD) e que foi possível identificar o que e quanto a UFSCar e o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação ofereciam para nós como estudantes. Trouxemos para São Carlos cerca de 400 estudantes vindos de todos os cantos do Brasil e que discutiram sobre “Atuação inovadora na geração, transferência e uso da informação” que propunha identificar as novas formas de desenvolver e pensar os processos de geração, transferência e uso da informação, onde o profissional interage e agrega valor. Este tema tinha a cara do curso de BCI da UFSCar com um tema que envolvia a gestão e as tecnologias da informação e comunicação. Tivemos apresentações acadêmicas voltadas para os eixos de geração, transferência e uso da informação que foram compilados em CD. Em meio às discussões para definição do tema a ser discutido no ENEBD iniciamos uma disciplina chamada Organização, sistemas e métodos ministrada pela professora Dra. Wanda Hoffman. Me interessei pelo assunto da área de gestão da informação e os Sistemas de Gestão da Qualidade ISO 9001,queria entender até que ponto o bibliotecário poderia trabalhar com este sistema em uma empresa. Procurei a professora Wanda e iniciei a produção de um artigo científico que procurava entender onde e até que ponto o bibliotecário colaboraria. A produção de artigo científico agregou a minha vida acadêmica diversos ensinamentos, a importância do docente neste processo e como deve ser bem realizado seu processo de pesquisa para que de fato acrescente algo para sua área do conhecimento ou pelo menos, esclareça dúvidas dos demais colegas sejam eles estudantes ou profissionais. Tive auxílio tanto da Dra. Wanda Hoffman na produção do artigo como de outros colegas com discussões que culminaram no término do texto e envio para um evento acadêmico dentro da própria universidade que era a Jornada de Inicia- 281 ção Científica. Foi a primeira produção científica e realmente a gente nunca esquece. A apresentação em banner na quadra esportiva da universidade foi um momento muito especial para mim, prestígio dos demais colegas, explanar sobre sua pesquisa aos interessados, isto também me fez valorizar ainda mais a pesquisa na área e as dificuldades em realizar um pesquisa de qualidade, assim como a gratidão de vê-la pronta. O primeiro ano do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar engloba disciplinas que te ajudam a entender algumas questões que fazem parte do vamos dizer assim “ambiente da informação” que o bibliotecário trabalha. Aliás neste primeiro ano de curso as discussões do nome do profissional são intensas, se chamamos de profissional da informação ou bibliotecário. Além da complexidade do trabalho com a organização da informação. No segundo ano de curso tivemos disciplinas voltadas para a organização e classificação da informação registrada. Áreas muito importantes para se ter conhecimento “do que e como fazer” com toda aquela informação registrada. Em ambientes como as bibliotecas públicas e escolares estas disciplinas são fundamentais, neste momento já havia encerrado estágio na EdUFSCar e estava estagiando na Biblioteca Comunitária “CAIC”, esta biblioteca tinha um caráter peculiar, pois além de atender a escola que estava no mesmo terreno da biblioteca, ela atendia a comunidade externa. Esta característica implica também em uma diversificação de atividades culturais para atender a demanda escolar e da comunidade externa e também bibliográfica. Aprendi junto com as disciplinas que estava cursando, como os processos ocorriam numa biblioteca comunitária e também como esta biblioteca fazia parte de uma rede de bibliotecas da cidade de São Carlos foi possível entender o funcionamento de uma rede de bibliotecas, esta situação interferia no modo como os livros eram processados, como as atividades culturais eram atendidas e a qual público se atenderia. A Biblioteca Comunitária do CAIC fica no bairro Cidade Aracy, uma comunidade carente da cidade, o atendimento da biblioteca tinha como intuito ampliar o repertório cultural e escolar dos alunos e de certa maneira convencer os pais das crianças e adolescentes que procuravam a biblioteca, que aquele espaço era importante para o desenvolvimento de seus filhos. No período em que estagiei neste local, aproximadamente 1 ano e meio, conheci e tive que lidar com auxílio dos profissionais que ali estavam de crianças e pais que valorizavam o local e com pais que queriam que seus filhos não frequentassem o espaço. Assim trabalhávamos com a educação do público para a importância daquele espaço cultural e educacional que é a biblioteca. 282 Em 2008, terceiro ano de curso em BCI tivemos a maior parte das disciplinas voltadas à gestão e no meio do semestre existia a possibilidade de você escolher entre duas ênfases da área do curso de BCI as chamadas disciplinas da “ênfase social” e as da “ênfase tecnológica”. Neste momento a turma se dividia dentre as escolhas que faziam, isto ocorria até o término do curso no quarto ano. Optei como sempre me interessei, pela ênfase tecnológica, que incluía disciplinas voltadas a gestão por processos, tecnologias da informação e informação para sustentabilidade. Junto com esta grade curricular, resolvi realizar disciplinas optativas no curso de Letras (Literatura infato-juvenil) e uma chamada Organização de Unidades de Informação do curso de BCI. A disciplina optativa de BCI ministrada pela professora Dra. Zaira Zafalon foi fundamental para o meu amadurecimento profissional, a disciplina trouxe para os estudantes importantes aspectos operacionais dentro de uma biblioteca e a importância da estruturação dos serviços oferecidos, a maneira de como definir os serviços a serem implantados em uma unidade de informação. Considero uma das disciplinas que tiraram muitas inseguranças de um quase egresso do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Junto as disciplinas do curso e participando de todo o processo estudantil que ocorria junto com o Programa da UFSCar chamado Ações Afirmativas que buscava promover a entrada de estudantes de escolas públicas, estudantes pardos e negros, assim como indígenas, fui escolhido pela Coordenação do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação como tutor, em que minhas responsabilidades eram de acolher os estudantes de BCI advindos do Programa Ações Afirmativas, orientar as diversas oportunidades que a universidade e o curso ofereciam, assim como facilitar o acesso a informações de suma importância e que culminassem com a permanência destes alunos na UFSCar. Assim trabalhei e orientei a chegada de diversos alunos do curso de BCI, desde a orientação de estudos, o que de fato o curso e o futuro profissional ofereciam. O acolhimento e orientação sobre a cidade de São Carlos até a conquista de bolsas de alimentação, alojamento e de atividades que os alunos realizassem e fossem remunerados por isto. Neste período conheci diversas histórias pessoais que me ajudaram a entender o grande desafio que tiveram para chegar até a universidade e como o programa era importante para a permanência dos mesmos. Crescia como aluno e entendia devido as políticas de permanência da UFSCar que meritocracia não garante os melhores nas universidades públicas, isto faci- 283 litaria e facilita o meu entendimento como profissional hoje no trabalho em bibliotecas escolares. Em 2008 participei junto com um grupo de alunos de minha turma, Vivian Storti, Juliana Landgraf, Alice Lopes, Renan Ramos, de reuniões para a elaboração dentro do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação de uma Empresa Júnior. Contatamos demais Empresas Juniores da UFSCar. Neste processo elaboramos o primeiro formato do Estatuto da Empresa Júnior de Biblioteconomia e Ciência da Informação e nomeamos como InfoJr. Deste processo até a permanência como membros eu (Diretor de Projetos) e o Renan Carvalho (Presidente) permanecemos, junto com demais membros que estavam nos cargos de Diretoria de RH, Financeiro, Treinamento. O movimento das empresas juniores na UFSCar estava se fortalecendo, éramos junto com a empresa júnior do curso de Letras as únicas empresas da área de conhecimento de humanidades. Tivemos nesse início a tutoria do professor Dr. Roniberto Amaral e iniciamos para captação de recursos e como fomento a aprendizagem dos alunos e profissionais da informação com workshops. No período em que estive como diretor de projetos, até fevereiro de 2010 buscamos parcerias com outras empresas juniores, realizamos um trabalho de organização de documentos para o departamento de Engenharia de Materiais e realizamos workshops, junto com isso tentávamos registrar oficialmente a InfoJr. Foi uma das grandes conquistas realizadas pelos estudantes para o curso e com colaboração intensa de todos os professores do departamento do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Participei em 2009 sob coordenação da professora Dra. Zaira Zafalon como tutor de um grupo de estudos em Biblioteconomia e Ciência da Informação, o objetivo deste curso era discutir artigos da área de conhecimento do profissional da informação e aprimorar nossos conhecimentos e práticas. Este grupo foi também de extrema importância pois reunia alunos do primeiro ao quarto ano de curso, ou seja, a miscelânea de conhecimentos era ali posta e compartilhada, questionada para que o grupo crescesse em conjunto. Em 2010 a proposta de discussões era virtual através do ambiente de aprendizagem Moodle e incluía a presença de profissionais formados no curso de BCI da UFSCar, já não estava como tutor e sim como profissional formado e a proposta era realizar apresentações de temas de interesse dentro da área para os demais colegas do grupo de estudos, a importância deste grupo mesmo após a conclusão do curso mantinha a minha atualização profissional e de 284 práticas e tinha esta proposta de continuar discutindo com uma miscelânea de conhecimentos dos participantes. Em 2009 participei de um projeto de extensão universitária sob coordenação da professora Zaira Zafalon para organização de acervo religioso da Igreja São Sebastião na cidade de São Carlos. Um dos maiores desafios de um quase egresso do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Antes deste projeto, havia feito um estágio voluntário a convite da vice-diretora de uma escola estadual de São Carlos, para organizar o espaço da sala de leitura da escola, este foi um desafio interessante, os livros estavam jogados no chão ou nas estantes e não havia nenhuma organização e utilização daquele espaço como sala de leitura, apenas utilizava-se o fundo da sala para apresentar filmes aos alunos. Já no projeto de extensão e depois de ter realizado a disciplina de Organização de Unidades de Informação e as demais que faziam parte do currículo tinha outra visão de como organizar um acervo do “zero” de uma biblioteca, eu e outras 4 estudantes do curso, três do primeiro ano e uma do segundo, ficamos responsáveis por esta organização, chegamos no primeiro dia e o padre nos mostrou aonde estavam os livros, estavam em um quarto cheios de terra e poeira. Este foi o primeiro desafio, como realizaremos a higiene destes materiais, a segunda era o grande volume de livros neste estado. Conversava com nossa professora coordenadora semanalmente sobre os desafios do local e a mesma nos orientava em como podíamos trabalhar da melhor maneira, cumprindo os prazos estipulados em cronograma previamente realizado. Realizamos a higienização de todo o material, em torno de 4 mil livros. Depois os desafios foram de realizar a representação descritiva daquele acervo que continha livros em italiano, latim, inglês e como foi importante a definição da utilidade daquela biblioteca, ela não atenderia o público externo, somente seminaristas e não teria uma pessoa responsável por aquele setor, sendo assim, optamos por deixar a descrição o mais simples possível para que as pessoas pudessem encontrá-las (título, autor, editora e 2 assuntos) em ordem alfabética de títulos. Esta percepção de organização do acervo e representação descritiva para atender ao público veio na prática com este projeto de extensão. Não tínhamos esta clara noção das nuances de um processo de representação descritiva e organização do acervo, apesar de sempre ouvirmos que o “leitor em primeiro lugar na biblioteca”. Os demais desafios foram de como organizar as tarefas da equipe para que o trabalho fosse bem executado e realizamos uma “linha de produção” em que duas higienizavam, uma realizava a representação descritiva, uma tombava os livros 285 e outra etiquetava e colocava nas estantes. Não me lembro ao certo, mas este trabalho durou em torno de 3 meses e para mim foi a experiência que faltava em meu percurso acadêmico. Posteriormente trabalhei por um período sob a coordenação da professora Dra. Zaira Zafalon na organização do acervo do Laboratório de Biblioteconomia e Ciência da Informação que estava desativado, trabalhei separando os materiais que continuariam no acervo do laboratório e outros que teriam outras destinações e no início da catalogação dos materiais bibliográficos no sistema Biblivre. Em 2009 estava realizando meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) sob orientação do professor Dr. Roniberto Amaral e que tinha como objetivo identificar as competências profissionais do bibliotecário em sistemas de gestão da qualidade em empresas da área médica. Realizei entrevistas com a profissional bibliotecária e foi um trabalho extremamente gratificante para mim, como disse anteriormente, me ensinava ainda mais a valorizar a pesquisa na universidade e me entusiasmava com as perspectivas de carreira além das bibliotecas naquela época. Em 2010, já formado, mas ainda na UFSCar realizando complementação de curso na ênfase social, realizava estágio na Biblioteca Pública da Vila Prado, outra experiência gratificante no que diz respeito a conscientização de usuários e para entender a importância da biblioteca em determinadas comunidades. Fui chamado para um projeto como aluno bolsista sob coordenação do professor Roniberto Amaral, Luciana Gracioso, Wanda Hoffman e Leandro Innocentini junto com outros alunos do curso em que o objetivo era entender as características do mercado calçadista. Voltava a trabalhar com informação tecnológica e para negócios e foi uma experiência curta, infelizmente pois em agosto de 2010, tive que me desligar do projeto, pois fora chamado para trabalhar como bibliotecário em uma escola de ensino básico na cidade de São Roque. O início profissional, depois de experiências incríveis no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, é como um corte no cordão umbilical, me via em uma cidade nova, sem amparo de colegas e professores e agora como profissional em que muitas pessoas dependem de seu trabalho e sua cobrança pessoal de “dar o seu melhor”. Eu sonhava em trabalhar em empresas, minhas pesquisas acadêmicas foram todas voltadas a área empresarial e meus estágios e bolsas de extensão voltadas à bibliotecas. A escola de São Roque não tinha biblioteca, havia uma sala de leitura em que os livros estavam amontoados em algumas estantes. A escola em breve se mudaria para 286 um novo prédio, já com local apropriado para receber a biblioteca, mas naquele momento em que cheguei o novo prédio estava em construção. Tínhamos os livros nas estantes e caixas e mais caixas de livros que foram comprados para a nova biblioteca. Meu primeiro desafio profissional neste momento era de selecionar o material que já estava na “sala de leitura” da escola e iniciar a catalogação dos materiais para que quando mudássemos, o acervo básico já estivesse mais organizado. Junto com este trabalho tinha de acordo com a proposta da instituição iniciar os atendimentos com os alunos do 1º ano do Ensino Fundamental até o 3º ano do Ensino Médio. Atendia os alunos para empréstimo de livros e realizava anotações em uma planilha Excel e as demais atividades de incentivo a leitura realizava nas salas de aula com autorização dos professores. Naquele momento tínhamos poucos recursos, não tínhamos computador, impressora, então decidi também não me preocupar com as perdas de livros que ocorressem a partir daquele momento em que a “sala de leitura” foi reativada de certa forma. Esta é uma das primeiras decisões que deve tomar como profissional. Não tínhamos nenhum controle de livros, a sala não era utilizada, então os benefícios do empréstimo com Excel e das atividades de incentivo a leitura seriam ainda assim de maior impacto para a escola do que a perda de alguns livros que poderiam ocorrer na circulação de livros entre alunos sem controle de acervo. Trabalhei também com a conscientização sobre o uso dos materiais, a importância da leitura, pesquisa e organização dos estudos. Em março de 2011 mudamos para a unidade nova, com todos os recursos disponíveis, sala adequada, computador para meu uso e dos alunos, assinatura de periódicos e um acervo em torno de 5 mil exemplares. O aprendizado foi enorme, tive que ter “jogo de cintura” na forma como realizava as parcerias com os professores, conscientização de que biblioteca não é lugar de castigo, infelizmente isto ocorria nesta escola, mas resolvíamos rapidamente estas situações. Planejar as atividades junto com os professores observando o seu plano de trabalho com os alunos de cada turma. Incentivar a leitura e responsabilidade com os materiais da biblioteca e cuidado com o patrimônio da escola. Estas práticas junto com as atividades de representação descritiva, organização do acervo me deram a imensa responsabilidade do trabalho do bibliotecário como educador. E me fez apaixonar por este espaço. Dentro da mesma instituição, mudei para uma escola na cidade de Salto no ano de 2011, e encontrei características parecidas com as da escola de São Roque, porém apesar da escola em obras, já iniciei minhas atividades na 287 biblioteca do prédio novo, então não tinha contato com os alunos e realizava atividades de organização do acervo, representação descritiva, classificação e preparo manual dos livros. Quando os alunos vieram para o prédio novo, a biblioteca tinha uma estrutura mais preparada para o atendimento e controle do acervo e também para realização das atividades dentro do espaço. As aulas que realizei de Literatura Infanto-juvenil me trouxeram a noção dos grandes autores da área além da vivência pessoal. Ainda assim, sentia a necessidade de realizar um curso de contação de histórias para mobilizar as crianças e adolescente a “entrarem nas histórias”. Depois de realizado o curso e visto o universo maravilhoso que é o da contação de histórias, meu trabalho se aperfeiçoou. Contava histórias para crianças e adolescentes e como dizia “Quem não gosta de ouvir uma boa história?” e assim marcava minha presença como profissional nesta escola e como foi importante toda a trajetória no curso de BCI. Neste momento me engajava para valorização do profissional bibliotecário em bibliotecas. A maior parte do mercado absorve os profissionais em bibliotecas, sejam elas escolares, universitárias, especializadas, públicas ou comunitárias. Porque as propagandas dos cursos de nossa área valorizam o além do livro? Neste momento percebi que as tecnologias, identificação de processos devem ser aperfeiçoados para a biblioteca e não somente para trabalho em empresas. Talvez um maior engajamento para bibliotecas não frustre profissionais que se formam com a ilusão de trabalho em empresas. Neste momento de engajamento, fui convidado através de um professor que trabalhava comigo na instituição e na Prefeitura Municipal de Salto a oferecer treinamento aos profissionais que cuidavam das salas de leitura do município. Visitei algumas “salas de leitura” do município e elaborei algumas orientações sobre organização, circulação do acervo e também sobre a importância do profissional bibliotecário neste processo. Todo este trabalho só foi possível ao conjunto de disciplinas que tínhamos na grade e com o agrupamento de todas estas disciplinas na matéria optativa de Organização de Unidades de Informação. Foi gratificante auxiliar outros profissionais que mesmo não sendo bibliotecários se demonstraram interessados no assunto e também conversar com profissionais que estavam nos cargo de gestão da prefeitura, a intenção na época era de implementação de algumas medidas para melhorar o funcionamento destes espaços. Tivemos em 2012, eleições municipais e fui em todos os encontros da população com os pré-candidatos a prefeitura de Salto com a mesma pergunta: Qual a importância das bibliotecas escolares no seu plano de governo? Vocês já devem saber que não tinha 288 nenhuma resposta, ou aquelas que você consegue encaixar qualquer coisa. Depois deste momento participei de alguns encontros em uma ONG que realizava ações culturais na cidade de Salto, o prefeito eleito, infelizmente não tinha nada de diferente dos demais no quesito bibliotecas escolares, ou seja, elas continuariam sendo “salas de leitura”. Em meados de 2013, também pela mesma instituição através de movimentação interna chego a escola de Jardinópolis, próximo a Ribeirão Preto. Também enfrento condições semelhantes às demais unidades escolares, mas esta não tinha nem “sala de leitura”. Esperei sem ter o que fazer por um mês até que pude iniciar os trabalhos no prédio novo, porém apesar de estar no prédio novo, o local da biblioteca estava sem estantes, mobiliários, computadores e impressoras. Iniciei um trabalho de separação por assunto nas cadeiras que tínhamos na biblioteca, colocava os livros que eram do mesmo assunto em cadeiras a espera das estantes que vieram somente em junho daquele ano. Atendia os alunos do 1º ao 5º ano no lado externo da biblioteca somente para contação de histórias. A biblioteca era de fato somente eu, nem o local podíamos utilizar pois as cadeiras que tínhamos estavam cheias de livros. Depois de tudo organizado e situação resolvida, tivemos o desafio de conhecer melhor a comunidade escolar através de pesquisas de usuários, de satisfação de atendimento, de atendimento a necessidades, foi a primeira vez que compilei resultados de um estudo de usuários, algo que deve ser feito sempre para realmente verificar as necessidades de atendimento de seu público. Sem deixar a parte acadêmica de lado, já havia realizado uma especialização na área de Biblioteconomia e publiquei em 2013 um artigo no periódico Biblioteca Escolar em Revista da USP chamado: Formação do bibliotecário escolar: estudo de caso sobre o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar que busca através da grade curricular do curso de BCI observar se a instituição prepara os alunos para o trabalho em bibliotecas escolares. Também gratificante trabalho e neste meu percurso profissional e de engajamento pelas bibliotecas escolares, apresentei um pouco do meu trabalho para alunos dos cursos de graduação da USP de Ribeirão Preto, UNESP campus Marília e também para minha querida BCI da UFSCar, com intuito de que mais pessoas se apaixonem e encarem os desafios do trabalho em bibliotecas. Tenho a certeza que as experiências na graduação ajudaram e ajudam os profissionais bibliotecários a seguirem e enfrentarem seus desafios e que as experiências profissionais ampliam o horizonte da importância deste profissional nas áreas cultural e educacional. 