Del narcisismo, celebridades,
"celetoides" y subcelebridades:
el caso de Tessália y su carácter Twittess
From narcisism, celebrities, "celetoides" and
subcelebrities: Tessalia's case and her character Twittess
Alex Primo2
Resumo Este trabalho apresenta inicialmente uma discussão teórica sobre
a vinculação entre celebridades e a personalidade narcisista. A partir disso,
discute como as tecnologias da Web 2.0 transformam ou potencializam o desejo
pela fama e a construção de reputações na rede. Finalmente, faz uma reflexão
sobre a trajetória midiática de Tessália Serighelli, desde a criação de seu perfil
no twitter (@twittess) até os esforços em manter sua fama em 2010, após ter
participado do reality show Big Brother Brasil 10.
Palavras-chave: Fama. Celebridade. Narcisismo. Blog. Twitter.
Resumen Primeramente este primer presenta una discusión teórica sobre la
relación entre las celebridades y la personalidad narcisista. De esto, se explica
cómo las tecnologías Web 2.0 transforman o intensifican el deseo de fama y la
construcción de una reputación en la Web. Por último, se reflexionará sobre
la trayectoria mediática de Serighelli Tesalia, desde la creación de su perfil en
Twitter (@twittess) hasta los esfuerzos para mantener su fama en 2010 después
de haber participado en el reality show Big Brother Brasil 10.
Palabras-clave: Fama. Celebridad. Narcisismo. Blog. Twitter.
1
Este artigo, versão atualizada e ampliada do trabalho apresentado no XXXII Congresso Brasileiro de Ciências da
Comunicação - Intercom 2009, prolonga minha discussão sobre celebridades e mídias sociais, iniciada com o texto
Existem celebridades da e na blogosfera? Reputação e renome em blogs (Primo, 2009).
2
Professor do PPGCOM/UFRGS, bolsista PQ-2 do CNPq. E-mail: alex.primo@me.com
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a r t i g o
De narcisismo, celebridades,
celetoides e subcelebridades:
o caso Tessália e sua personagem Twittess1
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a r t i g o
Abstract This paper initially presents a theorical discussion about the linking
between celebrities and the narcisist personality.From this, discusses how Web
2.0 technologies transform or potentiate the desire for fame and the building of
reputations on the web. Finally, brings a reflection about the mediatic trajectory
of Tessália Serighelli, since the profile creation on Twitter (@twitess) untill her
efforts to mantain her fame in 2010, after participate of the reality show Big
Brother Brazil 10.
Keywords: fame. Celebrity, Narcisism. Blog. Twitter.
Data de submissão: 10/2010
Data de aceite: 11/2010
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161
Celebridades narcisistas
David Drew Pinsky, conhecido simplesmente por dr. Drew, é um médico americano que se tornou famoso por programas de rádio e televisão
nos Estados Unidos. Durante muito tempo, após as entrevistas que realizava com celebridades, dr. Drew solicitava que respondessem a um questionário padrão, utilizado para o diagnóstico de narcisismo (Narcissistic
Personality Inventory). Os dados coletados permitiram confirmar aquilo
que era esperado: celebridades demonstram alto grau de narcisismo.
O que não parece ser surpresa. Segundo Twenge e Campbell (2009),
narcisistas fazem tudo para estar no centro das atenções. Tal comportamento é justificado pela grande admiração que os narcisistas têm por
si próprios.
Na mitologia grega, Narciso era um jovem que apaixonou-se por seu
reflexo na água. A palavra “narcisismo” origina-se justamente desse mito, e é utilizada na psicologia para descrever pessoas autocentradas, com
grande apreço por si próprias e, não raro, demonstram dificuldades em
manter relacionamentos íntimos.
O narcisismo se caracteriza por uma visão de si inflada, sentimento de superioridade e excessiva autoadmiração. Dependendo do grau, o
narcisismo atinge níveis patológicos. Pacientes narcísicos demonstram
dificuldades de empatia, de manter relacionamentos sociais e tendências
de explorar os outros, buscando privilégios pessoais (ASHE, MALTBY e
MCCUTCHEON, 2005).
Para Lasch (1991), a pessoa narcisista precisa estar sempre na companhia de uma audiência que o admira, que valide sua autoestima. Logo,
não se trata simplesmente de perfil individualista. Este supõe ser alguém
livre para moldar o mundo segundo sua vontade. Já o narcisista entende
que o mundo é um espelho, no qual busca reafirmação constante. O
homem narcísico não busca impor seus pontos de vista aos outros, mas
procura incansavelmente sentido para sua vida.
Ao investigar sobre quais celebridades são mais narcisistas, Young e
Pinsky (2006) encontraram que participantes de reality shows ultrapas-
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sam os resultados de atores, comediantes e músicos. A fama instantânea
oferecida a desconhecidos por programas desse tipo é prêmio mais importante do que o valor em dinheiro disputado (TURNER, 2004). A
exposição em cadeia nacional pode render contratos futuros em outros
veículos massivos (como a revista Playboy). No limite, a fama alcançada
seria lucrativa até mesmo no momento da morte. Foi o que ocorreu com
Jade Goody, que ganhou notoriedade na versão inglesa do programa Big
Brother em 2002. Tendo-se tornado personalidade da mídia, e depois
participado de outros dois reality shows, Goody vendeu a história de seus
últimos meses de vida a diferentes veículos midiáticos ao ter câncer terminal diagnosticado.3
É curioso observar que não apenas as celebridades apresentam altos
níveis de narcisismo, mas também seus fãs. Ashe, Maltby e McCutcheon (2005) comprovaram uma relação entre narcisismo e a tendência de
idolatria a celebridades. Tendo em vista a dificuldade de narcisistas em
manter relacionamentos, eles encontram maior facilidade em satisfazerse com relações parassociais. Essa interação de mão única, apontam os
atores, não permite que as limitações da personalidade narcisista do fã
sejam descobertas, pois não existe encontro real e continuado com a
celebridade. A correlação verificada pela pesquisa, realizada nos Estados
Unidos e Inglaterra, tende a se manifestar mais entre aqueles que mantêm admiração doentia por celebridades, em forma próxima da adicção.
Lasch (1991, p. 85) acrescenta que “o narcisista admira e identifica-se
com ‘vencedores’ a partir de seu medo de ser chamado de perdedor. Ele
busca aquecer-se no brilho refletido deles...”.4 Por outro lado, entende
que o fã obsessivo tem um misto de admiração e inveja. Sua idolatria
pode a qualquer momento se transformar em raiva, tão logo alguma
imagem da celebridade lhe recorde sua insignificância.
3
http://veja.abril.com.br/040309/p_074.shtml
4
No original: “The narcissist admires and identifies himself with ‘winners’ out of his fear of being labeled a loser.
He seeks to warm himself in their reflected glow...”..
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163
Cultura do narcisismo
Mesmo reconhecendo que o etnocentrismo e posturas egoísticas sempre
estiveram entre nós, Lasch (1991) ressalta que vivemos em uma sociedade
narcisista. O passado perdeu seu valor, as ideologias enfraqueceram, as expectativas diminuíram. Esse cenário teria como causas modificações sociais
e culturais, como a crescente burocracia, proliferação de imagens e culto ao
consumo, além de alterações nos relacionamentos sociais e familiares.
É importante notar que o comportamento narcísico varia de cultura
para cultura. Conforme mostram Twenge e Campbell (2009), o narcisismo não é tão intenso em culturas asiáticas, tendo em vista o valor
conferido ao coletivismo. A personalidade narcísica também varia entre
raças. Pesquisa realizada por Halpern (2007, citado por TWENGE e
CAMPBELL, 2009) encontrou que adolescentes negros, em comparação a seus colegas brancos, afirmaram duas vezes mais que preferiam ser
mais famosos, em vez de mais inteligentes, fortes ou bonitos.
