Após sete anos longe do Brasil, ex-miss Taíza Thomsen rompe o silêncio. A joinvilense e miss Brasil 2002, volta à cidade natal e, em entrevista, conta sobre o tempo que ficou na Europa. Fala de tráfico de mulheres, dos sonhos que deixou pelo caminho e das dificuldades que passou neste período.

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Taíza falou abertamente sobre a fuga do País, os boatos que cercaram a saída em 2006 e sobre os sete anos em que viveu na Europa. Sem revelar nomes, sugere ter sido vítima, aos 23 anos, de um esquema de aliciamento e tráfico de mulheres para prostituição.

A Notícia – Por que você deixou o País?

Taíza Thomsen – Deixei o Brasil com 23 anos. Estou com 31. São várias histórias em uma só. São sete anos fora do País.

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AN – Como foi? Por que decidiu fugir?

Taíza – Eu estava morando em São Paulo em 2005. Fui por agências de modelo e lá conheci um namorado. Nós tínhamos uma amiga em comum, mas era mais amiga dele. Terminei com ele e essa senhora começou a dizer que ele estava muito bravo e estava querendo me matar por causa do término do relacionamento. Então, ela me disse que eu teria de sair do Brasil. Essa mulher me apavorou, me deixou com muito medo. Eu era uma menina na época, tinha 23 anos, muito inocente, muito criada a pão de ló. Então, eu não sabia muito da malícia das pessoas. Ela era muito minha amiga, acreditei nela. Ela pagou a passagem para que eu saísse do País. Falou que tinha um amigo belga que poderia me ajudar com o problema que eu estava passando. Ao chegar em Londres, antes de partir para Bélgica, ele me recebeu com flores. Em princípio, ele deveria apenas cuidar de mim, mas eu já queria voltar para o Brasil.

AN – Não procurou a polícia?

Taíza – Eu ligava para ela (amiga brasileira) chorando, dizendo que não queria sair do Brasil, que iria procurar a polícia. Ela dizia: “Não, a polícia não vai acreditar na história, não vai te ajudar”. Eu era muito inocente. Hoje, eu vejo que ela fez uma lavagem cerebral em mim. Ela cortou todo o contato com minha família, com meus amigos. Eu tenho uma personalidade forte. Meus pais sabem disso. Não sei como fui tão enganada por essa mulher. Ela dizia que era vidente. Então, acreditava nela com certa facilidade. Ela era amiga.

AN – Era tráfico de mulheres? Como era lá?

Taíza – Chegando na Bélgica, esse homem era muito querido e muito sedutor nas palavras. Fiquei apaixonada por ele. Mas quando ele saía de casa, me deixava lá sem comida, sem bebida, só água da torneira. Ele não me deixava sair. Tive de procurar comida no lixo. Eu ficava com muita fome. E foi aí que ele começou a me bater. Ele me batia muito. Eu estava muito fraca.

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AN – Você ficou presa, então…

Taíza – Primeiro, ele foi amoroso, me mostrou Londres. Parecia um príncipe. Aí, ele me levou para a Bélgica, na periferia, e me deixou lá. Falou que ia me ajudar. Disse que eu não teria nenhum problema, que conhecia muito bem essa mulher. Mas eu ficava lá, trancada, sozinha e sem ninguém. Eu comecei a mexer no computador dele para saber onde havia me metido. Neste período, ia falando com essa mulher. Eu queria fugir dele, mas ela não deixava. O dinheiro que eu tinha, ele pegou. Fiquei com algumas moedas.

AN – Ele a ameaçava? Batia em você?

Taíza – Ela falou que se eu falasse com minha família, eu ia morrer. Que o telefone estava grampeado, que eu não podiam entrar em contato com meus pais. Eu fiquei isolada. E ele me batendo, fazendo ameaças. Não me deixava sair de casa. E comecei a emagrecer. Eu ia catando comida, no lixo, quando conseguia sair. Ao redor do prédio… (chora).

AN – Havia algum esquema? Desconfiava de algo?