289 Foto: Waldeck Schutzer DA GRADUAÇÃO PARA A ATUAÇÃO NA BIBLIOTECA ESCOLAR MARCELA ANTOCHIO* É algo extremamente positivo poder discutir e relembrar fatos do caminho profissional que escolhi para trilhar. Já se passaram 10 anos desde que coloquei meus pés e minha alma na carreira de Bibliotecária. Neste artigo pretendo expor minhas experiências no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar, as disciplinas mais marcantes e importantes para minha formação e as atividades que realizei quanto aluna que me auxiliaram a escolher a área de atuação e especialização. Após 10 anos já são 6 anos de formada e dentro desse espaço de tempo atuei em diversas frentes, tanto como profissional da informação, quanto fora da área e no decorrer do artigo poderão conhecer os caminhos que trilhei como profissional. Para encerrar abordarei características das disciplinas que facilitaram meu exercício como Bibliotecária e até mesmo para outras profissões, como também os conhecimentos adquiridos com a prática e que mudaram minha forma de compreender a profissão que escolhi, também falarei sobre perspectivas futuras: doutorado, especializações, pois o conhecimento não para de crescer e não podemos nos permitir a estagnação. Trajetória acadêmica No ano de 2007 comecei minha graduação, foi um ano cheio de entusiasmo e sacrifícios. Eu ainda * Mestre em Ciência, Tecnologia e Sociedade (UFSCar), Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão 2010). Contato: mantochio.cts@gmail.com. 291 trabalhava em Descalvado e para poder ir para a Universidade precisava pegar o transporte público, o começo do ano foi um tanto corrido e que me impulsionou a tentar uma vaga de estágio. O que foi uma grata surpresa, pois era início do semestre, mal conhecia a área e surgiu a oportunidade de estagiar na Biblioteca Comunitária da UFSCar, mas este assunto abordarei na próxima sessão, nesta quero falar um pouco mais sobre as experiências em sala de aula. Foram diversas disciplinas, listo aqui as que realmente marcaram meu fazer como profissional: Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação: Disciplina que permeou a base histórica e criação dos conceitos e técnicas da área de atuação, algo crucial para a evolução da profissão é conhecer sua origem e como se tornou o que é atualmente. Tive o prazer de aprender tal disciplina com uma grande profissional e exemplo de pessoa, nossa querida e saudosa Vera Regina Casari Boccato, excelente professora que me mostrou a importância e como foi constituída nossa área. Linguagens Documentárias: Essa disciplina visa trabalhar os conceitos, estruturação e utilização dos sistemas documentários, tais como CDD e CDU. Para mim foi muito interessante e importante como bibliotecária conhecer todas as etapas de elaboração do número de chamada, como Dewey e outros pesquisadores chegaram nessa elaboração. Foi muito interessante também, pois conhecemos outros sistemas de classificação, através de pesquisa de campo e exposição dos mesmos em sala de aula. Grande contribuição para a profissional que sou atualmente, novamente devo agradecer nossa ilustre Vera Regina Casari Boccato. Representação descritiva: Catalogação, o caminho de pedras tortuosas, repleto de detalhes que demanda um olhar sempre atento para não cometer o erro de pisá-las e se machucar. Para mim foi uma disciplina difícil, principalmente com relação a catalogação de mídias eletrônicas, foi um grande desafio, compreender os campos, localizar a informação no item e descrevê-lo da melhor forma possível para que enfim o usuário ao procurar a informação que deseja seja capaz de encontrá-la nos mais diversos itens e com agilidade necessária para atendê-lo. E apesar da disciplina para mim ser um tanto complexa, era também oferecida aos sábados de manhã, mas se tinha algo agradável era realmente nossa professora, Zaira Regina Zafalon, capaz de motivar e um batalhão para poder falar com tanto carinho da área que mais gosta de atuar. Usos e usuários da Informação: A disciplina de usos e usuários de informação me possibilitou conhecer as estratégias para atendimento das neces- 292 sidades informacionais dos usuários, quais meios eles buscavam para alcançar tais necessidades e como eu poderia utilizar desses conhecimentos para planejar ações de capitação, manutenção e atendimentos adequados para cada público. Atualmente, como bibliotecária escolar, sou capaz de utilizar na praticar tais informações para melhor realizar meu trabalho. Na época nossa professora foi Eliane Colepicolo, profissional ativa e dinâmica, nos trouxe conceitos de como trabalhar com tecnologia. Informação para competitividade empresarial: Na graduação a área que mais me atraía foi de lidar com informação e conhecimento para competitividade empresarial. A disciplina de Informação para competitividade empresarial abriu as portas para essa oportunidade diferenciada em nossa profissão e que me esclareceu a relevância e a importância de fontes informacionais confiáveis, a boa utilização de ferramentas de filtragem para agilizar processos de busca e a acessibilidade informacional pronta para as maiores decisões da empresa. Tive oportunidade de conhecer um grande professor e que me auxiliou muito durante a graduação, professor Sérgio Luis da Silva. Gestão de Projetos em unidades de informação: Conhecer toda a logística de entrada e saída de uma unidade de informação, traçar estratégias de marketing e planos para ampliar serviços ou reestruturar áreas existentes. A Disciplina de Gestão de Projetos em Unidades de Informação ampliou minha visão com relação a administração de unidades e como podemos atuar nesse âmbito. Agradeço aqui ao meu querido Professor e também orientador de Trabalho de Conclusão de Curso Roniberto Morato do Amaral, por transmitir de forma simples e detalhada sobre uma disciplina tão presente no cotidiano do profissional atuante. Metodologia da pesquisa científica: Foram dois momentos importantes para explorar o conteúdo da Metodologia de pesquisa científica, o primeiro com a professora Ariadne Chlöe Mary Furnival, pude perceber o lado humano da pesquisa, a necessidade de buscar esclarecer ou relatar fatos, como ser capaz de construir um conhecimento através da pesquisa e quais ferramentas utilizar. No segundo momento, com o professor Sérgio, pude então conhecer melhor da estrutura, como apresentar a pesquisa cientificamente, dentro dos padrões e necessidades para que o conhecimento construído seja realmente produto final de uma pesquisa científica. Hoje falo muito sobre essas questões em meu trabalho e só posso agradecer aos professores por trabalharem tão bem uma disciplina tão relevante e por alguns difícil de se praticar corretamente. 293 Teoria geral da administração aplicado a unidades de informação: Foi uma disciplina que me agradou muito, pois administração é uma área em que me sinto confortável e que gosto de aplicar. Poder conhecer a base da administração, o que seus teóricos relatam e poder relacionar tais informações com a minha profissão foi realmente importante. Mais uma vez agradeço ao meu professor Roniberto Morato do Amaral. Experiências extra-curriculares na graduação Ao iniciar o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação consegui vaga como estagiária na Biblioteca Comunitária da UFSCar, BCo, iniciei as atividades no Departamento de Processamento Técnico e permaneci na instituição aproximadamente por um ano e meio. Dentro do Departamento pude trabalhar com catalogação de periódicos e todos os serviços relacionados a este meio, como permuta, doação e organização. Logo em seguida fui designada para trabalhar com catalogação de multimeios, também aprendi sobre tesauros e como registrar os itens no sistema utilizado pela Biblioteca. Minha saída do estágio justifica-se pela oportunidade de bolsa de iniciação científica com o professor Sérgio Luis da Silva, para auxiliar em um projeto de desenvolvimento e monitoração de uma base de dados para auxiliar na coleta e disseminação de informação crucial para os profissionais do Departamento de Engenharia de Produção da USP – São Carlos. Mantive-me na iniciação científica cerca de um ano. Procurei conhecer várias possibilidades de atuação, dentre elas, estagiei também na Fazenda Santa Maria do Monjolinho, local em que passaria o último ano de graduação e finalizaria minhas experiências como estagiária. Na fazenda tive contato com restauração e manutenção de acervo, conhecimentos relevantes para a área, mas teoricamente ainda não trabalhadas intensificamente na grade curricular dos cursos de Biblioteconomia. Tive contato também com o monitoramento e atendimento à escola, pois por se tratar de uma fazenda histórica são realizadas excursões escolares e pude vivenciar essa vertente. Na mesma época atuei também como monitora de uma disciplina de extensão, relacionada a uma ferramenta extremamente importante para nossa profissão e que faço muito uso da mesma na Biblioteca em que atuo, o MARC-21, disciplina oferecida pela professora Zaira Regina Zafalon, a expe- 294 riência de monitoria foi extremamente relevante, absorvi conhecimento de forma tal que provavelmente como aluna somente não seria capaz de reter. Ao encerrar a graduação minha vida profissional tomou rumo, diferente do esperado, devido a questões familiares assumi responsabilidades distintas do que planejava para minha profissão. Vivências profissionais Devido a questões pessoais precisei auxiliar na empresa de transportes da qual meu pai era sócio, atuei na área administrativa, porém consegui relacionar diversas atividades com meu fazer profissional, como por exemplo, a organização de documentações, pesquisas de mercado e seleção de material relevante para a área. Após dois anos atuando na empresa decidi me dedicar a minha área e percebi a necessidade de retornar aos estudos e pesquisas para melhor me encaixar no mercado de trabalho. Mestrado em ciência, tecnologia e sociedade Em 2012 senti a necessidade de me envolver com a área, porém de uma forma diferente, a Gestão do Conhecimento sempre me agradou e despertou interesses em aprofundar o assunto. Resolvi então participar do processo seletivo para Mestrado no Departamento de Ciências da Informação na área de Ciência, Tecnologia e Sociedade. Foi gratificante conseguir passar no processo seletivo e para me auxiliar na construção de algo tão importante pedi orientação da nossa estimada Reitora, Professora Doutora Wanda Hoffmann, na época além de professora do departamento, também era diretora do Centro de Estudos em Ciências Humanas – CECH. Minha dissertação recebeu o título de Gestão do conhecimento: uma proposta de modelo para associações empresariais e baseou-se no estado-da-arte em Gestão do Conhecimento, para estruturar um modelo de Gestão do Conhecimento que proporcione a geração e troca de conhecimentos externos capazes de auxiliar no mecanismo de tomada de decisões. O modelo proposto demonstrou os processos de geração do conhecimento, como filtrar, divulgar, armazenar e recuperar tais conhecimentos, tendo como base as 295 características e necessidades relacionadas às Associações Empresariais e as empresas que a integram, e propor mecanismos de análise da utilização afim de proporcionar ferramentas para classificar os níveis de melhoria na aprendizagem organizacional e conjuntamente no desempenho da organização, também é definido o papel dos membros participantes da Associação para cada etapa, demonstrando a importância do fator humano para uma efetiva Gestão do Conhecimento. Como resultado final foi obtido um modelo de Gestão do conhecimento composto por 8 etapas: Geração do Conhecimento; Filtragem; DSI para empresas; Armazenagem; Utilização; Tomada de Decisões; Desempenho Organizacional e Profissionais do Conhecimento, demonstrado no Infográfico a seguir: Infográfico 1 – Proposição de modelo de Gestão do Conhecimento para Associações empresariais Fonte – Antochio (2014). Junto à Pós-graduação, também realizei outras atividades profissionais, fui Bibliotecária na Faculdade de Medicina de Barretos, posição que me mostrou as dificuldades de gerenciar uma unidade de informação e de se fazer entender como líder do departamento, também aprendi muito sobre a área médica e as formas de se trabalhar pesquisa científica no setor. 296 Logo após a Faculdade de Medicina, passei em um processo seletivo para ser Agente Local de Inovação no SEBRAE de Campinas e atuar como ponte de informação para as empresas. Propondo projetos, inserção de atividades administrativas, atualização de informações sobre a área de atuação de cada empresa, entre diversas outras atividades, foi um processo enriquecedor, do qual apreciei participar, porém havia prazo determinado da atividade e busquei nova fonte de renda, participei do processo seletivo da Rede SESI e fui chamada para atuar na Biblioteca Escolar da cidade de Amparo. Profissão atual, bibliotecária da rede SESI – SP No dia 14 de maio de 2014 iniciei o trabalho, que seria para mim uma conquista e uma realização. Ao realizar a prova do processo seletivo não imaginei que trabalhar em uma Biblioteca escolar poderia ser tão gratificante e revigorante. Além da atuação geralmente exigida para o profissional, como catalogação, aquisição, organização do acervo, atendimento aos usuários, o SESI também propõe atividades de incentivo a leitura, como contar histórias, elaborar teatros junto aos alunos e realizar atividades de pesquisa orientada com o auxílio do corpo docente para melhor atender e abordar e conteúdo necessário a cada área do conhecimento. No início a maior dificuldade foi harmonizar a interação com os alunos, fazer com que compreendessem a utilização do espaço de forma lúdica, mas que também não descaracterizasse outros critérios relevantes da biblioteca, como conversas ponderadas, conservação do espaço e das obras, entre outros. Sou Bibliotecária do Centro Educacional SESI 356 da cidade de Amparo e por mais que meus interesses acadêmicos tenham sido completamente diferentes, sinto que agora estou realizada profissionalmente, meu trabalho exige muita dedicação e dinamismo. Atuamos em diversas frentes e projetos realizados pela instituição, possuímos metas, como atendimento, empréstimos e catalogação, realizamos todo mês relatórios e portfólios das atividades, o acervo deve ser cuidado e como nosso público alvo possuem faixa etária que varia entre 6 a 17 anos precisamos organizar e verificar o acervo rotineiramente. Mas o que parece um tanto exaustivo, na verdade não se compara com a alegria das crianças ao entrar e ver novidades na Biblioteca, o caloroso “bom dia” que recebemos, ter certeza de que faço meu papel como 297 profissional e que posso considerar que sou a “ponte” ligando os alunos, professores e funcionários às informações que realmente precisam. Todo ano realizamos em abril a SELIBI, Semana do Livro e da Biblioteca, é um projeto grandioso com o objetivo de incentivar a leitura por prazer, utilizar como marketing dos serviços da biblioteca e também despertar o interesse pela cultura. São realizados na SELIBI, saraus, teatros, exposições, vídeos elaborados pelos alunos, companhias de dança e teatro da cidade que entro em contato para se apresentarem, é realmente um trabalho muito rico, que envolve planejamento e horas de dedicação, mas que fazem toda a diferença para toda a instituição. Cada projeto ou atividade de incentivo a leitura, procuro trabalhar de forma lúdica e palpável para todas as idades, trabalho com fantoches, teatros. A imagem a seguir representa o dia de leitura de histórias envolvendo o alfabeto, foram realizadas atividades lúdicas e interação dos alunos com fantoches, depois da atividade a busca por livros de poesia e jogos musicais aumentou consideravelmente. Para os adolescentes foi elaborada a cena de um crime baseado no Livro de Agatha Christie “Um corpo na Biblioteca”, No dia da atividade conversamos sobre a escritora, sua trajetória de vida, em seguida mostrei alguns exemplares de suas obras e seguimos para a atividade. Elaborei um texto baseado no livro para que os alunos desvendassem os mistérios. Acabo trabalhando com decorações e cenários para envolver ainda mais os jovens. Foi gratificante ver o interesse de todos em participar e conhecer outras histórias do gênero mistério. O Halloween também é uma data interessante para se trabalhar de formas diferentes. Elaborei atividades de acordo com a faixa etária e foram momentos maravilhosos com os alunos e professores. Além das histórias contadas, também ajudei a preparar o desfile de halloween, um momento de lazer para todos. Outro grande projeto da Rede SESI é o incentivo para os jovens a conhecerem e aprimorarem seus conhecimentos sobre robótica. Os alunos do 6°A ao 9°A do Ensino podem competir na FLL (First Lego League) e além de trabalharem no robô e nos desafios impostos para ele, deve também trabalhar em um projeto de pesquisa para solucionar algum problema, cada ano o tema de pesquisa é diferente, para o ano de 2017 o tema será água. Sou mentora da equipe, ou seja, auxílio em diversas etapas e acompanho a equipe na competição, por ser bibliotecária acompanho e desenvolvo atividades 298 que facilitem a construção do projeto de pesquisa. Nossa equipe já ganhou 2 troféus de melhor pesquisa nas competições que participamos. Em janeiro os alunos do SESI retornaram das férias e para recepcioná-los de forma prazerosa e diferenciada, trabalhei atividades e decorações com o tema da série Harry Potter. Realizei leituras de trechos e Quiz sobre os livros. Foi algo inesperado para os alunos e todos adoraram participar. O que me encantou no trabalho em Biblioteca Escolar é justamente a pluralidade de atuações, poder auxiliar em diversas frentes de conhecimento e proporcionar atividades culturais para os alunos. Quando entrei no curso de Biblioteconomia estava completamente voltada para outra área, mas depois que comecei a trabalhar como bibliotecária escolar acredito ter encontrado meu espaço. Aos ingressantes, formandos ou profissionais atuantes, deixo um conselho, sempre mantenha uma janela aberta, nunca se sabe as surpresas e alegrias que ela pode nos trazer. Congruência entre o ensino na graduação e o percurso profissional Os quatro anos de graduação me trouxeram informações, conhecimentos e experiências na área que foram e ainda são de grande importância para minha profissão e também para o meu viver. Foram anos também de dedicação e de lutas, lembro-me da época em que discutíamos a necessidade de uma disciplina para trabalhar a criação e organização de coleções, algo imprescindível do cotidiano do profissional, mas que ainda não possuía um momento somente desse assunto para se trabalhar. Meus anos de graduação foram de 2007 a 2010, pude aproveitar diversas coisas durante minha passagem na UFSCar e todas as disciplinas foram relevantes para construir a profissional que sou atualmente. Acredito que se não para todos, mas para grande maioria, existem algumas disciplinas e professores que nos marcam e acabamos inserindo ensinamentos e até certos comportamentos na nossa atuação. As disciplinas que citei anteriormente, Fundamentos de Biblioteconomia e Ciência da Informação, Linguagens Documentárias, Representação Descritiva, Usos e Usuários da Informação, Informação para Competitividade Empresarial, Gestão de Projetos em unidades de informação, Metodologia da pesquisa científica e Teoria geral da administração aplicado a unidades de informação e os pro- 299 fessores responsáveis por cada uma dessas áreas na época foram essenciais para minha vida profissional e sou capaz de correlacioná-las todo dia na Biblioteca que trabalho. Analisando a grade curricular do curso atualmente, conseguir perceber algumas mudanças e inserções de disciplinas que são cruciais para a atuação e que farão a diferença para os novos profissionais que se formarão e já se formaram com esta nova grade, como por exemplo, Leitura e cultura, Gestão de coleções e do patrimônio em unidades de informação, Repositórios institucionais e gestão de documentos eletrônicos. Todas as disciplinas envolvem questões rotineiras de qualquer profissional da informação e realmente trarão grandes benefícios para os graduandos. Como todas as áreas e cursos, a constante alteração e a agilidade das informações que possuímos hoje, exige do profissional a freqüente atualização, consequentemente os cursos também precisam conhecer novos ares, ampliar disciplinas, alterar formatos para que seu objetivo final, o de construir um profissional de excelência, seja alcançado com êxito. Referências ANDRADE, M. M. de. Introdução à metodologia do trabalho científico: elaboração de trabalhos na graduação. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2007. ANTOCHIO, M. Gestão do conhecimento: uma proposta de modelo para associações empresariais. São Carlos, 2014. Dissertação (Mestrado em Ciência, Tecnologia e Sociedade) – Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2014. SILVEIRA, F. J. N. da. Biblioteca como lugar de práticas culturais: uma discussão a partir dos currículos de Biblioteconomia no Brasil. 2007. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) – Escola de Ciência da Informação da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2007. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS. Grade curricular. São Carlos, 2017. Disponível em: http://www.dci.ufscar.br/biblioteconomia-e-ciencia-da-informacao/ grade-curricular. Acesso em: 23 fev. 2017. 300 Foto: Waldeck Schutzer ENTRE PASSAGENS, BAGAGENS E UM PORTO: UM PERCURSO NA BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO PEDRO IVO SILVEIRA ANDRETTA* Partidas: início de um percurso... Ao me deparar com o convite para escrever este texto fui tomado de uma imensa alegria. Alegria essa em função da dupla oportunidade: a primeira, de poder colocar no papel as memórias que a saudade evoca, e a segunda, pela oportunidade de refletir sobre a prática docente e acadêmica na Universidade Federal de Rondônia (UNIR) e na Ciência da Informação. Passada uma década desde que tomei contato com a Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) e completados dois anos de exercício docente em Porto Velho, cabe um olhar retrospectivo. Cabe pensar as passagens vivenciadas nesse tempo, quais “outros” constituíram o meu “eu” e quais as bagagens aprendidas foram essenciais para o “eu” da atualidade, e desse modo também, no meu modo de ensinar e pensar a Biblioteconomia. Olhar retrospectivamente minha passagem pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) traz uma nostalgia que somente aqueles que viveram e curtiram intensamente esse privilégio podem entender. De modo igual, somente meus contemporâneos de curso poderiam entender, por exemplo, o que se configurou como o ponto de encontro dos alunos no “LIG da Biblio”, a aventura de ir a um Encontro Re- * Mestre em Ciência, Tecnologia e Sociedade (UFSCar), Mestre em Linguística (UFSCar), Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2010). Docente na Universidade Federal de Rondônia (UNIR) desde 2014. Contato: pedro.andretta@unir.br. 302 gional de Estudantes de Biblioteconomia, Documentação, Ciência e Gestão da Informação (EREBD) – com os ônibus da UFSCar, o subir e descer escadas do Centro de Educação e Ciências Humanas (CECH), seja para conversar, seja para colher assinaturas com a secretária Rosângela Castilho, o percurso longo para o início da Empresa Júnior de Biblioteconomia – InfoJr, as aulas com a Profa. Nádea Gaspar e a Profa. Vera Boccato, ou ainda outros os espaços de socialização que se constituíram ao passar dos anos como: Siri Cascudo, Tio Pepe, Pastel na Amélia (em frente ao cemitério) e bar do Amaral. Lembranças boas que causam saudade de um tempo bom! Neste exercício de retomar lembranças, de recuperar as influências e os acontecimentos que marcaram meu percurso de formação na UFSCar, e como esses proporcionaram a produção de sentidos, norteando meu pensar e agir na Biblioteconomia, apresentarei a exposição em quatro seções. Nas primeiras duas – “As primeiras passagens” e “Guardando bagagens” – retomarei meus anos de formação no curso; nas outras duas, notadamente, “Malas prontas para novas passagens!” e “Em um novo porto... distante”, as aprendizagens finais na UFSCar e a prática como bibliotecário e docente. Ao final, concluo este relato de experiência com a seção “Entre idas e vindas”. Sem mais delongas, começo a viagem. As primeiras passagens Ao pensar “as primeiras passagens”, vários sentidos são invocados, tais como: o passe para ir, o ato de passar, o lugar por onde se passa e a transição. Sentidos esses que correm do mais concreto – encarnado na materialidade plural do bilhete – até o mais simbólico, intangível e irrepetível, o efeito da mudança. Nesse contexto, recordo-me de memórias concretas e simbólicas vividas no decorrer dos anos de formação, e que apesar do tempo e da falta de registro, permanecem. As primeiras recordações que me tocam, de passagens em seu sentido concreto, são as idas e vindas às rodoviárias nas filas nos guichês para comprar a passagem Salto-Campinas-São Carlos e seu reverso. Não posso me esquecer da frase tão emblemática ouvida nos apertos dos ônibus: “um passinho para trás” e as integrações com cartão de passes da Athenas Paulista no terminal e na escola Álvaro Guião. Ficam latentes também as listas para as 303 viagens animadas aos EREBDs e ENEBDs1 e a oportunidade de voar para Argentina, de modo a conhecer e estudar, na Universidad Nacional de La Plata (UNLP). Esses tantos registros de passagens, passaram. As demais, passagens de sentido simbólico, trazem algumas recordações que cito: o trote de calouro, o tempo na Biblioteca Setorial de Estatística, a recepção dos meus primeiros “bixos”, as extensões e estágios na Biblioteca Comunitária (BCo/UFSCar), a publicação do primeiro artigo acadêmico (BELISÁRIO; ANDRETTA, 2008, p. 306-313), a participação nos Congressos de Iniciação Científica (CIC/UFSCar), a organização das jornadas, as aprendizagens da Biblioteca Municipal de São Carlos e reuniões do NIT2, a fundação da Empresa Júnior, a apresentação do Trabalho de Conclusão de Curso, a formatura. A lista de passagens simbólicas vai longe, se estende, se perdem de vista no horizonte dos quatro anos de graduação que se prorrogaram em outros quatro anos, extras, na passagem pelo Mestrado em “Linguística” (PPGL/UFSCar) e em “Ciência, Tecnologia e Sociedade” (CTS/UFSCar). Desse tempo de primeiras passagens, recordo com especial carinho a passagem na implantação e implementação da Empresa Júnior de Biblioteconomia e o Blog InfoBCI; dois empreendimentos coletivos que marcaram meus anos finais de graduação na UFSCar. Com o passar do tempo, infelizmente, tomei um distanciamento dessas propostas, mas o legado permanece intrínseco em mim. Julgo que é pertinente esboçar algumas considerações a respeito da Empresa Júnior de Biblioteconomia (InfoJr), que tal como entendo, surgiu a partir de discussões e de um trabalho final de disciplina optativa, “Gestão de Projetos” no 2º semestre de 2007, ofertada pela Profa. Wanda Aparecida Machado Hoffmann3. A disciplina foi oferecida para pouquíssimos alunos, que traindo a minha memória e valendo-me da verificação dos slides da apresentação, cito: Ainsten Baldan, Carol Periotto, Maira Bassoli e Vinicius Camargo e eu. Algum tempo mais tarde, início de 2009, Tiago Fernandes Andrade e outros muitos, dos quais me recordo principalmente de alguns – Renan Carvalho Ramos, Débora Ninin e Ardala Kochani – tomaram a frente para a efetivação da proposta, correndo com a elaboração de reuniões, estatutos e recursos. Nesse mesmo ano, fui selecionado para o intercâmbio pelo Programa 1 2 3 Respectivamente, Encontro Regional dos Estudantes de Biblioteconomia, Documentação, Ciência e Gestão da Informação e Encontro Nacional dos Estudantes de Biblioteconomia, Documentação, Ciência e Gestão da Informação. Núcleo de Informação e Tecnologia de Materiais. Docente do Departamento de Ciência da Informação (DCI/UFSCar). 