IBGE faz recenseamento no Edifício Copan, o maior da América Latina

Idealizado por Oscar Niemeyer, o condomínio é considerado o maior conjunto de apartamentos residenciais da América Latina

São Paulo
Vista do Edifício Copan, região central de São Paulo
Copyright Rovena Rosa/Agência Brasil

Nos versos clássicos de “Sampa”, Caetano Veloso imortalizou o encontro entre duas avenidas famosas. Ícones paulistanos como o Bar Brahma, Galeria Metrópole, Edifício Martinelli e Galeria do Rock são alguns exemplos de locais que fazem parte da história dessas avenidas.

Uma construção, em particular, desperta a curiosidade de quem caminha pela Avenida Ipiranga. Um prédio em formato irregular, feito de alvenaria e concreto armado, de curvas e dobras acentuadas. Trata-se de um dos mais icônicos cartões-postais da metrópole paulistana: o Edifício Copan.

O projeto, idealizado por Oscar Niemeyer, foi construído entre os anos de 1952 e 1966 e impressiona não apenas por sua estrutura inusitada em forma de “S”, mas também por seus números colossais: são mais de 120 mil m² de área construída, 115 metros de altura, 1.160 apartamentos (que variam entre quitinetes a coberturas com mais de 200 m²), 32 andares, 22 elevadores, 115 vagas de estacionamento, 104 funcionários e uma área comercial que conta com 72 lojas que atendem aos seus 5.000 moradores: população superior a 22% (ou 1.287) dos 5.570 municípios brasileiros. Atualmente, o condomínio é considerado o maior conjunto de apartamentos residenciais da América Latina.

Monumento no Centro

Rodeado por vias agitadas, bancas de jornais e patrimônios históricos importantes, como a Igreja da Consolação, o Teatro Municipal e o Edifício Itália, o prédio causa espanto por seu tamanho monumental. Atualmente, uma enorme rede de proteção azul cobre todo o edifício, devido ao restauro das pastilhas de cerâmica da fachada. De acordo com o brigadista Gutemberg Santos, 43 anos, o Copan passa por um processo de revitalização, mas a administração ainda não possui capital suficiente para concluir o restauro: “Atualmente, o condomínio conta com certa quantia em caixa, mas a restauração completa das pastilhas demandaria algo em torno de R$ 50 milhões”.

Ao se entrar no prédio, observam-se estabelecimentos comerciais em um espaço conhecido como Galeria. Dezenas de lojas oferecem todo tipo de serviço aos seus residentes e visitantes, desde restaurantes, papelaria, livraria, lavanderia, estúdio de pilates e até locadora de filmes – uma das poucas remanescentes na capital em meio à era das redes de streaming.

Início do Censo no Copan

Para realizar o Censo 2022 no edifício, que conta com 7 setores censitários, foram designados dois recenseadores, Antônio Lima e Sérgio Ricardo, ambos moradores do Copan. Durante o início da coleta, Antônio e Sérgio, acompanhados pelo supervisor Rafael Canotilho, dirigiram-se à cobertura, no intuito de configurar as coordenadas do local em seus DMCs (Dispositivos Móveis de Coleta). A área também conta com um heliporto (desativado, pois não possui medidas de comprimento adequadas para pousos).

Para alcançar a cobertura, é preciso subir 33 andares em um dos elevadores. A pequena viagem vale a pena: dali se tem uma vista panorâmica na qual é possível observar a cidade de São Paulo. O prédio da prefeitura, a Catedral da Sé, o Elevado Presidente João Goulart (conhecido popularmente como Minhocão), o Sambódromo do Anhembi, os hotéis Hilton e Jaraguá, a Estação da Luz, o Estádio do Sport Club Corinthians Paulista e os morros do Jaraguá são alguns locais que podem ser vistos.

Diante do oceano de concreto que forma a paisagem, o supervisor Rafael, morador do Edifício Louvre (vizinho ao Copan), reflete sobre sua realização pessoal em coordenar o recenseamento em um endereço que sempre admirou. “Quando prestei o concurso para o cargo de ACS (Agente Censitário Supervisor), queria passar em uma boa colocação; assim, seria capaz de participar da coleta no meu prédio e no Copan. Aí, quando vi o resultado final, fiquei muito feliz. Esse lugar é único, um marco da cidade de São Paulo. Participar deste trabalho está sendo uma experiência maravilhosa”, comenta Rafael.

Moradores apoiam recenseamento

Depois de finalizar as coordenadas, os recenseadores montaram uma mesa na Galeria, para recepcionar os moradores. No intuito de facilitar a coleta censitária, eles criaram listas de todos os apartamentos dos 6 blocos (A ao F) do edifício. “Essa ideia das listas quem deu foi a minha esposa. Elas estão facilitando o nosso trabalho”, afirma Antônio. Com a lista em mãos, conversam com os porteiros para chamarem os moradores a comparecer à Galeria. “Tem blocos com mais e outros com menos domicílios. Assim, dividimos o trabalho para cada recenseador por domicílios”, explica Rafael.