Taíza – Eu consegui achar a senha dele no computador. Não sei nem como, porque não sou chegada em computador. Não sei como consegui. Deus agiu naquela hora. Vi que ele estava envolvido em prostituição. Ele mandava as meninas se vestir de tal forma. Mandava elas para os lugares. Ele tinha várias meninas. Então, comecei a perceber onde estava realmente. No tamanho do rolo em que estava.

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AN – Como você escapou?

Taíza – Um dia, ele me convidou para ir a Londres. Aí, já tinha decidido fugir. Pelas conversas dele ao telefone, notei que ele queria me entregar para outra pessoa. Não sei confirmar o que era. Vi que era uma coisa perigosa. Não sabia se envolvia drogas ou se era para ser escrava branca. Hoje, acho que escapei de uma coisa muito grande. Então, em Londres, na estação de trem, fugi dele. Foi muito difícil porque ele ficava sempre perto de mim. Não queria me deixar ir a lugar algum. A gente saiu do trem para ir a um caixa eletrônico e eu pedi para ir no banheiro. Ele disse que iria comigo. Então desisti. Ele disse para ficar perto dele no caixa eletrônico. Fui andando para trás, toda vez que ele olhava para o outro lado, ia colocando o pé para trás. Quando ele virava, eu procurava a saída daquele lugar. Quando ele tirou o dinheiro, eu corri. Corri pela minha vida. Parece que eu corri uma maratona. Meu coração estava acelerado. Não sabia para onde ir.

AN – Aonde você foi?

Taíza – Eu entrei em um táxi. Nem falava inglês. Me abaixei no banco de trás do carro e disse “vai, vai, vai”. O taxista não saiu do lugar e disse um palavrão em inglês. Aí, entrei em outro táxi e mostrei o dinheiro. Tinha 100 libras e dei 20 libras ao motorista. Parei em um ponto de ônibus bem longe. Entrei em vários ônibus. A mulher de São Paulo disse que se eu fosse para a casa dele, de lá eu nunca mais sairia. Que tinha um capanga lá me esperando e que eu não deveria voltar.

AN – E o que você fez? Onde dormiu?

Taíza – O ponto de ônibus estava vazio. Do nada, vi um rapaz e comecei a dizer “ticket, ticket, bus, bus”. Ele olhou para mim e disse: “você é brasileira, né?”. Ah! Deus (suspirando). Eu disse que sim, que estava fugindo do namorado e pedi que ele me ajudasse. Eu ia dormir na rua, mas ele me ajudou. Esse é o tal de Graveto que a mídia ficou falando que era meu namorado e era traficante. Mas eu conheci ele num ponto de ônibus, do nada, no pior momento da minha vida (choro). Para mim, ele foi um anjo naquele momento. Eu teria que dormir na rua. Ele me levou para um abrigo e fiquei no quarto com uma polonesa.

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AN – Daí você começou a trabalhar? O que fez para sobreviver?

Taíza – Ainda tinha 80 libras. Usei para pagar o lugar e comecei a fazer trabalhos como babá, limpeza de prédios, fazendo trabalhos honestos, andava com cachorros e trabalhava limpando o chão… Sabe quando uma fábrica quer abrir? Eles contratam pessoas como eu, que precisam de emprego e a remuneração é baixa. Uma vez, trabalhei das 6 horas da manhã até as 6 horas da manhã do outro dia. Deveria receber 150 libras, mas não ganhei nada porque eu não estava com visto de trabalho. Tive vários, vários empregos. Auxiliar de garçonete, limpando mesas, o chão, banheiros… Foram esses os meus trabalhos.

AN – Não era nada do que você pensava…

Taíza – Eu sofri. Não achei que minha vida iria ser assim. Mas estou viva, bem. Estou com minha família. Sofrimento deixa a gente mais forte. Lá conheci um casal, Linda e Geraldo Assaiante. Trataram-me como filha, ajudaram-me e deram-me conselhos. Depois, conheci um namorado italiano.

AN – A vida começou a melhorar, então?

