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Rodolfo Rodrigues

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Copa do Mundo não é só momento e convocação de Daniel Alves é compreensível

Daniel Alves foi capitão da seleção brasileira no amistoso contra o Japão, em junho - Masashi Hara/Getty Images
Daniel Alves foi capitão da seleção brasileira no amistoso contra o Japão, em junho Imagem: Masashi Hara/Getty Images

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A convocação do lateral direito Daniel Alves foi a mais contestada nessa segunda-feira (7), após o anúncio do técnico Tite dos 26 jogadores da seleção brasileira que vai para a Copa do Mundo do Qatar 2022. Acho as críticas muito exageradas.

Entendo que jogadores não devem ser convocados para uma Copa do Mundo só pelo momento. A história do atleta, a importância dele para o grupo, sua qualidade técnica, tudo isso deve ser levado em conta. Em Copas passadas, já vimos muitos casos de veteranos que brilharam em Mundiais. Ou apostas que não deram em nada. Tudo é muito relativo. Se o Brasil voltar com o Hexa, muitos vão se render à escolha do técnico Tite. Foi assim com Felipão, que deixou Romário e Alex de fora em 2002.

Vejo Copas do Mundo desde 1982. Naquela, curiosamente, a Itália foi campeã com um goleiro de 40 anos. Dino Zoff já não tinha o mesmo preparo físico de quando ganhou a Euro de 1968, mas foi fundamental na conquista da Azzurra na Copa da Espanha, principalmente no jogo contra o Brasil, quando defendeu uma cabeçada de Oscar de forma sensacional.

O alemão Lothar Matthäus foi outro exemplo, disputando cinco Copas do Mundo. O zagueiro italiano Paolo Maldini, o goleiro Buffon, o zagueiro Rafa Márquez, o camaronês Roger Milla, o goleiro inglês Peter Shilton e tantos outros, acima dos 37 anos, que brilharam em Copas.

Pela seleção, Daniel Alves (39 anos) tem a chance de se tornar o brasileiro mais velho a entrar em campo. Em 1966, Djalma Santos, também lateral direito, atuou com 37 anos. Em 1962, Nilton Santos, lateral esquerdo, foi campeão com 37 anos. Cafu, em 2006, jogou sua quarta Copa do Mundo com 36 anos. O capitão Dunga tinha quase 35 anos quando foi vice na Copa de 1998.

Daniel Alves pode ser um cara polêmico e controverso fora de campo. Se posiciona mal, fala besteiras... mas até aí, os jogadores não são avaliados por esse comportamento para serem convocados. Fosse assim, Neymar jamais seria chamado. O fato é que Daniel Alves ainda tem como contribuir. Tem um histórico sensacional. Jogador brasileiro com mais títulos na carreira (42), o lateral ganhou quase todos os títulos possíveis por onde passou.

Na seleção brasileira, foi campeão do Mundial Sub-20, da Copa América (2007 e 2019), da Copa das Confederações (2009 e 2013) e medalha de ouro nos Jogos Olímpicos (2020). Se conquistar a Copa do Mundo, se tornará o único jogador da história a vencer todas as principais competições do futebol por seleções.

Daniel Alves disputou 124 partidas oficiais pela seleção brasileira principal desde 2007. É o terceiro jogador com mais partidas pelo Brasil atrás apenas de Cafu (142) e Roberto Carlos (126), podendo ainda pular para o segundo lugar.

Por clubes, se tornou um dos maiores da posição, entrou para a história do Barcelona no momento mais vitorioso do clube, conquistou todos os títulos possíveis, incluindo três Liga dos Campeões, três Mundiais de Clubes e seis Campeonatos Espanhóis. É o brasileiro com mais jogos e mais assistências na história do Campeonato Espanhol. Foi ainda campeão nacional pela Juventus-ITA e PSG-FRA.

Em 2022, teve uma passagem discreta no Barcelona, em sua volta ao clube, mas se tornou o mais velho a jogar pelo time uma partida do Espanhol. Algo impressionante. No México, teve também uma passagem discreta pelo Pumas UNAM. Foi titular e não foi substituído nos 12 jogos que disputou, o último deles no dia 27 de setembro, dois meses antes da Copa. O Pumas não foi bem na Liga Apertura, terminou no 16º lugar, mas Daniel Alves, de 39 anos, foi o 5º com mais minutos em campo, mesmo não tendo participado de todos os 17 jogos. Não dá para dizer que ele não aguenta.

A fase técnica de Daniel Alves não é das melhores, mas não se pode descartar suas qualidades. É um jogador que pode funcionar bem na lateral direita, ainda mais no esquema tático da seleção, que joga com pontas e não necessita de um lateral que vá à linha de fundo toda hora. Daniel Alves sabe jogar como meia ou segundo volante. Foi assim que teve sua melhor fase no São Paulo.

Mas, fundamentalmente, é um jogador que pode agregar fora de campo. É experiente, já disputou duas Copas (2010 e 2014), sofreu com o corte às vésperas da Copa de 2018, e passou por bons e maus momentos pela seleção. É um líder no grupo de atletas e tem uma convivência muito boa com os mais novos. É um exemplo de superação. Nunca vimos um atleta de 39 anos jogando uma Copa pela seleção brasileira.

Em 2002, Felipão buscou formar um grupo unido e entendia que Romário destoaria pelo seu egocentrismo. Formou a 'Família Scolari' e se deu bem em suas convicções. Tite, de certa forma, fez o mesmo agora. Está levando um cara de grupo. Amigo do principal trunfo do time, Neymar, e um exemplo para os mais novos, Dani pode ser o agregador que Tite precisa.

Para completar, não existem tantos laterais direitos em grande fase, de quem realmente podemos lamentar a ausência. Fágner, que substituiu Daniel Alves na última Copa, não fez parte do ciclo da Copa de 2022. Pelo Corinthians, não vem atuando com tanta frequência e está longe de sua melhor forma física e técnica. Mariano, do Atlético-MG, de 36 anos, não fez uma boa temporada em 2022. Rodinei, do Flamengo, vem sendo lembrado agora, pós-títulos. Há poucos meses estava sendo criticado por torcedores. Emerson Royal, do Tottenham, não agradou na Copa América de 2021 e não vem apresentando um futebol de alto nível pelo clube inglês. Já Marcos Rocha, do Palmeiras, de 33 anos, tem dois jogos pela seleção brasileira, ambos em 2013.

Por todo esse conjunto, acho que a convocação de Daniel Alves não é tão absurda assim. Um jogador veterano merecia um respeito maior aqui no Brasil. Infelizmente, muitos acreditam que atletas precisam ter o mesmo rendimento sempre. Não valorizam o que ele ainda pode oferecer no final de carreira. Renato Augusto, no Corinthians, está longe de ser aquele que arrebentou em 2015 pelo clube ou que brilhou pela seleção até 2018. Mas ainda dá um caldo e alegra a torcida com seus lampejos em 2022. Sou contra o ódio e acho desnecessário massacrar Daniel Alves dessa forma. A 'culpa' pela convocação, na verdade, nem é dele. É do técnico Tite e de sua comissão que deram o respaldo pelo lado físico.

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Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do que foi informado, foi Oscar quem cabeceou a bola para a ótima defesa de Dino Zoff na Copa de 1982. O erro foi corrigido.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL