13.06.2013 Views

2013 1º Vol Morfologia e função Fasc I.pdf - Biblioteca Digital do IPB ...

2013 1º Vol Morfologia e função Fasc I.pdf - Biblioteca Digital do IPB ...

2013 1º Vol Morfologia e função Fasc I.pdf - Biblioteca Digital do IPB ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Carlos Aguiar<br />

Botânica<br />

para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

<strong>Vol</strong>ume I <strong>Morfologia</strong> e <strong>função</strong> (fasc. 1)<br />

Instituto Politécnico de Bragança<br />

<strong>2013</strong>


Publica<strong>do</strong> pelo Instituto Politécnico de Bragança<br />

Imagem da capa: Alstonia boonei De Wild. (Apocynaceae) (Bafatá, Guiné-­‐Bissau)<br />

Versão de 18-­‐V-­‐<strong>2013</strong><br />

© Carlos Aguiar<br />

ISBN 978-­‐972-­‐745-­‐123-­‐4


1 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

“Crescem as flores no seu dever biológico,<br />

e as cores que patenteiam, por sua natureza,<br />

só podem ser aquelas, e não outras.<br />

Vermelhas, amarelas, cor de fogo,<br />

lilazes, carmesins, azuis, violetas,<br />

assim, e só assim,<br />

tu<strong>do</strong> conforme a sua natureza.<br />

Ásperas são as folhas, macias, recortadas<br />

ou não, tu<strong>do</strong> conforme;<br />

e o aprumo como tal,<br />

ou rasteiras, ou leves, ou pesadas,<br />

tu<strong>do</strong> no seu dever,<br />

por sua natureza.”<br />

[…]<br />

«Poema da Minha Natureza» in Novos Poemas<br />

Póstumos, António Gedeão<br />

"A vida só pode ser entendida olhan<strong>do</strong> para trás,<br />

mas precisa ser vivida olhan<strong>do</strong> para a frente."<br />

Søren Kierkegaard


2 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente


3 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Índice<br />

Prólogo aos quatro volumes...........................................................................................................7<br />

Objecto ...........................................................................................................................................7<br />

Breve reflexão epistemológica .......................................................................................................7<br />

Fontes de informação...................................................................................................................10<br />

Histologia e anatomia vegetal. <strong>Morfologia</strong> e relações morfologia-­‐<strong>função</strong> de plantas-­‐com-­‐<br />

semente...................................................................................................................................10<br />

Biologia da reprodução de plantas-­‐com-­‐semente...................................................................10<br />

Estrutura das descrições das famílias e taxa superiores .........................................................10<br />

Botânica económica.................................................................................................................10<br />

Abreviaturas, siglas e expressões latinas......................................................................................11<br />

Convenções ..................................................................................................................................11<br />

Imagens ........................................................................................................................................12<br />

1. Conceito de planta................................................................................................................13<br />

2. A célula e os teci<strong>do</strong>s das plantas-­‐com-­‐semente.....................................................................16<br />

2.1. A célula vegetal .....................................................................................................................16<br />

2.2. Os teci<strong>do</strong>s vegetais ...............................................................................................................18<br />

2.2.1. Meristemas ...................................................................................................................................19<br />

2.2.2. Teci<strong>do</strong>s definitivos simples ...........................................................................................................22<br />

Parênquima ..................................................................................................................................22<br />

Colênquima e esclerênquima .......................................................................................................23<br />

2.2.3. Teci<strong>do</strong>s definitivos complexos ......................................................................................................23<br />

2.2.3.1. Epiderme...............................................................................................................................23<br />

2.2.3.2. Teci<strong>do</strong> fundamental ..............................................................................................................24<br />

2.2.3.3. Teci<strong>do</strong> vascular......................................................................................................................24<br />

O transporte de água e nutrientes ...............................................................................................24<br />

Xilema...........................................................................................................................................25<br />

Floema..........................................................................................................................................26<br />

3. Organização <strong>do</strong> corpo das plantas-­‐com-­‐semente ..................................................................26<br />

<strong>Vol</strong>ume e superfície nas plantas...................................................................................................28<br />

Estrutura modular das plantas .....................................................................................................29<br />

Simetria ........................................................................................................................................32<br />

Homologia e analogia. Princípio da homologia ............................................................................32<br />

Variação morfológica intraespecífica ...........................................................................................33<br />

Adaptação e aclimatação .............................................................................................................34<br />

4. Sistema vegetativo das plantas-­‐com-­‐semente.......................................................................34<br />

4.1. Aspectos morfológicos comuns a to<strong>do</strong> o corpo vegetativo ..................................................34<br />

Espinhos .......................................................................................................................................34<br />

Emergências .................................................................................................................................35<br />

Corpos nutritivos, hidáto<strong>do</strong>s e nectários extraflorais ..................................................................38


4 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Galhas...........................................................................................................................................39<br />

4.2. Raiz........................................................................................................................................40<br />

4.2.1. Funções da raiz .............................................................................................................................40<br />

4.2.2. Anatomia da raiz ...........................................................................................................................40<br />

4.2.2.1. Estrutura primária da raiz .....................................................................................................40<br />

Meristemas e teci<strong>do</strong>s ...................................................................................................................40<br />

Epiderme e córtex ........................................................................................................................41<br />

Cilindro central .............................................................................................................................42<br />

<strong>Morfologia</strong> da extremidade radicular e ramificação ....................................................................42<br />

4.2.2.2. Estrutura secundária .............................................................................................................43<br />

4.2.3. Aspectos gerais da morfologia externa da raiz .............................................................................44<br />

Tipos de radicação........................................................................................................................44<br />

Direção e estrutura <strong>do</strong> sistema radicular .....................................................................................45<br />

Situação e consistência.................................................................................................................45<br />

4.2.4. Metamorfoses da raiz ...................................................................................................................45<br />

Tipos de metamorfose..................................................................................................................45<br />

Raízes tuberosas...........................................................................................................................47<br />

4.2.5. Modificações causadas por microrganismos ................................................................................48<br />

Micorrizas .....................................................................................................................................48<br />

Simbioses com bactérias diazotróficas.........................................................................................49<br />

4.2.6. As raízes das árvores.....................................................................................................................49<br />

4.3. Caule .....................................................................................................................................50<br />

4.3.1. Funções <strong>do</strong> caule ..........................................................................................................................50<br />

4.3.2. Anatomia <strong>do</strong> caule das plantas-­‐com-­‐semente..............................................................................50<br />

4.3.2.1. Estrutura primária .................................................................................................................51<br />

Teci<strong>do</strong>s e meristemas...................................................................................................................51<br />

Epiderme e córtex ........................................................................................................................51<br />

Cilindro central .............................................................................................................................52<br />

4.3.2.2. Estrutura secundária .............................................................................................................53<br />

Espessamento secundário nas gimnospérmicas e dicotiledóneas ...............................................53<br />

Espessamento primário e secundário nas monocotiledóneas .....................................................55<br />

Felogene e riti<strong>do</strong>ma......................................................................................................................56<br />

Lenho de reação ...........................................................................................................................57<br />

4.3.3. Alongamento, ramificação e cla<strong>do</strong>ptose ......................................................................................57<br />

Gemas...........................................................................................................................................57<br />

Número ........................................................................................................................................60<br />

Alongamento rameal....................................................................................................................61<br />

Intensidade <strong>do</strong> alongamento .......................................................................................................62<br />

Prolepsia e silepsia .......................................................................................................................63<br />

Tipo e grau da ramificação ...........................................................................................................63


5 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Direção e orientação ....................................................................................................................63<br />

Apoio <strong>do</strong>s caules das plantas trepa<strong>do</strong>ras .....................................................................................64<br />

Dominância e controlo apicais .....................................................................................................64<br />

Cla<strong>do</strong>ptose....................................................................................................................................65<br />

4.3.4. Aspectos gerais da morfologia externa <strong>do</strong> caule ..........................................................................66<br />

Situação e consistência.................................................................................................................66<br />

Superfície......................................................................................................................................66<br />

4.3.5. Metamorfoses <strong>do</strong> caule ................................................................................................................66<br />

4.3.6. Produção de látex .........................................................................................................................69<br />

4.4. Folha......................................................................................................................................69<br />

4.4.1. Funções da folha ...........................................................................................................................69<br />

4.4.2. Anatomia da folha.........................................................................................................................70<br />

Epiderme ......................................................................................................................................70<br />

Mesofilo. Anatomia da folha. .......................................................................................................71<br />

Anatomia de Kranz .......................................................................................................................72<br />

Adaptações anatómicas ao nível da folha ....................................................................................73<br />

4.4.3. Filomas..........................................................................................................................................73<br />

Teoria telomática de W. Zimmermann.........................................................................................73<br />

Tipos de filomas............................................................................................................................74<br />

4.4.4. Aspectos gerais da morfologia externa da folha...........................................................................75<br />

Situação ........................................................................................................................................75<br />

Diferenciação................................................................................................................................75<br />

Posição .........................................................................................................................................76<br />

Nervação <strong>do</strong> limbo .......................................................................................................................76<br />

Forma <strong>do</strong> limbo e recorte.............................................................................................................79<br />

Divisão ou composição.................................................................................................................82<br />

Apêndices foliares ........................................................................................................................84<br />

Superfície e epifilia .......................................................................................................................85<br />

Consistência e cor.........................................................................................................................85<br />

Duração ........................................................................................................................................86<br />

Filotaxia ........................................................................................................................................86<br />

Ptixia e vernação ..........................................................................................................................88<br />

Heterofilia.....................................................................................................................................88<br />

4.4.5. Metamorfoses da folha.................................................................................................................89<br />

Bolbos e bolbilhos ........................................................................................................................89<br />

Outras metamorfoses...................................................................................................................90<br />

4.5. O corpo das gramíneas .........................................................................................................91<br />

5. Referências ...........................................................................................................................92


6 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente


7 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Prólogo aos quatro volumes<br />

Este <strong>do</strong>cumento não é um livro texto de referência e muito menos um trata<strong>do</strong>. Resume-­‐se a uma revisão<br />

bibliográfica mais ou menos atualizada, complementada pela experiência de 20 anos de ensino e investigação <strong>do</strong> seu<br />

autor, em torno de temas chave de organografia vegetal 1 , biologia da reprodução, evolução, de botânica sistemática<br />

de plantas-­‐com-­‐semente e de botânica económica. Tem por destinatários os estudantes <strong>do</strong> ensino superior que<br />

necessitam de adquirir, num curto perío<strong>do</strong> de tempo, conhecimentos básicos de botânica. Por isso, a organização <strong>do</strong><br />

texto, a linguagem, e, muitas vezes, a estrutura das frases nem sempre será fácil de perseguir. De início a sua leitura<br />

será trabalhosa, quan<strong>do</strong> não cansativa, porém, a persistência e a perseverança abrirão as portas a um conjunto de<br />

conhecimentos essenciais para to<strong>do</strong>s aqueles que têm a plantas como objecto de trabalho.<br />

Objecto<br />

A forma externa, a biologia da reprodução e a organização sistemática, como produtos de um processo evolutivo,<br />

e o uso humano das plantas-­‐com-­‐semente são os objetos maiores deste livro. O seu estu<strong>do</strong> pode ter diferentes<br />

pen<strong>do</strong>res. Por exemplo, pode ter uma abordagem descritiva-­‐formal, uma perspectiva histórico-­‐evolutiva ou insistir<br />

em aspectos funcionais. Procurou-­‐se uma abordagem híbrida, ten<strong>do</strong> em mente conferir competências a futuros<br />

profissionais de “biologia aplicada”. Para tal foi dada uma ênfase especial aos seguintes temas: i) descrição <strong>do</strong>s<br />

caracteres morfológicos externos e internos de maior interesse taxonómico (vol I); ii) relações morfologia-­‐<strong>função</strong><br />