Taíza – Não tive um dia que estivesse feliz (choro). Eu não pude me defender das coisas horríveis que falaram de mim. Eu poderia ter feito várias coisas para aparecer na época. No processo do miss, eu nunca quis ir à televisão para me expor. Sempre quis ser respeitada. Tentei me matar. Pensei que não tinha mais solução. Pensava: “Minha família acha que odeio eles”, mas não era isso. Eu não podia conversar com eles. Estava com muito medo. Achava que me comunicando com a família, iria colocá-la em perigo também.

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AN – Como soube do que estava acontecendo aqui no Brasil?

Taíza – Em 2007, quando saíram a revista e a minha foto em todos os jornais de Londres, eu não podia sair na rua. Tive que me esconder. Os brasileiros estavam todos atrás de mim. Disseram que tinha uma recompensa de US$ 50 mil. Fiquei um ano dentro de casa. Saía na rua e a luz me incomodava. Eu era muito nova. Não sabia o que fazer.

AN – Nunca pensou em pedir ajuda para as autoridades?

Taíza – Pedi asilo para o governo inglês e fiquei na detenção por 27 dias, sendo entrevistada. Depois, tive que ir toda semana assinar na polícia. Isso foi antes de me trancar em casa. Teve uma vez que me entrevistaram por oito horas seguidas. E todos perguntavam sobre ser miss. Eu era só uma menina de 23 anos.

AN – Você ficou na casa de quem?

Taíza – Com esse italiano que conheci em 2007. Foi uma relação de cinco anos. Não foi fácil. Por causa das coisas que falaram de mim. Ele bebia muito. Sofri muita violência doméstica, física e emocional. Aqui no Brasil, as pessoas se movem naturalmente. Lá é preciso visto disso, visto daquilo. E, na minha situação, eu só podia me esconder. Tinha muito medo. Da imigração, do namorado brasileiro, do belga, medo de tudo. Esse meu namorado italiano foi ruim, mas pelo menos me ajudou, me deu comida. Ele me ajudou devagarinho a sair de casa e a procurar emprego. Até encontrar esse casal que é dono de um restaurante.

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AN – A Polícia Federal fez contato?

Taíza – Meus pais estavam preocupados e foram me procurar. Mas eu tinha muito medo. Não poderia colocar eles em risco. Liguei para um policial, que era delegado na época. Dei minha identidade, meu CPF, mas talvez não acreditaram em mim porque a ligação caiu. Eu estava tão enroscada, envolvida com pessoas tão más, que não sabia o que fazer. Essa mulher falava que se eu ligasse para os meus pais, ia morrer. Eu dizia que poderia voltar numa caixa, no avião, mas queria voltar para a minha família. E aquele desespero.

AN – Você ganhou muitos títulos de beleza…

Taíza – Ganhei o Miss Joinville 150 Anos, que dura 50 anos o título. (risos) Tomara que eu sobreviva até lá. Foi em março de 2001. Participo de concurso desde os 14 anos, comecei a modelar e a viajar. Fui para a Elite Model. O pai sempre viajava comigo. Nunca desgrudava de mim. Depois teve o Miss Joinville, o Miss Santa Catarina e o segundo lugar no Miss Brasil. Então aconteceu tudo aquilo com a Joseane (que foi desclassificada por ser casada). Fiquei representando o Brasil como miss por dois meses. Viajei. Fiz trabalhos lá fora. Há muitas faixas lá em casa. Era um grande sonho da minha mãe, na realidade, ser miss. Estava realizando mais o sonho dela. Porque o meu sonho era ser atriz. Eu acho que eu estava realizando o sonho da minha mãe. É uma mulher muito bonita, muito atenciosa. E ela ficava torcendo por mim, pela bonequinha da família.

AN – Havia dois boatos quando você deixou o País: que você tinha um romance com o ex-prefeito Marco Tebaldi e que você estava grávida. Você conhecia esse boatos?