304 Escala da Asociación de Universidades Grupo Montevideo (AUGM) e passei a acompanhar os progressos com uma certa distância, sem me envolver muito, porém, mesmo antes de partir, dei minha pequena colaboração com o primeiro minicurso “Tirando proveito da web: ferramentas e fontes para BCI”. Ao retornar à UFSCar, voltei a colaborar efetivamente com a Empresa Júnior, assumindo a função de “Presidente”, contando sempre com o apoio, para tudo, de Iruama de Oliveira. Sua ajuda, nessa época, possibilitou o levantamento de recursos com normalizações e suporte a eventos. Não posso deixar de ressaltar os muitos acadêmicos que colaboravam com a Empresa Júnior, e hoje fico feliz ao ver que ela segue – ainda que com alguns intermináveis problemas de estatuto e demais burocracias. Talvez, o iniciante de hoje no curso de BCI e tão mais, na própria Empresa Júnior, não consiga imaginar o tamanho da articulação de esforços para a criação e manutenção da InfoJr. O Blog InfoBCI (2016), diferentemente da InfoJr, surgiu fora da UFSCar, em um EREBD a partir de um contato meu com Laura Inafuko, acadêmica de Biblioteconomia da UNESP, e Renan Carvalho Ramos, meu “veterano” de curso. A proposta do blog consistia-se como uma fonte de informação em Ciência da Informação, de modo a listar links de outras fontes e blogs, além de divulgar as publicações acadêmico-científicas em Ciência da Informação, indexando publicação por publicação em uma postagem. A lógica e a estrutura eram bem simples e pode parecer hoje, aos novos acadêmicos, um desperdício de tempo, mas em 2009, não havia iniciativa semelhante, e a Base de Dados Referenciais de Artigos de Periódicos em Ciência da Informação (BRAPCI) estava ainda engatinhando. Do blog InfoBCI, saíram uma série de trabalhos acadêmicos desenvolvidos para eventos e periódicos elaborados pela equipe (ANDRETTA et al., 2011; INAFUKO; ANDRETTA RAMOS, 2009; INAFUKO et al., 2009), que passou a contar com a colaboração de Eduardo Graziosi Silva e João Paulo Borges da Silveira e mais tardiamente, com Anderson das Neves Moreira, Emanuelle Geórgia Amaral Ferreira e Fabrício Silva Assumpção. Atualmente o blog não é atualizado com a mesma frequência, mas a ideia de elaboração de uma fonte de informação para a Ciência da Informação, foi algo que, desde o início da graduação, saltou aos meus olhos, de modo que é algo com o qual venho trabalhando atualmente. Oportunidades de passagens e aprendizagens, não faltaram e de cada pequena ou longa passagem somei bagagens as quais exponho a seguir. 305 As bagagens que guardei Ao pensar nas bagagens que guardei nesse percurso de formação, dois sentidos vem à tona: o primeiro, literal, aquele que compõe as malas para viagem; e o segundo, figurado, de experiências vividas, conhecimentos adquiridos. Do primeiro sentido, ao passar os olhos pelo meu armário vejo o convite de formatura da turma 2007-2010, os diplomas, livros que ajudei a escrever, outros que comprei e ganhei, e uma pilha de papéis, de cópias de artigos, certificados e anotações de aula; do segundo, fixados à memória, vejo o quanto aprendi e fui influenciado pelos mestres da UFSCar e outros tantos mestres, não titulados e de fora da universidade, que norteiam minha prática docente. Sem me fixar ao acúmulo de bagagens materiais, seguirei pelas bagagens imateriais; pelas marcas que ficaram nos conhecimentos apreendidos, nas experiências vivenciadas e nos valores transmitidos. No decurso de aproximadamente oito anos de formação tenho muito a agradecer, de tal modo que não caberia neste relato, porém, alguns foram imprescindíveis: professores, amigos de turma e bibliotecários. Comecemos pelos últimos. No transcorrer do curso de Biblioteconomia da UFSCar, ao menos no meu tempo, era bastante fácil encontrar estágios nos mais diversos setores de modo a possibilitar a troca de conhecimentos com os colegas iniciantes e já iniciados no curso. Dessas trocas, destaco a figura importante nos estágios, o bibliotecário, e mais comumente, as bibliotecárias. Dessas, recordo da sorte que tive em atuar muito próximo a Deise Belisário e a Eliane Colepicolo na BCo/UFSCar e a Fátima Ciapina na Biblioteca “Alfredo Américo Hammar”4. Conheci também outros profissionais, excepcionalmente bons no que faziam, porém, os que destaco aqui foram verdadeiras incentivadores e muito abertos na arte de ensinar e de promover condições para a aprendizagem profissional. Dos alunos do curso de Biblioteconomia, recordo-me da união e integração. Integração essa fomentada pelas tradicionais recepções dos calouros, pelas semanas acadêmicas e demais palestras, além das práticas de estágio e encontros no Pão de Queijo Mineiro – PQ, que além de lanchonete, servia de ponto de espera para aqueles que moravam em outras cidades e faziam uso de ônibus ou vans escolares durante o fim da noite. Acredito que tenha co4 Atualmente Biblioteca “Euclides da Cunha”. 306 nhecido grande parte dos bibliotecários formados pela UFSCar que entraram entre os anos de 2005 a 2013 devido às oportunidades de integração. Dos tantos bibliotecários que conheci, foram dois os que acompanhei mais de perto, seja pela proximidade geográfica de nossas cidades natais, seja pela afinidade com determinados docentes e temáticas de interesse, seja pelos nossos jeitos “caxias” de levar o curso, seja ainda por uma expectativa comum de crescer academicamente para além da graduação ou tudo isso junto... Refiro-me a Renan Carvalho Ramos e a Eduardo Graziosi Silva. Dois estudantes extremamente talentosos, com os quais foi possível a criação de um grupo informal de estudo e pesquisa para temas diversos, de: sistemas de gerenciamento de referências a repositórios, do Blog InfoBCI à métricas em produção científica da comunidade paulista e brasileira em Ciência da Informação (ANDRETTA; SILVA; RAMOS, 2012; ANDRETTA et al., 2012; RAMOS; ANDRETTA; SILVA, 2012; SILVA; ANDRETTA; RAMOS, 2011). Atualmente, esses dois profissionais e acadêmicos fantásticos a que me refiro aqui estão na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) e Universidade de São Paulo (USP), respectivamente, e aos quais devo muito de minha aprendizagem e horas de sono, revisando artigos e trocando ideias. As aprendizagens e vivências com os docentes mereceriam por certo um livro à parte. Todos tão singulares e apaixonados pelo que ensinavam e problematizavam, tanto que alguns eram raríssimos de ver em sala de aula, por viajarem ou esquecerem, por vezes, que deveriam aparecer para ministrar a aula, mas cada um deixou algo para somar na bagagem. Alguns ofereceram um punhado de figurinhas e ideias apresentando teóricos e conceitos, outros uns manuais e maquinetas apresentando códigos, sistemas, normas e programas, e outros ainda com verdadeiras caixas de ferramentas com teorias para ver e ler o mundo e as palavras. De tantos mestres que ensinaram tanto, enumero três do Departamento de Ciência da Informação (DCI/UFSCar) que foram e são cruciais em minha trajetória: Profa. Vera Boccato, Prof. Leandro Innocentini e principalmente, Profa. Nádea Gaspar. Três professores distintos em seu repertório teórico-analítico, contudo, muito receptivos e influentes nas escolhas das disciplinas que ministro e nas pesquisas e orientações que supervisiono atualmente. Comecemos pela Profa. Vera, sempre tão apaixonada e competente para ensinar os conteúdos relacionados a Representação Temática, trazia desde o primeiro dia de aula os planos de ensino das disciplinas carregados com leituras obrigatórias e sugeridas para cada encontro, seguindo-os rigo- 307 rosamente, além de explicar detalhadamente cada slide que apresentava. Recordo-me de inúmeras vezes de chamá-la para tirar dúvidas quanto a prática profissional e do trabalho que passou de elaboração de um micro Tesauro. Segundo ela, eu era seu “traidor favorito”, cunha dada por minha opção aos estudos em Análise do Discurso e não aos de Representação Temática, para a realização do meu Trabalho de Conclusão de Curso. Talvez hoje, do céu, ficasse feliz em saber que mesmo não tendo sido seu orientando, sigo lendo e relendo os materiais e suas pesquisas ao preparar minhas aulas de Classificação e Tesauros. Já o Prof. Leandro ministrava as disciplinas de bases de dados e bibliometria, apresentando os temas com a demonstração de exemplos práticos produzidos pelo Núcleo de Informação e Tecnologia de Materiais (NIT), de modo a conciliar teoria e práticas reais nas aulas, o que as deixavam bem interessantes. Com o meu retorno do intercâmbio, passei a acompanhar algumas das reuniões de estudos do GENIT5 com alguns alunos do Mestrado em CTS, em especial, com a companhia de Angela Emi Yanai e Maria Fernanda Oliveira, que insistiam em me fazer enveredar nas métricas. Não segui por esse caminho, embora nesse tempo tenha produzido alguns trabalhos para o 2º Encontro Brasileiro de Bibliometria e Cientometria (HAYASHI; FARIA; HAYASHI, 2013). Por fim, a Profa. Nádea, que articulava nas disciplinas que ministrava as relações da Ciência da Informação com os estudos do Discurso. Provavelmente como seu orientando de Iniciação Científica e Mestrado e mais, trabalhando com ela desde o primeiro ano do curso, sou suspeito para descrever quão generosa é como pessoa, professora e orientadora. As aulas ministradas passavam voando com teorias e exemplos, e ao final de cada uma delas éramos incentivados a elaboração de um trabalho final para ser apresentado no CIC/UFSCar e nas “Jornadas em Análise do Discurso na Ciência da Informação” que revezavam entre as cidades de São Carlos – sob organização da professora – e em Ribeirão Preto – sob organização de Lucilia Romão. Nas orientações, a Profa. Nádea, era paciente de modo a rascunhar nos papeis as partes do trabalho, explicando detalhadamente a “Arqueologia do Saber” e ao final da sessão de orientação afirmava: “está pronto seu trabalho!” Hoje se há muitos trabalhos em Análise do Discurso na Ciência da Informação, se valendo principalmente da abordagem de Michel Foucault, eles se devem a Nádea que instaurou as condições de possibilidade desses dizeres. Apesar de ser apaixonada pelos trabalhos 5 Grupo de Estudos do Núcleo de informação e Tecnologia de Materiais. 308 de Michel Foucault, não abria mão de explicar a obra de Mikhail Bakhtin e Michel Pêcheux para que seus alunos pudessem optar em qual caminho seguir. Em meu caminho, segui colocando Michel Foucault em minha bagagem, a ponto de me enveredar pelo Mestrado em Linguística. Nessa passagem somei mais e mais bagagens, retornando, também de passagem às salas de biblioteconomia, tal como explico a seguir. Malas prontas, novas passagens! O último ano do curso era sempre, para todos, um ano de crise em torno da questão: “O que fazer quando formado?”. A solução era diversa: uns estendiam o curso, puxando uma segunda ênfase e com isso mantendo o vínculo necessário para os estágios; outros já faziam as malas com destino certo para alguma biblioteca; alguns simplesmente partiam e sumiam do mapa; enquanto outros ainda se aventuravam em prestar o Mestrado. Na época, na UFSCar, não usufruíamos do Programa de Pós-graduação em “Ciência da Informação”, sendo frequente, a opção pelos Mestrados da própria “casa”, em migrações para outros programas como CTS, Linguística e Educação, e com mais raridade, Engenharia de Produção, Engenharia Urbana, Imagem e Som ou Estudos Literários. Os meus meses finais do curso também giraram em torno dessa crise, de modo que passei boa parte deles estudando para as provas do Mestrado em Linguística e CTS, ao mesmo tempo que concluía a monografia. Optei pela Linguística, por incentivo da Profa. Nádea, uma vez que em anos anteriores também incentivou outros de seus orientandos a seguir por esse caminho, a saber: Hélio Pajeú, Andrea Pereira e Livia Reis. Alguns amigos da minha turma prosseguiram, nesse mesmo ano, pelo CTS como Felipe Mussareli, Ricardo Biscalchin e Livia Mello. Todos esses, hoje, acadêmicos ou bibliotecários em instituições como UNESP e UFSCar. Na Linguística, sob orientação da Profa. Luzmara Curcino6, passei empreender meus trabalhos em torno da articulação teórica entre a Análise do Discurso e a História Cultural da leitura, problematizando a crítica amadora contemporânea de Machado de Assis em blogs. Temática um tanto distante dos interesses da Ciência da Informação, assim como as diferentes disciplinas 6 Docente do Departamento de Letras (DL/UFSCar) e do Programa de Pós-Graduação em Linguística (PPGL/UFSCar). 309 cursadas que abordavam principalmente a relação do discurso e o sujeito. Viajar por esse porto sem ter nas malas todas as bagagens que subsidiassem esse percurso, impôs alguns desafios, amenizados em grande medida com a participação no “Laboratório Interdisciplinar de Estudos das Representações discursivas do leitor brasileiro contemporâneo” (LIRE). O olhar “para fora” possibilitou refletir os documentos, itens bibliográficos, para além de sua representação temática e descritiva, e tomar as pesquisas sobre as práticas de leitura para além dos questionários, que eram (e são) bem comuns aparecerem nos TCCs da Biblioteconomia. Os anos do Mestrado na Linguística passaram voando, desse período recordo-me da colaboração como professor de redação no Cursinho Pré-Vestibular da UFSCar, da minha atuação como bibliotecário na “Casa do Pinhal” e da colaboração na organização da “V Jornada Nacional e I Internacional em Análise do Discurso na Ciência da Informação”. Além disso, relembro-me também de ajudar na graduação junto às disciplinas da Profa. Nádea, como também, conjuntamente com a professora e seu grupo de estudo e pesquisa “Laboratório de Análise do Discurso de Imagem” (LANADISI), a organizar e dar suporte no Curso de Especialização “Discurso e Leitura de Imagens”. A concretização da especialização era o desabrochar de todo um trabalho orientado, coordenado, semeado, pela Profa. Nádea, que resultou em um livro muito bonito de se ver e ler (GASPAR; PAJEÚ; MUSSARELLI; ANDRETTA; TORRES; PEREIRA, 2013). Recordo-me da escolha, pela a pintura “O semeador” de Vincent van Gogh, feita pela professora para compor a imagem da “V Jornada”. Hoje, ao pensar nessa imagem e no percurso da Profa. Nádea com seu grupo, formado por seus orientandos de biblioteconomia, em especial: Hélio, Felipe, Andréa, Livia e eu, vejo o cumprimento de uma missão docente. Esse exemplo somou muito a minha bagagem e marcou muito a vida de todos do grupo, afinal, éramos uma família. Antes mesmo de concluir o Mestrado na Linguística, e sem pensar muito, me inscrevi novamente para o Mestrado no CTS. A especialização despertou novas sementes, os cursistas passaram a manifestar interesse pelo Mestrado, e em grupo passamos a dedicar um tempo de estudo para as provas. Desses estudos, Felipe seguiu para o Doutorado, e no Mestrado entraram Priscila Motta, Mauricio Failache e eu. Concluído o Mestrado na Linguística segui então para o Mestrado no CTS. No CTS, novamente sob orientação da Profa. Nádea, agora empreendendo meus estudos nos leitores e práticas de leitura inscritas na obra ma- 310 chadiana a partir da perspectiva arqueológica de Michel Foucault, marcava uma nova fase. Fase da qual saí da biblioteca e passei a atuar como Professor Substituto no curso de BCI da UFSCar, ministrando disciplinas de: “Introdução à Administração para Unidades de Informação”, “Gestão de processos para geração de produtos e serviços”, “Orientação e Normalização Documentária” e “Discurso, História e Memória”, esse último dentro do “Programa de Estágio Supervisionado de Capacitação Docente” (PESCD). Nessa fase também passei a acompanhar alguns Trabalhos de Conclusão de Curso e a participar de bancas de alunos, ao mesmo tempo em que percebia que era preciso seguir para novas passagens. A passagem pelo curso de BCI na UFSCar foi uma grande viagem, na qual fui passageiro e tripulante, aprendendo sempre. Também nessa época a Profa. Nádea fechava seu itinerário, deixando uma lição importante na dedicatória de um dos tantos livros que me foram presenteados: “Avance sempre, para você, mas nunca se esqueça de olhar para quem está começando!” Já era hora de seguir, tomar o timão e avançar para novos espaços, conhecer um outro porto. Em um novo porto... distante Em meio ao Mestrado em CTS tomei conhecimento de um concurso com quatro vagas para o recente Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal de Rondônia (UNIR). Convidei todos os bibliotecários que conhecia para viajar comigo, mas existiam medos velados de assumir essa embarcação, acabei indo sozinho. As experiências do (per)curso e torcida foram mais que suficientes para que conquistasse a vaga e encontrasse meu porto, na distante Porto Velho, deixando das pessoas de São Carlos inúmeras saudades. A realidade de Porto Velho e da UNIR em muito se diferenciam de São Carlos e da UFSCar. Pela cidade, por todos os lados, vemos construções simples, menos verde, pouco vento, muito calor. A universidade, em continua construção e mudança, a procura de uma consolidação, com grande visão, enfrenta, diariamente, constantes desafios. O Departamento de Ciência da Informação tal como o curso de Biblioteconomia da UNIR são ainda muito jovens, tendo iniciando suas atividades em meados de 2008, de tal modo que somente há dois anos obteve seu quadro completo, com onze docentes, contando ainda com aqueles de licença saúde e afastados para doutoramento... 311 Nesse tempo aqui, de maneira geral, vejo que apesar das inúmeras dificuldades, o Departamento de Ciência da Informação vem crescendo e posso ver a minha marca e a diferença de minha formação híbrida na UFSCar. Essas marcas vão desde a elaboração do site do Departamento, a atuação em sala de aula, pesquisas, extensão e outros, como atividades de implantação de tecnologias digitais e trabalho pedagógico-administrativo como Presidente do Núcleo Docente Estruturante/Coordenação. Em sala de aula, tenho a oportunidade de ministrar disciplinas que me fascinavam durante o tempo de formação, atuando em diferentes frentes, desde o que poderíamos conceber como “Fundamentos Teóricos da BCI”, “Organização e Representação da Informação”, “Políticas e Gestão de Unidades de Informação” até “Tecnologias da Informação e Comunicação”. De tal modo que anualmente estou responsável pelas disciplinas de “História da Cultura e dos Registros do Conhecimento”, “Classificação I”, “Tesauros e Ontologias”, “Sistemas de Informação nas Organizações”, “Formação e Desenvolvimento de Acervo”, “Introdução à Informática e Planejamento e Geração de Base de Dados”. Nessas disciplinas exijo o máximo dos alunos, muito mais inclusive do que me foi exigido durante meus tempos de estudo, passando fichamentos e questões online semanais, listas com centena de exercícios de concursos, seminários e provas. Minha expectativa aqui não é formar bibliotecários como eu fui, mas melhores. Um avanço didático que destaco aqui foi a incorporação ao curso de ambientes virtuais de aprendizagem, seja fazendo uso do Moodle, como também, de diferentes sistemas, inclusive para a disciplina de tesauros. Após ter cursado toda a graduação utilizando o Moodle, ao chegar aqui, verifiquei que na UNIR essa tecnologia era exclusiva para os cursos da Universidade Aberta do Brasil (UAB). Assim, meses de trabalho foram dispensados para que pudesse implantar uma versão do Moodle para apoio ao ensino presencial no curso de Biblioteconomia. O Departamento de Ciência da Informação da UNIR é o único que conta, atualmente, com a instalação desse ambiente como ferramenta de apoio para aulas presenciais e isso tem chamado a atenção de inúmeros professores de diferentes departamentos, até mesmo de outros campi. Dessa forma, a demanda para o uso desse ambiente, depreende do meu empenho, e de colaboradores, na oferta de cursos de extensão aos docentes para o uso da plataforma. Nas pesquisas e orientações, sinto ainda não ter conseguido estabelecer um grupo de estudos com os acadêmicos ou no mais, delimitar um foco de 312 trabalho. Os Trabalhos de Conclusão de Curso em geral variam de temáticas abordando desde leitura, aplicações métricas, utilização de tecnologias digitais e gestão e avaliação de bibliotecas, que refletem em grande medida a série de interesses e possibilidades de estudos que me chamavam a atenção durante minha formação, e o perfil das diferentes frentes que leciono. Das conquistas em terras longínquas, destaco também a aprovação e conclusão de orientação de dois orientandos via Iniciação Científica e dois projetos de sucesso: Portal NÓS-UNIR (UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA, 2016) e Harvester in Library and Information Science (HiLIS) (UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA, 2016). O Portal NÓS-UNIR, busca contribuir para divulgação dos resultados de pesquisas alcançados pelos docentes entre os anos de 2000 a 2014, oferecendo apoio a inovação, de modo a apresentar redes de formação, atuação e interesses de pesquisa dos docentes distribuídos nos diferentes campi e núcleos. Além disso, conta com relatórios de produção divididos por departamento e sistema de busca de produção bibliográfica. A estrutura e metodologia empregada para a elaboração da plataforma deve ser publicada em breve e pretende ser uma contribuição para que os bibliotecários adotem iniciativas semelhantes em suas bibliotecas universitárias e especializadas. Já o projeto Harvester in Library and Information Science visa colaborar com as práticas de ensino, pesquisa e extensão junto a comunidade acadêmica e profissional em Ciência da Informação, subsidiando a busca de artigos científicos. Para tanto o sistema reúne registros de publicações em periódicos de acesso livre na área de Ciência da Informação e relacionados que utilizam o protocolo Open Archives Initiative Protocol for Metadata Harvesting (OAI-PMH). Atualmente o sistema promove acesso a 76466 registros de artigos on-line, provenientes de 198 periódicos e complementa as opções de pesquisa para além do Base de Dados Referenciais de Artigos de Periódicos em Ciência da Informação (BRAPCI) e o do moderno Repertório da Produção Periódica Brasileira de Ciência da Informação. Assim, como o Portal NÓS-UNIR, a apresentação da metodologia empregada para a implantação e implementação do sistema será divulgado em breve para oferecer suporte a novas iniciativas pela comunidade bibliotecária. Esses dois portais refletem em grande medida as aprendizagens na UFSCar sobre fontes de informação, geração e uso de base de dados, tecnologias da informação, bibliometria e sistemas de informação em ciência e tecnologia. Aprendizagens essas que ficaram guardadas e agora constituem minha contribuição social e tecnológica para UNIR e para a Ciência da Informação. 313 Nas atividades extensionistas, as contribuições para a Ciência da Informação foram mais tímidas, focando meus esforços em projetos voltados aos docentes visando demonstrar novos horizontes para a prática de ensino e pesquisa na universidade e respondendo às demandas sociais. Desse modo, coordenei projetos como “Cursos de aprendizagem ao Ambiente Virtual Moodle” e o “I Seminário sobre Práticas e Produções Científicas da Universidade Federal de Rondônia”. Além dessas atividades, participo junto ao Grupo de Pesquisa “Migrações, Memória e Cultura na Amazônia Brasileira (UNIR)” ministrando aulas de português para os haitianos recém chegados a Porto Velho. Ademais dessas atividades, desde que cheguei estive envolvido na elaboração do novo Projeto Pedagógico do Curso de Biblioteconomia que deve vigorar em 2017. A nova grade marcará uma mudança radical com relação a atual estrutura, tornando o curso mais moderno, equilibrado e dentro das expectativas e demandas nacionais, além do que compreendo como tendências acadêmicas. Como resultado de minha formação, trouxe para a nova grade disciplinas obrigatórias como “Leitura, Escrita e Cultura” e “Linguagens Documentárias III: Tesauros e Ontologias” e optativas como “Discurso e Leitura de Imagens”, “Discurso, História e Memória”, “Ciência da Informação e Literatura”, “Linguística Documentária”, “Ciência, Tecnologia e Sociedade no Âmbito da Ciência da Informação”, “Bibliotecas Digitais e Repositórios”. Passados esses poucos anos como docente vejo que apesar das inúmeras dificuldades tem sido possível desenvolver um bom trabalho junto aos alunos de graduação no que concerne ao saber e fazer na BCI em uma região distante. No entanto, vejo também a necessidade de retomar contatos e ver o que está sendo desenvolvido fora daqui para empreender trocas de modo a contribuir ainda mais na formação dos profissionais nortistas, o que justifica minhas idas e vindas a UFSCar assistindo eventos e participando de bancas. Entre idas e vindas Ao sinalizar nas páginas anteriores algumas passagens e bagagens na UFSCar e descrever alguns legados para a Biblioteconomia da Região Norte, e particularmente para os futuros bibliotecários de Rondônia, percebo que nada foi por acaso. Noto também quanta coisa se passou, quantas pessoas foram importantes, quanto vivi, quanto resumi, quantos não pude agradecer 314 nominalmente no decorrer dessa exposição, quanto as idas e vindas constituíram o que sou e o que faço. Despedir-me dos amigos e de tantas pessoas que me marcaram em São Carlos foi necessário para que pudesse crescer e amadurecer, e o mais importante, fazer crescer a amadurecer a formação e prática da Ciência da Informação. A saudade da família, dos amigos e até mesmo de casa sempre ocorre. Mas logo em seguida o pensamento “é aqui que preciso estar!” ocupa o lugar dessa saudade. Tendo aprendido tanto com inúmeros mestres e com as oportunidades que me foram dadas desde a minha chegada à UFSCar, entendo como dever moral, como bibliotecário e docente, passar aos outros aquilo que aprendi e descobri. Para concluir, recordo-me de uma canção de Renato Russo, uma de minhas preferidas, “Tempo perdido”, Todos os dias quando acordo Não tenho mais o tempo que passou Mas tenho muito tempo Temos todo o tempo do mundo Assim, ainda que não tenha mais os dezessete anos de quando comecei a jornada, ainda preservo no espírito a vontade de saber e fazer, e que embora “distante de tudo”, há aqui espaço para fazer diferente e coragem para seguir sempre em frente, na certeza que nada foi tempo perdido. Referências ANDRETTA, P. I. S.; SILVA, E. G.; RAMOS, R. C. Aproximações sobre produção, produtividade e colaboração científica entre os departamentos de Ciência da Informação do Estado de São Paulo. 