A rigor, o desejo por fama vem crescendo entre as gerações mais novas. Pesquisa de 2006, da Pew Research Center,5 mostrou que 51% dos
jovens de 18-25 anos afirmaram que “ser famoso” é um dos objetivos de
sua geração. Essa alternativa perdeu apenas para “ficar rico”, que alcançou 81% das respostas.6
No mesmo ano, uma pesquisa7 na Inglaterra perguntou a cerca de
1500 crianças de até dez anos o que seria “a melhor coisa do mundo”.
“Ser uma celebridade” foi a resposta mais popular, seguida por boa aparência e riqueza.
Em pesquisa informal8 divulgada no Twitter, com o mesmo questionário utilizado por Halpern, obtive os seguintes resultados: dos 153
5
http://people-press.org/report/300/a-portrait-of-generation-next
6
O questionário pedia que os entrevistados votassem em dois objetivos mais importantes para aquela geração, ordenando as duas opções.
7
http://www.dailymail.co.uk/news/article-423273/Being-celebrity-best-thing-world-say-children.html
8
Esta enquete que promovi utilizou o serviço Twtpoll e pode ser consultada neste endereço: http://twtpoll.com/r/
y4p6fn. Diz-se que a pesquisa foi informal, pois os votantes não foram escolhidos por meio de um método controlado. Os entrevistados chegaram até a enquete on-line por meio de simples divulgação no Twitter. Logo, tampouco
se pode garantir se as contas utilizadas nesse sistema eram ou não de fakes.
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votantes, 41% preferiam ser mais inteligentes, 28% mais magros, 12%
mais famosos, 10% mais fortes, 8% mais bonitos. Ainda que os resultados
tenham valor meramente exploratório, motivam aqui a reflexão sobre o
que desperta a aspiração pela fama.
Famosos e seus fãs
Se a fama era tradicionalmente relacionada ao reconhecimento de grandes méritos alcançados por alguém excepcional, hoje tal conexão é quebrada. Esse é o diagnóstico de Rowlands (2008). Para o autor, fama e
excelência se entrelaçavam.
... tradicionalmente, alguém torna-se famoso por fazer ou alcançar algo
digno de respeito. De forma mais geral, para ser famoso, em um sentido
tradicional, você deveria ser surpreendentemente bom em algo. E isso
significa que existiam padrões de competência independentes e objetivos
que você precisava alcançar (ROWLANDS, 2008, p. 29).9
Hoje, porém, a fama é também atribuída a pessoas sem talentos, o
que não motivaria o respeito alheio em épocas passadas. A essa nova variante de fama Rowlands (2008) emprega o neologismo “vfama”.
É característico da vfama que estes padrões objetivos e independentes
de valor ou excelência tenham sido em larga escala abandonados. Isso é
verdade se a vfama é vinculada a alguém com nenhum talento, ou se ela
é vinculada a alguém com talentos — como David Beckham —, mas que
vincula-se a eles como algo acima da fama que eles justificadamente possuem. Não existem padrões de excelência objetivos e independentes que
9
No original: “...traditionally, one became famous by doing or achieving something worthy of respect. More generally, to be famous, in the traditional sense, you generally had to be unusually good at something. And this meant
that there were independent and objective standards of competence that you had to meet”.
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alguém precisa satisfazer para se tornar vfamoso—se alguém fica vfamoso é
basicamente uma questão de sorte e timing (ROWLANDS, 2008, p. 30).10
Antes, a fama emergia em função da qualidade do trabalho intenso
e de uma questão de raridade (ninguém ou poucos têm tal talento). A
vfama, entretanto, pode ser resultado de sorte ou mesmo de bom timing.
Rowlands afirma que hoje pouco importa por que alguém é famoso,
mas simplesmente que ele é famoso.
Redmond (2006) reconhece a fama como fenômeno ubíquo, discurso que participa do significado que damos à vida social na contemporaneidade. Sua força é tal que o autor afirma que a fama serve como “cola”
da cultura de nosso tempo.
De fato, a idolatria por celebridades aproxima pessoas em torno de
conversações sobre a vida privada e a carreira de estrelas (LAWRENCE,
2009). Ou seja, é preciso reconhecer o papel dinamizador que a fama
tem nas conversações sociais. Ashe, Maltby e McCutcheon (2005) acrescentam que o interesse pela vida de celebridades serve de base para muitos encontros sociais. Alertam, contudo, que a fixação em notícias desse
tipo pode chegar ao limite de prejudicar a própria vida do idólatra.
A conversação sobre celebridades é cercada de contradições. Ao mesmo tempo que se utiliza uma linguagem de intimidade,11 por meio da
qual os fãs parecem realmente conhecer os ídolos, a interação raramente
ultrapassa a relação parassocial. Como mostra Redmond (2006), a produção e o consumo da fama envolvem a emulação de autenticidade e
proximidade enquanto provoca o desejo dos fãs. Para o autor, as tecnologias digitais de comunicação, ao lado das mídias tradicionais, ampliam
cada vez mais a conexão afetiva.
10
No original: “It is characteristic of vfame that these objective and independent standards of worthiness or excellence have largely been abandoned. This is true whether vfame attaches to someone with no talents whatsoever,
or whether it attaches to someone with definite talents—such as David Beckham—but that attaches to them as something over and above the fame that they justifiably possesses. There are no objective and independent standards of excellence that one must satisfy in order to be vfamous—whether one becomes vfamous is largely a matter of
luck or timing.”
11
Como faz o jornalista William Bonner, apresentador do Jornal Nacional, em seu Twitter (@realwbonner), chamando seus seguidores de sobrinhos e referindo-se a si mesmo como tio.
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Com o tempo, um fã teria realmente a sensação de intimidade com
os ídolos. Irônico, Lawrence (2009, pp. 22-23) sentencia: “Nós nos sentimos muito familiares deles, pois eles estão continuamente nos olhando a
partir da tela ou das páginas de uma revista”.12
Todo um aparato midiático é movimentado para a circulação de notícias sobre celebridades. Por um lado, mostram o descolamento da vida das estrelas de nosso cotidiano, apresentando sempre a abundância
de suas posses. Como lembra Lawrence (2009), celebridades têm mais
beleza, mais talento, mais carros, mais casas, riquezas, joias, barcos etc.
Além disso, ou por causa disso, recebem ainda mais adoração. Para os
fãs, os ídolos parecem quase perfeitos. Por outro lado, revistas de fofocas
e programas de reality TV insistem em mostrar o lado honesto, comum e
autêntico das celebridades. Como se fossem exatamente como nós. Redmond (2009), contudo, afirma que tais estratégias têm como fim apenas
ampliar a idolatria.
Esse regime de total visibilidade força os famosos a estarem sempre
desempenhando papéis de figuras midiáticas. Para Redmond (2006, p.
34), a vida deles existe apenas por meio das representações da mídia.
“Celebridades aparecem em programas de reality TV fingindo ser ‘eles
mesmos’, pois sem a referencialidade da fama eles não existem mais”.13
O interesse pela vida particular de celebridades vem desde a emergência das primeiras estrelas de Hollywood. Segundo Morin (1989), de
1920 a 1950, cerca de 5 mil correspondentes trabalhavam em Hollywood
cobrindo basicamente a vida de artistas. Nessa época, as notícias geradas
a partir da capital do cinema representavam a terceira principal fonte de
informações nos Estados Unidos, sendo superadas apenas por Washington e Nova York.
Lowenthal (2006), em pesquisa feita originalmente em 1943, observava o crescente interesse do público por biografias de pessoas ligadas à
12
No original: “We become very familiar with them because they’re continually looking out at us from a screen or
the pages of a magazine”.
