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Há 37 anos, Deise Nunes era eleita a primeira Miss Brasil negra da história

A Itatiaia conversou com a eterna Miss Brasil 1986, que falou sobre a importância do título conquistado apenas por três mulheres negras do país

A gaúcha Deise Nunes foi eleita Miss Brasil no dia 17 de maio de 1986 - há exatos 37 anos - entrando para a história dos concursos de beleza. Afinal, a representante do Rio Grande do Sul se tornou a primeira mulher negra a receber o título no país. “Foi extremamente importante para todas as mulheres negras”, conta a eterna Miss Brasil 1986 em entrevista à Itatiaia.

Aos 18 anos, Deise conquistou o sexto lugar no Miss Universo, que aconteceu no Panamá naquele mesmo ano. O título ficou com a Miss Venezuela Bárbara Palacios, que hoje é apresentadora de televisão.

Até os dias atuais, Deise recebe mensagens de pessoas que a veem como inspiração. Tanto que, alguns pais, escolheram colocar o seu nome nos filhos. “Conheci muitas pessoas e lugares que eu jamais imaginei estar”, recorda.

Para conquistar a coroa, Deise passou por muitas dificuldades. “Eu venho de uma família bem humilde, com pouca situação financeira”, destaca. À época, ela precisava de itens de vestuário para levar para o Miss Brasil e, por isso, fez parceria com uma estilista de Porto Alegre. Ela conta que sua mãe precisou assinar um termo de responsabilidade para devolver as roupas do jeito que recebeu, caso contrário, teria que pagar por elas.

“Eu cuidei daquelas roupas com o máximo cuidado possível, como se fossem joias raras, porque eu sabia que a minha mãe não teria condições financeiras de arcar com aquela despesa. Por sorte, várias pessoas me deram coisas, como acessórios e roupas de ginástica, que precisavam ser levadas para o Miss Brasil”, relembra.

Modelo desde os 14 anos, ela já sabia desfilar, mas sentiu falta de ter uma melhor preparação na oratória. “Dias após ganhar o Miss Brasil, senti um misto de sentimentos e a sensação de dever cumprido. Porém, não sabia o tamanho do meu dever. Quando me dei conta, acho que no quarto dia, eu sentei e parei para ler o que os jornais e as revistas diziam sobre a minha vitória”, conta.

Foi neste momento que Deise entendeu o que havia acontecido. “Eu entendi o tamanho da responsabilidade que eu estava tendo em levar o nome do Brasil ao Miss Universo, representar a beleza da mulher brasileira em um concurso Internacional”, disse.

Além do sexto lugar no Miss Universo, Deise ganhou o segundo melhor traje típico da noite. “Entrei nesses concursos uma menina e sai como uma mulher. Os concursos ensinam muito. Basta que a gente observe tudo que acontece ao nosso redor. E eu era muito observadora. Então foi muito gratificante ter representado o Brasil no Miss Universo”, enfatiza.

Em 72 anos de concurso, além de Deise Nunes, apenas duas mulheres negras receberam a faixa. São elas: Raíssa Santana (Miss Brasil 2016) e Monalysa Alcântara (Miss Brasil 2017).

Mudanças

De lá para cá, Deise observou algumas mudanças no concurso. Dentre eles, o aumento de procedimentos estéticos, o que já ocorria na Venezuela - país que ela conta possuir uma “fábrica de misses” há décadas. “No Brasil não se falava nisso. Aqui nós tínhamos como mote principal a beleza natural, a beleza real”, lembra. Ela esclarece: “Não sou contra cirurgias plásticas”. Porém, nota que “as meninas se parecem muito umas com as outras”.

Outra mudança, pelo menos no Brasil, é a preparação, que inclui aulas de passarela, inglês, espanhol, oratória e conhecimentos gerais. “A miss é uma série de coisas, é um pouco de tudo. Ela tem que ter beleza, carisma, elegância, saber falar inglês, ter boa comunicabilidade, ser engajada em projeto social e também nas redes sociais”, pontua.

Deise acrescenta dizendo que beleza não é o fator primordial. “Ela ganhou porque ela tem essa série de atributos que fazem daquela menina a mais completa. Outra coisa que eu sempre digo: no dia do concurso a estrela que mais brilhar é a vencedora”.

Casada há 34 anos, Deise tem dois filhos, de 31 e 29 anos, além de uma neta de 5. A eterna Miss Brasil mora em Porto Alegre e trabalha há 12 anos à frente de uma escola de modelos, onde atende crianças e adolescentes. No entanto, ela pretende abrir as portas para a terceira idade, como já fez anteriormente em uma associação.

Minas elege a 3ª Miss negra da história

Isadora Lúcia de Souza Silva, mais conhecida como Isalu Souza, é a representante de Minas Gerais no Miss Universo Brasil, que deve acontecer no início do próximo semestre. Assim como Deise Nunes, ela também é de origem humilde e recebeu muitos “nãos” ao pedir apoio na cidade em que mora.

A estudante de jornalismo é a segunda ouro-pretana a ganhar a faixa de Miss no concurso estadual. A primeira foi Rafaella Tinti Borja Pinto, em 2003, que ficou no TOP 10 do Miss Universo Brasil daquele ano.

Além disso, Isalu é a terceira mulher negra do estado a receber o título. Antes dela, venceram o concurso Alessandra Nascimento, Miss Minas Gerais 1999, e Karen Porfiro, Miss Minas Gerais 2014.

Após a mineira ter a vitória questionada por alguns internautas, Deise Nunes deixou um conselho para ela. “As pessoas ainda não estão prontas para aceitar que uma pessoa negra possa realmente estar no lugar de destaque. É muito triste isso. O conselho que eu dou para essas meninas é que elas jamais desistam dos seus sonhos”, diz a primeira Miss Brasil negra.

“Eu sempre tirei lições dos preconceitos que eu sofria e eu acho que foi isso que me fez seguir em frente, claro que com a ajuda da minha mãe, que sempre foi a minha maior incentivadora”, finaliza.

Patrícia Marques é jornalista e especialista em publicidade e marketing. Já atuou com cobertura de reality shows no ‘NaTelinha’ e na agência de notícias da Associação Mineira de Rádio e Televisão (Amirt). Atualmente, cobre a editoria de entretenimento na Itatiaia.
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