(vol. I); iii) biologia da reprodução das plantas-­‐com-­‐semente (vol. II); iv) fundamentos de biologia da evolução das<br />

plantas (vol. II); v) história evolutiva da plantas-­‐terrestres (vol. II); vi) sistemas de classificação botânica e<br />

nomenclatura (vol. III); vii) sistemática e filogenia <strong>do</strong>s grandes grupos de plantas-­‐com-­‐semente (vol. III); viii)<br />

tipologia, origem e evolução das plantas cultivadas (vol. IV); ix) taxonomia, características morfológicas diagnóstico e<br />

distribuição das plantas úteis de maior interesse económico.<br />

A segunda parte <strong>do</strong> II volume, depois de uma pequena introdução à biologia da evolução, inclui uma história<br />

evolutiva das plantas-­‐terrestres. Pode parecer estranho que um tema tão especializa<strong>do</strong> e volátil como este seja<br />

desenvolvi<strong>do</strong> num livro de botânica que se pretende aplica<strong>do</strong>. As plantas, ao longo da sua evolução, foram tanto<br />

agentes de mudança como sujeitos passivos nas alterações climáticas e na dinâmica da composição química da<br />

atmosfera terrestre. O solo como hoje o conhecemos é uma criação das plantas-­‐terrestres. Sem noções de evolução<br />

das plantas é impossível entender estes três temas chave das ciências <strong>do</strong> ambiente (vd. (Berling, 2007)). Depois,<br />

como escrevia em 1973 o evolucionista norte-­‐americano de origem ucraniana Theo<strong>do</strong>sius Dobzhansky, "Nada em<br />

biologia faz senti<strong>do</strong> excepto à luz da evolução”.<br />

Breve reflexão epistemológica<br />

Na organização <strong>do</strong>s seres vivos reconhecem-­‐se vários níveis de complexidade (vd. Figura 1). As células, as<br />

unidades elementares da vida, organizam-­‐se em teci<strong>do</strong>s, os teci<strong>do</strong>s em órgãos e sistemas, e estes, por sua vez,<br />

integram os organismos. Os indivíduos ocupam nichos ecológicos e trocam informação genética entre si no âmbito<br />

de uma população. A componente viva <strong>do</strong>s ecossistemas, a biocenose, compreende indivíduos de diferentes<br />

espécies. Finalmente, os ecossistemas organizam-­‐se em sistemas ecológicos de complexidade variável (e.g.<br />

comunidade vegetal, série de vegetação, geossérie e bioma). Os diferentes níveis de complexidade interatuam entre<br />

si, de forma tanto mais intensa quanto mais próximos estiverem na escala de complexidade, e ajustam-­‐se às<br />

flutuações e variações direcionais <strong>do</strong> ambiente abiótico e biótico, através de rearranjos na sua estrutura (e.g.<br />

composição florística de uma comunidade vegetal ou plasticidade fenotípica <strong>do</strong>s indivíduos) e pela ação da seleção<br />

natural à escala <strong>do</strong> indivíduo. A biologia e a ecologia, à semelhança de outras ciências fundamentais, procuram<br />

explicar e prever a estrutura e <strong>função</strong> de cada nível de complexidade, em <strong>função</strong> <strong>do</strong>s imediatamente anteriores.<br />

Constata-­‐se, porém, que “em cada salto de complexidade” este esforço esbarra na emergência de novas<br />

propriedades, não previstas nos níveis de complexidade inferiores. Por exemplo, a estrutura <strong>do</strong> genoma é<br />

insuficiente para uma compreensão total <strong>do</strong> funcionamento celular, ou a autoecologia das espécies é insuficiente<br />

para explicar e prever o funcionamento de um ecossistema. Os epistemólogos – os especialistas em filosofia da<br />

1 A organografia vegetal ou fitomorfologia tem por objecto a morfologia externa das plantas (= estrutura externa). A anatomia<br />

vegetal dedica-­‐se à morfologia interna (= estrutura interna). Neste texto consideram-­‐se redundantes os conceitos de estrutura,<br />

morfologia e forma.


8 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

ciência – repartem-­‐se em <strong>do</strong>is grupos para explicar a emergência de novas propriedades. Muitos são de opinião que<br />

a escassez de conhecimento está na origem das limitações <strong>do</strong> reducionismo 2 e, por conseguinte, as propriedades<br />

ditas emergentes são um artefacto das limitações epistémicas da mente humana. Os holistas, pelo contrário,<br />

admitem que a emergência de propriedades é uma característica constitutiva <strong>do</strong>s sistemas complexos.<br />

Qualquer destas duas hipóteses não impede que atividades humanas tão complexas como a agronomia, a<br />

silvicultura ou a restauração ecológica, todas elas parte de uma grande disciplina que poderíamos denominar por<br />

biologia aplicada, se possam aproveitar das abordagens reducionistas-­‐mecanicistas próprias da ciência moderna. Sob<br />

esta perspectiva, uma botânica dirigida à sistematização das formas, <strong>do</strong>s sistemas de reprodução e da diversidade <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong> vegetal, e ao uso humano das plantas, conforme se segue neste texto, oferece informação indispensável para<br />

a prática da biologia aplicada, impossível de obter noutros <strong>do</strong>mínios da biologia. Isto é, o acervo de informação e<br />

méto<strong>do</strong>s da organografia vegetal, da botânica sistemática, da biologia de reprodução de plantas e da botânica<br />

económica são insubstituíveis mas não suficientes para o agrónomo, o silvicultor e ao especialista em restauração<br />

ecológica exercerem a sua atividade de forma eficaz e eficiente.<br />

Figura 1. Níveis de<br />

complexidade <strong>do</strong> vivo<br />

O conhecimento científico resulta da observação meticulosa da realidade através da concorrência de<br />

instrumentos conceptuais e observacionais <strong>do</strong>s mais diversos tipos. Os instrumentos conceptuais (e.g. conceitos,<br />

teorias, hipóteses e modelos), formaliza<strong>do</strong>s matematicamente ou não, categorizam e organizam a realidade, i.e.<br />

atribuem-­‐lhe uma estrutura por nós percepcionável. Os instrumentos observacionais (e.g. microscópio e sondas de<br />

DNA) permitem ultrapassar as limitações físicas <strong>do</strong>s nossos senti<strong>do</strong>s. To<strong>do</strong> o conhecimento científico é, por<br />

definição, não <strong>do</strong>gmático porque está sujeito a um escrutínio permanente por parte da comunidade científica e <strong>do</strong>s<br />

utiliza<strong>do</strong>res da ciência. Os mecanismos de revisão e de aperfeiçoamento <strong>do</strong> conhecimento atribuem à ciência uma<br />

enorme capacidade de explicar, de prever o funcionamento e de atuar na realidade. Por outras palavras, o<br />

conhecimento científico está particularmente adequa<strong>do</strong> para a solução de problemas. No entanto, o conhecimento<br />

científico deve ser aceite sempre de forma provisória porque não pode ser comprova<strong>do</strong>. Não existem verdades<br />

absolutas em ciência, existem sim conceitos mais ou menos consistentes, e teorias e hipóteses mais ou menos<br />

corroboradas. O conhecimento científico não é definitivo e não deve (pode) ser toma<strong>do</strong> como tal.<br />

As relações forma-­‐<strong>função</strong> nas plantas são um bom exemplo da humildade que deve caracterizar a atitude<br />

científica. A <strong>função</strong> de muitas formas, internas e externas, das plantas é autoevidente: as gavinhas servem para<br />

ancorar as plantas aos suportes e o néctar das flores é uma recompensa para os poliniza<strong>do</strong>res. No entanto, muitas<br />

formas atuais foram evolutivamente adquiridas num passa<strong>do</strong> remoto, e no presente não desempenham qualquer<br />

<strong>função</strong> ou têm uma <strong>função</strong> distinta da <strong>função</strong> primordial. As formas podem, ainda, nunca ter desempenha<strong>do</strong> uma<br />

<strong>função</strong> e a sua retenção ser uma obra <strong>do</strong> acaso. Os raciocínios de tipo adaptativo, que relacionam a forma com o<br />

desempenho de uma dada <strong>função</strong>, exigem uma ampla base indutiva observacional ou, de preferência, corroboração<br />

experimental. As proposições teleológicas <strong>do</strong> género “as plantas desenvolveram espinhos para evitar a herbivoria”<br />

simplesmente devem ser evitadas. A especulação em torno das relações forma-­‐<strong>função</strong> envolve, por conseguinte,<br />

eleva<strong>do</strong>s níveis de incerteza. Propõe-­‐se, por isso, que o utiliza<strong>do</strong>r deste texto tenha uma atitude crítica em relação<br />

aos temas mais adiante discuti<strong>do</strong>s.<br />

A observação empírica da forma das plantas faculta a detecção de padrões, por exemplo, na posição relativa <strong>do</strong>s<br />

órgãos vegetais, na forma das folhas ou na estrutura da flor e <strong>do</strong> fruto. A conceptualização e a inventariação das<br />

regularidades na forma das plantas são uma das tarefas mais antigas e importantes da botânica. Os conceitos são<br />

2 O reducionismo é uma <strong>do</strong>utrina filosófica que sustenta que a fragmentação em partes da realidade é necessária, e suficiente,<br />

para explicar o to<strong>do</strong>. Portanto, para os reducionistas, sistemas complexos como os seres vivos ou os ecossistemas não são mais<br />

<strong>do</strong> que a soma das suas partes. A ciência é intrinsecamente reducionista. Na prática da ciência a realidade é decomposta em<br />

níveis de complexidade. Cada um destes níveis, por seu la<strong>do</strong>, é explora<strong>do</strong> per se, procuran<strong>do</strong>-­‐se estabelecer as conexões causais<br />

entre diferentes níveis de complexidade.