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Na maioria das vezes optamos por essa carreira porque estamos ainda meio perdidos, ou porque gostamos das bibliotecas, ou porque é um curso de graduação pouco concorrido e a pressão e vontade de passar no vestibular é muito grande, principalmente quando estamos concluindo o ensino médio. Optei por prestar o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade de São Carlos – BCI/UFSCar, que faz parte do Departamento de Ciência da Informação (DCI/ UFSCar), por todos esses motivos e, além disso, porque tenho uma tia bibliotecária na qual me inspirei. Ingressei no curso em 2007. No primeiro ano tive muitas dúvidas sobre a carreira, o que é muito comum na nossa área, por isso deixei algumas disciplinas de lado e comecei a fazer cursinho pré-vestibular. Com alguns meses de cursinho, resolvi me engajar no curso mesmo! Acho que muitos de nós passamos por essa crise, por ser uma carreira pouco prestigiada e muitas vezes nem ao menos conhecida por quem não * Mestre em Ciência da Informação (UFSCar) e Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2007). Docente no Claretiano desde 2018. Contato: tamie@usp.br. 318 é da área. Mas o curso foi ficando interessante, os docentes sempre muito empenhados em nos mostrar todo aquele universo da informação e, vendo o engajamento e paixão deles pela área, acabei gostando e resolvi ficar. O apoio dos docentes e secretaria, com os quais sempre pude contar, foram fundamentais. Minha grade curricular ficou desajustada devido as disciplinas nas quais reprovei por frequência no primeiro semestre, então foram necessários vários ajustes. Com isso também fiz parte de várias turmas, o que foi muito bacana, pois fiz amizades que mantenho até hoje, principalmente com a turma 2008. Se tem uma coisa que aprendi na graduação é que com calma (ou não!), tudo acaba dando certo. E se desesperar é bobeira, apesar de inevitável as vezes. No segundo ano tive oportunidade de fazer estágio na Biblioteca Comunitária da UFSCar (BCo), a biblioteca mãe do BCI/UFSCar, onde muitos alunos desenvolvem o estágio obrigatório, estágios voluntários e projetos de iniciação científica e de trabalho de conclusão de curso (TCC). Essa experiência foi muito importante e proveitosa, pois ao fazer estágio em uma biblioteca de grande porte como a BCo, pude conhecer os diversos aspectos e serviços estudados na teoria. Lá o estagiário trabalha bastante e aprende muito. Desenvolvi atividades principalmente na seção de Processamento Técnico (PT), onde conheci na prática os processos de preparo físico, classificação e catalogação, cujos aspectos teóricos estavam sendo estudados no curso. Também tive contato com os serviços da Seção de Acesso a Bases de Dados (SeABD), responsável pela orientação aos alunos no uso das bases de dados, pelo Empréstimo Entre Bibliotecas (EEB) e pela Comutação Bibliográfica (COMUT). Nos dois anos de estágio também conheci um pouco de todas as outras seções, como a Aquisição, Gibiteca, Sala Infantil, Seção de Manutenção do Acervo, sala de Coleções Especiais (Colesp), entre outros. A BCo, por ser uma biblioteca universitária e comunitária, dispondo de diversas seções e serviços, torna-se uma experiência muito importante para o graduando, que tem a oportunidade de conhecer na prática muito do que é visto no curso, inclusive ter contato com diversos tipos de usuário, como alunos de graduação e pós-graduação, em sua maioria; e docentes, alunos do ensino fundamental e médio, crianças e o público adulto em geral, formado principalmente pelos moradores da cidade de São Carlos e arredores. Na seção de PT ficava também a Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD/UFSCar), sob a responsabilidade do Prof. Dr. Roniberto Morato do Amaral, na qual fiquei um período do estágio e auxiliei nas atividades de 319 confecção da ficha catalográfica, cadastro das teses e dissertações na versão digital e disponibilização dos trabalhos online. Paralelamente a minha atuação nessa seção, desenvolvi meu trabalho de conclusão de curso, usando a BDTD como objeto de estudo, no qual trabalhei com a preservação digital das teses e dissertações. Nessa pesquisa desenvolvi uma sistemática com base em um modelo de diagnóstico da obsolescência tecnológica, construído a partir de artigos que versavam sobre a temática, seguido do desenvolvimento e aplicação de uma solução computacional para a preservação digital do conhecimento científico produzido pelos Programas de Pós-Graduação (PPGs) da UFSCar. O TCC foi o melhor momento do curso para mim, pesquisei muito, porque quis explorar uma área que não havia sido vista em disciplinas no curso, a preservação digital. Por isso foi um processo muito enriquecedor e pude contar muito com o apoio do Prof. Roniberto, então meu orientador, que me auxiliou em todas as etapas, desde o desenvolvimento do tema, até as muitas revisões durante todo processo. Foi um orientador muito presente, e isso fez com que essa etapa fosse mais prazerosa, e não quase traumática como ouço dizerem por aí. Atuei também como tutora em duas disciplinas de gestão, ministradas pelo Prof. Roniberto, visto que eu já as havia cursado. Temos no curso disciplinas com conceitos de administração e marketing, pois o bibliotecário é o administrador e gerente da biblioteca, que é uma empresa sem fins lucrativos, e tem clientes e oferece produtos e serviços de informação. A monitorias também me fizeram aprender muito, são verdadeiras revisões; ademais aprendi a administrar a turma via Moodle, fazia o controle de entregas das atividades através de planilhas e respondia quaisquer dúvidas dos alunos. Acredito que, na nossa área, devemos procurar e criar nossas oportunidades, porque elas estão aí para serem desenvolvidas. Nessa época eu era bem tímida, tinha um pouco de dificuldade em lidar com atendimento, mas o Prof. Dr. Roniberto me fez atender todos os telefonemas para que eu melhorasse nesse quesito e hoje sou muito grata por isso! Ainda no curso, pude fazer matérias eletivas, que são as ministradas em outros cursos, de outros departamentos, e como gosto muito de literatura, cursei uma disciplina do curso de Letras, chamada Literatura Infanto-Juvenil. Foi um prazer cursar essa disciplina, pois estudamos as fases do desenvolvimento da criança e do adolescente, além de clássicos literários desta faixa etária. Essa disciplina, juntamente com outras do curso, como as que tinham como ementa estudos de usuários da informação – pois temos que ter em mente que todo 320 nosso trabalho deve ser orientado de acordo com nossos usuários, ou clientes – foram importantes para uma segunda experiência de estágio que tive, na escola Cooperativa Educacional de São Carlos: Educativa. Nessa ocasião fui monitora do laboratório de informação, um anexo da biblioteca, sendo assim tive a oportunidade de conhecer a biblioteca escolar, porque apesar da BCo ser também comunitária e atender o público infanto-juvenil, o foco é o serviço universitário, e são ambientes bem diferentes. Na Educativa auxiliava crianças desde o ensino infantil até o ensino médio. Era muito gostoso acompanhar e fazer parte do desenvolvimento delas, conhecer cada etapa, de cada idade, cada uma com sua peculiaridade. Desenvolvi muita empatia trabalhando essas relações interpessoais. Esse estágio foi muito importante também para que eu desenvolvesse melhor minha comunicação e perdesse de vez a timidez. Voltando ao curso, devido a oportunidade de trabalhar com o repositório digital e o interesse pela preservação digital, tema que desenvolvi no TCC, senti que tinha mais aptidão e interesse na ênfase tecnológica e empresarial, a qual cursei. Nela pude conhecer um pouco mais da biblioteconomia fora de biblioteca, com as disciplinas de informação para negócios, conhecimento nos processos empresariais, entre outras. O curso é muito mais do que apenas fundamentos de biblioteconomia, teorias, classificação, indexação e catalogação; não que tudo isso também não seja muito importante e, sem dúvida, a base das novas técnicas aplicadas à informação em formato digital, como a “Folksonomia” – que é a indexação feita pelos usuários da informação na web – e as Ontologias, usadas na web semântica e arquitetura da informação, por exemplo, como representação do conhecimento. No que tange a área empresarial, desenvolvemos nas disciplinas atividades como mapeamentos do conhecimento em empresas para gestão da informação e do conhecimento nos processos empresarias, através do desenvolvimento de fluxogramas e manuais, por exemplo. Também contamos com disciplinas que tem como ementa patentes, informação para negócios sustentáveis, informação para competitividade empresarial, entre outras. Apesar das oportunidades no mercado de trabalho serem um pouco restritas nessas áreas, temos exemplos de grande sucesso, como a bibliotecária Iara Rezende, Gerente de informação da Natura, a qual tive a oportunidade de conhecer quando fizemos uma visita à fábrica, que fica em Cajamar (SP), com a Profa. Dra. Zaira Zafalon. Outro exemplo é o bibliotecário Carlos Alberto Ferreira Café, Consultor de Soluções Web, que trabalha com arquitetura da informação, que aplica técnicas da biblioteconomia na tecnologia. 321 No final do terceiro ano, e eu fiz o curso em cinco anos, por causa daqueles atrasos no primeiro semestre, prestei e passei em um concurso para Auxiliar de Biblioteca na BCo. Sendo assim, voltei para minha querida BCo, porém agora não mais no Processamento Técnico, como no estágio, mas dessa vez no balcão de atendimento. Neste momento vi como foram importantes as etapas anteriores, em que desenvolvi habilidades de comunicação, porque meu trabalho como auxiliar era atender, fornecendo todas as informações sobre a biblioteca e os serviços, realizar os empréstimos, devoluções e renovações e fazer guarda dos livros. Meus ex-colegas do balcão, de quem sou amiga até hoje, são todos pessoas queridas e o clima no trabalho era muito prazeroso. Aliás, em todos os locais nos quais trabalhei, sempre fiz amizades e me senti muito querida. Neste período começou então minha saga no horário noturno, do qual eu nunca gostei muito, porque sou uma pessoa do dia, gosto de acordar cedo. Mas com isso surgiu a oportunidade de dar aulas particulares para a filha de uma funcionária, que cursava o ensino fundamental. Estudávamos todas as disciplinas, eu a ajudava nas tarefas, quase todos os dias. Toda experiência é válida, junto com ela também aprendi muito. Esse período foi muito bom, de grande crescimento, afinal, era meu primeiro trabalho, eu não era mais estagiária. No quinto ano, em 2011, já estaria formada se tivesse cursado adequadamente as disciplinas desde o começo, mas ainda estava cursando duas das que não haviam sido concluídas no primeiro semestre. Nesse ano foi publicado o edital de um concurso para Bibliotecário da Universidade de São Paulo (USP), campus São Carlos. Prestei e passei em primeiro lugar, mas para minha tristeza ainda não havia me graduado. Eu me formaria em alguns meses, porém a convocação para a prova ocorreu na semana seguinte ao resultado, fato não muito comum em concursos. Fiquei arrasada, me culpando muito por ter sido indecisa e não me dedicado desde o começo ao curso. Perdia então uma das melhores vagas para bibliotecário do estado de São Paulo. Pensei em recorrer de alguma forma, pois já havia cursado mais de 80% do das disciplinas, mas segui o conselho do Prof. Dr. Roniberto e fiquei à espera de uma nova oportunidade. Nada acontece por acaso, certo?! Assim que me graduei, no início de 2012, também prestei o processo seletivo para cursar mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade (PPGCTS/UFSCar), fui aprovada e comecei a cursar as disciplinas no primeiro semestre deste ano. Inquieta que sou, no ano anterior também havia prestado Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e neste mo- 322 mento me inscrito no Sistema de Seleção Unificada (Sisu), no qual fui aprovada nos cursos de Bacharelado em Educação Física e Licenciatura em Letras pela UFSCar. Tinha a intenção de continuar como auxiliar na BCo, cursando o mestrado e a graduação em Educação Física. Porém, nos primeiros meses de 2012 foi publicado o edital para o concurso de bibliotecário para a USP no campus de Ribeirão Preto. Prestei esse outro concurso e fui a terceira colocada, sendo convocada sem muita demora também, em maio de 2012, desta vez já em posse do meu diploma e minha carteirinha do Conselho Regional de Biblioteconomia (CRB). Sendo a terceira colocada, fui alocada na biblioteca da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP (FDRP), o que não poderia ser mais gratificante, pois o curso era novo, assim como o prédio e a biblioteca, recém construídos. O ambiente todo é muito bonito, com jardins bem cuidados, manutenção e limpeza impecáveis. Tive que deixar o mestrado no PPGCTS/UFSCar, pois não fui liberada pela chefia para cursar as disciplinas; a nova graduação também teve que ser deixada para outra oportunidade, pois não havia maneira de frequentar as aulas, já que me mudaria de cidade. Claro que, no primeiro momento, fiquei apreensiva com a mudança, pois gostava de São Carlos, tinha minha casa, meus amigos, estava bem ambientada com a cidade, com a UFSCar, e tudo isso ia mudar. Fiquei feliz pelo fato de que, morado em Ribeirão Preto, estaria mais perto de Batatais, minha cidade natal, portanto mais perto da minha família. Achei que ia me libertar do horário noturno, mas aqui continuo nesse horário, afinal, nem tudo são flores... Passei dois anos morando na casa da minha mãe, em Batatais, e viajando todo os dias até que resolvi me mudar para Ribeirão Preto. Hoje eu sou muito feliz aqui, adoro a cidade, adoro o bairro onde moro, adoro a USP Ribeirão, adoro a FDRP. Hoje agradeço por não ter dado certo assumir a vaga do campus São Carlos. Então, às vezes, há males que vem para o bem. Assim começou minha carreira como bibliotecária de fato. A Biblioteca da FDRP (BDRP), onde atualmente desenvolvo minhas funções como bibliotecária, tem cerca de 30 mil itens cadastrados e uma equipe formada por três bibliotecárias, dois técnicos administrativos, um auxiliar administrativo e dois estagiários. Ela faz parte do Sistema Integrado de Bibliotecas da USP (SIBi/USP) e oferece os serviços auxílio aos usuários na pesquisa e uso dos serviços em geral, auxilio na normalização de trabalhos acadêmicos de acordo com a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), empréstimos regulares, renovações, EEB, comutação bibliográfica e levantamento bibliográ- 323 fico. A biblioteca disponibiliza também salas de estudo individuais com quadros brancos, que são bastante utilizadas por seus usuários. Trabalhamos com uma equipe restrita, sendo que nos últimos anos deixamos de dispor de um técnico e um estagiário, e neste período, de 2012 até aqui, o número de alunos aumentou muito. Anteriormente atendíamos apenas as turmas de graduação, são 5 turmas, pois o curso tem duração de 5 anos, com aproximadamente 100 alunos cada, e atualmente atendemos também as turmas de mestrado acadêmico, com aproximadamente 80 alunos, e quinze cursos de especialização além de outros de atualização e difusão, somando mais cerca de 800 alunos. Neste período também foi aberto o Cursinho Popular da FDRP, e os alunos têm frequentado a biblioteca para estudar e, além disso, devido ao ambiente ser agradável e silencioso, recebemos diversos usuários de outras unidades USP e usuários externos, que vêm estudar principalmente para concursos jurídicos. Na BDRP, por ser uma unidade pequena, as bibliotecárias acabam desenvolvendo um pouco de trabalho em todas as seções. Somos subdivididos em aquisição, que é desenvolvida principalmente pela chefia, tratamento da informação e serviço de referência, minha principal função, sendo que fico alocada próximo a entrada e o balcão de atendimento. Graças as minhas experiências anteriores, hoje não tenho nenhum problema em lidar com o atendimento dos usuários, muito pelo contrário, gosto muito dessa atividade. É gratificante quando você apresenta os recursos e auxilia nas buscas e vê que os usuários ficam satisfeitos com o atendimento. Na função de bibliotecária de referência, fico a disposição para apresentar e tirar quaisquer dúvidas sobre a biblioteca, serviços e pesquisa; auxilio no processo de normalização dos trabalhos acadêmicos desenvolvidos pelos alunos da unidade, pessoalmente e via e-mail; sou responsável também pelos serviços de levantamento bibliográfico, EEB e comutação bibliográfica. No serviço de referência, junto à seção de circulação, também somos responsáveis por gerar estatísticas de circulação, que são os números de empréstimos, renovações, consultas e número de usuários que adentaram na biblioteca em determinado período, assim como as estatísticas de uso dos serviços oferecidos. Quando recebemos novos estagiários, que tem uma rotatividade de aproximadamente um ano e meio, fazemos o treinamento e acompanhamentos deles no atendimento, no preparo físico dos materiais e na guarda dos livros, funções desenvolvidas pelos mesmos. Sou responsável pela atualização do site institucional da biblioteca, devendo manter as informações atualizadas sobre a biblioteca, seus horários 324 e serviços, assim como inserir novos conteúdos que sejam de interesse aos usuários. Nos períodos em que não estou desenvolvendo serviços de referência, trato da seleção e cadastro dos periódicos, tanto advindos de compras correntes quanto de doações que recebemos, em grande número. Também auxilio na classificação, indexação, tombamento e catalogação dos livros, e no cadastramento de TCC na Biblioteca Digital de Trabalhos Acadêmicos da USP, junto ao tratamento da informação. Em períodos de compras e pregões, todos os funcionários ajudam na busca dos livros a serem adquiridos, assim como alguma outra tarefa com prazo definido e mais curto. Em meio a rotina de trabalho, aprendi muito sobre as diversas áreas do Direito e sobre documentos jurídicos, dos quais eu tinha pouco conhecimento até então. Tive oportunidade de participar de cursos, treinamentos e workshops oferecidos pelo SIBi/USP e também por outras instituições, com apoio da FDRP/USP, como o “Workshop Clipping de Notícias em Escritórios Jurídicos”, oferecido pelo Conselho Regional de Biblioteconomia 8ª Região (CRB8), que aconteceu na Faculdade de Direito da USP (FD/USP), campus São Paulo. Em 2016 também tive a oportunidade fazer um curso online, oferecido pela ContentMind e financiado pela FDRP/USP, chamado “Gestão de informação jurídica e apontamentos sobre direito autoral”, o qual foi importante para estabelecer os conceitos dos diversos documentos jurídicos e as noções de direitos autorais. Atualmente, devido à falta de verba da USP, essas oportunidades têm sido bem escassas. No ano de 2016, para grande contentamento meu, do DCI/UFSCar e acredito que de toda a universidade, pois foi uma grande conquista, foi inaugurado o Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UFSCar (PPGCI/UFSCar). Fiz o processo seletivo, fui aprovada, e estive novamente sob a orientação do Prof. Dr. Roniberto, fazendo parte da primeira turma do PPGCI/UFSCar, com muito orgulho e muito feliz por voltar a estudar na UFSCar. O programa tem como foco a inovação, e acho que nossa área muito com esse conceito, pois é sabido que a velocidade de evolução é diretamente proporcional a velocidade da propagação da informação. Ingressei no PPGCI/UFSCar com um projeto sobre preservação digital distribuída, que abordava a aderência do Brasil na Rede LOCKSS. A título de contextualização, no ano de 2004 a Stanford University (EUA) lançou a Aliança LOCKSS – a sigla LOCKSS é uma abreviação para Lot of Copies Keep Stuff Safe – e no ano de 2012, preocupado com a salvaguarda do patrimônio cientifico e cultural do país, o Instituto Brasileiro de Ciência e Tecnologia (IBCT) 325 criou a Rede Brasileira de Serviços de Preservação Digital – Cariniana, parte da Rede e usuária do software LOCKSS. A rede Cariniana consiste em parcerias com instituições de pesquisas do país, para preservar acervos digitais de forma distribuída, ou seja, cada instituição armazena os dados fisicamente de forma interligada, através do software LOCKSS. Somente em 2015 a Rede Cariniana de fato se estabeleceu, então a preservação digital distribuída é uma área muito fértil para pesquisas em Ciência da Informação (CI). Apesar disso, outros rumos foram sendo tomados durante o primeiro semestre do mestrado, novos conteúdos, novas descobertas e novas propostas em meio as conversas com meu orientador, Prof. Dr. Roniberto, até que decidimos investigar a interdisciplinaridade na CI. A origem e a interdisciplinaridade da CI são temas de diversos estudos, devido sua complexidade e subjetividade. Sendo a informação o principal objeto de estudo da área, e esta estando presente em todos os outros campos do conhecimento, infere-se que a CI pode se relacionar como todas elas, desde de estudos filosóficos e sociais, que são mais comumente conhecimentos, até outras mais diversas, por meio de estudos bibliométricos, por exemplo. A pesquisa contribuiu para termos um panorama das áreas estudadas pela CI, colaborando assim para maior entendimento e divulgação dessa ciência, considerada novas para alguns teóricos, porém com longo histórico, que data desde o século 19, com Paul Otlet, que foi autor, empresário, advogado e ativista belga, na criação dos sistemas de classificação – como a Classificação Decimal Universal (CDU) – e visionário e percursor da internet/web, na medida em que previa e criava sistemas e mecanismos para facilitar a organização e catalogação dos materiais. Por todo seu trabalho e contribuição para a área, foi considerado o pai da CI e da Documentação. A pesquisa de mestrado versou sobre a multi e interdisciplinaridade nos programas de pós-graduação em Ciência da Informação brasileiros. Após um referencial teórico sobre a história da Ciência da Informação e sobre os conceitos de multi, inter e transdisciplinaridade, desenvolvemos um estudo bibliométrico com base na área de atuação de 417 docentes, vinculados aos 23 Programas de Pós-graduação em Ciência da Informação, analisando as coautorias das publicações no período de 2013 a 2016, além de outras diversas análises. Como resultados, foram caracterizados o perfil multidisciplinar do pesquisador e as relações interdisciplinares na Ciência da Informação, identificando-se as áreas que fornecem e as que recebem contribuições desta ciência. Os resultados obtidos contribuem para instrumentalizar a compreensão 326 da interdisciplinaridade na atividade científica da área, e consequentemente para o seu fortalecimento e visibilidade como área do conhecimento no Sistema Nacional de Pós-Graduação. Devido a relevância da pesquisa para a área, foi submetida e rapidamente aceita na revista Perspectivas em Ciência da Informação (Qualis A1), v. 23, n. 4, 2018, onde poder ser lida com mais detalhes. Não poderia deixar de, novamente, elogiar e agradecer toda orientação e atenção do Prof. Dr. Roniberto, o melhor orientador que poderia ter, que novamente tornou a experiência da pesquisa prazerosa, mesmo eu tendo passado, inclusive, por problemas de saúde durante o desenvolvimento. Gratidão! Junto ao final do mestrado, segundo semestre de 2018, fui convidada para ser docente no curso de Biblioteconomia do Claretiano, inaugurado em 2017. Antes do ingresso como docente, fui convidada a desenvolver o material didático da disciplina ‘Estudos de usuários’, na qual sou professora responsável desde então. Também atuo como tutora nas disciplina de Estudos Literários e Linguísticos Aplicados à Biblioteconomia, Fontes de Informação e Competência Informacional, Representação Temática: Classificação e Metodologia da Pesquisa Científica, na qual oriento os alunos na produção de um artigo científico. No Claretiano, também participo de bancas de avaliação, na qual eles apresentam esse artigo desenvolvido na disciplina de Metodologia da Pesquisa, nos cursos de Artes e Pedagogia; e como parecerista na seleção dos artigos de Biblioteconomia para os eventos científicos da instituição. Em 2019 o curso já recebeu nota máxima da avaliação do MEC – avaliação da qual participei. São experiências que tenho gostado muito, que me realizaram mais profissionalmente, muito mais do que a atuação na biblioteca, que com o passar do tempo passou a ser enfadonha, devido a má gestão da biblioteca. Encerro assim meu relato, e faço votos de que todos os futuros egressos, mesmo que um pouco perdidos no começo, possam, assim como eu, conhecer, se identificar e se encantar com a CI, principalmente em um ambiente universitário tão gostoso, que é a UFSCar, e cheio de docentes dedicados, que demonstram tanto amor pela área e pela profissão, como os do DCI. 327 Foto: Waldeck Schutzer TRAJETÓRIA E MEMÓRIAS DE JOÃO AUGUSTO E RELAÇÃO COM A BCI UFSCar JOÃO AUGUSTO DIAS BARREIRA E OLIVEIRA* Nascido em São Paulo capital em 11 de abril de 1984, João Augusto Dias Barreira e Oliveira é filho único de Maria Pilar e Antonio Carlos. Deixo aqui meus agradecimentos aos meus pais que sempre acreditaram em meu potencial. Em 1990 nos mudamos para São Carlos e desde então tenho uma relação