13
No original: “Celebrities appear on reality TV pretending to be ‘themselves’ because without the referentiality of
fame they no longer exist at all”.
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indústria de entretenimento. Duas décadas antes de sua avaliação, esses textos tinham baixa presença nos periódicos e pouca importância. A
mudança de cenário, segundo ele, revelava a emergência de um tipo de
fofoca massiva.
Ao analisar as biografias, Lowenthal detectou que o caráter mitológico das biografias girava invariavelmente entre o difícil caminho para
alcançar o sucesso e as dificuldades decorrentes, narradas de forma
estereotípica.
De fato, esse roteiro narrativo se aproxima justamente da estrutura da
saga do herói, conforme relata Campbell (1990, p. 138) em seus estudos
sobre o poder do mito:
A façanha convencional do herói começa com alguém a quem foi usurpada alguma coisa, ou que sente estar faltando algo entre as experiências normais franqueadas ou permitidas aos membros da sociedade. Essa
pessoa então parte numa série de aventuras que ultrapassam o usual,
quer para recuperar o que tinha sido perdido, quer para descobrir algum
elixir doador da vida. Normalmente, perfaz-se um círculo, com a partida e o retorno.
Para Campbell (1990, p. 30), um ator de cinema,14 por exemplo, pode
ser mitificado à medida que se torna um modelo para a vida alheia.
Fofocas de celebridades
Distante do convencional preconceito com relação à fofoca, Turner
(2004) reconhece nessa prática uma forma de compartilhamento de julgamentos sociais, formação de comportamento e identidade, além de
14
Segundo Campbell (1990, p. 30), “existe algo mágico nos filmes. A pessoa que você vê está ao mesmo tempo em
algum outro lugar. Esse é um atributo de Deus. Se um ator de cinema chega a uma casa de espetáculos, todos se
viram e contemplam o ator de cinema. Ele é o verdadeiro herói do evento. Está em outro plano. É uma presença
múltipla. O que você vê na tela não é de fato ele, contudo ‘ele’ está lá. Através de múltiplas formas, a forma das formas, de que tudo isso provém, está exatamente ali”.
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criar e agregar redes sociais e estabelecer normas em comunidades. Por
outro lado, o autor admite, o foco em figuras midiáticas tem também o
poder de domesticar o desejo, minimizando a percepção sobre o poder
da mídia sobre as audiências.
Os periódicos dedicados a cobrir a vida privada de celebridades não
se contentam apenas em mostrar o luxo que as cerca. Conforme Rojek
(2008, p. 88), “a mídia que constrói as celebridades, com frequência não
resiste a arquitetar a sua queda”. O estrago na fama (fame damage), como denomina Redmond (2006), é tendência esperada durante a vida da
celebridade, estando vinculada à intensidade da fama. A degradação pública não raro é acompanhada por degeneração física: “As celebridades
com frequência sentem-se pessoalmente indignas depois de serem aduladas pelo público e perderem o controle de suas próprias carreiras. Elas
sofrem de uma incidência altíssima de manias, esquizofrenias, paranoias
e comportamentos psicopáticos” (ROJEK, 2008, p. 88). Para o autor, a
mortificação do corpo, como anorexia e abuso de substâncias, traz a celebridade de volta à terra.
A carreira de uma celebridade, portanto, não é acompanhada apenas de luxo e idolatria. A imagem de seu sucesso é tão lucrativa quanto a de seu fracasso. Capas de revistas com Britney Spears e Michael
Jackson, por exemplo, venderam bem em momentos de glória e de
dificuldades. Tal ciclo chega a ser tão previsível que muitas vezes o
próprio declínio e superação, como no caso de Britney Spears, parece
planejado e encenado.
A independência da imprensa especializada em celebridades também
é posta sob suspeita. Turner (2004) ressalta que é possível observar certo
alinhamento entre as notícias publicadas pelos tabloides e os interesses
da indústria de entretenimento.
De toda forma, o que se quer aqui mostrar é a inter-relação entre a
indústria de celebridades e a imprensa. O talento de um bom ator não
seria suficiente para sua idolatria ou mesmo mitificação se não fosse
acompanhado de notícias em tabloides e revistas de fofocas, que contribuem para a modelagem de sua personalidade pública. Essa narrativa,
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mais ou menos administrada por equipes de intermediários culturais
(ROJEK, 2008), tem o potencial de inclusive fazer a fama de uma celebridade crescer até mesmo de forma desproporcional ao tamanho de
seu talento.
Na Web, hoje, multiplicam-se os sites dedicados a celebridades. Mas,
além de simples notícias da vida e carreira, muitos sites especializam-se
em narrar o que há de degradante na vida privada das celebridades. Bebedeiras, prisões, brigas, traições e todo tipo de confusão são temas constantes em sites como Bitten & Bound15 e TMZ16 (blog que foi o primeiro
veículo a noticiar a morte de Michael Jackson) e nos blogs brasileiros
PapelPop17 e Te Dou um Dado?.18 Essas páginas digitais, diferentemente
do que se possa pensar, alimentam a curiosidade por celebridades. Apesar de noticiar eventos que poderiam prejudicar a imagem de famosos,
fomentam as conversações sobre e o interesse por celebridades.
Fama e tecnologia
Baseando-se na tradição da análise de redes sociais, Shirky (2008) afirma que a fama surge a partir do desequilíbrio entre o número de links
recebidos e enviados. Para que alguém se torne famoso, o autor enfatiza,
duas são as condições necessárias, sendo que nenhuma delas tem a ver
com tecnologia. A primeira é escala, ou seja, o tamanho da audiência é
fundamental. Em segundo lugar, existe incapacidade de se responder
a toda atenção recebida. Em virtude da dimensão da audiência, a interação recíproca não é possível. Isso fica muito claro quando se trata de
televisão e outros meios massivos. Mas, mesmo que o meio utilizado
seja de dupla via, comenta Shirky, a conversação entre a pessoa famosa
e seu público não pode acontecer. O limite é cognitivo e não tecnológi-
15
http://www.bittenandbound.com/
16
http://www.tmz.com/
17
http://papelpop.com/
18
http://entretenimento.r7.com/blogs/te-dou-um-dado/
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co. Nesse sentido, “Weblogs não irão destruir o espelho de uma via da
fama...”(p. 93).19
Para Shirky, o igualitarismo e a comunicação plenamente horizontal só são possíveis em sistemas sociais pequenos. Critica os primeiros
estudos que indicavam que a Web (“boa”, de dupla via) mataria a TV
(“má”, de audiência “passiva”). “Agora nós sabemos que a Web não é um
antídoto perfeito para os problemas da mídia de massa, porque muitos
daqueles problemas são humanos e não são passíveis de soluções tecnológicas” (p.94).20 Logo, em grandes sistemas sociais, diz Shirky, a fama é
um subproduto comum.
Twenge e Campbell (2009) defendem que a Web 2.0 potencializa a
cultura narcisista, típica de nosso tempo, por ampliar as formas de celebração de si e autopromoção. Os sites de relacionamento, por sua vez, acabam incentivando a vaidade e competição. Como mostram pesquisas dos
autores, jovens esforçam-se para mostrar em seus perfis fotos e textos que
lhes valorizam e promovem o incremento do número de pessoas que lhes
adicionam como “amigos”. “Amizade é agora um esporte competitivo” (p.
112).21 Esse tipo de comportamento se justifica por uma busca constante
por atenção e reconhecimento. Nesse cenário, os autores não se surpreendem com as marcas (como MySpace e Facebook) e slogans (por exemplo,
“Broadcast yourself”, do YouTube) de sites da segunda geração da Web.