9 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

representações mentais, que no âmbito da organografia vegetal resumem as propriedades de um objecto natural: o<br />

corpo das plantas. No capítulo dedica<strong>do</strong> à botânica sistemática os objetos naturais conceptualiza<strong>do</strong>s serão os taxa.<br />

Uma correspondência biunívoca inequívoca entre os conceitos, representa<strong>do</strong>s por vocábulos ou símbolos (e.g.<br />

fórmulas florais), e os objetos ou ideias conceptualiza<strong>do</strong>s melhoram a qualidade e acelera as trocas da informação<br />

entre professores e alunos, ou entre os praticantes de uma ciência. Quanto maior a precisão e o detalhe de um<br />

corpo conceptual, maior o seu valor heurístico, i.e. maior a sua utilidade para gerar hipóteses e mais longe se pode<br />

chegar na compreensão <strong>do</strong> objeto de estu<strong>do</strong>. Logo, no estu<strong>do</strong> científico da forma das plantas, da biologia da<br />

reprodução ou na sistemática de plantas, a observação e a construção de hipóteses – sustentadas na grande teoria<br />

unifica<strong>do</strong>ra da biologia que é a teoria da evolução – devem caminhar la<strong>do</strong> a la<strong>do</strong> com a construção de um corpo<br />

consistente de termos e conceitos. Todas as ciências, sem exceção, cultivam um corpo de termo e conceitos, na<br />

botânica tem um denso lastro histórico que recua aos tempos em que o latim era a língua franca das gentes cultas.<br />

No que à organografia vegetal diz respeito, pese embora uma história de quase três séculos de observação e<br />

descrição atenta da forma das plantas, falta ainda percorrer um longo caminho em busca da universalidade e<br />

consistência terminológico-­‐conceptual. Como referem Voght et al. (Vogt, Bartolomaeus, & Giribet, 2009) a descrição<br />

da morfologia <strong>do</strong>s entes viventes continua dificultada pela falta: (i) de uma terminologia estandardizada de uso<br />

comum; (ii) de um méto<strong>do</strong> comum estandardiza<strong>do</strong> de descrição morfológica; (iii) e de um conjunto de princípios a<br />

aplicar na delimitação de caracteres morfológicos. Esta limitação é, como se discute no vol. III (Sistemas cladísticos),<br />

um sério entrave à conjunção da informação molecular com a informação morfológica no estabelecimento de<br />

filogenias.<br />

A filogenia e a sistemática molecular ganharam, nas últimas décadas, uma importância acrescida em biologia. Os<br />

caracteres moleculares são hoje mais valoriza<strong>do</strong>s <strong>do</strong> que os caracteres morfológicos no estabelecimento de<br />

filogenias, na exploração de padrões filogeográficos ou na delimitação <strong>do</strong>s taxa de categoria superior. O fenótipo é<br />

um produto direto da expressão génica. Por outro la<strong>do</strong>, a exploração das relações genoma-­‐fenótipo exige uma<br />

perfeita compreensão da estrutura das plantas e o uso de termos precisos. Deste mo<strong>do</strong>, o estu<strong>do</strong> da morfologia<br />

externa e interna e da biologia da reprodução das plantas antecede, necessariamente, a “descida” à fisiologia e ao<br />

gene. No que à filogenia e sistemática diz respeito, é consensual entre os especialistas que a morfologia e os da<strong>do</strong>s<br />

moleculares são complementares: um tipo de informação não dispensa o outro.<br />

A botânica sistemática desenvolve-­‐se na confluência de um conjunto alarga<strong>do</strong> de ciências fundamentais, e.g.<br />

evolução, histologia e ecologia. Esta disciplina oferece um conjunto de princípios, méto<strong>do</strong>s e informação descritiva<br />

que permite apreender a diversidade vegetal que nos rodeia de uma forma rápida e estruturada. Uma vez que a<br />

partilha de caracteres entre as plantas se deve, frequentemente, à partilha de antepassa<strong>do</strong>s comuns, a sistemática<br />

vegetal permite que os seus utiliza<strong>do</strong>res aperfeiçoem as suas capacidades inatas de antecipar a organização <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong> vivo à escala da sua percepção visual (tema a retomar no início <strong>do</strong> vol. III, O porquê de classificar). A botânica<br />

sistemática é uma ciência moderna e de vanguarda. No passa<strong>do</strong> reduzia-­‐se à prática da classificação biológica das<br />

plantas. Hoje, por exemplo, é fundamental em ecologia – em ecologia as biocenoses são geralmente segmentadas ao<br />

nível da espécie ou da família, – em paleoclimatologia, no melhoramento de plantas e na testagem de hipóteses de<br />

biogeografia e de biologia da evolução.<br />

A botânica conforme é abordada neste texto – chamemos-­‐lhe botânica geral ou clássica – é uma disciplina de<br />

charneira entre a evolução, a biogeografia, a etnobiologia e a agronomia. Ronse De Craene e Wanntorp (Ronse De<br />

Craene & Wanntorp, Introduction : establishing the state of the art – the role of morphology in plant systematics,<br />

2011) criticam duramente o efeito negativo que o fascínio pelo molecular está a ter na persistência, e no progresso,<br />

<strong>do</strong> conhecimento sobre a morfologia das plantas e a sua sistemática: na botânica geral. Insidiosamente, a<br />

universidade (assim como o ensino não universitário) está a eliminar a botânica geral <strong>do</strong>s curricula quebran<strong>do</strong>, de<br />

forma irreparável, um cadeia secular de transmissão de saberes, trocan<strong>do</strong>-­‐os por conhecimentos hiper-­‐<br />

especializa<strong>do</strong>s. De acor<strong>do</strong> com os mesmos autores, a falta de investimento em botânica de clássica está em<br />

contraciclo com a crise da biodiversidade que ameaça as sociedades modernas. A sobrevalorização <strong>do</strong> molecular em<br />

detrimento da botânica clássica reduz a utilidade social da educação.


10 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Fontes de informação<br />

Este <strong>do</strong>cumento divide-­‐se em quatro volumes que correspondem a quatro grandes objetos da botânica:<br />

morfologia externa, biologia reprodutiva, sistemática e botânica económica. Num capítulo menor <strong>do</strong> segun<strong>do</strong><br />

volume foi feita uma pequena introdução à biologia da evolução das plantas.<br />

Histologia e anatomia vegetal. <strong>Morfologia</strong> e relações morfologia-­‐<strong>função</strong> de plantas-­‐com-­‐semente<br />

A pequena introdução à célula, histologia e anatomia vegetais que abre o vol. I, e as descrições anatómicas que a<br />

se seguem inspiraram-­‐se nas publicações de Esau (Esau, 1977), Beck (Beck, 2010), Moreira (Moreira, Histologia<br />

Vegetal, 1983), Moreira (Moreira, Anatomia das Plantas: Estruturas, 2010) e Rudal (Rudal, Anatomy of Flowering<br />

Plants. An Introduction to Structure and Development, 2007), complementadas com artigos e livros diversos de<br />

recente publicação. A componente de histologia e anatomia vegetais necessita de ser melhor trabalhada em edições<br />

futuras. Propõe-­‐se aos utiliza<strong>do</strong>res desta publicação o seu aprofundamento nas seguintes páginas Web:<br />

http://botweb.uwsp.edu/anatomy/; http://www.cls.zju.edu.cn/sub/fulab/plant_Antomy/plant/index.html.<br />

As Noções de <strong>Morfologia</strong> Externa de Plantas Superiores <strong>do</strong> Prof. João de Carvalho e Vasconcellos (Vasconcellos,<br />

1969) fixaram a terminologia botânica de uso corrente em Portugal e não se antevê, para breve, a sua substituição<br />

por outras publicações. Ainda assim, no estu<strong>do</strong> da forma das plantas são indispensáveis o Diccionario de Botánica de<br />

Pio Font Quer (Font Quer, 1985) e o Glossário de Termos Botânicos da Prof. Rosette Battarda Fernandes (Fernandes,<br />

1972). Na preparação deste <strong>do</strong>cumento foram também extensivamente consulta<strong>do</strong>s os livros de Pérez-­‐Morales<br />

(Pérez-­‐Morales, 1999), Judd et al. (Judd, Campbell, Kellog, Stevens, & Donoghue, 2007), Vozzo (Vozzo, 2002), Keller<br />

(Keller, 2004), Ingrouille & Eddie (Ingrouille & Eddie, 2006), Bell (Bell, 2008), Ronse de Craene (Ronse De Craene,<br />

Floral Diagrams: An Aid to Understanding the Flower Morphology and Evolution, 2010), Beentje (Beentje, 2012) e um<br />

grupo alarga<strong>do</strong> de artigos cita<strong>do</strong>s nas referências bibliográficas.<br />

A normalização terminológica e conceptual com o vocabulário <strong>do</strong> Plant Ontology Consortium<br />

(http://www.plantontology.org/index.html) fica adiada para uma próxima versão desta publicação. Fica prometi<strong>do</strong><br />

que edição de 2014 terá um pen<strong>do</strong>r um pouco mais tropical <strong>do</strong> que a atual.<br />

Biologia da reprodução de plantas-­‐com-­‐semente<br />

A biologia da reprodução é um tema indispensável para compreender a evolução, a fisiologia da produtividade e<br />

melhoramento de plantas. Com mais de 100 anos de edições sucessivas, o Strasburger: Trata<strong>do</strong> de Botánica (Sitte,<br />

Weller, Bresinsky, Kadereit, & Korner, 2003) continua a ser uma das fontes mais valiosas de informação sobre a<br />

biologia da reprodução de plantas. O livro de texto de Díaz et al. (Díaz Gonzalez, Fernandez-Carvajal Alvarez, &<br />

Fernández Prieto, 2004) contém uma descrição cuida<strong>do</strong>sa e precisa <strong>do</strong>s ciclos de vida das plantas.<br />

Estrutura das descrições das famílias e taxa superiores<br />

Desde a publicação <strong>do</strong> Genera Plantarum de Antoine de Jussieu, no final <strong>do</strong> séc. XVIII, que a família é a categoria<br />

taxonómica superior ao género mais utilizada na organização <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> vegetal. A organização taxonómica das<br />

famílias e grandes grupos taxonómicos seguida no vol. III deste livro funda-­‐se no APG III (Angiosperm Phylogeny<br />

Group, 2009). A descrição das famílias botânicas foi, em grande parte, adaptada <strong>do</strong> Guia de Árvores e Arbustos de<br />

Portugal Continental de Bingre et al. (Bingre, Aguiar, Espírito-Santo, Arsénio, & Monteiro-Henriques, 2007), que por<br />

sua vez foi beber grande parte da sua informação a (Heywood, 1993), (Stevens, 2001+), (Spichiger, Savoilainen,<br />

Figeat, & Jeanmonod, 2004) e (Judd, Campbell, Kellog, Stevens, & Donoghue, 2007). Para facilitar a percepção da<br />

morfologia das famílias, de uma forma muito concisa, é oferecida informação sobre o número de espécies à escala<br />

global ou presentes em Portugal continental e um apontamento sobre as plantas de maior interesse económico. Os<br />

exemplos incluí<strong>do</strong>s nos <strong>do</strong>is primeiros volumes e nas descrições das famílias, salvo indicação em contrário, referem-­‐<br />

se à flora de Portugal (inc. arquipélagos atlânticos) ou a plantas cultivadas.<br />

Para saber mais sobre as famílias das plantas-­‐com-­‐semente recomendam-­‐se <strong>do</strong>is livros de referência: W. Judd et<br />

al. (Plant Systematics. A Phylogenetic Approach, 2002) e V. H. Heywood (Flowering Plants of the World, 1993). O site<br />

http://www.mobot.org/MOBOT/research/APweb/welcome.html é indispensável para quem se quiser manter<br />

actualiza<strong>do</strong> com as descobertas taxonómicas mais recentes.<br />

Botânica económica


11 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Uma vez que os alunos de ciências agrárias e <strong>do</strong> ambiente são o público-­‐alvo deste <strong>do</strong>cumento foi atribuída uma<br />

grande importância ao uso das plantas. A bibliografia usada no volume de botânica económica envolveu livros-­‐texto<br />

de proveniências várias e um alarga<strong>do</strong> conjunto de papers da área da arqueologia e da história da agricultura.<br />

Abreviaturas, siglas e expressões latinas<br />

No Quadro 1 expõem-­‐se as abreviaturas, siglas e expressões latinas a<strong>do</strong>ptadas neste texto.<br />