próxima com a UFSCar. Localizada na Zona Norte de São Carlos a Universidade tem 42 anos e conta com o curso de Biblioteconomia há 25 anos. Minha ligação com a UFSCar começou quando minha família mudou-se para São Carlos. Sempre tive o sonho de estudar na UFSCar, principalmente quando minha mãe começou a cursar Enfermagem em 1994, terminando em 1998. Com ensino gratuito e de qualidade, foi por muitos anos a única Universidade Federal do estado de São Paulo. Tenho orgulho de ter estudado e me formado pela UFSCar. O campus da UFSCar é exuberante, misturando diversos tipos de vegetações e animais, sendo um dos ambientes mais agradáveis para se estar em São Carlos. O lago, o bosque e o cerrado formam a paisagem perfeita para se unir tranquilidade e sossego em meio a uma paisagem fascinante. Ao adentrar na “Federal” sentimos que atravessamos um portal dentro de São Carlos rumo à predominância da natureza em meio a um ambiente de formação de cida- * Doutorado em andamento em Ciência da Informação (UNESP) e Mestre em Ciência da Informação (UNESP), Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2012). Contato: joaodbo@gmail.com. 329 dãos que contribuirão com seu conhecimento para o avanço da sociedade como um todo. Minha conexão com a Biblioteconomia começa ao acompanhar minha mãe em suas visitas à biblioteca da UFSCar, ajudando-a procurar os livros que ela precisava no catálogo de fichas. Pensando melhor nessa memória, percebo que nessa época de certa maneira, eu realizava o trabalho de um bibliotecário de referência ao auxiliar minha mãe na busca pelos livros. Muita coisa mudou desde então, a UFSCar cresceu e passou a contar com uma Biblioteca Comunitária (BCo) que atende a comunidade universitária e a população de São Carlos. Lembro que em 1997 e nos anos seguintes da inauguração da BCo ocorria aos sábados de manhã uma ação cultural voltada aos quadrinhos e jogos de roleplaying (RPG), sendo um dos meus passatempos preferidos aos finais de semana quando jovem. Durante esses encontros conhecíamos outras pessoas, trocávamos ideias e nos divertíamos com algum tipo de jogo de RPG, sendo de fundamental importância notar que a imagem positiva que tenho da BCo perpassa essa época onde não só pelos livros mas por diversos projetos, visava também agregar pessoas em torno da cultura, subcultura trocas de conhecimentos. Anteriormente ao curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) me formei no curso de Tecnólogo em Hotelaria pelo Centro Universitário SENAC em Águas de São Pedro iniciando em 2005 e concluindo no final de 2006. Ao cursar hotelaria, um dos principais interesses despertados foi o de entender de forma mais aprofundada o funcionamento dos fluxos de informação existentes em um hotel, entre os serviços de hospedagem, alimentos e bebidas e no funcionamento do hotel como um todo. Durante o curso de Hotelaria realizei pelo período de um ano uma pesquisa de Iniciação Científica (IC) junto ao Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento (CNPq). Por tratar de um tema complexo, encontrei na BCo a principal obra de referência sobre o assunto, o que contribuiu de sobremaneira para fundamentar e alcançar resultados satisfatórios de uma pesquisa de IC. Vejo que por ter realizado esse projeto me aproximei da pesquisa e vi ali uma vertente em que gosto de atuar, ao investigar e tentar solucionar problemas que contribuem para soluções em minha área de atuação. Ao voltar para São Carlos tomei a decisão de voltar a estudar para o vestibular e pesquisei outros cursos, por tentar jornalismo anteriormente, percebi na Biblioteconomia e em especial na Ciência da Informação uma porta de entrada para melhor compreender e se possível otimizar e aperfeiçoar a comuni- 330 cação entre os diversos setores de um hotel. Era fascinante ver na prática no Grande Hotel São Pedro em Águas de São Pedro (SP) o quão importante era o atendimento ao hóspede com a eficaz e eficiente comunicação de informação entre os setores. Posso afirmar que com a comunicação fluindo de forma adequada, o grau de satisfação dos hóspedes era maior, pois atua em duas vias: facilita sua estadia e dá a sensação de atendimento único e exclusivo (o que pode ou não ser verdade, dependendo da missão e tipo de empreendimento). Em 2008 ingressei no curso de BCI da Universidade Federal de São Carlos. Fui aprovado na lista de espera, para o período noturno. Acredito que como muitos que cursam BCI há uma certa incerteza sobre o curso e que aos poucos vai sendo desvendada. Lembro que meu pensamento aos 24 anos, recém-formado e com muitas dúvidas sobre qual profissão cursar e exercer não conhecia toda a grande área de BCI. Acredito que muitos que optam pelo curso entrem com uma visão provisória do que é Biblioteconomia e somente ao cursar o bacharelado que temos a real noção que a área pode contribuir e alcançar. Hoje ao escrever sobre isso, vejo quão grande e complexa é a rede de conhecimentos teóricos e práticos utilizados e aplicados pela BCI. No primeiro ano temos contato com disciplinas que formam a base do curso e de certa forma, podem ser vistas como introdutórias para diversos temas. Ainda não dava para saber com certeza o que realmente era a biblioteconomia bem como todas suas vertentes de estudo e atuação. No primeiro semestre tivemos a oportunidade de participar de uma seleção para monitores culturais da Fazenda Pinhal, um patrimônio cultural e histórico da região que remonta aos tempos da fundação de São Carlos (SP). No primeiro ano atuei como monitor cultural da Fazenda Pinhal realizando visitas técnicas dentro da propriedade acompanhando grupos de pessoas nacionais e estrangeiras, bem como crianças e jovens de escolas públicas e particulares de todo o estado de São Paulo. O contato com diferentes pessoas é algo valioso que carrego dessa época e que traduz-se em um tipo de design das informações sobre a fazenda que apresentava. As informações de uma visita para crianças são diferentes de uma turma de adultos. Cada grupo possuía algumas características principais e a exposição do conteúdo da visita era melhor adaptada para cada grupo. Era difícil controlar uma turma com 30 ou 40 crianças, mas ao vê-los prestando atenção e entendendo aquilo que estavam vendo sempre me trouxe uma sensação de orgulho. 331 Acredito que ter esse contato com a preservação cultural e do patrimônio contribuiu para melhor posicionar a atuação do profissional da informação nesses redutos, fomentando a conservação da memória e da história de nossa cidade. Até os dias de hoje a Fazenda Pinhal conta em seu quadro de funcionários com bibliotecários que cuidam e preservam o acervo de obras históricas. Um ponto muito positivo do curso de BCI está na facilidade de se conseguir estágios em São Carlos. A UFSCar absorve muitos estagiários na Biblioteca Comunitária e em seus departamentos tornando-se um estímulo a mais para seguir e melhor conhecer as dinâmicas existentes em diferentes ambientes de trabalho. Por exemplo, há alguns departamentos que fazem questão de ter um bibliotecário em seu rol de funcionários, pois a importância de sua atuação é vista e sentida na prática. A partir do segundo ano podemos escolher e iniciar a disciplina de estágio obrigatório. No segundo ano do curso, a maior parte de disciplinas técnicas contribuem para melhor definir a área e a possibilidade de estágio expande os horizontes para a atuação profissional. Compreendendo teorias, práticas, conceitos e técnicas que surgem na Biblioteconomia como as atividades de catalogação, classificação e indexação. Esse ano é crucial para o aluno obter uma identificação com alguma vertente da área, pois algumas dessas disciplinas fazem parte do cerne da atuação como pesquisador e profissional da informação. A realização do estágio curricular na biblioteca comunitária da UFSCar (BCo) foi importante para o contato com a realidade de trabalho de nossa profissão. A oportunidade de aproveitar na prática os ensinamentos do curso tornou-se fundamental para solidificar meu apreço pela profissão. Após cerca de um ano estagiando na BCo, sempre fui atraído por uma vaga de estágio na Coordenadoria de Comunicação Social (CCS) da UFSCar, uma iniciativa positiva pois demonstrava que podemos atuar em outros redutos, e não apenas na biblioteca. Consegui a vaga e lembro que atuávamos junto aos jornalistas, enaltecendo a importância de se possuir uma equipe multidisciplinar que, a meu ver, potencializava o trabalho de todos envolvidos. Foram 15 meses de estágio na CCS e por conta de um problema existente em nossa atuação encontrei meu objeto de pesquisa que comentarei adiante. Por trabalhar com o Clipping Institucional atuávamos tanto na parte de busca e recuperação quanto na classificação e indexação dos clippings. O clipping consiste na localização e recuperação de informação publicada em 332 veículos de comunicação como jornais e revistas, que façam menção à UFSCar, no caso, nosso trabalho tinha tanto uma característica ao providenciar informações sobre o que estava sendo publicado bem como resguardar a memória institucional da Universidade. Entre os clippings tínhamos notícias publicadas na impressa relacionadas aos eventos da universidade, vestibulares e concursos, vagas para cursos de pós-graduação e extensão, artigos publicados por alunos e docentes bem como publicações de pesquisas realizada pela comunidade científica da UFSCar. Uma dificuldade era a de classificar com termos em linguagem natural algo que fosse recuperado pelo usuário, sendo assim, tínhamos que encontrar a melhor forma de representar a informação, nos colocando na posição do usuário ao indexar termos que satisfaçam à recuperação precisa de informação no sistema. Por conta desse problema procurei contribuições de outras áreas e encontrei no Design gráfico, em específico no Design da Informação, um aliado importante para o avanço de nossa área. Posso dizer que os conhecimentos teóricos que já me atraíam somados à experiência prática me possibilitaram encontrar um caminho a seguir, pois via na profissão uma forma de contribuir com outras pessoas, facilitando sua vida em relação às suas necessidades de informação, ampliando seu conhecimento, permitindo acesso à diferentes mundos reais e virtuais que ampliam sua capacidade de cognição, satisfazendo suas vontades de aprender e estudar, capacitando-os a tomar decisões mais precisas apoiadas em informações autênticas e possibilitar o avanço da ciência por meio da atualização e desenvolvimento de pesquisas de cunho informacional. O terceiro ano inclui muitas disciplinas importantes assim como a continuação das disciplinas técnicas do curso. Nesse ano passei a estagiar na CCS. No quarto ano temos a opção de escolhermos uma ênfase entre a tecnológica e a social, onde a turma é dividida e cursamos disciplinas diferentes focadas principalmente em comunicação e informação em ambientes empresariais e em ambientes de interação social além da biblioteca. No primeiro semestre de 2011, comecei a cursar a disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso um (TCC 1), tendo obtido nota 8 ao final do semestre. No segundo semestre, escolhi a disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso dois (TCC 2) para completar os últimos créditos necessários para me formar. Entretanto, tive alguns problemas e não planejei da melhor forma como conciliar o estágio e as disciplinas, deixando a produção do TCC de lado. 333 Um pouco antes do final do semestre, me reuni com minha orientadora Prof. Dra. Maria Cristina Comunian Ferraz e entramos em um acordo. Basicamente eu poderia tentar reunir o máximo possível de conteúdos e resultados da pesquisa teórica que estava desenvolvendo, mas que seria difícil eu obter uma nota muito alta, pois ainda faltava muita coisa que ficou pendente no final do TCC 1. Sendo assim, decidi que seria melhor me dedicar as últimas disciplinas do curso e realizar o TCC 2 no próximo semestre sendo reprovado na disciplina TCC 2 no final do semestre de 2011. Essa opção sempre me trouxe preocupação, pois uma reprovação era algo que eu não gostaria e não estava previsto, mesmo assim, acredito que foi a melhor decisão a ser tomada visto os desdobramentos futuros que mencionarei aqui. Sendo assim, o primeiro de semestre de 2012 foi de dedicação total à pesquisa, encontrei no meu objeto de pesquisa um tema que gosto muito e que possibilitará muitos avanços para a área de BCI como um todo. Em junho de 2012, defendi o meu TCC intitulado “A Ciência da Informação e o Design gráfico: descobrindo o Design de Informação” obtendo a nota máxima e a recomendação para que prestasse o Mestrado acadêmico em Ciência da Informação da UNESP Marília, um dos cursos de Pós-graduação com a maior nota do Ministério da Educação (MEC). O processo seletivo da UNESP foi em julho e tive que correr para criar um projeto e me inscrever, sendo aprovado e iniciado minha carreira acadêmica como pesquisador em março de 2013. Em maio de 2015, me tornei mestre ao defender minha dissertação intitulada “A Ciência da Informação e o Design da Informação: perspectivas interdisciplinares”. Em 2015 realizei as provas e fui aprovado no doutorado acadêmico da UNESP Marília, iniciando os estudos no ano de 2016. Nesse ano a UFSCar criou o Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PPGCI). Considero este um grande passo para o crescimento do curso de BCI e do Mestrado (e futuramente doutorado) do PPGCI UFSCar, com minha experiência na UNESP Marília pude notar que o curso de graduação da UFSCar tem muito a ganhar e se desenvolver como um todo quando há um Programa de Pós-Graduação junto à Instituição. A relação do corpo discente e docente ocorre de forma mais frutífera e não apenas no escopo profissional, mas também no escopo de pesquisa, evoluindo nossa área e capacitando capaz vez mais os profissionais da informação para que atuem e contribuem de forma eficaz com a sociedade, garantindo acesso à informação e cidadania. 334 A possibilidade de oferecer informação de alta qualidade aos usuários dos serviços de informação é uma das características mais atraentes do curso. O trabalho de um pesquisador será capaz de desenvolver com maior facilidade sua investigação e fortalecer sua área de atuação e propiciar benefícios para a sociedade. A congruência entre o ensino da graduação e a atuação profissional pôde ser vista durante a Pós-Graduação, foi possível perceber que muitos assuntos e temas que estudávamos de forma aprofundada já tinham sido mencionados durante a graduação. Em alguns casos, percebo que certos assuntos são demasiado complexos e que não necessitam do aprofundamento durante a graduação visto a grande quantidade de informações que um aluno recebe durante sua trajetória acadêmica. Foi na UFSCar onde pude encontrar um curso de graduação que me encantou, um objeto de estudo original e pioneiro no Brasil – o Design da Informação aplicado junto à Ciência da Informação – que me possibilitou cursar o Mestrado e o Doutorado, podendo contribuir de forma incisiva, com a possibilidade de otimizar a atuação dos profissionais da informação e consequentemente dos usuários de informação e que, continuarei buscando o desenvolvimento da área tanto em sua vertente profissional quanto científica. Para finalizar e por trabalharmos com livros, deixo uma citação que reúne a importância da nossa profissão, dos livros e de todos os suportes de informação que trabalhamos. Que coisa surpreendente é um livro. É um objeto plano feito a partir de uma árvore com peças flexíveis onde é impresso um monte de linhas escuras engraçadas. Mas um olhar para ele e você está dentro da mente de outra pessoa, talvez alguém morto por milhares de anos. Através dos milênios, um autor está falando claramente e silenciosamente dentro de sua cabeça, diretamente a você. Escrever talvez seja a maior das invenções humanas, unindo pessoas que nunca se conheceram, cidadãos de épocas distantes. Os livros quebram os grilhões do tempo. Um livro é prova de que os seres humanos são capazes de trabalhar com magia (A PERSISTÊNCIA..., 1980). 335 Aqui fica uma dedicatória, parecida com as de teses e dissertações, mas que é devida em um livro de memórias. Obrigado a todos os funcionários da UFSCar e do curso de BCI, aos docentes do curso e a todos os alunos que fizeram parte dessa história, cada um deles contribuiu para o crescimento nesses 20 anos de Biblioteconomia e Ciência da Informação da UFSCar. Um grande viva para as conquistas já alcançadas e para todas as outras que ainda irão acontecer. Referências A PERSISTÊNCIA da memória. In: COSMOS: uma viagem pessoal. Direção: Carl Sagan e Ann Druyan. Produção: Carl Sagan Productions, KCET, BBC e Polytel International. [Estados Unidos], 1980. 1 DVD, color. 336 337 Foto: Sílvia Moura BCI UFSCar: SENTA QUE LÁ VEM A HISTÓRIA... JOSÉ CARLOS BASTOS JUNIOR* Antecedentes... Para fins de apresentação, meu nome é José Carlos, tenho 28 anos e sou natural de São Carlos. Estudei integralmente na rede pública e sou oriundo de família humilde (Meus pais não concluíram o Ensino Fundamental, além de ter uma avó analfabeta. Sendo assim, desde a tenra idade, tive que adquirir autonomia para buscar conhecimentos, e, por conseguinte, me tornar um “ponto fora da curva” na trajetória de minha família. Essa necessidade de me virar sozinho, tornou-me curioso e sedento por informação. Ademais, a partir da 5º série do ensino fundamental, me tornei um frequentador assíduo da biblioteca da escola em que estudava. Ingressei no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) da UFSCar no ano de 2009. Tinha na época 20 anos e trabalhava em período integral como operador de caixa em um hipermercado da cidade, em uma conjuntura que me permitia fazer uma faculdade apenas no período noturno. Destaco que, nunca havia pensado em estudar BCI, já que minhas opções de curso principais eram História, Geografia, Jornalismo ou Publicidade. Em suma, sempre gostei da área de Comunicação e Ciências Humanas. Em relação as minhas expectativas sobre o curso, ressalto que, por um desconhecimento das possibilidades de atuação de um bibliotecário, embarquei no senso comum ecoado por grande parte das pessoas, de que a atuação de um bibliotecário se limitava a emprestar livros em uma biblioteca. Sendo assim, qual * Mestre em Ciência, Tecnologia e Sociedade (UFSCar) e Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2013). Contato: josecarlosbastosjr@yahoo. com.br. 338 foi então o motivo que me levou a cursar BCI? Bem, voltando um pouco no tempo, no ano anterior (isto é, 2008), conheci uma aluna do curso que trabalhava na Biblioteca próxima a minha residência. Ela se chama Cláudia e na ocasião estava no último ano do curso. Diante de sua solicitude e simpatia, passei a trocar algumas ideias à respeito do vestibular (que já estava às portas). Conversa vai, conversa vem, ela foi me relatando informações sobre o curso e também sobre o seu trabalho de conclusão de curso, no qual estava realizando um estudo sobre peças de artes que compunham um determinado acervo, fato que me despertou o interesse pelo curso, que já começava a ver com outros olhos (enfatizo que, no vestibular anterior, tinha prestado Letras, com o intuito de ser dramaturgo, pois adorava novelas, e me encontrava em dúvidas sobre o que cursar). Bem, dai pensei: “Vou me inscrever pra esse curso ai”. Isso mesmo, sem buscar me aprofundar conhecer mais sobre o mesmo, o escolhi como opção. Passado os dias de vestibular, no inicio de fevereiro de 2009, (Minha impulsividade Ariana!) saiu a lista dos aprovados em primeira chamada da UFSCar, e pra minha surpresa, meu nome constava dentre os tais. Fui tomado de uma sensação indescritível, pois custei a acreditar que estava concretizando um sonho: ingressar em uma universidade pública. Devo enfatizar ainda que, o contexto de vida pré-vestibular foi muito puxado: trabalhava aos finais de semana e frequentava as aulas do Cursinho Pré- Vestibular da UFSCar à noite. Todavia, hoje vejo que valeu a pena a tríade suor, sangue e lágrimas. O primeiro semestre... Confesso que apanhei um pouco para me adaptar ao padrão universitário. Lembro-me que desconhecia alguns macetes básicos da informática como o control C e o control V (graças a colegas de sala aprendi a usar esse recurso poderoso- rs), entretanto, destaco um fato hilário ocorrido ainda no primeiro semestre: por desconhecer as normas da ABNT, redigi o meu primeiro trabalho final (da disciplina “Sociedade do Conhecimento”) em fonte tamanho 24 e sem algum padrão de formatação, resultando em um puxão de orelha por parte da professora responsável da disciplina e zoação pelos colegas. Mas, enfim, digeri como aprendizado e a partir dai (graças também a disciplina de “Orientação e Normalização Documentárias”) passei a digitar os trabalhos em padrão adequado. 339 Com o finar do primeiro semestre (que pra ser sincero, achei meio chato), partimos para o segundo semestre, no qual começamos a cursar as disciplinas técnicas do curso (como “Análise Documentária”, ministrada pela Profa. Dra. Vera Regina Casari Boccato). Não podia deixar de citar minha emoção em interpretar a celebridade e sumidade internacional da Biblioteconomia Ranganathan1, em um curta que meu grupo idealizou para o trabalho final da disciplina “Fundamentos da Biblioteconomia, Documentação e CI”, ministrada pela Profa. Dra. Luciana Gracioso). Enquanto isso, em meu trabalho, comecei a receber propostas de um cliente que costumava atender constantemente (atuava como operador de caixa) para trabalhar como vendedor em sua loja de roupas masculinas (e me considerava comunicativo e simpático). No entanto, tive de recusar as tentadoras propostas pelo fato de ter aulas aos sábados (isso mesmo, apesar de apelidarem a BCI de “curso coxa”, tínhamos aulas de segunda a sábado). As primeiras experiências profissionais... Chegando o ano de 2010, correspondente ao segundo ano de graduação, passei a observar que alguns dos meus colegas de turma já estavam estagiando na área (muitos de forma remunerada) e, consequentemente, passei a almejar um estágio, já que meu trabalho muito me limitava e exauria. Desse modo, em meados do referido ano, prestei o concurso para estagiário da Biblioteca Comunitária (BCO), no qual fui classificado. Em síntese, o segundo ano de graduação foi legal, pois passei a ter contato com disciplinas mais específicas da BCI (Tais como Representação Temática I e II, Princípios e práticas de Representação Descritiva – pra facilitar, Catalogação, Usos e Usuários da Informação etc.). Adentrando o terceiro ano de graduação (2011), recebi um convite da Profa. Vera Boccato para ser seu orientando de iniciação científica, o que me deixou muito animado. Contudo, como nem tudo são flores, tinha um entrave a resolver: a falta de tempo hábil para me dedicar à pesquisa, já que trabalhava o dia todos e aos finais de semana também (vida de pobre é difícil minha gente!). 1 Minutos Ranganathan. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=bJTJ2ppTxKY. 