Destino favorito de viajantes desde a Antiguidade, a terra dos faraós banhada pelo Nilo fascina viajantes há milhares de anos. Nenhuma outra civilização despertou tantas vocações arqueológicas.

A egiptomania tem sido uma constante no imaginário humano. De Heródoto, que descreveu os templos faraónicos em 450 a.C., a Bonaparte. De Champollion, decifrador da escrita hieroglífica, a Howard Carter, que em 1922 descobriu o túmulo de Tutankhamon no vale dos Reis, passando por Flaubert, Agatha Christie, Terenci Moix ou os milhões de turistas desejosos de ver cumprido o seu sonho de ver as pirâmides. Apesar da inquietude provocada pelas recentes alterações políticas, o Egipto e os seus tesouros continuam a incentivar o desejo humano de conhecimento e aventura.

A melhor época para percorrer este país de verões abrasadores é de Novembro a Fevereiro, quando as temperaturas oscilam entre 26º e 18ºC. O Cairo, capital construída no ano 973, dois séculos depois da invasão muçulmana do Egipto, é hoje uma cidade com vinte milhões de habitantes e contrastes extremos, cuja jóia mais valiosa é o Museu Egípcio, situado em Meadan at-Tahrir, a poucos passos do Nilo e dos hotéis internacionais. Foi fundado pelo arqueólogo francês Auguste Mariette, aqui sepultado, fundador do Serviço de Antiguidades, e constituiu uma primeira tentativa de pôr fim aos saques e tráfico de peças antigas. Mariette foi também o autor da descoberta do Serapeum em 1850, uma necrópole subterrânea que continha no interior os sarcófagos de cerca de trinta touros mumificados.

Um acervo espantoso

O Museu Arqueológico do Cairo exibe em dois pisos uma espantosa colecção de obras-primas. Destacam-se os tesouros e a máscara funerária de ouro encontrados por Carter e Lorde Carnarvon no túmulo de Tutankhamon, o rei-menino. Neste espaço de conservação, começa verdadeiramente a imersão na complexidade de uma refinada cultura que contava com soberbos arquitectos e artistas que fizeram da fúnebre viagem ao Além um prolongamento da vida em todas as suas dimensões.

museu Egipto

Dois museus repletos de tesouros.

A máscara de ouro de Tutankhamon é a peça mais famosa do imenso acervo guardado no Museu Arqueológico do Cairo, fundado em 1902. Está repleto de estátuas de deuses e faraós, múmias e objectos com milhares de anos. Situado na Praça Tahrir, no coração da cidade, o edifício que o acolhe foi expressamente desenhado para expor os achados realizados desde o século XIX. Até agora, o Museu Egípcio foi a segunda atracção mais visitada no Cairo, depois das Pirâmides. A partir de 2019, a maioria destes tesouros será exposta no Grande Museu Egípcio do Cairo (GEM), um edifício de forma triangular e uma fachada de alabastro translúcido, situado junto das Pirâmides de Guiza. A entrada será presidida por uma estátua de Ramsés II.

Antes de o viajante começar a sua rota pelo Egipto faraónico, terá de dedicar algum tempo a esta metrópole de trânsito infernal. No bazar de Al-Khalili, construído no século XII no interior da cidadela impulsionada por Saladino, é essencial regatear o preço de qualquer objecto pretendido. Terá de se sentar e degustar uma fortíssima bebida de inspiração turca no antigo café Al-Fishawy Coffe House, reverenciado pelo Nobel da literatura Naguib Mahfouz. É preciso recordar que aqui não se bebe álcool, nem sequer cerveja. As bebidas alcoólicas só estão acessíveis nos hotéis internacionais ou no bonito bar inglês do Hotel Windsor, cujos gins tónicos gozam de tanta celebridade como o seu encantador mobiliário do século XIX.

A norte do bazar, encontra-se o Cairo islâmico. A cidade tem templos de grande interesse, como a enorme Mesquita de Ibn Tulun (ano 886), a Mesquita do Sultão Hassan (1356) ou a Mesquita Azul de Aqasunquur (1347), a sul do agradável parque Al-Azhar.

O Museu Copta

Para descobrir o carácter ideográfico e fonético dos hieróglifos enquanto estudava a Pedra de Roseta, Jean-François Champollion beneficiou da vantagem de dominar a língua copta, herdeira directa da faraónica, que foi substituída pelo árabe no ano 706. O fascinante património intelectual dos cristãos coptas está exposto no Museu Copta, que guarda os papiros do Códice de Nag Hammadi, textos gnósticos e sincréticos do século IV. O museu situa-se no coração de um bairro que fervilha de animação aos domingos. Na tradição local, a Igreja de São Sérgio, do século V, foi construída sobre a gruta onde supostamente se teriam alojado Maria, José e o Menino Jesus ao fugirem da perseguição de Herodes. Muito próximo dali, junto do local onde a lenda assegura que a filha do faraó terá encontrado o pequeno Moisés entre os juncos, ergue-se a sinagoga de Ben Ezra.

Maravilhas de Guiza

Para chegar às pirâmides do planalto de Guiza, a vinte quilómetros do Cairo, o mais prático será alugar um táxi. Poucos não se emocionam ao ver as pirâmides a partir da estrada que penetra no deserto.

Pirâmides

Estátuas de Amen-hotep III e da sua esposa Tié, no Museu Egípcio.

A única sobrevivente das sete maravilhas do mundo antigo, a Grande Pirâmide de Khufu, faraó da IV Dinastia que reinou há mais de 4.600 anos, mede mais de 140 metros de altura.

No século XIX, Napoleão trouxe um verdadeiro “exército” de eruditos e artistas, entre os quais se destacou Vivant Denon, fundador do Museu do Louvre e pai da egiptologia. Este especialista calculou que, com os blocos destas três pirâmides, se poderia construir uma muralha contínua ao longo do perímetro de França. Por seu turno, o escritor norte-americano Mark Twain relatou em The Innocents Abroad a forma como subiu, em 1867, à Pirâmide de Khufu, transportado por habitantes locais… Hoje, felizmente, a proeza já não é permitida, mas é possível entrar nas galerias sinuosas e claustrofóbicas que conduzem à câmara destinada ao sarcófago do rei.

Frente a frente com a Esfinge

Com 136 metros de altura, a pirâmide de Khafré conserva o revestimento original de calcário. O templo funerário é protegido pela imensa esfinge de corpo de leão e rosto humano, um retrato do próprio Khafré, cujo nariz se diz ter sido destruído por um mameluco. Esconde nas patas um pequeno templo de alabastro. A pirâmide permaneceu escondida pela areia até 1886, ano em que Gaston Maspero conseguiu pô-la à vista

pirâmides ê Esfinge

A Grande Esfinge preside à entrada do conjunto composto pela Grande Pirâmide de Khufu, e as de Khafré e Menkauré.

A mais pequena das três é a de Menkauré, filho de Khafré. Com pouco mais de 65 metros de altura, destaca-se pela fileira de blocos de granito rosa na base. Num museu por trás da Grande Pirâmide, encontra-se a Barca Solar de Khufu, com mais de 4.600 anos, descoberta aqui em 1954. Completam o conjunto as pirâmides menores das rainhas e as mastabas, os túmulos mais antigos. À data de fecho desta edição, ainda não tinha sido inaugurado o Grande Museu Egípcio (GEM), que complementará o Museu do Cairo.

A grandeza de Imhotep

A sul de Guiza, encontram-se as ruínas de Mênfis, a antiga capital que, segundo o sacerdote e historiador egípcio Maneton (século III a.C.) foi fundada por Menés, um rei provavelmente lendário. Junto de Mênfis, situa-se a necrópole de Sakara, usada durante mais de 3.500 anos. Neste local, foram construídas as primeiras pirâmides, uma criação arquitectónica do genial Imhotep. Definido por Isaac Asimov como “o primeiro cientista da história”, em 2008 foi inaugurado aqui um museu em sua honra.

pirâmides do Egipto

As pirâmides dos faraós da IV dinastia, a par das pirâmides das rainhas, mais pequenas, distam apenas vinte quilómetros do Cairo.

Em 2686 a.C., Imhotep, a quem eram atribuídas faculdades de mago e que mais tarde foi deificado, desenhou a pirâmide de Djoser, o rei com o qual se iniciou a III dinastia. Primeiro monumento da humanidade construído inteiramente em pedra, esta pirâmide está rodeada de muitas outras, atribuídas a dinastias mais tardias e de suma importância histórica pelas fórmulas rituais fúnebres descobertas nelas. São os denominados Textos das Pirâmides. As mastabas e o conjunto piramidal ulterior compõem um cenário mortuário rematado pelo Serapeum com sarcófagos destinados aos 30 bois ou touros sagrados. São a nota final solene para esta visita às entranhas do Antigo Egipto.