Quadro 1. Abreviaturas, siglas e expressões latinas.<br />

Az – Arquipélago <strong>do</strong>s Açores. ICN – Código Internacional de Nomenclatura<br />

para Algas, Fungos e Plantas *<br />

ca. – circa, aproximadamente. ICNCP – Código Internacional de Nomenclatura<br />

das Plantas Cultivadas**.<br />

Tomaram-­‐se como esdrúxulas as palavras de etimologia grega derivadas de filos “amigo” ou de fito “planta”; e.g.<br />

xerófito (planta adaptada a ambientes secos), gametófito (v.i.), heliófilo (que aprecia a luz) e fitófilo (que ama as<br />

plantas). As palavras compostas com a raiz grega phyllo ou filo “folha”, não têm acentuação, são graves; e.g.<br />

esporofilo (v.i.) e mesofilo (v.i.). Estes são três exemplos de grafia conflituosa na bibliografia, cuja solução, em última<br />

instância, se baseou em Font Quer (1985).<br />

Convenções<br />

p.p. – pro parte, uma parte.<br />

s.l. – sensu lato, num senti<strong>do</strong><br />

alarga<strong>do</strong> <strong>do</strong> termo.<br />

cf. – confer, conferir, ver. inc. – incluso, incluí<strong>do</strong>. s.str. – sensu stricto, num senti<strong>do</strong><br />

estrito <strong>do</strong> termo.<br />

cv. – cultivar. lat. – em latim. sin. – sinónimo.<br />

e.g. – exempli gratia, por exemplo. Lu – Portugal continental. sing. – singular.<br />

excl. – excluso, excluí<strong>do</strong>. Ma – arquipélago da Madeira (inc. ilhas da<br />

Madeira, Porto Santo e Desertas).<br />

sp. – espécie não determinada.<br />

fam. – família. M.a. – milhões de anos antes <strong>do</strong> presente. sp.pl. – várias espécies.<br />

gén. – género. MS – matéria seca. subsp. – subespécie.<br />

i.e. – isto é. n.b. – nota bene, preste atenção. vd. – vide, ver.<br />

ing. – em língua inglesa . o.m.q. – o mesmo que.<br />

* Em vigor o código de Melbourne desde 1 de Janeiro de 2012 (McNeill, et al., 2012). ** em vigor a oitava edição, de 2009<br />

(Brickell, et al., 2009)<br />

Nomes latinos infraespecíficos, específicos e supraespecíficos – grafa<strong>do</strong>s em itálico, e.g. Celtis australis e<br />

Magnoliophyta; refira-­‐se que na literatura mais atual existe a tendência de italicizar apenas os nomes genéricos,<br />

específicos e infraespecíficos.<br />

Vernaculização de nomes latinos – à exceção <strong>do</strong>s nomes genéricos, específicos e infraespecíficos admite-­‐se que<br />

to<strong>do</strong>s os nomes latinos podem ser vernaculiza<strong>do</strong>s. Os sufixos previstos pelo ICN (McNeill, et al., 2012) foram<br />

aportuguesa<strong>do</strong>s no feminino e no plural: -­‐phyta em “-­‐fitas” (divisão ou filo), -­‐phytina em “-­‐fitinas” (subdivisão ou<br />

subfilo), -­‐opsida em “-­‐ópsidas” (classe), -­‐idae em “-­‐idas” (subclasse), -­‐ales em “-­‐ales” (ordem), -­‐ineae em “-­‐íneas”<br />

(subordem), -­‐aceae em “-­‐áceas” (família), -­‐oideae em “-­‐oideas” (subfamília), -­‐eae em “-­‐eas” (tribo) e -­‐inae em “-­‐inas”<br />

(subtribo). Exemplos: equisetópsidas, rosales e magnoliáceas. Nomes vulgares de uso corrente foram reti<strong>do</strong>s depois<br />

de clarifica<strong>do</strong> o seu significa<strong>do</strong>, e.g. fetos, musgos. Os nomes vernáculos <strong>do</strong>s taxa foram toma<strong>do</strong>s como substantivos<br />

comuns e escritos em minúsculas, e.g. angiospérmicas, coníferas e asteráceas.<br />

Tradução <strong>do</strong>s cla<strong>do</strong>s – nas publicações de filogenética vegetal em língua inglesa os cla<strong>do</strong>s geralmente terminam<br />

em “ids”. Na sua tradução para português optou-­‐se por substituir “ids” por “idas”, e.g. rosids em rosidas e lamiids


12 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

em lamiidas. O sufixo “ideas” usa<strong>do</strong> por alguns autores de língua portuguesa, e.g. rosidas ou lamiidas, não nos<br />

parece adequa<strong>do</strong>.<br />

Sufixo “fita” – em harmonia com a literatura mais recente em inglês o sufixo “fita” foi usa<strong>do</strong> de forma<br />

indiscriminada para designar grandes grupos taxonómico sem uma categoria taxonómica definida, e.g. briófitas,<br />

cormófitas, traqueófitas pteridófitas e licófitas.<br />

Redundâncias fonéticas – para evitar redundâncias fonéticas os nomes específicos, foram, por vezes, abrevia<strong>do</strong>s,<br />

e.g. Q. robur (= Quercus robur) (vd. Nomenclatura biológica clássica [vol. III]).<br />

Grafia <strong>do</strong>s nomes vulgares – em minúsculas, hifeniza<strong>do</strong>s e entre aspas, e.g. «lódão-­‐bastar<strong>do</strong>».<br />

Grafia <strong>do</strong>s nomes de cultivares – em acor<strong>do</strong> com o ICNCP, primeira letra maiúscula, hifeniza<strong>do</strong>s e entre aspas<br />

simples ou, sem aspas, e então precedi<strong>do</strong>s da abreviatura “cv.”, e.g. alface ‘Orelha-­‐de-­‐mula’ e macieira cv. Starking<br />

(vd. Nomenclatura de plantas cultivadas [vol. III]).<br />

Grafia <strong>do</strong>s cla<strong>do</strong>s (grupos monofiléticos) – em minúsculas. As relações filogenéticas entre os grupos que<br />

constituem os cla<strong>do</strong>s foram pontualmente expressas através de parêntesis rectos, e.g. cla<strong>do</strong> fixa<strong>do</strong>r de azoto das<br />

fabidas = Fabales [Rosales [Cucurbitales + Fagales]].<br />

Grafia <strong>do</strong>s gra<strong>do</strong>s (grupos parafiléticos) – em minúsculas e entre aspas simples, e.g. ‘carófitas’, ‘briófitas’ e<br />

‘angiospérmicas basais’.<br />

Imagens<br />

As representações esquemáticas sem autoria são originais. As fotografias sem identificação autoral provêm <strong>do</strong><br />

acervo de fotografia botânica <strong>do</strong> autor.<br />

Propõe-­‐se que o leitor acompanhe a leitura deste texto, em particular <strong>do</strong> vol. III, com visitas regulares ao site<br />

(imagem com hiperligação):<br />

Uma checklist da flora de Portugal está disponível aqui (imagem com hiperligação):<br />

Persistem inúmeros erros, omissões e gralhas: conto com to<strong>do</strong>s os utiliza<strong>do</strong>res para os corrigir. Para esse fim<br />

está à vossa disposição o seguinte endereço de e-­‐mail: botanica@ipb.pt.<br />

Como tantas vezes acontece, o texto padece de erros de formatação causa<strong>do</strong>s pelo programa de gestão de<br />

referencias bibliográficas.


13 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

1. Conceito de planta<br />

Aristóteles (séc. IV a.C.) admitiu <strong>do</strong>is grandes grupos de seres vivos, depois de Carlos Lineu (séc. XVIII)<br />

categoriza<strong>do</strong>s ao nível <strong>do</strong> reino: reino Plantae e reino Animalia (=Metazoa). O zoólogo alemão Ernst H. Haeckel, em<br />

1866, reconheceu que nem to<strong>do</strong>s os seres vivos eram animais ou plantas ao propor, sem grande sucesso no meio<br />

académico, um novo reino – o reino Protista – reunin<strong>do</strong> os atuais procariotas, os protozoários, as algas e os fungos.<br />

Durante a maior parte <strong>do</strong> século XX os livros-­‐texto de botânica, além das plantas-­‐terrestres (= embriófitas), incluíram<br />

no reino das plantas to<strong>do</strong> o tipo de algas, os fungos e, em alguns casos, as bactérias. Somente em 1961, quase cem<br />

anos depois da proposta de E. Haeckel, os microbiologistas R. Y. Stanier e C. B. van Neil clarificaram a oposição<br />

fundamental entre procariotas e eucariotas, identificada na década de 1920 pelo biólogo francês É<strong>do</strong>uard Chatton,<br />

eliminan<strong>do</strong>, em definitivo, a dicotomia planta-­‐animal.<br />

Robert Whittaker (Whittaker, 1969) propôs, com temporário êxito, um sistema de classificação alternativo à<br />

aproximação lineana, funda<strong>do</strong> em cinco reinos: Monera, Protista, Animalia, Fungi e Plantae. Este conheci<strong>do</strong> sistema<br />

tem uma ín<strong>do</strong>le funcional e ecológica – R. Whittaker era um ecólogo de vegetação – e não expressa qualquer tipo de<br />

relação evolutiva. Apoia-­‐se no nível de organização (procariotas e eucariotas, unicelulares ou multicelulares), no<br />

mo<strong>do</strong> de nutrição (autotrofia, ingestão e absorção) e no papel desempenha<strong>do</strong> pelos seres vivos nos ecossistemas<br />

naturais (produtores, consumi<strong>do</strong>res e decompositores). Os conhecimentos acumula<strong>do</strong>s nas últimas três décadas de<br />

bioquímica, fisiologia, genética e biologia evolutiva, a par da progressiva aceitação <strong>do</strong> princípio da monofilia – os<br />

taxa têm de incluir to<strong>do</strong>s, e apenas, os descendentes de um ancestral comum (vd. Conceitos e objetivos da<br />

taxonomia [vol. III]) – implicaram uma restrição significativa <strong>do</strong> conceito de planta e a substituição <strong>do</strong> sistema<br />

ecológico/funcional de R. Whittaker por sistemas de classificação filogenéticos.<br />

As plantas são eucariotas (<strong>do</strong>mínio Eukaryota), um <strong>do</strong>s três <strong>do</strong>mínios (= super-­‐reinos) da vida celular – por<br />

definição excluin<strong>do</strong> vírus e priões – defini<strong>do</strong>s por Carl Woese et al. (Woese, Kandler, & Wheelis, 1990). Embora a<br />

origem <strong>do</strong>s eucariotas permaneça um enigma e um <strong>do</strong>s maiores desafios da biologia evolutiva, as relações<br />

filogenéticas entre os grandes grupos de eucariotas estão convergir num consenso. O sistema de classificação de Adl<br />

et al. (Adl, et al., 2005), por exemplo, reconhece cinco grandes grupos de eucariotas: Amoebozoa, Rhizaria,<br />

Opisthokonta, Chromalveolata e Archaeplastida sob a categoria não formal de “super-­‐grupo”, que alguns autores<br />

preferem içar à categoria de reino. Grosso mo<strong>do</strong> <strong>do</strong>is deles, Amoebozoa e Rhizaria, reúnem essencialmente seres<br />

unicelulares; os Opisthokonta incluem, entre outros seres, fungos (Fungi) e animais (Metazoa); os oomicetas<br />

(Oomycota, Chromalveolata), as algas-­‐castanhas (Phaeophyceae, Chromalveolata) e as diatomáceas (Bacillariophyta,<br />

Chromalveolata) são as Chromalveolata mais conhecidas; as plantas encontram-­‐se nas Archaeplastida.<br />