O YouTube, segundo Twenge e Campbell, é um palco onde esse padrão pode ser facilmente reconhecido. Grande quantidade de vídeos é
publicada diariamente por pessoas que sonham tornar-se famosas. Esses
materiais variam de gravações de performances musicais a diferentes gêneros humorísticos. Como afirma Chad Hurley (citado por Twenge e
Campbell, 2009), cofundador do YouTube, “todo mundo, no fundo de
sua mente, quer ser uma estrela”.22 Como se a fama tivesse sido democratizada. Os autores observam, contudo, que a substituição dos vídeos mais
19
No original: “Weblogs won’t destroy the one-way mirror of fame...”.
20
No original: “Now we know that the Web is not a perfect antidote to the problems of mass media, because some
of those problems are human and are not amenable to technological fixes”.
21
No original: “Friendship is now a competitive sport”.
22
No original: “Everyone, in the back of his mind, wants to be a star”.
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populares é mais veloz do que o ciclo de notícias na mídia tradicional.
Ou seja, um vídeo cômico no YouTube pode ser logo esquecido em virtude da publicação de outros no sistema.
Twenge e Campbell (2009, p. 122) concluem que a internet potencializa o que chamam de epidemia narcísica. Para eles, a Web permite
que se assuma uma persona aparentemente mais atrativa do que se realmente é. Além disso, como os perfis on-line são construídos a partir de
textos autobiográficos e fotos, esses materiais são selecionados cuidadosamente, buscando valorizar os melhores aspectos. Em terceiro lugar, essas
pessoas podem encontrar audiências numerosas na rede, que satisfaçam
o desejo por atenção.
Reputação e fama em blogs e no Twitter
Celebridades são fenômeno típico da indústria cultural, vinculado à força difusionista e aos interesses mercadológicos da mídia de massa. Como
se viu anteriormente (PRIMO, 2009), a celebridade é, ao fim e ao cabo, uma mercadoria, fruto de um projeto bem planejado, com objetivos
e metas a serem alcançados. A celebridade não pode ser pensada apenas como pessoa famosa. Trata-se de um complexo construído por uma
grande quantidade de profissionais e equipes. A celebridade vincula-se
a outras indústrias e produtos culturais, dos quais depende para manter
seu sucesso. Hoje, não é possível avaliar o valor de uma celebridade sem
sua inter-relação, por exemplo, com a indústria da moda e com periódicos especializados em fofocas. O status de celebridade, portanto, não é
construção individual, simples consequência do talento próprio.
Apesar dessas características típicas, a todo momento se observa no
Twitter, em blogs e em sites jornalísticos, o uso elástico do conceito “celebridade” como referência a pessoas que conquistaram renome (ROJEK,
2008) entre seus pares, mas que a rigor não pertencem àquela categoria.
Claro, não existe problema algum em usar aquele termo de forma livre
e até metafórica, mesmo que seu uso seja impreciso e até contraditório
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(celebridade — um fenômeno massivo — em micromídia digital?). Como se sabe, existem celebridades massivas que mantêm blogs e contas
no Twitter. Contudo, a emergência de celebridades a partir da própria
blogosfera, por exemplo, depende da passagem desses blogueiros para
programas e páginas da mídia de massa e sua vinculação com indústrias
e profissionais que possam explorar seu potencial lucrativo.
De qualquer forma, é possível detectar o desejo de blogueiros e twitteiros em desenvolver seu próprio “star system”. Diante de tal constatação, é preciso questionar-se sobre o que justifica a busca por estrelas em
blogs e no Twitter, se seriam esferas nas quais se poderia estar livre da
manipulação massiva. A idolatria em contextos de micromídia digital
não seria a própria derrota das utopias que anunciavam que blogs, por
exemplo, nos libertariam da tirania das estratégias mercadológicas das
grandes instituições massivas? Seriam esses novos ídolos necessários para legitimar as mídias sociais? Não estaríamos mimetizando aqui o que
lá criticávamos? O que pode justificar esse possível encaminhamento?
Algumas hipóteses. Depois de décadas sendo “educados” pela mídia,
não nos ensinaram que devemos seguir certas “personalidades”? Talvez
essa seja uma das razões pela busca por quem idolatrar na blogosfera e
no Twitter. O encontro e desenvolvimento de ídolos na micromídia digital serviriam como a “cola” que junta as conversações dispersas pela
Web 2.0? É como se essas pessoas de renome fossem nos livrar de nossa
orfandade na blogosfera. Desgarrados do alento afetivo das grandes celebridades, procuramos agora quem nos reúna sob o calor de suas asas?
Desorientados na Web descentralizada, queremos agora desenvolver altares que nos reúnam em seu entorno para idolatrarmos juntos nossos
próprios ídolos? Essas hipóteses fazem sentido? Essas frases não serão
percebidas em breve como simples exageros?
Não é suficiente, contudo, atribuir a emergência de ídolos na Web
apenas ao coletivo que busca alguém para seguir e liderar. Primeiramente, a generalização não é precisa, pois reduziria a multidão que interage,
debate e se mobiliza na internet a uma simples massa desarticulada. Em
segundo lugar, a emergência de novos líderes de opinião na Web só ocor-
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reria em virtude da possibilidade de expressão e publicação de produtos
culturais de forma independente. Além disso, a força das redes sociais
na internet permite que pessoas sem o suporte de uma grande estrutura
midiática (normalmente produzindo sozinho textos, imagens e áudio)
recebam a atenção de uma significativa audiência. E mais, interagir conversacionalmente com ela. O sistema AdSense23 de anúncios do Google,
os programas de parcerias de lojas on-line (que oferecem porcentagens
sobre vendas intermediadas em blogs) e o patrocínio de posts e tweets
vieram prover remuneração para a produção independente na internet.
Nesse sentido, nada mudou no cenário publicitário: onde há uma audiência segmentada existe o interesse em anunciar.
Já se repetiu muito o seguinte bordão pseudocrítico: “Se todos podem
falar na Web, quem escuta?”. Na verdade, hoje encontramos um grupo
de blogs no Brasil que atrai milhares de visitantes por dia. Alguns passaram a se estruturar como mídias de nicho, oferecendo seus serviços a
agências de propaganda por meio de media kits e dividindo o trabalho
de produção e administração do blog entre os membros de sua equipe.
Contudo, boa parte dos blogueiros profissionais consegue manter a lucratividade de suas páginas na Web de forma individual (o que seria impossível na mídia tradicional).
É preciso observar, por outro lado, a utilização cada vez mais frequente de estratégias que ampliam artificialmente as estatísticas de blogs
e contas no Twitter. Diversos blogs especializaram-se no que se costumou chamar de “caça-paraquedistas”. Esses blogueiros são muito ágeis
em criar posts sobre assuntos em voga, conquistando as primeiras posições nas páginas do Google.24 Além disso, forjam títulos juntando nomes
de atrizes e modelos com palavras como “beijando”, “nua”, “fotos” etc.
Mesmo que o post não apresente o que o título promete, o blog consegue
capturar pessoas que usam tais termos em mecanismos de busca. São
chamados de “paraquedistas”, pois não são leitores contumazes daqueles
blogs, e chegam até eles de forma indireta e passageira.
23
https://www.google.com/adsense/
24
Usando técnicas de Search Engine Optimization (SEO).
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A construção da fama de @twittess/Tessália
No Twitter, o número de “seguidores” que um assinante possui é revelado no topo de sua página. Como esse valor poderia representar
numericamente a reputação de tal pessoa, scripts e serviços on-line
(muitos deles pagos) passaram a ser anunciados sob a promessa de automatizar a atração de novos seguidores. No Brasil, um dos casos que
ganharam maior notoriedade foi o da curitibana Tessália Serighelli.
Sua conta no Twitter (@twittess) passou a ser notada a partir do crescimento súbito de seguidores, que chegou em pouco tempo a mais de
40 mil,25 em julho de 2009. A partir do uso de um script, sua conta
passou a seguir milhares de pessoas por dia. Como muitas destas passaram a segui-la reciprocamente, retribuindo o follow (conforme o jargão
do Twitter), em pouco tempo a conta @twittess figurava em rankings dos brasileiros mais seguidos. Apesar de não possuir blog naquele
momento26 e não ser uma pessoa conhecida até então, seus números
despertaram a curiosidade dos assinantes daquele serviço. Mesmo que
não produzisse conteúdo próprio e basicamente publicasse links para
páginas de terceiros, o perfil @twittess demonstrou potencial de liderança por meio do serviço Migre.me. Esse site, que transforma grandes
links em curtos atalhos (ideal para o limite de 140 caracteres imposto
pelo Twitter a cada mensagem), quantifica quantas vezes os links são
clicados e retransmitidos por outras pessoas (prática chamada de retweet). A home page do site Migre.me passou a mostrar diariamente os
links de @twittess como os mais clicados e retransmitidos. A referência
constante ao nome Twittess contribuiu para ampliar o interesse pela
conta da curitibana.
25
Vale comentar que uma importante parcela desses seguidores é formada por contas de estrangeiros que retribuem
o “follow” automaticamente. Ou seja, boa parte dessas pessoas não passou a seguir o twitteiro (que utilizou o script)
em virtude do que escreve.
26
Mais tarde, abriu o blog http://www.twittess.com.br, que, na verdade, não era escrito por ela. Essa publicação online, contudo, tinha uma abordagem estética e um conteúdo que diferia bastante daquilo que a notabilizou no Twitter. Sem conseguir atingir o sucesso de sua conta no Twitter nem atingir o mesmo público, o blog foi cancelado.
Alguns blogs, no entanto, foram criados por fãs e publicam notícias e tweets de Tessália e sua personagem Twittess:
http://somentess.blogspot.com/ e http://tessaliaserighelli.blogspot.com/
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175
O background e fotos sensuais que estampavam sua página no Twitter
também participaram da construção de sua imagem (Fig. 1). O fundo
da interface se aproximava da estética de revistas femininas voltadas para
leitoras adolescentes. O background incluía a palavra “love” pichada em
um círculo, cuja cor roxa parecia escorrer. Na parte superior, quatro imagens de Tessália (com bordas brancas, imitando fotografias em papel)
são mostradas sobrepostas. As fotos seguem o mesmo estilo de ensaios de
moda, sendo que a foto principal mostra Tessália de boca entreaberta.
Enfim, apesar de ser uma desconhecida, a estética geral da página de
@twittess apresentava-a como se fosse uma estrela.
Figura 01. Interface do perfil @twittess em setembro de 2009
Por figurar entre os rankings nacionais de pessoas mais seguidas no
Twitter, e tendo em vista sua beleza física, Tessália foi entrevistada pela revista Playboy na edição de junho de 2009 (que estampou apenas uma imagem sensual de seu rosto) e posou para fotos com lingerie em duas páginas
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da revista VIP em julho de 2009. A partir desse encadeamento midiático
(PRIMO, 2008), Tessália (e, por que não dizer, sua personagem Twittess) ultrapassou os limites do Twitter, ganhando cobertura em veículos massivos.
É interessante observar que Tessália não era conhecida por sua curta
carreira de modelo, nem tampouco por seu trabalho como assistente de
fotografia. Sua reputação emergiu apenas pelo número de seguidores
que conseguiu reunir de forma artificial, a partir da utilização de script
informático. O processo aproxima-se do que Rowlands (2008) chama
de vfama. Vale também lembrar a máxima de Boorstin (2006, p. 79): “A
celebridade é uma pessoa que é conhecida por ser muito conhecida”.27
Ainda que naquele momento Tessália não fosse identificada como celebridade, deve-se observar que ela se tornou famosa na twittosfera simplesmente pelo volume de seguidores e não por algum tipo de produção
cultural de relevo. Ou seja, a mesma circularidade se encontra nesse
caso: Twittess ficou famosa por ser famosa no Twitter.
No dia 13 de junho de 2009, a conta de Twittess foi hackeada e todos os seus seguidores foram apagados, justamente na semana em que a
revista Playboy chegou às bancas. Durante o período em que perdeu a
posse da conta Twittess, Tessália fez vários movimentos para tentar manter sua reputação e as estatísticas de cliques e retweets, ainda que sem sucesso. Tessália pediu a vários amigos para divulgarem sua nova conta (@
aliastes). Mesmo assim, não houve rápida migração de seguidores para a
nova página. Ela também assumiu uma conta que possuía 10.712 seguidores, oferecida gratuitamente por seu criador original, Lucas Florêncio.
A grande quantidade de seguidores dessa conta também tinha sido reunida com métodos “artificiais”, composta em sua maioria por tuiteiros
estrangeiros. A estratégia de Tessália foi muito criticada na twittosfera
nacional, somando-se a tantas outras que criticavam os métodos da curitibana para forjar uma reputação que, por final, mostrou-se eficiente em
garantir ampla difusão de links.28
27
“The celebrity is a person who is known for his well-knownness”.
28
O que é interessante para agências e anunciantes, que sempre desejam formas de atrair grandes audiências para
as mensagens publicitárias.
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Em 23 de junho de 2009, após ter recuperado a conta @twittess, por
meio de contatos com a empresa Twitter, Tessália publica: “TWITTESS
VOLTOU :D o/”. Ao retomar as dezenas de milhares de seguidores, Tessália também voltou a figurar na capa do site Migre.me. Logo, apesar de
sua fama no Twitter ter sido forjada a partir do uso de scripts, seus efeitos
foram reais. Os convites para posar em revistas masculinas, as matérias
em revistas nacionais (como Época e Galileu), a indicação ao prêmio
VMB 2009 da MTV e o interesse de agências de propaganda provaram
que as estratégias encontraram os objetivos.
Em janeiro de 2010, o nome de Tessália foi divulgado como uma das
participantes da décima edição do reality show Big Brother Brasil (BBB10).
A estratégia da produção do programa ao convidá-la para participar, mesmo que ela própria não houvesse se inscrito, era atrair o interesse dos jovens tuiteiros do Brasil. Esse objetivo logo foi atingindo, de tal forma que
o BBB10 foi amplamente relatado e discutido no Twitter durante toda a
sua duração. Diversas hashtags29 foram criadas e utilizadas como forma
de torcida para a permanência ou exclusão dos participantes. Ou seja, a
produção havia conseguido ampliar o interesse no programa, à medida
que ele permanecia sob atenção constante em debates on-line, figurando
com frequência no Trending Topics do Twitter, uma lista dos assuntos e
hashtags mais utilizados em cada período do dia.
Era a primeira vez que a maior parte de seus seguidores e “detratores”30
conhecia quem estava por trás do perfil @twittess. Curiosamente, o próprio Twitter foi utilizado para campanha pela eliminação de Tessália. A
hashtag #ForaTessália foi uma das mais populares entre aqueles descontentes com seu desempenho. Apesar de estar namorando Michel, outro
29
Hashtags são “etiquetas” utilizadas em mensagens no Twitter que facilitam a contextualização do texto e a busca por outros tuítes semelhantes. As hashtags utilizam o símbolo “#” em seu início e não admitem espaços. Como
exemplo, pode-se citar a hashtag #BBB10, muito utilizada enquanto o programa era veiculado.