Ao notar a atividade dos recenseadores, uma das moradoras se aproximou e mencionou que gostaria de participar do Censo. Baiana natural de Arraial d’Ajuda, Ísis reside no Copan há 4 anos, onde compartilha um apartamento de 90m² com sua mãe, irmã e pai, que completou 100 anos há poucos dias. “Durante as edições de 1980 e 1990, fui recenseadora nas cidades de Ilhéus e no Rio de Janeiro. Enquanto fazia a coleta no Leblon (bairro da capital fluminense), tive a oportunidade de conhecer o presidente do IBGE na época”, relembra.

Depois de responder ao questionário, Ísis não mediu elogios para parabenizar o trabalho da instituição. “A vinda de vocês é muito importante e confiável, todos deveriam abrir as portas e atender o IBGE, pois essa visita é muito importante para saber quais políticas públicas o nosso Brasil necessita”.

Enquanto levava seu cachorro para caminhar, Valter Cocarelli, 70 anos, morador do Copan há mais de 30, notou o estande do IBGE na Galeria e também decidiu responder ao questionário. “Foi uma experiência muito interessante. Essa pesquisa é muito importante. Eu espero que todos tenham consciência social e participem”. Além disso, o residente comentou um pouco sobre as principais mudanças que observou no Copan e no perfil de seus moradores ao longo da última década. “O Copan melhorou muito e o prédio passou por um processo de valorização muito grande. Já o perfil dos habitantes mudou também. Antigamente, boa parte dos moradores eram idosos, mas agora o edifício vem recebendo cada vez mais jovens”, comentou.

“O melhor lugar do mundo”. É assim que Inês Silva Costa, 74 anos, descreve como é morar no Copan. Moradora do prédio há 24 anos, a aposentada é uma grande fã do IBGE e fez questão de pausar sua rotina agitada para responder aos recenseadores: “Aqui tem tudo que eu quero: aula de natação em uma rede pública no entorno, lojas, restaurantes. Eu não troco esse lugar por nada no mundo”, ressalta Inês. “Eu saí de casa, estava indo ao metrô, quando passei aqui na Galeria e vi o espaço do Censo. Eu quis participar, pois sei da importância da pesquisa. Ela é muito importante para o Brasil”.

Sobre a interação com os moradores, o recenseador Sérgio afirmou: “A receptividade aqui é muito boa. Gosto muito de conhecer as pessoas do prédio, adoro as nossas conversas. Na 1ª semana trabalhando aqui, conheci um publicitário que compôs um jingle para uma loja de departamentos e essa música ficou muito conhecida na década de 60. Ficamos conversando por quase duas horas”.

“Raiz dos habitantes”

Antônio, um dos recenseadores que atua no Copan, é protagonista de uma história de vida bastante peculiar. Formado em arquitetura e teatro, morador do Copan há 5 anos, tinha como objetivo pessoal recensear o condomínio. “Posso dizer que cobrir o Censo aqui é uma realização. Digo isso não apenas pelo fato de ser morador, mas também porque gosto muito desse prédio projetado por Oscar Niemeyer, o pai da arquitetura brasileira. O Copan é uma cidade, é uma vida à parte aqui no centro histórico”.

O paulistano, que já havia trabalhado no Censo Demográfico de 1980 e no Censo Comercial de 1985, afirmou que a participação na pesquisa censitária foi muito impactante em seu crescimento pessoal: “Eu sempre acreditei no IBGE. Como cursei arquitetura, sempre tive uma ligação muito grande com geografia e estatística. Lembro que, quando participei pela primeira vez, tinha pouco mais de 18 anos. Eu gostei bastante da experiência, pois além de realizar um trabalho cuja importância abrange todo o país, tive a oportunidade de conhecer muita gente. O Censo permite conhecer a verdadeira raiz dos nossos habitantes”, destacou.

Nas edições anteriores em que participou, o questionário do Censo era feito em papel. Desse modo, Antônio imaginou que teria dificuldades para lidar com as novas tecnologias. Porém, após alguns dias na função, conseguiu realizar a pesquisa utilizando o DMC sem nenhum problema. “Eu tive um pouco de receio, pois nunca fui muito ligado a tecnologia e temia com a possibilidade de possíveis problemas no equipamento. Nas outras vezes em que trabalhei no Censo, a pesquisa ainda era feita de forma escrita e era tudo muito rústico, com papel e caneta. Você anotava, apagava, anotava de novo, pedia orientações… Agora, achei o sistema muito bem pensado. Nós recebemos todas as orientações por meio do nosso posto e supervisor. Tudo é muito claro e até o momento não tive nenhum problema”, acrescentou.