O nome “Plantae” continua em uso, a designar combinações dispares de organismos fotossintéticos. Os autores<br />

mais recentes reduzem o conceito de Plantae, agora raramente concretiza<strong>do</strong> com a categoria de reino, a um<br />

agrega<strong>do</strong> constituí<strong>do</strong> pelas plantas-­‐terrestres e por um número variável de grupos de algas. Um ponto da situação<br />

atualiza<strong>do</strong> deste conceito pode ser aprecia<strong>do</strong>, por exemplo, no Tree of Life (http://tolweb.org/tree/). A designação<br />

Plantae é aplicada por estes e muitos outros autores, a um grande grupo monofilético constituí<strong>do</strong> pelas glaucófitas<br />

(Glaucophyta 3 , vd. Estádios inicias da evolução das plantas-­‐terrestres [vol. II]) + algas-­‐vermelhas (Ro<strong>do</strong>phyta) +<br />

plantas-­‐verdes (= Chlorobionta 4 ). O nome Plantae porém é equívoco porque desde a fundação da moderna<br />

nomenclatura biológica por Carlos Lineu (vd. Nomenclatura, vol. III), nos mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> séc. XVIII, foi usa<strong>do</strong> com<br />

múltiplos senti<strong>do</strong>s. A solução mais parcimoniosa talvez seja evitar o nome Plantae e substituí-­‐lo por Archaeplastida 5 ,<br />

sem concretizar a categoria taxonómica (Adl, et al., 2005), traduzi<strong>do</strong> para a linguagem comum por plantas ou<br />

linhagem-­‐verde (vd. Quadro 1).<br />

As plantas-­‐verdes, um <strong>do</strong>s três grupos de Archaeplastida, repartem-­‐se por duas grandes linhagens: as<br />

Chlorophyta e as Streptophyta (Leliaert, et al., 2012). As algas incluídas nas Streptophyta, as Charophyta 6 , são<br />

evolutivamente muito próximas <strong>do</strong> seu grupo irmão, as atuais plantas-­‐terrestres (= Equisetopsida 7 ; vd. As primeiras<br />

3 O.m.q. Glaucocystophyta (glaucocistófitas).<br />

4 Ou ainda Viridaeplantae, Viridiplantae, Chlorobiota ou Chloroplastida.<br />

5 Um terceiro nome disponível na bibliografia: Primoplantae.<br />

6 As Charophyta (‘carófitas’ ou ‘algas-­‐carófitas’), e implicitamente as ‘algas-­‐verdes’ (=Chlorophyta + Charophyta), são parafiléticas<br />

porque não incluem to<strong>do</strong>s os descendentes de um ancestral comum, concretamente excluem as plantas-­‐terrestres.<br />

7 Ou ainda Embryobionta ou Embryophyta.


14 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

plantas-­‐terrestres [vol. II]). A classe Equisetopsida (plantas-­‐terrestres ou embriófitas) abrange as ‘briófitas’ (=<br />

hepáticas + antóceras + musgos), as ‘pteridófitas’ (= licopódios + fetos) e as plantas-­‐com-­‐semente (= angiospérmicas<br />

+ gimnospérmicas). As hepáticas são basais relativamente às restantes plantas-­‐terrestres, portanto, foram o primeiro<br />

grupo, entre as plantas-­‐terrestres atuais, a diferenciar-­‐se e a colonizar a terra emersa, algures durante o perío<strong>do</strong><br />

Or<strong>do</strong>vícico.<br />

No Quadro 2 faz-­‐se um enquadramento taxonómico <strong>do</strong>s principais grupos de plantas-­‐terrestres. Embora se tenha<br />

opta<strong>do</strong> por uma categorização formal <strong>do</strong>s grandes grupos de seres vivos e de plantas é importante referir que as<br />

categorias formais entre o <strong>do</strong>mínio e a classe, inclusive, são, na prática, dispensáveis (vd. Nomenclatura filogenética<br />

[vol. III]). Por essa razão na bibliografia é frequente o uso indiscrimina<strong>do</strong> <strong>do</strong> sufixo de divisão “phyta” (vd.<br />

Nomenclatura biológica clássica [vol. III]). A taxonomia das plantas-­‐vasculares é retomada no vol. III.<br />

Quadro 2. Enquadramento taxonómico da classe Equisetopsida «plantas-­‐terrestres». Basea<strong>do</strong> em (Adl, et al.,<br />

2005); (Chase & Reveal, 2009); (Christenhusz, Reveal, Martin, Robert, & Chase, 2011); (Christenhusz,<br />

Zhang, & Schneider, A linear sequence of extant families and genera of lycophytes and ferns, 2011).<br />

Categoria taxonómica Taxa Nome vulgar<br />

Sem categoria formal Eukaryota eucariotas<br />

Sem categoria formal Archaeplastida linhagem-­‐verde ou plantas<br />

Sem categoria formal Chlorobionta plantas-­‐verdes<br />

Sem categoria formal Streptophyta estreptófitas<br />

Classe Equisetopsida plantas-­‐terrestres, embriófitas<br />

Subclasse Marchantiidae hepáticas<br />

Subclasse Bryidae musgos<br />

Subclasse Anthocerotidae antóceras<br />

Subclasse Lycopodiidae licopodiidas, licófitas, licopódios<br />

Subclasse Ophioglossidae ophioglossidas, fetos-­‐ophioglossi<strong>do</strong>s<br />

Subclasse Equisetidae equisetidas, fetos-­‐equiseti<strong>do</strong>s, equisetófitas, equisetas<br />

Subclasse Marattiidae marattiidas, marattiófitas, fetos-­‐marattii<strong>do</strong>s<br />

Subclasse Polypodiidae polipodiidas, polipodiófitas, fetos-­‐verdadeiros, fetos-­‐<br />

leptoesporangia<strong>do</strong>s<br />

Subclasse Cycadidae cicadidas, cicadófitas, cicas, cicas<br />

Subclasse Ginkgoidae ginkgoídas, ginkgófitas, ginkgos<br />

Subclasse Pinidae pinidas, pinófitas, coníferas<br />

Subclasse Gnetidae gnetidas, gnetófitas<br />

Subclasse Magnoliidae angiospérmicas, magnoliidas, plantas-­‐com-­‐flor, magnoliófitas<br />

Uma vez que este texto versa as plantas-­‐com-­‐semente, e as plantas-­‐terrestres cormofíticas serão ciclicamente<br />

recordadas, impõe-­‐se, desde já, uma importante questão: o que é uma planta-­‐terrestre? As plantas-­‐terrestres<br />

(Equisetopsida) são um taxon monofilético, cujos elementos partilham um conjunto alarga<strong>do</strong>s de características,<br />

maioritariamente devidas a uma ancestralidade comum. Estas características serão desenvolvidas nos capítulos que<br />

se seguem. O Quadro 3 resume as principais características das plantas-­‐terrestres.


15 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Quadro 3. Principais características estruturais e funcionais das plantas-­‐terrestres. Basea<strong>do</strong> em (Ingrouille & Eddie,<br />

2006) e autores vários.<br />

Característica Descrição<br />

Estrutura celular eucariótica Organismos com um núcleo e outras estruturas celulares complexas encerradas por<br />

membranas<br />

Multicelularidade Indivíduos com mais de uma célula, com diferentes funções e interdependentes entre<br />

si<br />

Imobilidade Organismos fixos a um substrato durante grande parte <strong>do</strong> seu ciclo biológico, com fases<br />

de dispersão breves, normalmente sob a forma de esporos ou de sementes<br />

Com uma estrutura modular vd. Estrutura modular das plantas<br />

Elevada plasticidade fenotípica vd. Variação morfológica intraespecífica<br />

Crescimento indetermina<strong>do</strong> vd. Organização <strong>do</strong> corpo das plantas-­‐com-­‐semente<br />

Paredes celulares celulósicas Estrutura rígida que envolve o protoplasma maioritariamente constituída por um<br />

polímero de β celulose<br />

Cutícula Camada não celular, cerosa de proteção <strong>do</strong>s órgãos aéreos primários<br />

Revestimento de algumas<br />

estruturas reprodutivas com<br />

esporopolenina<br />

Biopolímero complexo, de composição química pouco conhecida, muito resistente à<br />

agressão química, emprega<strong>do</strong> na proteção de esporos e grãos de pólen contra os raios<br />

UV e a dessecação<br />

Foto-­‐autotrofia Produzem compostos orgânicos complexos e ricos em energia a partir de moléculas<br />

inorgânicas simples (e.g. H2O, CO2, K + , e NO3 -­‐ ), e da energia (sob a forma de ATP) e <strong>do</strong><br />

poder redutor (sob a forma de NAPH2) gera<strong>do</strong>s pelas moléculas de clorofila excitadas<br />

pela luz <strong>do</strong> sol<br />

Órgãos assimila<strong>do</strong>res 8 com<br />

uma elevada relação<br />

superfície/ volume<br />

Elevada relação superfície/ volume conseguida através da redução da espessura das<br />

folhas e <strong>do</strong> diâmetro das raízes; consequência da fototrofia e <strong>do</strong> consumo de alimentos<br />

inorgânicos diluí<strong>do</strong>s (vd. <strong>Vol</strong>ume e superfície nas plantas)<br />

Estomas Pequenas aberturas na superfície <strong>do</strong>s órgãos aéreos primários por onde se processam<br />

as trocas gasosas com o exterior (ausentes na maioria das ‘briófitas’)<br />

Órgãos especializa<strong>do</strong>s na<br />

absorção de nutrientes <strong>do</strong> solo<br />

Órgãos fotossintetiza<strong>do</strong>res<br />

suporta<strong>do</strong>s por um sistema<br />

tubular rígi<strong>do</strong><br />

Ciclo de vida haplodiplonte<br />

heteromórfico<br />

Rizoides (nas ‘briófitas’ e no protalo das ‘pteridófitas’) ou sistema radicular<br />

Sistemas de caules com folhas s.l., i.e. com filídios <strong>do</strong>s musgos, microfilos e megafilos<br />

nas plantas vasculares (vd. Teoria telomática de W. Zimmermann)<br />

Com meiose desfasada da fecundação e alternância de duas gerações – fases haploide<br />

(gametófito) e diploide (esporófito) – de distinta morfologia (vd. Ciclo de vida das<br />

plantas, vol. II)<br />

Anterídeos e arquegónios Órgãos onde se diferenciam, respectivamente, gâmetas ♂ e ♀ (vd. Contextualização<br />

taxonómica <strong>do</strong> ciclo de vida das plantas-­‐terrestres, vol. II)<br />

Esporângios Órgãos onde se diferenciam esporos (vd. Contextualização taxonómica <strong>do</strong> ciclo de vida<br />

das plantas-­‐terrestres, vol. II)<br />

Embrião Estrutura multicelular geralmente protegi<strong>do</strong> por um teci<strong>do</strong> multicelular haploide (nas<br />

‘briófitas’, ‘pteridófitas’ e gimnospérmicas) ou triploide (nas angiospérmicas) (vd.<br />

Contextualização taxonómica <strong>do</strong> ciclo de vida das plantas-­‐terrestres, vol. II)<br />

8 Entende-­‐se por assimilação a incorporação e conversão de nutrientes no protoplasma, processo que nas plantas envolve a<br />

fotossíntese nos órgãos herbáceos aéreos (folhas e caules primários) e a absorção de nutrientes pelas raízes.