30
Tessália, antes de entrar no BBB10 e ser vista como pessoa polêmica e de opiniões fortes, já era muito criticada
no Twitter e na blogosfera, principalmente por blogueiros conhecidos no meio. Em virtude do uso de scripts, Tessália havia adquirido rápida notoriedade e estava lucrando com marketing digital. Essa condição atraía muitas críticas ácidas de blogueiros mais experientes, que desdenhavam do conteúdo do perfil @twittess e de sua liderança
no Twitter (plataforma que começava a se popularizar no país). Quando Tessália teve seu perfil hackeado, não faltaram aqueles que comemorassem a perda. Tessália, contudo, reagia a essas críticas de forma veemente, atraindo
ainda mais críticas.
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participante do programa,31 Tessália foi eliminada na votação popular no
terceiro “paredão”. Apesar do lastro que trazia do Twitter, ela atraiu, no curto tempo em que permaneceu no programa, grande rejeição da audiência.
Com 78% de votos em um “paredão” com três concorrentes, Tessália parecia ter feito rápida transição de tuiteira famosa para figura muito impopular; de favorita ao prêmio, transformou-se em vilã do programa.32
De toda forma, Tessália foi a primeira participante do BBB10 a assinar
contrato com a Playboy, além de ter posado para o site Paparazzo, do portal
Globo.com. Nos meses seguintes, em 2010, os sites de fofocas cobriram algumas participações de Tessália e de outros participantes do programa em
diversos eventos, e interessavam-se particularmente sobre a continuidade
ou não de seu namoro com Michel. Além disso, noticiava-se que ambos
fizeram um curso de DJ, atividade à qual Tessália se dedicaria nos meses
seguintes. Em junho, os sites de fofocas publicaram notícias de que havia
colocado próteses de silicone e afirmava que aceitaria posar mais uma
vez para revistas masculinas. Vale observar que o padrão “namoro entre
famosos-silicone-discotecagem” é roteiro frequente entre celebridades (ou
aspirantes a esse status), uma agenda midiática.33 Em novembro de 2010, a
revista VIP a incluiu em uma lista das 100 mulheres mais sensuais, eleitas
em votação popular no site do periódico e via celulares.
Enfim, o projeto deliberado de Tessália de construção de sua notoriedade no Twitter, sua decisão de expor-se nacionalmente no BBB10 (após
convite especial do programa) e em revistas masculinas, e seu trabalho
de manter-se em evidência na mídia demonstram perfil narcisista, vontade de centralizar a atenção alheia (LASCH, 1991).
Tessália, apesar de não ter formação universitária em publicidade e
propaganda, nem carreira anterior consolidada na área, revelou grande
desenvoltura na delimitação de suas estratégias midiáticas quando des31
Em edições anteriores do BBB, casais de namorados frequentemente eram “poupados” pelo público nas votações semanais.
32
http://mdemulher.abril.com.br/big-brother/reportagem/bbb10/tessalia-perdeu-encanto-528842.shtml
33
Outra etapa que se consolida nessa agenda de celetoides/subcelebridades (ver definição na sequência deste artigo) é a utilização da notoriedade repentina como trampolim para uma carreira como deputado. Nas eleições de
2010, mais uma vez esse roteiro, que confunde fama e política, foi seguido por personagens da mídia, como a modelo Mulher Pêra e os cantores Kiko e Leandro da boy band KLB: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/769406mulheres-fruta-querem-disputar-vagas-no-legislativo.shtml
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pontou naquele serviço de microblog. Após alguns meses de reconhecimento no Twitter, já contava com colaboradores que atuavam como
ghostwriters do perfil @twittess e do blog de mesmo nome. Ou seja, o
perfil @twittess passou a ser administrado como produto midiático assim
que começou a se popularizar.
Em virtude de sua participação no BBB10, cresceu o interesse pela
pessoa de Tessália, transformando seu perfil @TeS2alia em outra conta
de sucesso, com mais de 100 mil seguidores. A partir de então, ela assume @twittess como personagem virtual, sendo essa a descrição oferecida
nesse perfil e em sua página no Facebook.34
Alguns erros, no entanto, podem ser apontados na administração desses produtos virtuais. No blog Twittess, mantido por outras pessoas e
depois incluído no portal de blogs Vírgula, do UOL, percebia-se com
facilidade a falta de unidade do conteúdo (frequentemente voltado para
oportunidades de negócios na Web) e design (um casal de bonequinhos
em 3D sorridentes ao lado de um computador iMac) com os tweets e
layout do perfil @twittess no período anterior ao BBB10 (FIG. 2).
A falta de vinculação estética e informacional do blog com a conta
do Twitter, que construiu sua fama na rede, talvez tenha sido a razão do
fechamento do primeiro. Com relação ao perfil @twittess no Twitter, a
interface descrita anteriormente foi totalmente alterada. Como Twittess
passou a ser identificada como uma personagem,35 as fotos de Tessália
foram substituídas por uma única ilustração do rosto de uma garota de
cabelos roxos. O fundo passou a ser composto por imagem de ilustrações
ladrilhadas, de aspecto mais infantil. Ou seja, a mística criada a partir
do background anterior foi enfraquecida. Sem o rosto de Tessália, o apelo
sensual e a estética adolescente, a página de Twittess perdeu valor simbólico e persuasivo (FIG. 3).
34
http://www.facebook.com/pages/Twittess/199591559277
35
Mesmo assim, os tweets desse perfil não trabalham na construção da personalidade fictícia dessa personagem. Os
textos ainda são interpretados como sendo da própria Tessália.
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Figura 02. Interface do blog Twittess.com em agosto de 2009
Figura 03. Interface do perfil @twittess em novembro de 2010
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181
Ainda que os dois perfis no Twitter de sua responsabilidade ainda
veiculem tweets pagos por anunciantes, observa-se que seus tweets já
não são presença nos links mais clicados e retuitados verificados pelo site
Migre.me. No segundo semestre de 2009, contudo, diversas mensagens
de Twittess figuravam ao mesmo tempo no ranking daquele serviço.
De tuiteira famosa a celebridade massiva:
existem microcelebridades?
Para Tessália, o convite especial para participar do Big Brother Brasil
serviu de inesperado atalho para a divulgação de seu trabalho on-line e
de seu nome (transformado em marca). Mesmo saindo prematuramente
do programa, vista como uma das vilãs do jogo, e quase ter sido barrada
pela Globo de participar do encerramento do BBB10 por divulgar links
ilegais da transmissão pay-per-view,36 ela soube tirar proveito de sua súbita exposição nos meios de massa. O namoro com Michel, que mantinha
outro relacionamento antes do programa, pareceu ser confirmado com
um beijo na boca na festa de encerramento. Mais tarde, em agosto de
2010, os dois abriram juntos um site de vídeologs,37 dando início à carreira de empresária.