340 No entanto, poucos meses depois, os anjos do céu ouviram minhas preces e fui contemplado com uma benção: havia sido chamado pela UFSCar para estagiar na biblioteca. Fiquei muito feliz, porém dividido, pois fiquei inseguro em deixar um emprego fixo com carteira assinada para assumir uma vaga de estágio que não me dava garantias trabalhistas (FGTS, registro formal em carteira etc.). Reforço que tomar essa decisão me tomou alguns dias de reflexão, porém, resolvi seguir meu coração e literalmente “chutei o pau da barraca”: tomei coragem, falei com meus pais e pedi demissão, pois sentia que havia chegado o tempo de dar um novo rumo para minha vida profissional. Sendo assim, no dia 11 de abril de 2011, iniciei minha trajetória como estagiário na Biblioteca Comunitária da UFSCar, atuando no Departamento de Aquisição e Desenvolvimento de Coleções. E não poderia ter feito a melhor escolha: apesar de ganhar um pouco menos em relação meu antigo trabalho, passei a ter mais tempo para me dedicar aos estudos e, especialmente, a minha vida pessoal, afinal, após três anos e meio, tinha os finais de semanas e feriados livres (Iupi!). Embora tenha permanecido em um único setor durante meus dois anos de estágios (o que considero uma falha de gestão... mas, isso não é Casos de Família), tenho a convicção que o saldo final foi positivo, pois tive a oportunidade (graças a minha curiosidade natural de aprender coisas novas) de ter contato com diferentes atividades, já que, além de minha rotina de trabalho, que incluía conferir páginas de livros, carimbar e processar, também atendia os usuários no balcão (na ausência dos funcionários do setor) e auxiliava os mesmos na busca por livros na base e nas estantes. Todavia, convém dar destaque a um projeto de extensão que participei como palestrante voluntário e que me enche de orgulho: o “Pesquise já: inovando a pesquisa escolar”, projeto que era fruto da parceria da biblioteca com a Pró-Reitoria de Extensão (PROEX) e cujo objetivo se centrava em conscientizar os alunos do Ensino Fundamental e Médio de escolas da rede pública e particular de São Carlos e região sobre a relevância da pesquisa escolar no processo ensino-aprendizagem, através da realização de palestras que apresentavam fontes de informação impressas e digitais seguras para utilização em pesquisas escolares, além de dicas de como elaborar um resumo e um bom trabalho de pesquisa. Ressalta-se que o supracitado projeto fora idealizado conjuntamente por quatro bibliotecárias da BCO (Camila Cassiavilani Passos, Luciana Teresa Romanelli Vicente Sebin, Teresa Bessi Lopes e Vera Lúcia Cóscia) e era or- 341 ganizado da seguinte forma: Primeiro, era ministrada uma apresentação em powerpoint para os alunos participantes, na qual eram transmitidas orientações a respeito do processo de pesquisa escolar, além de informações sobre a Bco (horários de funcionamento, como fazer carteirinha e retirar livros, normas de conduta etc.). Em seguida, era realizada uma breve visita monitorada pela biblioteca (dando ênfase especialmente à biblioteca infantil) e por fim, encerravam-se as atividades com uma breve palestra de como manusear corretamente um livro. Em suma, enfatizo que os dois anos que participei do referido projeto (2011 a 2013) me proporcionaram uma experiência rica e inesquecível. Percebi (na verdade, apenas se confirmou), o quanto gostava de trabalhar com o público (especialmente, o infantojuvenil). O saldo final contemplou mais de 300 alunos participantes durante a vigência do projeto. Voltando ao tópico graduação, com o término do quinto semestre, passei por um pequeno dilema: qual ênfase devia escolher? Para mim se tratava de uma escolha difícil, pois gostava de um pouco de tudo, porém, após analisar as possibilidades, acabei optando pela Ênfase em Informação Tecnológica e Empresarial (temida por muitos, encarada por poucos – rs). No findar do terceiro ano, aconteceu algo inesperado e que mudaria minha trajetória de pesquisa: devido a um problema de saúde da Profa. Vera (que infelizmente, veio a falecer em 2013), tive que interromper minha iniciação científica. E agora José? Estava chegando ao quarto (e último) ano, isto é, época de fazer o temido Trabalho de Conclusão de Curso (TCC, pra simplificar) e ali estava eu sem um orientador. Passei por momentos de tensão, contudo, como “meu santo é forte”, Papai do Céu colocou em meu caminho uma professora muito especial, que se tornou uma verdadeira ORIENTADORA em minha trajetória como pesquisador pelos três anos seguintes: a Profa. Dra. Camila Carneiro Dias Rigolin. Marcamos uma reunião e já fechamos o tema do TCC no mesmo dia. Contudo, como sempre há pedras no caminho, precisei literalmente começar tudo do zero (levantamento bibliográfico, fichamento, elaboração da revisão de literatura), já que o tema era totalmente diferente (provando que sou Camaleão, passei dos estudos das Taxonomias em portais institucionais, tema da iniciação, para um estudo comparativo das grandes curriculares dos cursos de BCI do Estado de São Paulo no TCC). Apesar dos apesares, o processo de construção do trabalho se revelou produtivo e prazeroso, já que, durante a elaboração da revisão de literatura, 342 tive a oportunidade de conhecer mais profundamente o percurso histórico da Biblioteconomia e Ciência Informação á nível global e brasileiro. Em abril de 2012, fui contemplado com um prêmio que, sem modéstia, me mostrou o quanto era querido por todos: recebi o Oscar BCI de Sumidade (isto é, um indivíduo que se destaca por sua inteligência – Ui! Rs). Enfim, em setembro de 2012, chegou o tão esperado dia: a apresentação e defesa do TCC. Para composição da banca, convidei o Prof. Dr. Roniberto Morato do Amaral e a Profa. Dra. Luciana Gracioso. Ademais, tinha uma pequena plateia, composta por colegas de sala e da universidade. Descontando o nervosismo de praxe e os imprevistos técnicos (projetor que não funcionava etc.), tudo transcorreu bem na apresentação e, resumindo: fui aprovado, com nota 10! (confirmando que era uma sumidade. hehehe ). Nesse interim, iniciei um estágio na Proposta Engenharia de Edificações, uma empresa do ramo de Construção Civil, substituindo uma colega de curso. Meu trabalho se concentraria na organização do arquivo documental da organização, que incluía prontuários de funcionários, licitações, editais, plantas de imóveis, dentre muitos outros. Confesso que no início me assustei um pouco com o volume de trabalho (e bagunça, obviamente) que teria pela frente, mas aos poucos, com a ajuda da equipe, fui elaborando um plano de organização do arquivo e aos poucos, colocando “a casa em ordem”. Estava muito empolgado com o trabalho, pois sempre gostei de desafios, embora enfrentasse uma carga pesada de trabalho (estagiava na Proposta das 7h às 12h e na Bco, das 14h às 18h). Após a conclusão do TCC, passei a me dedicar a um novo objetivo: a elaboração de um projeto de mestrado. Me inscrevi no processo seletivo e dediquei-me muito as leituras indicadas para a prova teórica, todavia, fui reprovado na prova de inglês, fato que me entristeceu muito. Apesar do ocorrido, tive o apoio da querida Profa. Camila, que muito me motivou a prosseguir e a não desistir de meu objetivo de ingressar no mestrado. “Encerrado” (sim, as aspas são justificadas pelos efeitos da greve dos servidores ocorrida nos meses finais de 2012) o quarto e último ano da graduação (cujo semestre, pelos motivos outrora apresentados, se encerrou em fevereiro), estávamos próximos do tão sonhado momento: a formatura. Creio que todo estudante de graduação almeje a chegada deste momento, de enfim, “pegar o canudo” e se esbaldar no tão esperado baile de formatura. E assim ocorreu: nos dias 2 e 3 de março de 2013, ocorreu respectivamente o jantar e o baile de formatura, ambos realizados no clube da ABASC. 343 Como não havia pago a formatura, participei apenas do baile, graças a minha querida amiga Olívia, que me presenteou com um convite. No dia 5 de março, ocorreu a Colação de Grau de minha turma. Ressalto que foi um momento muito especial para mim (em que chorei, e não foi pouco), embora não tivesse a presença do meu pai (que estava trabalhando) e de minha avó Neide, que havia falecido há poucos meses. Um filme passou em minha mente (lembrei-me de diversos momentos de minha vida, desde a infância) e tenho convicção que os quatro anos de graduação em BCI me transformaram como ser humano, como pesquisador e profissional, através dos eventos, palestras e amizades consolidadas. Passadas as supracitadas festividades, no dia 12 de março de 2013, comemorei meu primeiro dia como “bibliotecário oficialmente formado” de uma forma maravilhosa: o Projeto Pesquise Já, do qual participei voluntariamente por dois anos, fora contemplado como o Prêmio Laura Russo de Biblioteconomia (um dos mais importantes da área) na categoria melhor projeto de extensão. A entrega do prêmio ocorreu na noite do dia 12, no Centro Cultural São Paulo e participaram da solenidade (além de mim, claro!), as bibliotecárias responsáveis pelo projeto, membros da equipe da BCO e a Profa. Dra. Zaira Regina Zafalon. A(dura) realidade de um recém-formado... Após um período de águas tranquilas, veio a realidade pós-formatura: após a finalização de meu contrato de estágio com a Bco e a não contratação pela empresa Proposta Engenharia, encontrava-me desempregado. Triste, porém concreta realidade de muitos bibliotecários recém-formados. (Pobreza pega, conforme citação da célebre Bia Falcão). Contudo, como nunca fui de me entregar, parti a luta: comecei a enviar currículos para várias escolas da cidade. Mas, infelizmente, como bem sabemos, raras, são as escolas públicas e particulares que contam com bibliotecários na gestão de suas bibliotecas. Destarte, aproveitei minha disponibilidade de tempo para cursar uma disciplina como aluno especial no Programa de Pós Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade (PPGCTS). Enfim, em junho de 2013, surgiu uma entrevista, e estudar para os concursos da área para trabalhar na biblioteca a ser inaugurada no interior da fábrica de motores da Volkswagen de São Carlos. Certamente, me entusiasmei para a entrevista (pois queria muito atuar na área), que contava com outras 344 colegas de curso, no entanto, não fui escolhido (de primeira) para assumir a vaga. Fiquei chateado, pois já fazia quase três meses que me encontrava desempregado. Nesse meio tempo, consegui um emprego em uma Distribuidora de doces, próxima de minha casa, na qual desempenhei por cerca de quatro meses a função (novamente) de operador de caixa. Apesar de ganhar muito pouco (já que trabalhava apenas meio período), consegui suprir minhas despesas emergenciais. Como a vida sempre dá voltas, no mês de novembro foi contemplado com duas ótimas notícias: minha aprovação no Mestrado em Ciência, Tecnologia e Sociedade2 (um programa interdisciplinar da UFSCar), após meses de intensão dedicação e uma nova convocação para entrevista, para preenchimento da mesma vaga e estudos em grupo com minha amiga Graziela ofertada para a Biblioteca da Volkswagen, pois a bibliotecária outrora contratada havia pedido demissão, para cursar Doutorado. A entrevista ocorreu via Skype, e para minha alegria, fui escolhido! Foi uma grata surpresa, já que havia até me esquecido dessa vaga. Na mesma semana, pedi demissão do emprego na Distribuidora e na semana seguinte, já parti para São Paulo, sede da empresa que me contratou (O Instituto Brasil Leitor, uma OSCIP3 que implementa bibliotecas em empresas, terminais rodoviários e demais órgãos públicos), para participar de um treinamento. Fiquei lá por dois dias, em um hotel super bacana (4 estrelas mon amour!). Entretanto, fui surpreendido com uma triste notícia: o falecimento de minha avó paterna, Dona Antônia. Foi um choque, porém, precisava ser profissional e prosseguir com os treinamentos. Enfim, após alguns dias espera (por causa de questões burocráticas), assumi o cargo de Gerente de Biblioteca na unidade da Volkswagen São Carlos. Um desafio e tanto, mas que abracei com muita garra. Foram nove meses de trabalho e reforço que foi um período de intenso aprendizado, já que por ser o único responsável pela biblioteca, dependia de mim a realização de todas as atividades (limpeza, organização, classificação e catalogação do acervo, marketing, planejamento de eventos, elaboração de relatórios estatísticos etc.). Como resultado de um profícuo trabalho, pautado pela perseverança e determinação, conseguimos quase que dobrar o número de usuários 2 3 Para maiores informações sobre o PPGCTS, visite o site: http://www.ppgcts.ufscar.br/. Organização da Sociedade Civil de Interesse Público. 345 e de empréstimos de livros, demostrando que a biblioteca passou a ter uma maior visibilidade dentro da empresa. Dentre as ações empreendidas para promoção da biblioteca, destacam-se: a) aumento no número de empréstimos por usuário (de um para três, sendo que um preferencialmente deveria ser infantojuvenil; b) incentivo à leitura em família, através da promoção e destaque do acervo infantojuvenil; c) Ações de divulgação da biblioteca no refeitório da fábrica, com a exposição de obras e realização de novos cadastros; d) realização de eventos especiais: contação de histórias, apresentação do projeto “Pesquise já”, adaptado a realidade da unidade, visita dos filhos doa funcionários à biblioteca. Mas, infelizmente, alegando uma crise financeira, meu contrato não foi renovado, sendo dispensado da empresa em setembro de 2014. Mais uma vez, me encontrava desempregado. Desta vez, foram três meses de espera até uma próxima recolocação (Ser pobre é f...!). Em janeiro de 2015, fui convidado por uma amiga para cobrir férias de uma funcionária em sua empresa de Eventos. Acabei ficando por dois meses, até que em fevereiro fui indicado por uma colega de classe para atuar na organização do acervo particular de um professor e poeta Sãocarlense, Italo Savelli. Como se tratava de um projeto sem vínculo empregatício, abri uma Microempresa Individual (MEI) e passei a atuar, a partir de então, como bibliotecário responsável pela organização geral do Acervo Savelli, localizado no interior da Biblioteca da Fundação Pró-Memória de São Carlos. Mais uma vez, me deparei com um desafio que me proporcionou uma experiência ímpar: durante o período de sete meses, trabalhei na higienização (processo que até então não havia experimentado), catalogação, classificação, inserção dos registros bibliográficos na base de dados PHL, etiquetação e rearranjo nas estantes de um acervo composto por quase três mil títulos, que inclui grandes clássicos da literatura mundial e nacional, além de obras raras da área de direito (área na qual Savelli era graduado), dentre outros títulos de campos do conhecimento diversificados. Ademais, trabalhar com um acervo riquíssimo como este, possibilitou-me ampliar meu acervo de conhecimentos culturais e mergulhar em um denso processo de pesquisa, já que algumas obras exigiam uma investigação mais aprofundada (Aliás, me serviu para me mostrar o quanto era ignorante em relação à literatura brasileira). Esse trabalho, em especial, gerou uma boa repercussão, já que após a finalização do processo organização, algumas matérias foram veiculadas na 346 mídia local (ACERVO..., 2015; SÃO CARLOS, 2015; JORNAL..., 2015), fatos esses que ocasionaram em reconhecimento de minha atuação (Olha Ele!!!). Ressalto que, após está última experiência relatada, não tenho atuado diretamente como bibliotecário. Em fevereiro de 2016, apresentei a defesa de minha dissertação de mestrado, intitulada “Comunicação Pública da Ciência e Health Literacy no Portal da Anvisa, sob a orientação da Profa. Dra. Camila Carneiro Dias Rigolin, a quem devo muito pelo meu amadurecimento acadêmico. O objetivo da pesquisa centrou-se em verificar a natureza da comunicação pública em saúde no portal da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, mediante a análise de cartilhas informativas disponível na aba dedicada ao cidadão. No período de abril de 2016 a março de 2018, exerci a função de inspetor de alunos na Escola de Ensino Fundamental Brasilina Teixeira Ianoni, situada no Jardim Cruzado, na cidade de Ibaté, localizada a cerca de 15 km de São Carlos. No referido período, trabalhei na organização e restruturação da biblioteca da escola, que possui mais de 850 alunos, que inclui crianças na faixa etária de 4 a 13 anos e adultos, discentes do Ensino de Jovens e Adultos (EJA), além de realizar empréstimos de livros para os alunos do período da manhã. Em março de 2018, após quatro anos de espera, fui convocado para assumir a vaga de bibliotecário em um concurso realizado pela Câmara Municipal de São Carlos. Tal novidade me provocou excitação (pois este novo trabalho me possibilitaria melhores condições financeiras), embora tenha ficado com o coração partido (literalmente) por abandonar a comunidade escolar que aprendi a amar (Enfim, partiu, novos desafios!) Dentre meus objetivos futuros, pretendo aliar os conhecimentos adquiridos academicamente e profissionalmente às causas sociais, educacionais e políticas que acredito (Participo como voluntário em projetos sociais há sete anos). Em vias de conclusão, olhando para meu percurso como estudante e profissional de BCI, vejo o quanto aprendi e amadureci, através dos erros e acertos. Portanto, sei que ainda há um longo caminho a percorrer, pois como profissional da informação e vivendo em mundo marcado por constantes e abruptas transformações, tornou-se uma questão de sobrevivência reinventar-me. E quanto ao futuro? Cenas de um próximo capítulo (Talvez, escrito na Pedagogia, minha segunda graduação, que iniciei em 2017, portanto, atualmente estou cursando o sétimo período, com o objetivo de ...). 347 Referências ACERVO disponível: conheça a Biblioteca da Fundação Pró-Memória de São Carlos, um patrimônio em obras, documentos, livros, títulos e materiais digitalizados. Kappa Magazine, São Carlos, ano 3, n. 110, p.58-60, nov. 2015. Disponível em: http://www. revistakappa.com.br/edicoes/saocarlos/edicao_110/. Acesso em: 17 abr.2020. JORNAL São Carlos 624 BL02. São Carlos, 2015. 1 vídeo (5:53 min). In: JORNALISMO TVE São Carlos. São Carlos, 2015. Disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=BQDCXXdRvXw. Acesso em: 17 abr.2020. SÃO CARLOS. Prefeitura. Fundação Pró-Memória disponibilizará acervo de Ítalo Savelli. São Carlos, 22 out. 2015. Disponível em: http://www.saocarlos.sp.gov.br/index.php/ noticias-2015/169355-fundacao-pro-memoria-disponibilizara-acervo-de-italo-savelli. html. Acesso em: 17 abr.2020. 348 Foto: Waldeck Schutzer RELATO DE SOBRE O TRABALHO NA BIBLIOTECA E A TRAJETÓRIA NO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS – UFSCar CÉLIA APARECIDA RUFINO GOMES DA SILVA* Eu sou funcionária da Unesp Câmpus de Rio Claro-SP há vinte e sete anos. Quando tive a oportunidade de prestar o concurso de acesso interno, hoje dito Mobilidade funcional, no ano de 2000 para a função de auxiliar de biblioteca foi surpreendente, pois tive pouco tempo para estudar e tentar assimilar a teoria com a prática do serviço na biblioteca, graças a Deus e ao meu empenho fui aprovada e comecei a trabalhar neste mesmo ano. Já no inicio do trabalho fiquei maravilhada com as atividades que eu tinha que realizar, percebi que podemos efetuar várias funções que envolvem os processos desde o preparo físico de uma obra que fará parte do acervo, como também efetuar atendimento ao usuário de maneira presencial ou virtual de maneira eficaz. Para que eu pudesse me interagir ainda mais com as diversas atividades na biblioteca, prestei o vestibular na Universidade Federal de São Carlos UFSCar, mas não consegui passar na primeira tentativa, resolvi * Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2014). Licenciada em Letras. Contato: celia.rufino@unesp.br. 350 então prestar o vestibular para o curso de Letras na Faculdade Claretiano em Rio Claro-SP, conclui e em seguida prestei novamente o vestibular para o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação no ano de 2010 e assim realizei o meu sonho. A minha trajetória na graduação no curso de biblioteconomia e ciência da informação foi excepcional, tive contato com uma turma que jamais irei esquecer devido as trocas de experiências adquiridas. No inicio alguns alunos da geração mais nova não tinham a certeza pela escolha do curso, mas estavam ali sanando suas dúvidas e sempre contando com ajuda dos professores que estavam prontos a atendê-los. Um exemplo é o caso do dedicado aluno Fernando Brito que naquele período gostaria de ser advogado e não sabia o que estava fazendo no curso de Biblioteconomia, mas ele teve a felicidade de ter o esclarecimento da saudosa professora Vera Regina Casari Boccato, que amava o que fazia e o convenceu a concluir o curso, dizendo que ele poderia também futuramente fazer o curso de direito e em paralelo a biblioteconomia poderia ser um bibliotecário jurista. Vários colegas de classe sabendo do meu trabalho na biblioteca perguntavam se o bibliotecário tinha mesmo que saber de tudo, chegaram a dizer o termo: “o bibliotecário seria um google ambulante”? A minha resposta para alguns colegas era que ao prestar o atendimento à comunidade temos que ter conhecimento de todos os serviços oferecidos como empréstimo entre bibliotecas (EEB), Comut, ofertas de treinamentos de bases de dados entre outros, mas que várias funções tinham suas especificidades como por exemplo: a função do profissional que auxilia os usuários no emprego das normas da ABNT na elaboração dos trabalhos acadêmicos, nos quesitos das citações e estrutura dos textos, a função da elaboração da ficha catalográfica, e na orientação quanto ao uso correto de bases de dados confiáveis, portanto o papel do bibliotecário é o de mediador entre a informação e o cliente ou usuários de uma instituição ou empresa. As aulas foram ministradas pelos excelentes professores: Roniberto Morato do Amaral, Hélio Márcio Pajeù, Leandro Innocentini Lopes de Faria, Nádea Regina Gaspar, Luzia Sigoli Fernandes Costa, Ariadne Chloë Mary Funival, Camila Carneiro Dias Rigolin, Carlos Roberto Massao Hayashi, Luciana de Souza Gracioso, Maria Cristina Comunian Ferraz, Maria Cristina P. Innocentini Hayashi, Rogério Aparecido Sá Ramalho, Sérgio Luis da Silva, Wanda Aparecida Machado Hoffmann, Zaira Regina Zafalon e Vera Regina Casari Boccato. 351 Estes conseguiram em sala de aula passar as teorias aliadas às práticas de bibliotecas de uma forma bem prazerosa. Como eu sou da cidade de Rio Claro-SP tinha que viajar todos os dias para a cidade de São Carlos inclusive aos sábados, mesmo estando bem cansada para assistir as aulas do final da semana eu conseguia assimilar os conteúdos das disciplinas dos professores Roniberto, Zaira, Luciana e Chloë, posso dizer que aulas dadas foram aulas estudadas. Durante a trajetória no curso ouvi vários depoimentos de alunos já formados que trabalhavam como bibliotecários na TAM, Embrapa, Petrobras, Natura entre outras, conclui que o curso de biblioteconomia capacita o profissional em bacharelado em biblioteconomia e Ciência da informação, com a missão de formar bacharéis dotados de visão interdisciplinar capazes de contribuir para o desenvolvimento da ciência e da tecnologia. O objetivo do curso é formar profissionais com competências e habilidades para solucionar questões relacionadas à seleção, à coleta à organização, ao tratamento, à disseminação e ao acesso da informação e do conhecimento produzidos em diferentes meios e suportes, bem como aptos a gerenciar os fluxos e estoques, de forma a eliminar os excessos de informação. Atualmente trabalho na biblioteca da UNESP há 20 anos e a minha função é Assistente de Suporte Acadêmico I, locada na Seção Técnica de Aquisição e Tratamento da Informação – STRAUD. Eu sou apaixonada pelo que faço e a minha formação acadêmica provinda da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar me proporcionou conhecimentos que utilizo na prática diária. Trabalhar em biblioteca é um presente divino, é estar em constante aprendizado; estou diante de diversas ferramentas que me auxiliam na divulgação da informação, e estas proporcionam o conhecimento, seja pelo meio físico, o livro, pelo meio virtual ou pelas trocas de informações ao estar em contato direto com o usuário. 352 Foto: Sílvia Moura CONTRIBUIÇÃO DO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIAS DA INFORMAÇÃO PARA MINHA ATUAÇÃO PROFISSIONAL SANDRA TIOSSI* Meu nome é Sandra Aparecida Tiossi e ingressei na UFSCar no curso de Biblioteconomia e Ciências da Informação no ano de 2009, como aluna transferida Curso de Pedagogia da UNESP – campus Araraquara. Trabalhava na Biblioteca da Faculdade de Ciências e Letras – UNESP – Campus Araraquara (FCLAr) e a graduação na área foi importante na minha formação profissional, na medida em que me ofereceu subsídios para ampliar meus conhecimentos. Atuei na Biblioteca da FCLAr de 2000 a 2013, e decidi frequentar o curso Biblioteconomia e Ciências da Informação para me aprofundar nos serviços relacionados à uma Unidade de Informação, assim como conseguir a promoção no plano de carreira estabelecido pela UNESP aos servidores técnico-administrativos. Logo nos primeiros meses de curso, início dos princípios básicos das disciplinas, pude ter uma percepção maior sobre o funcionamento de uma biblioteca, em especial a universitária, principalmente relacionados ao Serviço de Referência, seção em que eu atuava, e assim comecei a aliar a teoria aprendida à pratica do dia a dia no ambiente de trabalho. O fato de cursar o Ensino Superior fez ampliar minhas possibilidades e meus serviços deixaram de serem ativida- * Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2012). Contato: sandra.tiossi@unesp.br. 354 des básicas – emprestar, devolver e guardar livros – tornando-se mais elaborados, tais como: • participação na elaboração do planejamento estratégico da Seção de Referência: estabeleciam-se prioridades que norteavam o desenvolvimento e a construção dos próximos anos da Biblioteca. Em conjunto com os demais servidores, eram constituídas metas e elaborações de diagnósticos para que a Direção da Biblioteca tomasse decisões pautadas em análises práticas do ambiente de trabalho, prática muito debatida em sala de aula. • assistência em orientação de pesquisa bibliográfica em bases de dados, catálogos, buscadores, índices e outras fontes de informação existentes: neste trabalho, foram inseridas questões sobre o comportamento de busca e uso da informação, com a observação dos vários métodos que os usuários utilizam para descobrir e acessar as fontes de informação, assim como foi empregado os referenciais ministrados no curso sobre as teorias lógicas simbólicas, utilizadas nas atividades de pesquisa e recuperação da informação, associada com o conhecimento aprendido sobre as bases de dados, tais como a utilização da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações, Portal de Periódicos da Capes, BIREME, SCIELO, portal IBICT entre outros. • serviço de comutação bibliográfica de materiais em bibliotecas nacionais e internacionais. Neste trabalho, foi aplicado o conceito de intercâmbio de registros entre unidades de informação, cujo objetivo é ajudar no alcance de materiais documentais que não tem disponíveis em bibliotecas locais, colaborando na obtenção de informação, portanto sendo mediador entre a informação e o usuário. • controle de registro de usuário no sistema ALEPH (sistema utilizado em toda a rede de Bibliotecas da UNESP): neste trabalho, foi possível visualizar o funcionamento de um banco de dados, observando as formas, teorias e raciocínios lógicos utilizados para a representação e recuperação da informação. • mapeamento estatístico de materiais bibliográficos: devolução, empréstimo, circulação, renovação e consulta de obras: novamente aqui foi praticável o conceito de diagnósticos em Centro de Informação, pois o mapeamento dava suporte para realizar um mapa do 355 cenário do fluxo dos materiais e assim indicava quais as maneiras para se interver nos processos. • capacitação de usuários através de treinamento realizado para os alunos ingressantes dos cursos de graduação da FCLAr: o contato com a comunidade usuária permitia utilizar as concepções de usos e usuários da informação, com a observação do comportamento informacional e comportamento de busca da informação. Ensinava a comunidade a adquirir o hábito de utilizar as bases de dados em suas pesquisas acadêmicas. • cadastro