16 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

O esporófito (fase diploide <strong>do</strong> ciclo de vida das plantas-­‐terrestres) das plantas-­‐com-­‐semente é constituí<strong>do</strong> por<br />

três órgãos fundamentais: raiz, caule e folhas. A flor é um ramo curto muito modifica<strong>do</strong>, com folhas especializadas<br />

na reprodução sexuada (vd. Flor, vol. I, fasc. II). Qualquer outra estrutura nas plantas reside ou resulta da<br />

modificação destes três órgãos. O seu conjunto constitui o cormo ou corpo da planta. Os órgãos das plantas são, por<br />

sua vez, constituí<strong>do</strong>s por teci<strong>do</strong>s, e os teci<strong>do</strong>s por células. A estrutura interna ou anatomia vegetal refere-­‐se à<br />

organização <strong>do</strong>s teci<strong>do</strong>s no interior <strong>do</strong>s órgãos (vd. Breve reflexão epistemológica). Antes avançar no estu<strong>do</strong> da<br />

estrutura externa das plantas, o tópico principal deste volume (capítulos 3, 4 e 5), convém rever alguns aspetos da<br />

estrutura da célula e de histologia vegetal, que se resumem no ponto 2.<br />

2. A célula e os teci<strong>do</strong>s das plantas-­‐com-­‐semente<br />

2.1. A célula vegetal<br />

A célula foi descrita pela primeira vez pelo inglês Robert Hooke [1635-­‐1703], em 1665, a partir de cortes finos de<br />

cortiça. Ao holandês Antonie van Leeuwenhoek [1632–1723] cabe a honra da primeira observação de células vivas e<br />

de microrganismos unicelulares. As evidências observacionais subsequentemente acumuladas, assistidas pelos<br />

progressos da microscopia óptica, culminaram século e meio depois na teoria celular. Esta teoria fundamental da<br />

biologia, originalmente proposta pelos cientistas alemães Matthias Schleiden e Theo<strong>do</strong>r Schwann em 1839, postula<br />

que: i) to<strong>do</strong>s os seres vivos são constituí<strong>do</strong>s por células; ii) a célula é o elemento fundamental da organização da<br />

vida; iii) todas as células descendem de outra célula. A vida, tal como a conhecemos, evoluiu uma única vez: to<strong>do</strong>s os<br />

seres vivos têm, em última instância, um ancestral comum, cujas características quedam por clarificar. A natureza<br />

celular <strong>do</strong> primeiro ser vivo é, porém, inequívoca: a célula é uma plesiomorfia, i.e. um carácter ancestral, de toda a<br />

vida terrestre (vd. Sistemas cladísticos [vol. III]).<br />

A célula eucariota ancestral de todas<br />

as plantas era heterotrófica:<br />

alimentava-­‐se, por fagocitose, de<br />

substâncias orgânicas complexas. Com a<br />

aquisição, por en<strong>do</strong>ssimbiose, de um<br />

plastídio fotossintético (vd. Do<br />

nascimento da vida às algas ancestrais<br />

das plantas-­‐terrestres [vol. II]) os<br />

componentes orgânicos da célula<br />

vegetal principiaram a ser produzi<strong>do</strong>s<br />

no seu interior, a partir <strong>do</strong>s esqueletos carbona<strong>do</strong>s forneci<strong>do</strong>s pela fotossíntese. A célula vegetal pode especializar-­‐<br />

se na alimentação de substâncias minerais simples, capazes de penetrar na célula por absorção – e a fagocitose<br />

volveu inútil. A absorção, ao invés da fagocitose, é compatível com o desenvolvimento de uma parede celular rígida<br />

com uma <strong>função</strong> de proteção contra preda<strong>do</strong>res e ambientes hipotónicos 9 Figura 2. Constituintes da célula vegetal.<br />

. Contu<strong>do</strong>, a parede celular celulósica<br />

característica das plantas-­‐verdes dificulta a excreção de subprodutos tóxicos <strong>do</strong> metabolismo. Uma das soluções<br />

evolutivas encontradas pelas plantas para este problema consistiu na sua acumulação num vacúolo, que nas células<br />

mais velhas ocupa a quase totalidade <strong>do</strong> protoplasma, e comprime o citoplasma e o núcleo para a periferia da célula<br />

(vd. terminologia na Figura 2). A parede celular e o vacúolo são apenas duas das muitas caraterísticas que<br />

diferenciam a célula vegetal da célula animal, descritas ao pormenor nos livros-­‐texto de biologia.<br />

9 Com poucos sais e que causam a turgescência e a eventual lise (ruptura) da célula


17 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

O desenvolvimento celular compreende três processos: i) divisão<br />

e multiplicação celulares – incremento <strong>do</strong> número de células; ii)<br />

alongamento celular – aumento da dimensão das células; e iii)<br />

diferenciação celular – especialização funcional das células. As células<br />

vegetais dividem-­‐se por mitose, outro tema aborda<strong>do</strong> em detalhe nos<br />

livros de biologia geral. A meiose é um evento constante mas raro no<br />

ciclo de vida das plantas vasculares, sempre associa<strong>do</strong> com a<br />

produção de esporos (vd. Ciclo de vida das plantas [vol. II]). Entre<br />

outras peculiaridades, na divisão celular por mitose nas plantas a<br />

individualização das células filhas (= citocinese) é de imediato<br />

sucedida pela formação de parede celular. As divisões celulares<br />

paralelas à superfície de um órgão – divisões periclinais– aumentam a<br />

sua espessura (Figura 3A); as divisões anticlinais são perpendiculares<br />

à sua superfície (Figura 3B). Nos órgãos cilíndricos (= axiais) – raiz e<br />

caule – as divisões celulares anticlinais, por sua vez, podem ser<br />

transversas (perpendiculares ao eixo longitudinal) (Figura 3A) ou<br />

radiais (decorrem num plano longitudinal). As divisões anticlinais<br />

transversas alongam os órgãos. As divisões anticlinais radiais<br />

ocorrem, por exemplo, no câmbio vascular e na felogene (vd. Os<br />

meristemas) em resposta às tensões resultantes <strong>do</strong> aumento <strong>do</strong><br />

diâmetro de raízes ou caules causa<strong>do</strong> pelo crescimento secundário.<br />

A parede celular primária das células somáticas (não reprodutivas) das plantas-­‐vasculares diferencia-­‐se ainda no<br />

interior <strong>do</strong>s meristemas (vd. Os meristemas). A parede celular primária é uma armadura resistente, e ao mesmo<br />

tempo porosa e extensível, a fim de permitir o alongamento celular. É constituída por três tipos de polissacarídeos<br />

(Refrégier, Höft, & Venhettes, 2012): microfibrilas de celulose (um polímero hidrófilo 10 de β-­‐glucose), entrelaçadas<br />

por hemiceluloses (polímeros de xiloglucano), numa matriz de pectinas (um polímero de áci<strong>do</strong> galacturónico). A<br />

celulose representa apenas cerca de 15% <strong>do</strong> peso seco da parede primária. As células alongam-­‐se em consequência<br />

da pressão exercida pelo protoplasma na parede celular primária. Neste processo é determinante o crescimento <strong>do</strong><br />

vacúolo.<br />

Fin<strong>do</strong> o perío<strong>do</strong> de alongamento celular muitas plantas constroem uma parede celular secundária por dentro da<br />

parede primária. A parede celular secundária resulta da acumulação de compostos que a enrijecem, sobretu<strong>do</strong> de<br />

celulose (que pode atingir os 94% <strong>do</strong> seu peso seco), em geral combinada com lenhina, um polímero aromático<br />

hidrófobo. Como adiante se explica, as células da en<strong>do</strong>derme (vd. Estrutura primária da raiz ) e <strong>do</strong> felema (vd.<br />

Felogene e riti<strong>do</strong>ma) acumulam suberina, uma outra substância hidrofóbica, desta feita de natureza cerosa.<br />

Interrompem as paredes celulares, tanto primárias como secundárias, pequenas aberturas conhecidas por<br />

pontuações (ing. pits). As pontuações de duas células vizinhas geralmente opõem-­‐se e são percorridas por cordões<br />

microscópicos de protoplasma, os plasmodesmos 11 . Esta continuidade membranar e protoplasmática das células<br />

vegetais não tem paralelo nas células animais, mas não é caso único entre os seres vivos (ocorre também nos<br />

fungos). As pontuações podem ser simples, ou mostrar uma aréola (pontuações areoladas, ing. bordered pits), como<br />

acontece nos elementos traqueais (vd. Xilema).<br />

Além <strong>do</strong> citoplasma, vacúolo, núcleo e organitos celulares, as células contêm, frequentemente, inclusões de vária<br />

ordem; e.g. grânulos de ami<strong>do</strong> e cristais oxalato de cálcio. As ráfides são cristais de oxalato de cálcio ou de carbonato<br />

de cálcio, alonga<strong>do</strong>s e em forma de agulha, comuns e de fácil observação microscópica, que se admite terem algum<br />

efeito na contenção da herbivoria; e.g. abundantes na Calocasia esculenta (Araceae) «inhame». Muitas gramíneas e<br />

cucurbitáceas, entre outras plantas-­‐com-­‐semente, depositam grandes quantidade de sílica, intra e/ou<br />

extracelularmente, sobretu<strong>do</strong> nas células da epiderme (células silicosas), sob a forma de acumulações microscópicas<br />

conhecidas por corpos de sílica ou fitólitos (ing. phytoliths). Foi demonstra<strong>do</strong> em gramíneas tropicais que a formação<br />

10 Com afinidade para com as moléculas de água; que atrai a água. Opõe-­‐se a hidrófobo.<br />

11 Ou plasmodesmata; sing. plasmodesmo.<br />

A<br />

B<br />

Figura 3. Orientação das divisões<br />

celulares. A) Divisão periclinal. B) Divisão<br />

anticlinal transversa.


18 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

de corpos de sílica nas folhas era maior nas plantas provenientes de pastagem sujeitas a uma herbivoria intensa e<br />

nas plantas intensamente desfoliadas (McNaughton & Tarrants, 1983). Aparentemente, a silicificação <strong>do</strong>s limbos das<br />

gramíneas também tem a <strong>função</strong> de deter a herbivoria. Dizem-­‐se ergásticas as substâncias de reserva, ou os<br />

subprodutos <strong>do</strong> metabolismo, constituintes de acumulações intracelulares ou inclusas na parede celular. As células<br />

com substâncias ergásticas caem, muitas vezes, no conceito de idioblasto (vd. Os teci<strong>do</strong>s das plantas vasculares).<br />

2.2. Os teci<strong>do</strong>s vegetais<br />

O termo desenvolvimento (= ontogénese) refere-­‐se à história das transformações estruturais vividas por um<br />

indivíduo, ou por uma parte de um indivíduo, desde o embrião, ou de um meristema, até à senescência. Diz-­‐se, por<br />

exemplo, que os espinhos foliares e caulinares têm uma ontogénese distinta porque os primeiros são folhas<br />

modificadas e os segun<strong>do</strong>s caules modifica<strong>do</strong>s (vd. Homologia e analogia. Princípio da homologia e Espinhos). O<br />

desenvolvimento das plantas envolve <strong>do</strong>is processos distintos: crescimento e diferenciação. O crescimento é um<br />

acréscimo da massa de células vivas origina<strong>do</strong> pela multiplicação (mitose) e alongamento das células. O número de<br />

tipos celulares, teci<strong>do</strong>s, órgãos e, em último caso, a fisionomia das plantas, são uma consequência da diferenciação 12<br />

celular.<br />

A B C D<br />

Figura 4. Planos de corte em órgãos cilíndricos. A) Plano transversal. B) Plano radial ou longitudinal. C) Plano<br />

tangencial. D) Qualificação espacial das paredes celulares em relação ao eixo longitudinal.<br />

Os teci<strong>do</strong>s são estuda<strong>do</strong>s no âmbito da histologia; a sua disposição espacial nos órgãos é o objecto da anatomia.<br />

Os cortes histológicos com técnicas de coloração diferencial 13 continuam a ser a técnica microscópica base da<br />

histologia e da anatomia vegetais. No estu<strong>do</strong> histológico-­‐anatómico <strong>do</strong>s órgãos cilíndricos distinguem-­‐se três planos<br />

de corte, consoante a sua orientação em relação ao eixo longitudinal (= eixo maior) (Figura 4): i) plano transversal –<br />

plano perpendicular ao eixo longitudinal; ii) radial (= longitudinal ou radial longitudinal) – plano axial que intercepta<br />

o eixo longitudinal e divide o órgão em duas partes iguais; iii) tangencial (= tangencial longitudinal) – plano axial<br />

paralelo ao eixo longitudinal. Vocábulos similares são usa<strong>do</strong>s para precisar a topografia das paredes celulares:<br />

parede tangencial (= periclinal), parede radial e parede transversal (Figura 4). As paredes tangenciais podem ser<br />

internas ou externas, e as paredes transversais anteriores ou posteriores.<br />

Os teci<strong>do</strong>s das plantas vasculares repartem-­‐se em <strong>do</strong>is grandes grupos de acor<strong>do</strong> com a sua capacidade de<br />

divisão e <strong>função</strong>: teci<strong>do</strong>s meristemáticos (vd. Os meristemas) e teci<strong>do</strong>s definitivos. As células <strong>do</strong>s primeiros têm<br />

capacidade meristemática, i.e. de se dividirem por mitose, e dão origem aos segun<strong>do</strong>s. Tradicionalmente, os teci<strong>do</strong>s<br />

definitivos são organiza<strong>do</strong>s <strong>do</strong> seguinte mo<strong>do</strong>: i) teci<strong>do</strong>s de proteção – epiderme e periderme; ii) teci<strong>do</strong>s<br />

fundamentais, de síntese, de reserva, de suporte ou secretores – parênquima, colênquima, esclerênquima e teci<strong>do</strong>s<br />

12 Alguns autores identificam desenvolvimento com diferenciação.<br />

13 Que diferenciam, geralmente pela cor, diferentes tipos celulares e de teci<strong>do</strong>s.


19 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

secretores; iii) teci<strong>do</strong>s de transporte – xilema e floema. Uma organização funcional desta ín<strong>do</strong>le é redutora porque<br />

só o xilema desempenha, em simultâneo, funções de transporte, de suporte e de reserva, e contém células<br />

parenquimatosas 14 . Em alternativa os teci<strong>do</strong>s vegetais podem classificar-­‐se atenden<strong>do</strong> à sua forma e <strong>função</strong> em: i)<br />

teci<strong>do</strong>s essencialmente elabora<strong>do</strong>res – parênquimas clorofilinos (= clorênquima) ou incolores, e teci<strong>do</strong>s secretores<br />

epidérmicos ou internos; ii) teci<strong>do</strong>s essencialmente mecânicos de proteção: epiderme e súber; iii) teci<strong>do</strong>s<br />

essencialmente de suporte: colênquima, esclerênquima e parênquima lenhoso; e iv) teci<strong>do</strong>s essencialmente de<br />

transporte: xilema e floema.<br />

Os teci<strong>do</strong>s definitivos podem ainda organizar-­‐se em teci<strong>do</strong>s simples e teci<strong>do</strong>s complexos (Rudal, Anatomy of<br />

Flowering Plants. An Introduction to Structure and Development, 2007). Os teci<strong>do</strong>s simples são constituí<strong>do</strong>s por um<br />

único tipo celular, pontualmente interrompi<strong>do</strong> por células com características únicas (= idioblastos). São teci<strong>do</strong>s<br />

simples o parênquima, o colênquima e o esclerênquima (vd. Teci<strong>do</strong>s simples). Os teci<strong>do</strong>s complexos envolvem vários<br />

tipos celulares, sen<strong>do</strong> reparti<strong>do</strong>s por três sistemas de teci<strong>do</strong>s com funções especializadas: i) teci<strong>do</strong> dérmico – <strong>função</strong><br />

de proteção (vd. Epiderme); ii) teci<strong>do</strong> fundamental – <strong>função</strong> fotossintética, reserva, preenchimento e suporte (vd.<br />

Teci<strong>do</strong> fundamental); iii) teci<strong>do</strong> vascular – <strong>função</strong> de transporte de água e nutrientes e, secundariamente, de reserva<br />

e sustentação (vd. Teci<strong>do</strong> vascular). O teci<strong>do</strong> dérmico reveste exteriormente as plantas. Dois teci<strong>do</strong>s complexos<br />

constituem o teci<strong>do</strong> vascular: o xilema e o floema. Integram o teci<strong>do</strong> fundamental os teci<strong>do</strong>s que não cabem nos<br />

conceitos de teci<strong>do</strong> dérmico ou vascular.<br />

Nas raízes e caules primários, o conjunto <strong>do</strong> teci<strong>do</strong> vascular mais o teci<strong>do</strong> fundamental a ele associa<strong>do</strong> (medula +<br />

teci<strong>do</strong>s interfasciculares) designa-­‐se por cilindro central (= estela). Nos órgãos cilíndricos – raiz e caule – das<br />

‘pteridófitas’, gimnospérmicas e dicotiledóneas os teci<strong>do</strong>s vasculares estão, por regra, organiza<strong>do</strong>s num cilindro<br />

vascular. O córtex, de origem primária ou secundária (vd. Felogene e riti<strong>do</strong>ma), corresponde à massa de teci<strong>do</strong><br />

fundamental entre o cilindro central e a epiderme. Nas raízes e, sobretu<strong>do</strong>, nos caules primários, por dentro cilindro<br />

vascular ocorre muitas vezes outra massa de teci<strong>do</strong> fundamental, a medula, pela sua posição topográfica é parte<br />

integrante <strong>do</strong> cilindro central.<br />

2.2.1. Meristemas<br />

Nos estádios iniciais da germinação todas as células vivas da semente se dividem por mitose. A progressiva<br />

diferenciação celular que se sucede à germinação compromete esta capacidade. A produção de novas células (i.e. o<br />

crescimento) das plântulas 15 rapidamente fica restringida a um tipo particular de teci<strong>do</strong> indiferencia<strong>do</strong>: aos<br />

meristemas (ing. meristems). Algumas células de vegetais diferenciadas, sobretu<strong>do</strong> nos teci<strong>do</strong>s definitivos<br />

parenquimatosos (vd. mais adiante), podem, pontualmente, desdiferenciar-­‐se e dividir-­‐se, por regra sem grande<br />

impacto na estrutura <strong>do</strong> corpo das plantas. A produção de novas células nas plantas está então concentrada nos<br />

meristemas; nos animais a divisão celular ocorre de forma difusa, com diferentes atividades mitóticas, um pouco por<br />

to<strong>do</strong> o corpo, mais intensa antes de atingida a fase adulta.<br />

Os meristemas são teci<strong>do</strong>s de células estaminais 16 . Duas propriedades caracterizam as células estaminais, tanto<br />

vegetais como animais: i) a capacidade de se auto-­‐perpetuarem, produzin<strong>do</strong> novas células estaminais; ii) a<br />

capacidade de se diferenciarem em tipos especializa<strong>do</strong>s de células. Nas preparações histológicas, as células vegetais<br />

estaminais destacam-­‐se pelo citoplasma denso sem vacúolos ou com vacúolos muito pequenos, pelas paredes<br />

celulares delgadas, geralmente angulosas, e por um núcleo de grande dimensão. Permanecem indiferenciadas em<br />

aglomera<strong>do</strong>s compactos sem espaços intercelulares e não envelhecem; são virtualmente imortais e a origem de<br />

todas as células diferenciadas. Em última instância, num meristema, todas as células estaminais procedem de um<br />

grupo restrito de células, conheci<strong>do</strong> por células iniciais. As iniciais dividem-­‐se com lentidão constituin<strong>do</strong> uma espécie<br />

de reserva que alimenta de células as restantes regiões <strong>do</strong> meristema. Nas algas, briófitas e em muitas pteridófitas<br />

ocorre uma única inicial; nas plantas-­‐com-­‐semente identifica-­‐se mais <strong>do</strong> que uma célula inicial.<br />

14 De parênquima.<br />

15 Plântulas – plantas recém germinadas.<br />

16 Células-­‐tronco na terminologia brasileira.


20 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Quadro 4. Tipologia <strong>do</strong>s meristemas vegetativos<br />

Critério/Tipo Descrição Subtipos<br />

Quanto à origem<br />

Meristemas primários<br />

(ing. primary<br />

meristems)<br />

Meristemas<br />

secundários (ing.<br />

secondary meristems)<br />

Quanto à posição<br />

Meristemas apicais<br />

(ing. apical meristems)<br />

Meristemas laterais<br />

(ing. lateral meristems)<br />

Meristemas<br />

intercalares (ing.<br />

intercalary meristems)<br />

A sua origem remonta às células<br />

embrionárias, sem que tenha ocorri<strong>do</strong> uma<br />

interrupção da atividades meristemática; o<br />

adjetivo “primário” explicita a continuidade<br />

meristemática entre as células embrionárias<br />

e as células iniciais <strong>do</strong>s meristemas<br />

primários.<br />

Resultam da desdiferenciação celular (e.g. de<br />

células parenquimatosas), ou da reativação<br />

de células com capacidade meristemática<br />

temporariamente interrompida que ocorrem<br />

em regiões <strong>do</strong> caule e da raiz <strong>do</strong>minadas por<br />

células maduras<br />

Meristema apical caulinar (ing. shoot apical<br />

meristem), meristema apical radicular radicular<br />

(ing. root apical meristem), meristemas axilares<br />

(ing. axillary meristems), meristema de<br />

espessamento 17 primário (ing. primary<br />

thickening meristem) e meristemas intercalares<br />

(ing. intercalary meristems)<br />

Câmbio vascular (ing. vascular cambium)<br />

(= câmbio libero-­‐lenhoso ou, simplesmente,<br />

câmbio), felogene (ing. phellogen) (= câmbio<br />

suberoso, ing. cork cambium, ou câmbio<br />

subero-­‐felodérmico) e meristema de<br />

espessamentosecundário (ing. secondary<br />

thickening meristem)<br />

Localiza<strong>do</strong>s nos ápices de caules ou raízes Meristema apical caulinar e meristema apical<br />

radicular, meristema axilar<br />

Revestem em extensão variável os órgãos<br />

axiais (caule e raiz) promoven<strong>do</strong> um<br />

aumento em diâmetro<br />

Meristemas primários próprios das<br />

monocotiledóneas, embuti<strong>do</strong>s entre teci<strong>do</strong>s<br />

já diferencia<strong>do</strong>s<br />

Câmbio vascular, felogene, meristema de<br />

espessamento primário e meristema de<br />

espessamento secundário<br />

Meristema intercalar folhear (ing. leaf intercalar<br />

meristema); meristema intercalar caulinar (ing.<br />

stem intercalar meristema)<br />

Uma primeira classificação <strong>do</strong>s meristemas refere-­‐se à sua determinação (Sablowski, 2007). Os meristemas<br />

determina<strong>do</strong>s (ing. determinate meristem) estão geneticamente programa<strong>do</strong>s para cessar a produção de novas<br />

células uma vez atingi<strong>do</strong> um estádio de desenvolvimento específico. Produzem estruturas com dimensão e formas<br />

determinadas, e.g. folhas (meristemas foliares) e flores (meristemas florais). Os meristemas indetermina<strong>do</strong>s (ing.<br />

indeterminate meristem) estão envolvi<strong>do</strong>s no crescimento de órgãos indetermina<strong>do</strong>s, i.e. raiz e caule (e por vezes<br />

inflorescência) (vd. Organização <strong>do</strong> corpo das plantas-­‐com-­‐semente).<br />