Posto de coleta

Localizado na Rua Dr. Bráulio Gomes, a dois quarteirões do Copan, fica o posto de coleta República/Sé, responsável por supervisionar a pesquisa na região. O posto conta com 3 salas bem iluminadas. “Estamos num espaço muito bem equipado e de fácil acesso, próximo ao metrô”, comenta Victor de Souza, coordenador da área Centro 1. “No momento, estamos intensificando novas contratações, para que novos recenseadores possam atuar na área. Além disso, no quesito receptividade, não temos problemas. O IBGE é muito bem recebido pelos moradores locais”.

Além da ótima receptividade, o diálogo entre posto de coleta e supervisores traz  resultados produtivos na região. No próprio Copan, Rafael explica que em uma semana de coleta, 75% dos condomínios já haviam sido recenseados.

O auxílio do “prefeito do Copan”

Em sua mesa no andar mezanino, rodeado por dezenas de blocos de papéis, correspondências, jornais impressos e um enorme quadro com uma fotografia em preto e branco do Copan, encontra-se Affonso Celso Prazeres de Oliveira, 83 anos, responsável por comandar o maior condomínio residencial da América Latina. Conhecido popularmente como o “prefeito do Copan”, sua rotina é atribulada. Enquanto falava sobre a história do edifício, conversava com os porteiros por meio de um rádio hand-talk, observava as câmeras de segurança e ainda respondia chamadas em seu telefone particular. “Eu me dedico 24 horas do dia ao meu trabalho. Dediquei tudo ao Copan. Esse prédio é minha vida”, afirmou.

Nascido no Rio de Janeiro, Affonso comentou que chegou a São Paulo em 1959 para ser missionário em uma igreja na Vila Matilde. Já sua relação com o Copan começou em 1963, antes mesmo de sua inauguração, quando decidiu morar no prédio devido à proximidade com o campus da faculdade Fundação Getúlio Vargas. Na década de 80, durante o segundo mandato de Jânio Quadros como prefeito de São Paulo, foi subprefeito do distrito Penha.

Affonso iniciou sua carreira como síndico em 1993 e se tornou conhecido por revitalizar o Copan em um período em que a obra passava por um momento de decadência e estava prestes a ser interditada devido a dezenas de problemas mecânicos nos elevadores e ausência de manutenção em seus circuitos elétricos.

O “prefeito” fez questão de comentar sobre episódios curiosos de sua longa trajetória profissional, entre elas o caso do fantasma da casa de máquinas, encontros com cantores famosos como Roberto Carlos e Tim Maia na Avenida Ipiranga e sua luta para que o prédio oferecesse acessibilidade ao público idoso. Além disso, Affonso não deixou de mencionar seu projeto mais ambicioso: a criação de um Museu do Copan, cujo acervo seria composto por materiais de sua coleção pessoal, objetos da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo) e até esboços do prédio feitos pelo próprio Oscar Niemeyer.

Sobre as mudanças sociais ao longo da última década, observou: “Hoje, a maioria dos residentes do Copan são proprietários; o número de inquilinos está se reduzindo ao longo do tempo. Temos alguns apartamentos que são locados por empresas de hospedagens temporárias. Além disso, noto que cada vez mais imigrantes têm interesse pelo endereço”.

“O Censo tem um papel muito importante para o Copan, por isso providenciamos um espaço com mesa e cadeiras para que os recenseadores pudessem trabalhar. Espero que essas informações ajudem o governo a melhorar a segurança e o bem-estar do entorno do prédio”, afirma Affonso. De acordo com o síndico, problemas relacionados a criminalidade são comuns na região central de São Paulo. “Assaltos aqui são frequentes. Sempre recebo notificações de pessoas que foram roubadas em frente ao prédio. Já coloquei uma viatura para ficar de plantão aqui 24 horas por dia, mas os moradores se mostraram incomodados”.

Uma curiosidade que chama a atenção em relação ao Copan é o número de moradores. De acordo com Affonso, esse dado é difícil de saber. “Acredito que, atualmente, cerca de 5.000 pessoas vivam aqui. Essa é a importância do Censo, pois somente a pesquisa poderá esclarecer essa dúvida”.

Desafios do Censo

Para Ana Kazan, Coordenadora de Comissões do Censo SP, a coleta de pesquisas do IBGE em condomínios é sempre um desafio. “Desde 2019, o IBGE vem cultivando contatos com associações e sindicatos de síndicos, administradores de imóveis, funcionários de condomínios, empresas de portaria eletrônica e segurança, no intuito de difundir o Censo e sua importância para toda a população. Nesse trabalho, enfatizamos os cuidados com a segurança de todos, garantindo fácil identificação do recenseador”, detalha.

No quesito parcerias, Ana ressalta a importância da articulação entre o Instituto e entidades públicas ao longo dos preparativos para a coleta. “O IBGE em São Paulo conta com o apoio da Secretaria Estadual de Segurança Pública, cujas unidades da Polícia Militar e Civil estão em prontidão para atender a população e os recenseadores”.


Com informações da Agência IBGE.

autores