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Taíza – Nem sabia desses boatos. Vi uma revista em Londres. Fiquei revoltadíssima com o que estavam falando. Mas estava com as mãos atadas. Eu não tenho nada a ver com política. A minha única relação com a família do Tebaldi é que eles eram como padrinhos, na época de miss. Adoro a Dilamar. A gente tem uma amizade. Não era de ir na casa, nem tinha intimidade. Conversei com ela (Dilamar) outro dia, quando cheguei, liguei para ela, vamos nos encontrar. O que aconteceu com a família dela foi muito ruim. Poderia ter destruído um casamento. Para mim, como mulher solteira e nova, destruiu minha reputação. Mas afirmo que não tem nada a ver. Para mim, isso foi por uma causa política. Só usaram o nome de uma menina que não estava aqui para se defender. Mas hoje estou. Quero ver quem tem provas. Eu não estava grávida. Eu fugi porque estava sendo ameaçada de morte. Nunca tive relacionamento com o Tebaldi. Nunca tive filhos. Nunca viajei com ele. Ele e a Dilamar foram ver o Miss Brasil. Minha relação era com ela. Não com ele.

AN – Como estava a sua vida ultimamente na Inglaterra? Você pensa em voltar?

Taíza – Eu não estava namorando. Estava com essa família desde 2010. Eles me convenceram a falar com minha família. Tive que deixar meu cachorro. Minha vida nunca se organizou lá. Não pretendo voltar.

AN – Você trabalhou na boate Sunset Strip, em Londres?

Taíza – Não. Eles devem estar me confundindo com alguém. Tragam essa mulher (a gerente da boate, brasileira, disse em uma rede de TV que Taíza teria trabalhado lá em 2007) na minha frente para confirmar. Ainda vou conversar com meu advogado sobre isso. Antes, eu não podia me defender, mas agora eu posso.

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AN – Usou drogas?

Taíza – Nunca. Sou careta. Fui criada assim. Jamais. ?

OPINIÃO

Ouvir sem julgamento

Adri Buch, colunista social

Depois de muitas ligações, angústia e expectativa, tive a oportunidade de ser um elo na entrevista exclusiva concedida ao jornal “A Notícia” por Taíza Thomsen, de Joinville. Foi modelo, miss Joinville e miss Brasil por um período, além de ter conquistado muitos títulos desde a infância.

Queria muito estar presente neste momento e lhe dar o direito de falar tudo o que viveu. Saber realmente o que aconteceu, perguntar sobre os boatos ocorridos na cidade, saber da relação com a família e a vida aqui e em Londres. Sem julgar, só ouvir.

Na tarde de sexta-feira, dia 8 de novembro de 2013, das 13h30 às 17 horas, o encontro ocorreu. Ela chegou linda, tímida, bem mais magra, desconfiada e com muitos medos. Aos poucos, fomos conversando e nos contou da sua vida em Joinville e depois em São Paulo, o porquê de ter ido a Londres e as inúmeras dificuldades enfrentadas lá até estar de volta nos braços da família.

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Ameaças, dificuldades, fome, cárcere, violência doméstica, enfim, um período difícil que ela só quer esquecer. Agora, quer cuidar da saúde, receber o carinho da família e ter o direito de recomeçar. Poder ser chamada pelo nome, viver sem disfarces, com liberdade.

Presenciei uma pessoa abalada psicologicamente, que neste momento precisa de ajuda, respeito e muito carinho dos pais e dos familiares. Precisa sentir-se amada. Muita insegurança e traumas.

Conforme ela ia relatando, a voz embargava, a expressão mudava e caíram muitas lágrimas. A feição dela mudava quando recebia o carinho e atenção do pai, que estava do seu lado o tempo todo da conversa, calado, chorando quieto e pronto a estender a mão.

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Não cabe a mim julgar, como já disse. Falo de coração que vivi uma tarde de muitas emoções e sofrimento por ouvir o relato. Torço para que esse ciclo de vida seja encerrado e desperte uma nova mulher, mais madura e confiante para seguir a vida. Uma jovem linda, com apenas 31 anos e um mundo a conquistar. ??

Vídeo: Taíza conta como foi reencontrar o pai:

Vídeo disponível também no YouTube

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