biométrico dos usuários da biblioteca da Rede UNESP: novamente a utilização dos conceitos de banco de dados, assim como os de organização, sistemas e métodos. • participação na organização dos eventos referentes à Semana do livro e da biblioteca, cujo objetivo era dar incentivo à leitura, divulgar o livro e o papel da biblioteca como mecanismo para a construção do saber e como espaço público para práticas sociais. Observando a teoria transmitida em sala de aula com a prática de trabalho em um Centro de Informação, percebe-se a associação entre os dois tópicos, tanto na ênfase social do curso, como na ênfase empresarial e tecnológica. Sentia-me inserida dentro do contexto do plano das discussões, relacionadas com o profissional atuante em Centros de Informação, tantas vezes ministradas em sala de aula, palestras e seminários e assim pude refletir sobre a atuação profissional e a realidade em que ele está envolto. Nos serviços que estavam sob minha responsabilidade, procurei aplicar os conhecimentos aprendidos para o aprimoramento dos meus trabalhos. Até mesmo o simples ato de se recolocar um livro na estante, remetia ao estudo da CDD – Classificação Decimal de Dewey, sistema de “classificação documentária” desenvolvido por Melvil Dewey, importante e essencial para o trabalho de classificação bibliográfica, onde se organiza todo o conhecimento do mundo em dez classes principais. No universo das estantes de livros, a classificação do conhecimento nestas dez classes torna-se perfeitamente visível. Na maioria das ações, vislumbrava além da uma simples tarefa mecânica, analisei a forma que poderia empregar ações que possibilitem a comunicação com os usuários de maneira eficiente e eficaz e deste modo, tornar os serviços mais dinâmicos. Nos dias atuais, consigo visualizar, com maior clareza, a função de uma Biblioteca, como suporte à pesquisa acadêmica, o 356 que me possibilitou que auxiliasse o usuário-pesquisador na sua busca informacional, seja através das plataformas digitais, bases de dados, catálogos científicos ou acervos físicos. Conforme aprendia nas disciplinas do referido curso, meu atendimento se aperfeiçoava, e com isso, percebi a visibilidade do catálogo da Biblioteca da UNESP, tanto nacional como internacionalmente. Neste sentido, pude assimilar o destaque importante das Bibliotecas no progresso científico, tecnológico e social, produzindo métodos e dinâmicas para guardar e disseminar a informação – seja através de tecnologias digitais ou impressas – os conhecimentos produzidos pela sociedade, perpetuando assim a memória. Importante salientar o benefício do avanço das TICs – tecnologias de informação e comunicação – para o profissional de um Centro de Informação: uma delas é a Internet, que além de disponibilizar uma quantidade infinita de ferramentas para a organização do acervo de uma biblioteca, também democratizou o acesso e a busca pela informação. Com o aparato das TICs, as bibliotecas acompanham os métodos de desenvolvimento tecnológicos e introduzem técnicas, sistemas e processos automatizados, consequentemente, oferecem um tratamento diferenciado ao armazenamento, registro, disseminação e recuperação da informação. As disciplinas relacionadas à informática, à comunicação, aos fundamentos da Biblioteconomia, à normalização documentária, à lógica dos sistemas de recuperação da informação, as fontes de informação e a sociedade do conhecimento ajudaram a formar a minha construção do saber, no sentido que foram abrindo meus conhecimentos que, até então eram técnicos, para o saber acadêmico. Nostalgicamente falando, percebia que o novelo de lã, que antes era apenas um emaranhado de fios, começou a formar belo casaco. O curso foi avançando nas disciplinas e as áreas foram tornando-se mais abrangentes, as mesmo tempo mais específicas: ênfases relacionadas a gestão de redes, gestão da informação, linguística, serviços de referencia, análise documentária, representação documentária, administração, analise do discurso e banco de dados, que aparentemente parecem áreas distintas, mas que aplicadas na prática, percebe-se sua interligação. Tive a oportunidade de estudar Biblioteconomia e Ciência da Informação ao mesmo tempo em que trabalhava na área, então, o processo de assimilação de todo esse conhecimento científico e acadêmico, aplicado à prática do trabalho, e desta forma aliando trajetória acadêmica com a vivência profissional, me tornaram preparada para atuar com proficiência na área. 357 O estágio obrigatório foi realizado no ano de 2012, na Faculdade de Odontologia – UNESP – Campus Araraquara, meu primeiro contato com uma Unidade de Informação da área biológica e consistia na coleta de dados na Base Aleph. O Serviço Técnico de Biblioteca da Faculdade de Odontologia precisava realizar um projeto de mapeamento do fluxo de circulação, com interpretação de resultados para elaboração de projetos que utilizem tais dados como subsídios para otimização dos produtos, serviços, estrutura física e recursos humanos. Para isso, foi elaborada uma planilha de Excel, com coleta de dados de dos anos de 2011 e 2012, com todos os tipos de materiais que continham no acervo, todos os status de usuários, com o total geral e média por dia, por mês e por ano e gráficos de todos estes tópicos. Era preciso também mapear estes dois anos, em um módulo do Sistema Aleph sobre empréstimo, renovação e devolução por status de usuário e por tipo de material. Os dados coletados foram utilizados como embasamento para que a Diretoria da Biblioteca da FOAr, utilizasse-os no Planejamento Anual 2013 e na revisão de objetivos e metas. Este trabalho me trouxe uma compreensão de como é o funcionamento na prática de um banco de dados, aprendizado teórico que tive em disciplinas voltadas à banco de dados. Esta atividade e a de alimentação na planilha Excel dos dados coletados no Aleph elucidaram sobre o uso das TIC’s nas bibliotecas universitárias, no qual é discutido em várias disciplinas do curso, além da análise dos usuários, onde foi possível aplicar a compreensão da importância de se conhecer o público que utiliza a biblioteca, fato tantas vezes narrada pelos docentes do curso. Ainda sobre a base de dados Aleph, foi possível verificar a forma como são inseridos os materiais nesta base, relembrando as disciplinas referentes à representação descritiva. Também me foi possível observar o valor de se ter dados documentados e com fundamentos para embasar o planejamento estratégico com vistas à tomada de decisões, tais como aumento do quadro de funcionários, aumento do espaço físico, entre outros, como foi analisado em disciplinas voltadas à área de gestão em Centros de Informação. Neste estágio, houve o treinamento sobre a Classificação de Black, no qual foi possível observar como é o funcionamento de um sistema documentário hierárquico na área de Odontologia, e posteriormente entender a organização do acervo, fato exposto nas disciplinas de representação temática. Obtive treinamento sobre as normas Vancouver, ferramenta utilizada para normalização documentária, que me trouxeram esclarecimentos sobre 358 as atividades de normalização dos trabalhos acadêmicos realizados na Faculdade de Odontologia e as diferenciações sobre esta e a norma ABNT. Durante o processo do estágio tive treinamentos sobre a Tabela de Classificação Black, utilizadas para representação temática, que me trouxe mais esclarecimentos sobre os tópicos classificação e catalogação. Participei da Semana do livro e da biblioteca, promovido pela Biblioteca da Odontologia, onde tive um contato maior com a comunidade usuária da área de odontologia. O estágio me deu experiência na área tanto de Biblioteconomia como na de Odontologia, tornando realidade os conceitos transmitidos em sala de aula aplicada na prática, alguns de forma sutis e outros mais claramente, trouxe habilidade no manuseio dos sistemas de informação e ajudou na compreensão das competências deste profissional como o agente mediador da informação. O meu trabalho de conclusão de curso foi orientado pela Profa. Dra. Zaira Regina Zafalon, intitulado “Serviço de disseminação seletiva da informação na FCLAr/UNESP: proposta com foco nos perfis temáticos de pesquisa docente”. Consistiu em um estudo para realizar um serviço de disseminação seletiva da informação (DSI) na Biblioteca da FCLAr, dirigido ao corpo docente ligado aos departamentos de ensino da Unidade, configurado assim como um caminho de comunicação da Biblioteca com os docentes e pesquisadora, com base nos perfis temáticos deles. O perfil temático dos materiais pertencentes ao acervo da Biblioteca foi alcançado a partir dos dados da Classificação Decimal de Dewey e o perfil temáticos dos docentes foi obtido através do registro no Currículo Lattes. A partir da coleta destes dados, foi feito o cruzamento dos perfis estudados, através de uma planilha do sistema Excel. De maneira empírica, trabalhei na monografia sob várias áreas ensinadas ao longo do curso, assim como nos trabalhos acadêmicos apresentados ao longo do curso, são eles: • Normas ABNT: que estabelece normas e padrões para o trabalho científico, e deste modo pude aprender na prática a normalização de trabalhos acadêmicos. • Metodologias da pesquisa científica: aprendizado sobre elaboração de projeto de pesquisa, planejamento do trabalho científico, observação científica e sua proposta para solução de incertezas da prática profissional. • Classificação Decimal de Dewey: a importância das linguagens documentárias hierárquicas na disposição e localização dos documentos. 359 • Curriculum Lattes: plataforma on line utilizada como modelo nacional no registro do trajeto acadêmico de estudantes e pesquisadores do Brasil. • Manuseio na planilha Excel para a criação das planilhas eletrônicas utilizadas no estudo. • Pesquisa em base de dados: para o referencial teórico, foi necessário acessar as bases de dados, trabalho do pesquisador acadêmico. • Ficha catalográfica: elaboração da ficha catalográfica, segundo as regras de representação bibliográfica e regra dos catálogos aprendidas nas disciplinas sobre catalogação bibliográfica. • Exposição oral para a banca constituída por docentes para avaliar a pertinência do trabalho: oratória em que eu tinha que expor de forma convincente o trabalho efetuado. Ao longo destes quatro anos, além dos ensinamentos transmitidos dos mestres, há outros fatores que não são apresentados explicitamente em disciplinas, mas não menos importante de se apresentar: a questão dos amigos que conquistamos ao longo destes anos de faculdade, nos mostrando o valor do trabalho em equipe e o valor da solidariedade uns para com outros. A amizade feita em sala de aula, tanto com os demais alunos quanto com os professores, é um fator impulsionador que alicerçou muitas vezes as dificuldades de assimilação do conhecimento, de elaboração dos trabalhos e das apresentações dos mesmos. Atualmente, meu campo profissional é em outro setor, além-muros da Biblioteca da FCLAr: trabalho como assessora administrativa do Departamento de Ciências da Educação da FCLAr. Para alcançar este cargo de confiança, possuir um diploma de ensino superior, e em especial Biblioteconomia e Ciência da Informação, teve um peso significativo. A questão da multidisciplinaridade do curso é o que o torna versátil, tornando o profissional hábil para atuar em várias áreas. Devido à sua identidade e afinidades, algumas profissões atribuem para si funções e competências específicas de outros ofícios: os profissionais da informação tradicionais (bibliotecários, arquivistas entre outros), se juntam a outros profissionais que trabalham com informação, comunicação, informática entre outros. No caso, o assessor administrativo “transporta” para o Departamento seu trabalho inerentemente relacionado ao ciclo da informação, colocando em prática as competências aprendidas sobre o fluxo da informação, neces- 360 sárias para o desempenho do ofício. O convívio entre os indivíduos, com destaque ao campo profissional, tem sido impactado com a explosão informacional, especialmente na área digital. O assessor que trabalha diretamente com informação, além de conhecer as particularidades da empresa que atua e a maneira como transcorre o fluxo de dados, deve possuir a habilidade para identificar as tecnologias necessárias e suas características para a execução de suas atividades, dominar os serviços acessíveis, como eles funcionam e como devem ser utilizados, com o propósito de dinamizar suas tarefas, consequentemente, possibilitando uma melhor comunicação entre os demais membros do setor que atua e as demais organizações e seções que mantém contato. Para que as tarefas a serem executadas sejam feitas com efetividade, o conhecimento das TICs é de fundamental importância. Nos dias de hoje, é requisito básico o assessor administrativo da UNESP ter conhecimento das novas tecnologias de informação e comunicação, assim como o permanente aprimoramento sobre o desenvolvimento das TICs. A otimização das tarefas o favorece em diversos âmbitos: a informatização de documentos, transferência de informações, documentos e a difusão de documentos, uso da Internet para transmissão de informações, utilização de programas de computador (como Excel, Word e Power point), utilização dos diversos sistemas que a UNESP disponibiliza para acesso a dados relacionados às seções, departamentos e organizações que interligam seus trabalhos, tais como: sistema acadêmico, suporte técnico, sistema de gestão de documentos, gerenciamento de inscrições on line, seção de gestão administrativa, entre outros. Ter aprendido no curso de Biblioteconomia e Ciências da Informação o manuseio e todo o aparato relativo às TICs sobre sistemas, programas de computador e Internet, me trouxe muitos benefícios para minha profissão. Trabalhar em assessoria administrativa requer conhecimento das leis, portarias e regras que são determinadas pelas UNESP e saber onde encontrá-las, como executá-las, como aplicá-las e como e para quem transferi-las é de fundamental importância. Dentre as fontes de informação que são próprias para utilização em Departamento de Ensino, o assessor administrativo tem representação relevante, pois exerce o papel de intermediador da informação. A maioria de suas atividades são intensivas à informação, o que lhe exige conhecimento, habilidade e atitude. Portanto, as competências e habilidades estabelecidas e ministradas no curso, que norteiam a interação e agregação de valor nos procedimentos de geração, transferência e uso da informação; no planejamento e na execução de recursos e produtos de informação e o 361 trabalho com fontes de informação de diversos ambientes, me são perfeitamente cabíveis no ambiente de trabalho. A característica interdisciplinar do curso, a flexibilização dos programas de ensino, que vão desde áreas como a análise do discurso, passando pelos tópicos próprios da biblioteconomia, da administração, entre outras, até as áreas como banco de dados, contribuiu para que minha trajetória profissional tivesse ascensão e tomasse outra direção, e assim me foi possível aplicar empiricamente os conceitos aprendidos no curso no ambiente de trabalho. Aproveito a oportunidade para agradecer a cada um dos meus mestres pelo ensinamento transmitido, oportunidade tão valiosa de crescimento, assim como agradecer aos funcionários da UFSCar pelo atendimento dedicado e aos amigos que conquistei na BCI 09. 362 Foto: Sílvia Moura UM FUTURO CONSTRUÍDO DIARIAMENTE KLICIA SILVA MENDONÇA* Ingressei-me na Universidade Federal de São Carlos no ano de 2011 e, desde a apresentação do curso pude observar o pioneirismo e a tendência ao espírito inovador. Entretanto, o que parecia apenas uma primeira impressão acabou se confirmando ao longo dos anos, moldando toda a minha experiência durante a graduação e formando minha vida profissional. Minha escolha pelo curso foi motivada pelos excelentes índices de recomendação que o curso apresentava em revistas especializadas na temática e me atraía o fato de que minha formação não ficaria restrita à biblioteconomia, mas seriam agregados conceitos da Ciência da Informação, além da opção de escolha entre as ênfases oferecidas. Dessa forma, enxergava a capacidade de adequar a minha trajetória acadêmica para o cenário futuro. Assim, durante a minha graduação procurei observar tendências e desenvolver habilidades que fossem competitivas de acordo com as exigências do mercado. Durante o desenvolvimento das disciplinas, pude observar não só as aptidões profissionais e a formação acadêmica dos professores, mas também uma postura ética e transparente, sempre disponível para melhor atender aos alunos. Além disso, todos os professores apresentavam grande atenção e preocupação com as inovações do mercado, sempre se mostrando atualizados e prontos para as novas tecnologias disponíveis. Isso foi de suma importância para mim, uma vez que era * Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2014). Bacharelado em andamento em Administração de Empresas (IFSULDEMINAS). Contato: kliciam@gmail.com. 364 uma grande motivação para que eu buscasse cada dia mais me assemelhar com aquela postura profissional que eu passei a admirar. Desde o primeiro semestre pude participar de excelentes projetos de extensão nos quais pude adquirir experiências profissionais e pessoais valiosas, que fizeram com que minha qualificação extrapolasse as ementas de cada disciplina, já que eu podia colocar em prática todo o conhecimento adquirido em sala de aula. Pude atuar junto a Unidade Especial de Informação e Memória (UEIM), parte constituinte do Centro de Educação e Ciências Humanas da UFSCar, onde desenvolvi atividades de restauro, higienização, organização, identificação e catalogação de informações de grande valor histórico. Dessa forma, pude observar a importância da conservação da informação não como simples itens de um acervo, mas como parte viva de histórias que foram realmente vividas, provadas e experimentadas por pessoas que dedicaram seus dias na construção de suas memórias. Pude perceber um grande crescimento pessoal durante essa experiência que até hoje me influencia em meu contato profissional com a informação. Aprendi assim que os esforços para a conservação vão além do objetivo de prolongar a permanência de um item no acervo, mas é a preservação do contato do presente com o passado, em uma colaboração e relação na construção da história compreendida como a aprendizagem que possibilita a existência de um futuro melhor. Durante a graduação, além do cumprimento das disciplinas obrigatórias, pude também ter diversas experiências de estágios em diferentes instituições públicas e privadas, desempenhando atividades ligadas à bibliotecas escolares e universitárias, além da construção de acervos públicos e particulares, de diferentes formatos. Assim, pude aplicar efetivamente tudo o que era transmitido nas aulas desenvolvendo, assim, inúmeras habilidades características do profissional da informação como a catalogação, linguagens e técnicas de representação e recuperação, classificação da informação para o desenvolvimento de acervos, referência, usos e usuários da informação, banco de dados, acervos digitais, organização e todas as etapas do processamento técnico. Era visível a total compatibilidade entre o conteúdo das disciplinas e as necessidades da prática profissional e perceptiva a capacidade de desenvolvimento de todas as atividades exigidas devido a qualidade do ensino. 365 Por tais experiências, pude adquirir novos conceitos práticos sobre a informação, como um instrumento de transformação humana na transmissão do conhecimento e edificação de novos horizontes para o ser humano, enquanto ator da sociedade. Perceber a importância da informação como agente transformador de realidades, construtor de descobertas e responsável por impulsionar e capacitar o homem no cumprimento de seus anseios e necessidades, apresentando novos desafios e oportunidades. Atuar em uma biblioteca escolar e poder participar do processo educacional de uma criança é ter a oportunidade de apresentar de novos mundos através da leitura e aprendizado, percebendo a beleza da descoberta e do conhecimento proporcionados pela informação dos livros. Ao mesmo tempo, a informação ganha aspecto desafiador para os usuários de uma biblioteca universitária, sendo a transmissão do conhecimento essencial para o desenvolvimento de novos profissionais ou pesquisadores que atuarão na sociedade, transformando realidades e descobrindo novos horizontes a serem alcançados. A possibilidade de participação em eventos também foi de grande importância para a minha construção profissional, uma vez que pude ter contato com realidades que, até aquele momento, pareciam distantes de mim. Isso colaborou muito para que estivesse preparada para enfrentar as diferentes situações da profissão, uma vez que o conteúdo de cada evento, palestra, workshop, curso ou apresentação de trabalho acadêmico pôde me oferecer bagagem diante da imprevisibilidade do mercado. Também durante a minha trajetória acadêmica pude participar da Empresa Júnior do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação, a InfoJr. BCI. Tal experiência é de grande satisfação para a minha vida pois contribuiu muito para determinar minhas áreas de interesse de atuação. Pude observar a importância de se obter um diferencial e de se buscar aprender a cada dia novas técnicas e aptidões para se alcançar oportunidades e vencer desafios. Durante a minha permanência na InfoJr. BCI pude presenciar o crescimento dos alunos através do auxílio e apoio dos professores no empenho e dedicação por um ideal, apesar das dificuldades impostas pela novidade daquilo que estávamos desempenhando. Após o cumprimento das disciplinas obrigatórias, optei pela ênfase em Informação Tecnológica e Empresarial, onde pude ter contato com um universo de atuação ainda mais amplo, na aplicação das habilidades profissionais voltadas para a competitividade. 366 O contato com o conteúdo direcionado para o mercado, na importância da informação para a gestão e administração como um recurso intangível de grande valor nas organizações era uma novidade para mim. Conhecer novos ambientes de atuação e o diferencial da colaboração da atuação do profissional da informação no meio empresarial e tecnológico foi essencial para a minha carreira, uma vez que pude perceber de forma mais clara o ambiente no qual desejaria atuar e desenvolver minhas atividades profissionais. Dessa forma, passei a perceber o profissional da informação não só como um canal de transmissão da informação até o usuário, mas também como aquele capaz de manusear a informação a fim de agregá-la de valor, tornando-a efetivamente um bem importante dentro de uma organização. Terminadas as disciplinas, foi o momento de desenvolver o Trabalho de Conclusão de Curso. Pude contar com o total apoio da Professora Doutora Maria Cristina Comunian Ferraz, a quem tenho grande admiração e gratidão por ter me auxiliado desde a definição do tema, no desenvolvimento e na realização do trabalho intitulado O conhecimento tradicional na ciência da informação brasileira: um levantamento de grupos de pesquisa no DGP/CNPq. Nosso trabalho tinha como objetivo observar a importância da colaboração da Ciência da Informação no desenvolvimento de pesquisas científicas sobre a temática do conhecimento tradicional a fim de promover maior debate sobre o assunto visando aumentar a proteção, respeito e visibilidade das comunidades tradicionais nos ambientes acadêmicos. Durante a realização das pesquisas pude então adquirir uma visão ainda mais ampla sobre o conhecimento, desta vez como herança e parte integrante da identidade dos seres humanos em seu desenvolvimento enquanto membros de uma sociedade, um todo no qual o homem transforma e é transformado em suas relações com os seus semelhantes e com aqueles que lhes são diferentes, em um meio ambiente que deve acolher a cada um em suas particularidades. Através do desenvolvimento deste trabalho pude transformar em algo palpável toda a contribuição, aprendizagem e experiências obtidas nos anos de graduação, colocando em prática atitudes éticas de pesquisa e trabalho aprendidas ao observar o exemplo dos professores. Além disso, pude aprender com a Professora Doutora Maria Cristina Comunian Ferraz muito mais do que técnicas do trabalho científico, mas a agir de forma a transformar a realidade, se não o mundo todo, pelo menos o mundo ao meu redor. Esse ensinamento prevaleceu sobre todas as coisas e me acompanha até hoje, sempre me fazendo recordar da minha capacidade de mudança. 