Tessália soube faturar as polêmicas em torno de seu nome, inclusive a
suspeita de felação durante a transmissão do programa. Apesar de negar
o fato, ela aceitou explorar a prática nas fotos da revista Playboy e em entrevista ao programa humorístico CQC.38 Ou seja, ciente da necessidade
de manter-se em evidência, a estratégia “falem mal, mas falem de mim”
foi adotada. Procedimento típico de personalidades narcisistas. E, como
se viu, a possibilidade de participar do Big Brother, em regime de total visibilidade em cadeia nacional por diversas semanas, oferece a fama (ain-
36
http://noticias.r7.com/blogs/daniel-castro/2010/03/25/globo-perdoa-e-tessalia-vai-a-final-e-a-festa-do-big-brother/
37
http://i-r7.com/entretenimento1.php?acao=Noticias&modulo=1&categoria=entretenimento/celebridades&set
or=entretenimento1¬icia=858
38
http://www.youtube.com/watch?v=ZX1k3U9JzzE
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a r t i g o
da que temporária) como prêmio a todos os concorrentes (TURNER,
2004). O desafio enfrentado é conseguir manter o reconhecimento e
interesse dos veículos, algo que poucos participantes conseguiram (como
Grazi Massafera, que mantém até o momento uma bem-sucedida carreira de atriz de novelas). Para a maioria dos concorrentes, resta o adjetivo de ex-BBB, que passou a funcionar quase como profissão, rendendo
convites para participações remuneradas em eventos diversos. Ou seja,
nos termos de Rojek (2008), apesar das aspirações à celebrização e reconhecimento duradouro, poucos são aqueles que conseguem ultrapassar
a categoria de celetoides.39 Esporadicamente, principalmente nas vésperas ou durante nova edição do reality show, são exibidas matérias sobre o
destino dos ganhadores de programas anteriores. Despertam curiosidade
os casos em que o prêmio acabou sendo mal aplicado. Durante a exibição do reality show, contudo, as personalidades narcísicas creem que sua
vida e seu comportamento40 são suficientemente interessantes a ponto de
garantir futura carreira midiática.
Ciente do desafio de permanecer em evidência, Tessália buscou
manter seu nome em voga em 2010, ainda que o interesse da mídia tenha diminuído progressivamente com o passar dos meses após a exibição
do BBB10, como se percebe em uma busca nos sites de fofocas portais
Globo.com e R7, além do blog Papel Pop. O esquecimento dos ex-BBBs é
acelerado quando nova edição toma conta das noites de verão, transformando desconhecidos em personagens de TV.
A trajetória de Tessália, de tuiteira reconhecida a celebridade midiática, alimentou o desejo de muitos jovens de conquistar a fama a partir da
internet.41 Conforme discussão anterior, essa aspiração foi verificada em
pesquisas com adolescentes. É como se a fama fosse valor em si, profis39
Celetoide é um subtipo, proposto por Rojek (2008), e refere-se a pessoas que tornam-se famosas na mídia de forma
efêmera: “Uma forma de celebridade atribuída, gerada, comprimida e concentrada pela mídia”.
40
Concorrentes invariavelmente definem-se como pessoas sinceras, que não “jogam” no jogo televisivo. É como se
as câmeras pudessem captar suas intenções mais honestas e espontâneas.
41
Tal utopia beira o grotesco e flerta com o humor na produção on-line de outro tuiteiro/blogueiro que acabou
ganhando notoriedade: Lucas Celebridade. Seu perfil no twitter (@lucasfamapop), em junho de 2009 trazia o seguinte texto autobiográfico: “Faço tudo pela fama, não tem jeito, eu sou assim!”. Seu blog (http://lucasfamapop.
blogspot.com/) funciona como coluna social on-line da cidade de Luzilândia, no Piauí, de 24 mil habitantes. Nes-
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são e garantia de plenitude. As mesmas estratégias utilizadas por Tessália
para inflar artificialmente o número de seguidores foram reproduzidas
por muitos, como se esse valor numérico, mostrado em cada perfil do
Twitter, representasse relevância e potencial midiático. Porém, não existe correlação direta e necessária entre alto número de conexões na rede
e status de celebridade.
Ao figurar em sites de celebridades, Tessália não está confirmando
que as redes sociais na internet oferecem hoje possibilidade garantida
de “celebrização” do-it-yourself (TURNER, 2004). É como se o sonho
americano do self-made man agora se atualizasse em “autocelebridades”. Tampouco fazem sentido as tentativas de criação de conceitos como “microcelebridades” (SENFT, 2008) ou “webcelebridades”, termos
em voga na internet e na imprensa. Rojek (2008), Marshall (1997) e
Boorstin (2006) insistem na vinculação entre celebridades e a indústria
de mídia de massa. Em outras palavras, celebridades são produtos massivos. O percurso de Tessália teve início, certamente, por seus próprios
esforços no Twitter. Porém, mesmo que tenha se tornado famosa nesse
serviço on-line, seu status de celebridade só foi alcançado à medida
que veículos massivos (como o programa Big Brother Brasil, da TV Globo, e a revista Playboy) contribuíram para a construção de sua imagem
pública. A partir desse momento, uma série de contratos e compromissos passam a delimitar ações, equipes de intermediários culturais42
(fotógrafos, maquiadores, empresários, assessores de imprensa etc.)
associam-se a ela. Seu nome transforma-se em marca administrada,
sua imagem torna-se um produto moldado para o consumo e suas aparições públicas vinculam-se a interesses midiáticos e publicitários. Ou
seja, de tuiteira independente, Tessália transforma-se (ou é transformada) em produto rentável.
se site, Lucas eventualmente publica o que chama de ensaios sensuais, sendo boa parte de suas fotos tiradas em sua
humilde casa. No Twitter, ele divulga constantemente o número de seu celular e seu e-mail para futuras entrevistas. De fato, já figurou em diversas matérias de veículos nacionais (como Folha de S. Paulo e revista Trip). Contudo, até o momento sua produção e sua pessoa parecem funcionar como caricatura do mundo das celebridades e da
vontade vazia de ser famoso.
42
“Intermediários culturais” é o termo utilizado por Rojek (2008) para referir-se aos profissionais que modelam e
administram a imagem de celebridades.
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Logo, uma celebridade não é qualquer pessoa famosa. Não faz sentido considerar um professor/pesquisador de renome43 em uma comunidade científica como celebridade acadêmica. No contexto da Web 2.0, um
blogueiro de renome pode ser muito conhecido em determinada rede,
mas totalmente desconhecido fora do círculo de leitores e produtores de
blogs de certo gênero. Embora talvez seja muito procurado por agências
de propaganda para veicular banners e posts patrocinados em seu blog, e
requisitado como palestrante, nenhum desses fatores o converte necessariamente em celebridade. Ora, celebridades são da ordem do espetáculo.
Para que se convertam em mercadorias lucrativas e façam render outros
produtos associados ao seu nome, elas precisam trabalhar na lógica industrial e, portanto, em uma economia de escala. Nesse sentido, o neologismo “microcelebridades” de Senft (2008) soa como oxímoro.
Em um microssistema, em uma comunidade virtual circunscrita a
determinado interesse, alguns participantes funcionam como hubs, por
serem nós da rede com muitas conexões. Eles têm grande poder de liderança e influência, pois sua voz possui maior penetração e peso diferenciado. Por outro lado, isso não os converte em celebridade do grupo,
“microcelebridade”. Apesar da grande notoriedade, do renome na comunidade, esses hubs não desempenham algumas funções típicas das celebridades. Para Rojek (2008), elas personificam o desejo, em um jogo de
encenação e distância, para fins mercadológicos. Marshall (1997) afirma
que funcionam como commodity simbólica, que converte sua personalidade em um sistema de troca. A face pública faz parte de um projeto
com objetivos mercadológicos bem definidos, que agenda e limita suas
ações e que atende a exigências de lucratividade.44
Em resumo, que toda celebridade é famosa é fato óbvio. O inverso,
contudo, não é verdade. Nem todo famoso é celebridade. Não se trata
de sinônimos que podem ser usados indistintamente. A celebridade é
43
Para Rojek (2008, p. 14), renome é “atribuição informal de distinção a um indivíduo dentro de uma determinada
rede de relacionamentos sociais”.
44
Diante disso, com facilidade se pode reconhecer a diferença entre aquele professor de renome com Tom Cruise ou
Xuxa, por exemplo. Considerar o primeiro como celebridade em sua comunidade, portanto, não passa de metáfora
livre e imprecisa.
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categoria específica de fama, vinculada à mídia e à indústria cultural no
regime capitalista.
Evidentemente, não há problema em usar-se livremente o termo “microcelebridade” ou “webcelebridade”. Na verdade, eles circulam na imprensa e até mesmo na blogosfera. Contudo, longe da metáfora ou de
aproximação despreocupada, os termos citados não se sustentam conceitualmente. No intuito de forçar-se o neologismo, esvazia-se o que se sabe sobre as especificidades desse tipo particular de fama: a celebridade.
Conforme argumentei em artigo anterior (PRIMO, 2009), muitas são as
celebridades presentes na blogosfera, mas é preciso debater se existem
celebridades da blogosfera.45
Em tempo, recentemente a imprensa passou a utilizar o neologismo
“subcelebridade” para referir-se ao que Rojek chama de celetoide. Ou
melhor, mais especificamente àqueles que galgaram fama repentina na
mídia e lutam por manter esse status, sonhando em preservar o interesse
do grande público, desejando adquirir a admiração recebida pelas grandes celebridades. A esses narcisos, sedentos por notoriedade, interessa
menos o retorno financeiro do que o status glamoroso e a presença continuada em festas e na grande mídia.
Na versão lusófona da enciclopédia on-line colaborativa Wikipédia,
subcelebridades são definidas como “um neologismo, usado em meios
de comunicação em geral, para se referir a, entre outros casos, namoradas (ou ex-namoradas) de jogadores de futebol e artistas, ex-participantes
de reality shows”.46
Para a jornalista Barbara Ellen,47 do jornal britânico The Guardian,
o público está cansado de celebridades que preservam sua privacidade.
Justamente nesse sentido as subcelebridades, chamadas por ela de “parasitas da fama onipresentes”, passam a rechear as páginas dos jornais
45
No artigo referido baseio-me em dados coletados em blogs e em entrevistas de grupos focais.
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http://pt.wikipedia.org/wiki/Subcelebridade. Já a versão humorística Desenciclopédia traz a seguinte definição:
“Subcelebridades são pessoas que não são celebridades, mas acham que são. De uma maneira geral, subcelebridades aparecem de repente na mídia, depois ninguém ouve mais falar delas. E, é claro, elas se consideram ‘as estrelas’, e
acham que merecem privilégios porque (acham que) são famosos”. (http://desciclo.pedia.ws/wiki/Subcelebridade).
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http://www.guardian.co.uk/commentisfree/2010/jan/03/barbara-ellen-celebrity-big-brother
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tabloides. Corrosiva, Ellen os considera cópias chinesas de celebridades, simples subespécie.
No Brasil, o termo ganhou notoriedade em junho de 2009, durante o
movimento de protestos no Twitter contra o senador José Sarney. O movimento utilizava a hashtag #ForaSarney. Um grupo de personalidades
mídiaticas (como o apresentador de TV Marcos Mion) tentava convencer
o ator americano Ashton Kutcher, o primeiro a atingir 1 milhão de seguidores, a utilizar aquela hashtag. Tendo recebido crítica de Kutcher de que
apenas os brasileiros poderiam intervir em seus problemas políticos, esse
grupo passou a ser referenciado como subcelebridades em textos e matérias jornalísticas na Web.48 Em última instância, para o grupo interessava
menos o protesto do que a demonstração de influência; mais a celebração
de si do que a manifestação pública de descontentamento político.
Considerações finais
A grande mídia tem papel fundamental na promoção do desejo pela
fama. Conforme Lasch (1991), ela encoraja pessoas comuns a se identificarem com celebridades. Por outro lado, como mostra a vida dessas
estrelas, sempre rodeada por conforto e glamour, a mídia causa insatisfação pela banalidade da vida cotidiana.
Nesse contexto, a vontade de transformar-se em celebridade, em alguém admirado por uma audiência, fortalece-se na contemporaneidade.
Personalidades narcísicas sonham em conseguir acesso aos programas de
televisão e às páginas das revistas e sites de fofocas. Um trampolim para essa
condição parece ser o convite para participar de nova edição anual do programa Big Brother. Outra forma de galgar a audiência interessada é exporse nas chamadas mídias sociais. Tessália Serighelli conseguiu justamente
projetar-se pelo Twitter, construir uma audiência numerosa (mesmo que
por meio de scripts automatizados) e atrair a atenção da grande mídia.
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http://blogs.estadao.com.br/link/o-show-das-sub-celebridades-brasileiras/
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Em tempos ciberculturais, em que tudo parece democratizado
(Anderson, 2006), não apenas o interagente comum procura ídolos
“autênticos” da blogosfera (Primo, 2009), mas também os narcisistas aspiram pela construção própria do status de celebridade. Como
todos podem ser repórteres cidadãos, redatores de enciclopédias colaborativas e designers em sites de moda49 na Web 2.0, o desejo “eu
também quero ser celebridade” revela-se coerente com esse imaginário. A busca pelo estrelato por meio do esforço próprio na rede parece
hoje acessível àqueles que sonham com a admiração de atrair sua
própria audiência.
O percurso de Tessália, de tuiteira famosa a ex-BBB (como se isso
fosse prêmio vitalício ou profissão a ser exercida), serve de modelo e
prova crível que o caminho é possível a qualquer interagente na rede.
Contudo, celebridades são da ordem da raridade. A “distância aurática”
(MARSHALL, 1997) dos fãs é necessária para a manutenção do valor da
estrela midiática. Em um cenário hipotético, no qual todos podem ser
famosos, quem os idolatraria? Por outro lado, a própria mídia tem interesse em alimentar o sonho e atrair atenção para seus produtos culturais.
A promoção anual de desconhecidos a brothers e sisters (como são chamados os participantes do Big Brother) e a inclusão de Tessália, a partir
de um convite especial, no cast da décima edição do programa, também
fomentam o desejo narcisista por exposição total. Por outro lado, o ciclo
redundante de figura televisiva invejada à ex-BBB esquecida cria nova
forma de celebridade: descartável, com prazo de validade de apenas um
ano (ou menos!).
No caso de Tessália, a luta por firmar-se entre blogueiros e tuiteiros
de renome e os percalços pelos quais sua conta @twittess passou (de duras críticas ao apagamento total de todos seus milhares de seguidores, seu
maior patrimônio), aproxima-se da saga do herói (CAMPBELL, 1990).
Porém, a trajetória heroica segue o timing da pós-modernidade: provações e redenção acontecem na velocidade do “tempo real”. Esses heróis
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Camiseteria (http://www.camiseteria.com/), por exemplo.
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contemporâneos, por outro lado, são logo esquecidos diante do interesse
pelo percurso inusitado de um novo celetoide (ROJEK, 2008).
Esse é o desafio a ser vencido por Tessália: manter-se ainda “vendável” assim que a prateleira do novo Big Brother encher-se de novos
produtos midiáticos (os concorrentes da próxima edição). O interesse
por novidades na internet e a rápida produção e circulação de bens
culturais aceleraram o aparecimento e a obsolescência das celebridades midiáticas.
O que se mantém ainda é a necessária vinculação desse star system à
mídia de massa. Muito embora Tessália tenha construído a relevância do
perfil @twittess de forma independente (juntamente com uma equipe
montada por ela), foi apenas com a exposição em revistas e programas
massivos que conseguiu saltar para o status de celebridade midiática.
Apesar das fantasias que parecem querer ratificar o imaginário cibercultural, neologismos como “microcelebridades” e “webcelebridades” negam justamente o que é necessário no universo do star system: audiência
massiva ávida por consumir o que é da ordem do espetáculo. Curiosamente, até mesmo para os mais narcisistas, desejos pela fama em cadeia
nacional, uma audiência especializada, circunscrita em uma comunidade virtual, é muito pouco tentadora.
Referências
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