367 Assim, terminada a minha trajetória acadêmica na UFSCar, optei por ingressar no mercado de trabalho onde pude colocar em prática todo o conhecimento adquirido em buscas de experiências ainda mais desafiadoras e gratificantes. Sou atualmente Bibliotecária responsável pelas bibliotecas de uma rede de ensino onde posso diariamente perceber que a minha realização profissional de hoje é devido à contribuição de cada uma das experiências e aprendizagens que pude adquirir durante a minha graduação. Desenvolvo e coordeno todas as atividades relacionadas à gestão de bibliotecas, desde a seleção, planejamento e desenvolvimento de coleções, adequação ao plano pedagógico, classificação, organização e preservação do acervo, atendimento aos diferentes tipos de usuários além da gestão de recursos humanos e materiais. Atualmente sou também estudante e pesquisadora da área de Administração de Empresas, onde são aplicados conceitos sobre disseminação e organização da informação para a competitividade empresarial voltada para o campo de políticas públicas social, econômica e ambientalmente sustentáveis. Toda a minha experiência e conhecimentos adquiridos durante a minha graduação são de grande importância para que eu possa desenvolver as minhas atividades já que tenho muito mais segurança e domínio sobre a pesquisa. De toda a minha história, posso atestar que a minha trajetória na Universidade Federal de São Carlos e minhas experiências no curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação foram essenciais na minha construção não somente profissional ou acadêmica, mas também pessoal. A dedicação dos professores em alcançarem objetivos sempre além, buscando o reconhecimento e espaço, não medindo esforços e sem se deixarem limitar pelas dificuldades foram ensinamentos de valor inestimável, uma vez que vai muito além do cumprimento de conteúdos programáticos. O contato com o exemplo de profissionalismo e a busca pelo aprimoramento sempre constante, além da preocupação com a seriedade e qualidade do trabalho, características de cada membro do Departamento de Ciência da Informação, foram essenciais para a minha formação e contribuíram para desenvolver em mim não só as habilidades exigidas a um profissional da informação, como também o desejo de buscar a inovação e o diferencial competitivo, com a certeza de que eu tenho essa capacidade aprendida durante a minha graduação. O trato com a informação em seus diferentes aspectos, como memória, agente social ou recurso competitivo me fez muito mais do que uma profissional completa e competitiva para o mercado, mas me capacitou para atuar de forma a utilizar a informação para o desenvolvimento humano, perceben- 368 do em mim características e habilidades que me tornam capaz de agregar valor e transformar a realidade em que me encontro. O espírito de inovação e o melhor desempenho percebidos desde o meu primeiro contato com o curso me fazem perceber hoje minha formação sólida e condizente com as exigências atuais do mercado de trabalho, me fazendo estar preparada para enfrentar os desafios e satisfazer as necessidades que me são apresentadas. Além disso, percebo ainda hoje a atualidade de tantos temas abordados durante a graduação, o que me torna uma profissional diferenciada. A minha vivência profissional atual é um fruto dos esforços e da dedicação de professores e funcionários do Departamento de Ciência da Informação que fizeram do curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação uma referência na formação e ensino, além de ser um grande diferencial competitivo. A preocupação constante com a qualidade no desempenho e desenvolvimento de cada disciplina e cada trabalho ao longo dos anos trouxeram consigo frutos de excelência. A perspectiva ampla de atuação que adquiri desde a graduação, percebendo as interrelações entre o curso e as diversas áreas do conhecimento me capacitaram a perceber oportunidades e alcançá-las. Posso, ao olhar para trás, perceber em minha trajetória a aprendizagem que extrapola as ementas e me fazem hoje ser quem eu sou. A UFSCar e o curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação foram de importância indescritível em cada uma das minhas conquistas profissionais, do meu crescimento pessoal e humano e do meu desenvolvimento acadêmico. Posso diariamente desempenhar minhas atividades com segurança, buscando a qualidade e a atenta às novas exigências e, ao observar o futuro, posso seguir com segurança sabendo-me capacitada para me preparar e estar à frente. Assim, o futuro de da minha decisão pelo curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação em 2011 chega dia após dia acompanhado de um imenso sentimento de gratidão e alegria, repleto da certeza de que não haveria melhor escolha a ser feita. O que virá a seguir continuará sendo enriquecido pela certeza de que a construção de tudo se dá na dedicação à perfeição em cada coisa. A todos que fizeram parte e compartilharam comigo tais experiências expresso minha sincera gratidão e, aos professores, alunos, funcionários, colaboradores e todos que continuam escrevendo a história de sucesso do 369 curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação desejo muitas realizações e determinação para que perseverem no desenvolvimento de uma ciência comprometida com a verdade e a ética, alcançando horizontes cada vez mais distantes e vencendo desafios cada vez mais difíceis para que no futuro nossas memórias sejam ainda mais belas. 370 Foto: Sílvia Moura QUANDO A SUA BIBLIOTECA É O UNIVERSO MARCOS TERUO OUCHI* “Faça Biblioteconomia. Dê uma olhada, pois existe o curso na UFSCar”. Esse foi o conselho que recebi de um ex-chefe, agora amigo Manoel Belem, ao informá-lo que pretendia concluir o curso superior em Ciência da Computação. Foi a primeira vez que ouvi a palavra biblioteconomia e não tinha a mínima ideia do que se tratava. “Se fizer Computação, vai chover no molhado”. Você precisa aprender mais sobre como organizar informações e entender de onde veio tudo isso, prosseguiu meu amigo referindo-se às tecnologias de informações. À época, em 2010, havia construído uma boa carreira na área de informática. Sou também técnico em eletrônica e trabalho com tecnologias de informação há mais de 30 anos. Comecei a “mexer” com computadores aos sete anos e com 14 consegui meu primeiro emprego como professor de programação. Sempre fui autodidata e isso me propiciou excelentes colocações no mercado, mesmo não possuindo curso superior. Não me preocupava muito com títulos, inclusive universitários, mas queria cursar uma universidade desde que pública e conceituada. Segundo meu amigo Belém, apesar de ter um bom domínio da informática, eu precisava conhecer de onde vinha tudo aquilo: teorias de classificação, indexação, organização, armazenamento, processamento, disseminação etc. Teorias que são amplamente utilizadas em sistemas de informação. Então, comecei a pesquisar sobre a área e o curso. * Mestre em Ciência da Informação (UFSCar) e Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação (UFSCar) (conclusão em 2014). Contato: marcos.teruo.ouchi@ gmail.com. 372 Me interessei, é claro. Encontrei inúmeras relações entre as abordagens do curso com diversos problemas que tive durante a minha carreira e que, talvez, se tivesse em mãos as teorias da área de Biblioteconomia e Ciência da Informação, teria resolvido esses desafios muito mais rapidamente e com custos menores. Por exemplo, em 2008 havia fundado uma empresa onde desenvolvi uma plataforma de e-commerce. Na verdade era um marketplace. Os maiores desafios giravam em torno de questões como: Devemos deixar os usuários vincularem palavras-chave aos produtos, serviços e empresas? Como as empresas e produtos devem ser apresentados em nosso catálogo online? Em que ordem ou sequência? Como as categorias seriam definidas? Como os clientes recuperariam as informações no mecanismo de busca? Como tratar o conteúdo de forma que os mecanismos de busca “indexariam” nossas páginas? Então, não poderia deixar de me interessar pelo curso uma vez que vislumbrei nele a possibilidade de encontrar subsídios em busca de respostas para as minhas indagações. Resolvi também ir até a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) para conhecer melhor o que me aguardava. Eu e minha esposa, Selma, visitamos o Departamento de Ciência da Informação e fomos recebidos pela Profa. Dra. Luzia Sigoli que, era a chefe desta seção. Neste dia, conheci também o Prof. Dr. Roniberto Morato do Amaral. Ambos me encorajaram e me apresentaram as perspectivas da profissão, as leis que garantiam vagas em inúmeras circunstâncias, entre outros aspectos. Mas, de fato, o que me convenceu foi a simpatia com que fomos tratados e o entusiasmo com que falavam do curso. Outro fator que me influenciou foram as palavras da Profa. e bibliotecária Carminda Nogueira de Castro Ferreira, a Dona Carminda, que em uma entrevista em vídeo no 23º Congresso Brasileiro de Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação falou sobre a área e os motivos pelos quais a maioria dos projetos de implantação de sistemas não obtinham sucesso. Do alto dos meus mais de 20 anos implantando sistemas de informações tive que concordar plenamente com ela. Em 2010 me inscrevi no Enem. Fazia mais de dez anos desde a última vez que havia estado em uma sala de aula. Resolvi estudar por conta própria. O autodidatismo se manifestava novamente. Além do mais, verifiquei a relação candidato por vaga do curso que era de 2,98. Achei que seria bem fácil. 373 Era a primeira vez que a UFSCar selecionaria seus alunos por meio do Sisu e, naquele ano, a relação subiu para, mais ou menos, vinte candidatos por vaga. Felizmente fui aprovado na primeira chamada. No dia de realizar minha matrícula, conheci a Profa. Dra. Luciana Gracioso e a secretária Rosângela Castilho. Nesta época, as redes sociais estavam entrando na moda e a do momento era o Orkut. Pela internet, conheci muitos veteranos e antes mesmo do curso começar já estava participando da reativação do Centro Acadêmico do Curso de Biblioteconomia e Ciência da Informação (CACIB) da UFSCar. Nossa primeira semana de aulas foi simplesmente inesquecível. Com inúmeras atividades promovidas pela coordenação do curso junto aos alunos. A Semana Inaugural contou com palestras, atividades, encontros e, é claro, trotes. As semanas seguintes foram muito empolgantes. Novos amigos, novos ambientes e nova rotina. Não foi fácil conciliar família, trabalho e estudo. Em particular para mim, pois acabara de me mudar para São Carlos. Estava muito empolgado e já nas primeiras aulas começamos a aprender sobre termos como indexação, classificação, taxonomias, vocabulários, organização de informações etc. que eram muito familiares para mim em outro contexto e que nunca havia parado para pensar nelas a fundo. Durante o curso, participei ativamente das atividades capitaneadas pela nossa coordenadora, a incansável Profa. Dra. Luciana Gracioso, que viria a se tornar nossa paraninfa. Entre essas atividades estavam: o Grupo de Estudos Avançados em Biblioteconomia e Ciência da Informação onde estudávamos artigos e conversávamos livremente sobre os assuntos, o Bibliomovie onde assistíamos a filmes sobre a Ciência e as bibliotecas, visita à Fazenda Conde do Pinhal que possui um acervo documental riquíssimo sobre a história de São Carlos, o café e a política regional da época. Realizamos também o primeiro evento Café Bibliosófico cujo objetivo era, em torno de uma mesa de café, ouvirmos as experiências de bibliotecários de sucesso. Neste evento tivemos a sorte de ter a bibliotecária e Profa. Dra. Elisabeth Márcia Martucci, nossa patronesse e chefe de gabinete da reitoria da UFSCar contando sua história e inaugurando o evento. A Profa. Luciana também foi e ainda é uma das principais incentivadoras dos movimentos estudantis. Junto com o Prof. Dr. Rogério Ramalho incentivou e apoiou as nossas iniciativas no CACIB e na Empresa Júnior de Biblioteconomia e Ciência da Informação (InfoJr). 374 Reativamos o CACIB. Reescrevemos e registramos seu estatuto. Tenho orgulho de dizer que por minha sugestão o CACIB foi rebatizado e recebeu o nome Centro Acadêmico Profa. Dra. Carminda Nogueira de Castro Ferreira, com autorização da família da homenageada. Em 2011 o CACIB coordenou a VIII Semana de Biblioteconomia e Ciência da Informação que foi, até então, a única a integrar em um único evento a Semana de Biblioteconomia e Ciência da Informação, o Seminário Integrado Programa de Educação Tutorial Biblioteconomia e Ciência da Informação e Coordenadoria de Comunicação Social da Universidade Federal de São Carlos e o Workshop da InfoJr. Tinha como tema “100 Anos de Biblioteconomia no Brasil: perspectivas futuras”. No Seminário Integrado do PET, apresentei, com meu amigo Antonio Carlos Conserva, e sob orientação do Prof. Dr. Rogério Ramalho, o trabalho intitulado “Disseminação e enriquecimento de informações a partir do padrão LINKED DATA”. Neste mesmo ano, fui aprovado e participei do evento Google Developer Day em São Paulo, um evento exclusivo para desenvolvedores no qual tomei conhecimento do padrão Schema.Org que objetiva justamente o desenvolvimento de um esquema estruturado de dados para enriquecimento de informações. A InfoJr era a minha “menina dos olhos”. Fui seu diretor de projetos por uma gestão e presidente por duas. Como diretor de projetos, ajudei a coordenar o III Workshop da InfoJr e promover, junto com a Profa. Dra. Zaira Zafalon a II Jornada de Trabalhos Acadêmicos e Científicos. A InfoJr já atuava há alguns anos quando me tornei seu presidente, no entanto, ainda era uma associação informal. Minha primeira gestão se incumbiu, além das prestações de serviços e promoções de eventos, de finalizar a reestruturação e formalização da empresa, conseguindo enfim, seu CNPJ e estatutos registrados. Foram meses de idas e vindas aos cartórios. Devido às nossas atividades fomos destaque em uma das edições do BOB News, boletim informativo do Conselho Regional de Biblioteconomia de São Paulo. Ainda como presidente da InfoJr fui agraciado com um convite do Prof. Dr. Sérgio Silva para participar do curso “Gerenciando Ágil de Projetos: visão e planejamento da inovação” da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP). Então, tive a oportunidade de conhecer a metodologia ágil de desenvolvimento e gestão de projetos e técnicas como o Scrum que hoje utilizo amplamente em todos os meus projetos. Em relação à pesquisa, uma passagem é particularmente importante para mim. Logo no início do curso e atuando na organização da VIII Sema- 375 na de Biblioteconomia e Ciência da Informação, mantinha muito contato por meio de mensagens e telefonemas com a Profa. Dra. Vera Boccato, uma vez que era ela a Coordenadora do Programa de Educação Tutorial Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade Federal de São Carlos (PET BCI UFSCar). Num dos raros encontros que tivemos, ela segurou em meus braços e me fez a seguinte pergunta: “Como você faria um computador diferenciar que o termo “manga” se refere à uma fruta ou parte de uma camisa?” Respondi: “Não tenho ideia professora. Estou aqui para aprender como fazer isso”. E ela respondeu: “Serei sua orientadora”. Infelizmente isso não aconteceu, pois pouco tempo depois ela veio a falecer. Além das atividades estudantis, durante 2011 e 2012, me envolvi como bolsista e monitor na Atividade Curricular de Integração Ensino, Pesquisa e Extensão (ACIEPE) “Utilização e desenvolvimento de tecnologias semânticas para a representação de recursos informacionais”, sob coordenação do Prof. Dr. Rogério Ramalho. As atividades resultaram no artigo “Tecnologias Semânticas: Novas Perspectivas para a Representação de Recursos Informacionais” publicado na revista Informação & Informação. As atividades de extensão me motivaram também a participar do Programa Unificado de Iniciação Científica e Tecnológica (PUICT UFSCar). Tomei parte do Núcleo de Estudos em Tecnologias de Organização e Representação de Informações (NETORI) nos projetos “Utilização e Desenvolvimento de Ontologias e Informação” e “Tecnologia e sociedade”. Minha pesquisa intitulada “Desenvolvimento de uma Ontologia de Domínio da Área de Biblioteconomia” resultou no meu Trabalho de Conclusão de Curso intitulado ONTOLIS: um protótipo de ontologia a partir dos FRBR” e este, numa apresentação no XV Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação em Belo Horizonte, Minas Gerais (ENANCIB) com o título “Ontologia baseada nos FRBR: proposta de aplicação em catálogos online”, escrito juntamente com o Prof. Dr. Rogério Ramalho e a Profa. Dra. Zaira Zafalon. Para mim, o curso foi excelente com ótimos professores e muitas oportunidades de aprendizado dentro e fora da sala de aula. A única falta que tive durante todo o curso foi no dia em que minha filha recém nascida precisou ser internada. E era dia de prova. Dentro da sala de aula tivemos a maioria dos professores nos desafiando, estimulando debates muito profícuos e trabalhos desafiadores. Me lembro de termos, em vários momentos, discussões acaloradas, porém, com muito conteúdo. Não quis me dar ao luxo de perder tempo. Infelizmente 376 alguns alunos não conseguem entender e ainda acreditam que estão cursando uma universidade para decorar e repetir conteúdos para conseguir um emprego. Penso que uma universidade deve nos estimular a pensar, desafiar e encorajar-nos a ir além de nossas limitações. Digo isso para exemplificar dois pontos: 1) um curso universitário pode criar e acompanhar os avanços e demandas da sociedade, desde que haja boa vontade e coragem de inovar em seu corpo docente e profissionais. Haja proatividade na busca por criar condições, situações e desafios para os alunos e isso os professores e profissionais da UFSCar têm de sobra. Além disso, os professores da UFSCar não se colocam como “Deuses” e sabem de suas limitações. A postura deles é a de “vamos construir juntos” e isso faz muita diferença. 2) Quem entra em uma universidade precisa aproveitar cada oportunidade. O curso passa muito rápido. Então, queria aproveitar cada dia de aula, cada oportunidade com cada um dos meus professores. Por exemplo: durante várias semanas, a Profa. Dra. Zaira Zafalon nos reuniu em sua própria casa, fora dos horários de aulas para nos ensinar todo o ciclo de processamento técnico, na prática. Durante vários finais de semana frequentei também a casa do Prof. Rogério Ramalho onde planejamos os projetos e discutimos diversos assuntos. Hoje, ele e sua esposa são grandes amigos de nossa família e padrinho e madrinha da minha filha. Durante o curso, além de assistir às aulas e realizar as atividades propostas, tive a oportunidade de participar, elaborar e implementar vários projetos. A Profa. Dra. Ariadne Chloe Mary Furnival, Prof. Dr. Roniberto Morato do Amaral e Profa. Dra. Wanda Aparecida Machado Hoffmann me deram a oportunidade de dimensionar a infraestrutura inicial e implementar a primeira versão do Repositório Institucional do Centro de Educação e Ciências Humanas da UFSCar (CECH). A Profa. Dra. Luzia Sigoli, Profa. Dra. Luciana Gracioso e Prof. Dr. Rogério Ramalho me deram a oportunidade de trabalhar no projeto da Biblioteca Virtual do Curso de Sistemas de Informações. Tive também o prazer de desenvolver e implementar os websites do Departamento de Educação Física e Motricidade Humana da UFSCar (DEFMH) e da Unidade Especial de Informação e Memória (UEIM). Através da UEIM, juntamente com os professores Roniberto, Luzia, Chloe, participei de um trabalho de avaliação de um sistema para a unidade que contou com uma visita técnica ao Arquivo Público do Estado de São Paulo. Na UEIM, ministrei também um treinamento aos funcionários sobre “Sistemas de Gestão de Conteúdo Joomla – Enterprise Content Management (ECM)”. Atuei também como monitor em uma discipli- 377 na ministrada pelo Prof. Dr. Rogério Ramalho na pós-graduação no Centro Universitário Central Paulista – UNICEP. A Profa. Dra. Ariadne Chloe Mary Furnival foi uma das professoras mais incríveis que já tive. A “mais brasileira das britânicas” é, para mim, um exemplo de humanidade. Com ela participei de inúmeros projetos e um deles foi bastante especial: colocar em prática uma das técnicas de avaliação de bibliotecas que estudávamos em aula. Escolhemos a técnica Mystery Shopping, conhecida no Brasil como “cliente oculto”. Selecionamos 11 bibliotecas pertencentes ao Sistema de Bibliotecas de São Carlos, sendo três bibliotecas públicas e oito bibliotecas escolares que também atendem à comunidade. Dividimos a classe em grupos e cada grupo escolheu a biblioteca que mais lhe conviesse para a pesquisa devido às suas preferências pessoais, localização, simpatia etc. A pesquisa foi aplicada também em duas bibliotecas públicas de distintas cidades vizinhas que serviram como bibliotecas de controle para fins de comparação, então, foram visitadas pelos grupos entre os dias 7 e 30 de novembro de 2011. O trabalho resultou em um artigo escrito por mim, pelo meu amigo Euzébio e a Profa. Chloe e publicado na Revista Interamericana de Bibliotecología de Medellín, na Colômbia sob o título “O uso da técnica cliente oculto como ferramenta de avaliação do atendimento aos usuários de bibliotecas públicas: uma experiência brasileira na graduação de Biblioteconomia” que, em 2014, fez parte da bibliografia obrigatória da disciplina Usuarios de información do Curso de Biblioteconomia da Universidad Nacional de La Plata na Argentina. Pelo Google Acadêmico soube também que este artigo tem sido utilizado em outros cursos no Brasil e no exterior. No início do curso, trabalhava em uma empresa de telecomunicações e era responsável pelo seu setor comercial, prospectando clientes, elaborando projetos e acompanhando as implementações. Em visita a um desses prováveis clientes, ao apresentar uma proposta ao presidente e à diretora financeira, iniciei uma conversa sobre organização de processos de informações, documentos e gestão de departamentos de Serviços e Tecnologias de Informação. Tive uma surpresa ao descobrir que a proprietária da empresa era formada em Biblioteconomia. O assunto se prolongou e saí de lá com uma proposta de trabalho, para que eu assumisse o setor de Tecnologia da Informação, que até então cuidava apenas do ERP, sistemas do fabricante, de computadores, equipamentos e redes. Durante meu estágio na Biblioteca Comunitária da UFSCar (BCo) minhas atividades consistiram em auxiliar o bibliotecário Ms. Alexei Merli na 378 organização do evento cultural Encontro de Poetas de São Carlos e Região. Em todos os materiais digitais utilizamos o padrão Schema.Org para enriquecimento de informações e otimização para os sites de busca. Esse estágio se tornou outro projeto de extensão intitulado “Utilização de tecnologias semânticas para a organização e divulgação de informações na BCo”, coordenado pelo Prof. Dr. Rogério Ramalho. Devido ao sucesso do projeto, demos continuidade e, em 2014, realizamos o projeto de extensão intitulado “Utilização de Novas Tecnologias de Informação e Comunicação para o Aperfeiçoamento dos Serviços Prestados pela Biblioteca Comunitária da UFSCar”. As atividades resultaram no trabalho “Utilização de Tecnologias para a Organização e Divulgação de Informações na Biblioteca Comunitária da UFSCar” no IX Congresso de Extensão da UFSCar (CONEX). Essas atividades se tornaram o Blog Biblionuvem, que mantenho até hoje. Comecei o curso para me aprofundar e me aprimorar como pessoa e profissional. Como disse anteriormente já atuava profissionalmente e não pretendia sair da minha carreira atual. No entanto, fui incentivado pelos meus professores a prestar concursos. A carreira pública no Brasil é, de fato, muito vantajosa em relação aos empregos da iniciativa privada. Prestei alguns concursos sendo aprovado em alguns deles. Estou aguardando nomeação para me decidir se continuo na iniciativa privada ou na pública. Grande parte dos conhecimentos adquiridos durante as aulas, as pesquisas, o estágio e os projetos de extensão resultaram, na empresa onde assumi o setor de Tecnologia da Informação, na criação de um departamento composto por três estagiários de Biblioteconomia que monitoram as atividades da empresa, dos seus concorrentes e clientes na web, identificando comportamentos, alimentando bases de dados e traduzindo-as em informações que subsidiam o desenvolvimento de estratégias empresariais. Essas atividades foram criadas através do conhecimento em desenvolvimento de produtos e serviços de informação, adquiridos nas aulas do Prof. Dr. Sergio Silva e a gestão delas nas aulas da Profa. Dra. Wanda Hoffmann, Profa. Dra. Luzia Sigoli, Profa. Ms. Aline Brito, Prof. Dr. Roniberto Morato do Amaral e Prof. Dr. Leandro Innocentini Lopes de Faria. Cuidamos também para que nossos documentos (artigos, postagens, blogs, imagens etc.) sejam organizados, ricos em metadados para que propiciem melhorias na indexação pelos sites de busca da web e catálogos eletrônicos, proporcionando maior exposição de nossos materiais e, consequentemente, alcançando precisamente nosso público, economizando recursos e assim, convertendo-se em maior satisfa- 379 ção de nossos clientes e maiores lucros para a empresa. Utilizamos técnicas e fundamentos à partir do conhecimento adquirido nas aulas relacionadas à organização e representação temática e descritiva de informações tecnologias de informações com o Prof. Dr. Rogério Ramalho, Profa. Luciana Gracioso, Profa. Dra. Zaira Zafalon, Profa. Ms. Raquel Prado Leite de Sousa, Profa. Dra. Nádea Regina Gaspar e Prof. Dr. Carlos Roberto Massao Hayashi. Hoje, depois de cinco anos, nossas ações culminaram em: • Mudança da nomenclatura e do status do departamento. Antes CPD, hoje somos conhecidos como Serviços & Tecnologias de Informações (STi). • Aumento da relevância do departamento. Nossa atuação que no início se limitava ao nível operacional hoje é, prioritariamente, no nível estratégico. • Melhora na comunicação e interação entre as áreas da empresa através de sistemas e vocabulários comuns. • Racionalização dos custos de Telecomunicações e Tecnologias de Informação da empresa. • Processos mapeados e documentados. • Estrutura de acesso e armazenamento de documentos racionais e seguros. • Integração das ferramentas informacionais. • Redução do tempo da curva de aprendizado de novos funcionários • Aumento da capacidade de informação dos funcionários. • Monitoramento da concorrência, da empresa e dos clientes. • Atuação intensa da empresa na internet, tendo hoje, mais da metade de seu faturamento em vendas proveniente da web. Enfim, seguir o conselho do meu amigo Belém foi uma das melhores coisas que poderia ter feito. Cursar Biblioteconomia e Ciência da Informação na UFSCar me abriu novas oportunidades, melhorou minha postura profissional, resolveu parte das antigas e me trouxe novas indagações. 380