A vida pós-­‐embriónica 18 das plantas-­‐com-­‐semente pode ser dividida em duas fases: fase vegetativa e fase<br />

reprodutiva. A transição da fase vegetativa para a fase reprodutiva implica a conversão de meristemas vegetativos<br />

indetermina<strong>do</strong>s, concretamente de meristemas apicais ou axilares caulinares, em meristemas reprodutivos,<br />

determina<strong>do</strong>s. Nesta conversão consite a diferenciação floral. Nas plantas-­‐com-­‐flor os meristemas reprodutivos<br />

passam por duas fases: meristema da inflorescência, enquanto diferenciam as estruturas da inflorescência, e<br />

meristema floral, quan<strong>do</strong> formam flores (vd. Iniciação floral) 19 . Os meristemas vegetativos são classifica<strong>do</strong>s de<br />

acor<strong>do</strong> com <strong>do</strong>is critérios: origem e posição (Quadro 4).<br />

A polaridade embrionária é definida num estádio inicial da diferenciação da semente, persistin<strong>do</strong> durante to<strong>do</strong> o<br />

ciclo de vida da planta, até à senescência. Os polos (= ápices) radicular e caulinar <strong>do</strong> embrião acolhem aglomera<strong>do</strong>s<br />

de células com capacidade meristemática permanente, que dão origem, após a germinação da semente, aos<br />

meristemas primários apical radicular e apical caulinar (Quadro 4). O alongamento lidera<strong>do</strong> pelos meristemas<br />

17 Ou “de engrossamento”, primário ou secundário.<br />

18 Que se segue à germinação das sementes.<br />

19 O estu<strong>do</strong> aprofunda<strong>do</strong> <strong>do</strong>s meristemas reprodutivos está para além <strong>do</strong>s objectivos desta publicação. Remetem-­‐se os<br />

interessa<strong>do</strong>s no tema para a obra de (Moreira, Anatomia das Plantas: Estruturas, 2010).


21 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

primários apical radicular e caulinar gera o corpo primário das plantas. O diâmetro <strong>do</strong> ápice radicular onde se aloja o<br />

meristema apical radicular ronda os 0,2 mm; este diâmetro é maior e mais variável nos caules. Os meristemas apicais<br />

caulinares ao mesmo tempo que diferenciam caule e folhas deixam na axila das folhas pequenos aglomera<strong>do</strong>s de<br />

células meristemáticas que tomam o nome de meristemas axilares (Figura 5). Os meristemas axilares são os<br />

responsáveis pela ramificação da parte aérea das plantas (vd. Organização <strong>do</strong> corpo das plantas-­‐com-­‐semente).<br />

Depois de ativa<strong>do</strong>s em nada se distinguem de um meristema apical. As raízes não têm meristemas axilares: a sua<br />

ramificação segue um mecanismo diferente <strong>do</strong> caule (vd. Ramificação da raiz).<br />

Nos meristemas apicais, radiculares e caulinares, as<br />

células estaminais, i.e. as células iniciais mais as suas<br />

descendentes diretas, constituem o promeristema. Embora<br />

não sen<strong>do</strong> consensual, a maior parte <strong>do</strong>s autores inclui nos<br />

meristemas apicais regiões teciduais de transição 20 , recém-­‐<br />

produzidas pelas células estaminais, constituídas por células<br />

com uma intensa atividade mitótica mas já com evidências<br />

de diferenciação. Distinguem-­‐se três regiões teciduais de<br />

transição (Beck, 2010): a protoderme (ing. protoderm), o<br />

promeristema fundamental (ing. ground meristem) e o<br />

procâmbio (ing. procambium), que geram, respectivamente,<br />

a epiderme, o teci<strong>do</strong> fundamental cortical e medular, e a<br />

vasculatura primária (mais o periciclo na raiz). Nos<br />

meristemas apicais caulinares logo abaixo <strong>do</strong> promeristema<br />

distinguem-­‐se ainda primórdios foliares.<br />

Nas monocotiledóneas, e em algumas dicotiledóneas, o<br />

meristema apical caulinar é coadjuva<strong>do</strong> por um meristema<br />

de espessamento primário (DeMason, 1983) (vd. Espessamento primário e secundário nas monocotiledóneas). Nas<br />

monocotiledóneas, e em algumas famílias de dicotiledóneas (e.g. Caryophyllaceae e Polygonaceae; (Khan, 2002)),<br />

persistem bandas de células meristemáticas, geralmente na base <strong>do</strong>s entrenós recém-­‐diferencia<strong>do</strong>s, encravadas<br />

entre teci<strong>do</strong>s já diferencia<strong>do</strong>s, que facultam um alongamento intercalar <strong>do</strong>s entrenós. Nas gramíneas estes<br />

meristemas intercalares contribuem mais para o crescimento <strong>do</strong>s caules e a exposição das inflorescências <strong>do</strong> que os<br />

meristemas caulinares apicais, poden<strong>do</strong> ser ativa<strong>do</strong>s em caules já maduros. Ainda nas gramíneas também<br />

meristemas intercalares foliares. Os meristemas intercalares das gramíneas são pormenoriza<strong>do</strong>s mais adiante (vd. O<br />

corpo das gramíneas).<br />

Nas plantas só com crescimento primário – e.g. a grande maioria das monocotiledóneas e muitas dicotiledóneas<br />

anuais – o corpo primário mantem, até à senescência, a forma e a espessura atribuída pelos meristemas primários.<br />

Nas gimnospérmicas e nas dicotiledóneas s.l. com crescimento secundário o crescimento processa-­‐se a <strong>do</strong>is tempos,<br />

governa<strong>do</strong> por meristemas vegetativos distintos: as raízes e os caules primeiro alongam-­‐se pela extremidade pelos<br />

meristemas apicais primários; numa fase posterior, geralmente prontamente iniciada, aumentam de diâmetro<br />

(engrossamento) com a produção <strong>do</strong> corpo secundário pelos meristemas secundários. A formação <strong>do</strong> corpo<br />

secundário depende de <strong>do</strong>is meristemas laterais especializa<strong>do</strong>s: o câmbio vascular e a felogene. A alusão à sua<br />

lateralidade denota que se dispõem no senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> eixo caulinar ou radicular onde estão aloja<strong>do</strong>s. Regra geral,<br />

diferenciam-­‐se a pouca distância <strong>do</strong>s meristemas apicais: no caule na região de contacto entre o córtex e os feixes<br />

vasculares primários, e na raiz normalmente a partir <strong>do</strong> periciclo. Nas monocotiledóneas com crescimento<br />

secundário entra em jogo o meristema de espessamento secundário.<br />

O câmbio é uma delgada e sensível película cilíndrica de células meristemáticas, de uma a várias células de<br />

espessura, que recobre to<strong>do</strong> o corpo secundário das plantas (raízes e caules secundários), imediatamente por<br />

debaixo da casca. O câmbio produz centriptamente (para dentro) xilema e centrifugamente (para fora) floema. A<br />

felogene tem uma estrutura semelhante ao câmbio; produz a periderme, um teci<strong>do</strong> complexo de proteção que<br />

20 Meristemas primários ou subzonas meristemáticas para outros autores. O termo meristema primário é equívoco (vd. Quadro<br />

4).<br />

Figura 5. Estrutura <strong>do</strong> meristema apical caulinar.<br />

Corte radial adapta<strong>do</strong> de www.<strong>do</strong>ctortee.com).


22 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

substitui a epiderme nos caules e raízes com crescimento secundário. O câmbio vascular, a felogene e o meristema<br />

de espessamento secundário são descritos com mais detalhe no capítulo dedica<strong>do</strong> ao caule (vd. Estrutura secundária<br />

<strong>do</strong> caule).<br />

Os meristemas podem diferenciar-­‐se a partir de teci<strong>do</strong>s definitivos, numa posição distinta <strong>do</strong>s meristemas<br />

enumera<strong>do</strong>s no Quadro 4, por exemplo, na base de folhas em muitas plantas estolhosas (com estolhos) ou a partir<br />

de calos. Os calos são proliferações celulares que se produzem em feridas ou cortes; têm origem em células<br />

parenquimatosas que mantiveram a capacidade de se multiplicar em teci<strong>do</strong>s diferencia<strong>do</strong>s (não meristemáticos)<br />

(e.g. células <strong>do</strong>s raios xilémicos, vd. Felogene e riti<strong>do</strong>ma). Estes meristemas “fora <strong>do</strong> lugar” são genericamente<br />

designa<strong>do</strong>s por meristemas adventícios, e, eventualmente, dão origem a órgãos adventícios (e.g. raízes adventícias)<br />

(vd. Quadro 5).<br />

Parênquima<br />

2.2.2. Teci<strong>do</strong>s definitivos simples<br />

O conceito de parênquima reúne to<strong>do</strong>s os teci<strong>do</strong>s pouco<br />

especializa<strong>do</strong>s, tanto de formação primária como secundária, que<br />

enchem os órgãos das plantas. Regra geral constituem-­‐no células de<br />

paredes delgadas, de forma poliédrica, de grandes vacúolos e<br />

abundantes espaços intercelulares. O seu vacúolo pode acumular to<strong>do</strong> o<br />

tipo de secreções, como sejam o ami<strong>do</strong>, cristais de substâncias várias<br />

(sobretu<strong>do</strong> oxalato de cálcio, sílica e carbonato de cálcio), óleos e<br />

taninos (vd. A célula vegetal). Muitos teci<strong>do</strong>s secretores 21 enquadram-­‐se<br />

no conceito parênquima.<br />

O parênquima fundamental ou de preenchimento enche o córtex e a<br />

medula de caules e raízes. O aerênquima é um tipo de parênquima com<br />

abundantes espaços vazios entre as células, comum nas plantas<br />

aquáticas (e.g. a maioria <strong>do</strong>s Ranunculus subgén. Batrachium,<br />

Ranunculaceae) ou anfíbias (e.g. Oryza sativa «arroz» Poaceae), que tem<br />

por <strong>função</strong> o transporte de gases às partes submersas das plantas<br />

Figura 6. Aerêquima. Aerênquima <strong>do</strong><br />

pecíolo de Nuphar luteum<br />

(Nymphaeaceae) «nenúfar-­‐amarelo»;<br />

n.b. <strong>do</strong>is escleritos (Deysson, 1965).<br />

(Figura 6). O parênquima com células fotossintéticas, tão frequentes no mesofilo das folhas e próximo da superfície<br />

<strong>do</strong>s caules primários, designa-­‐se por clorênquima (= parênquima clorofilino). Reconhecem-­‐se <strong>do</strong>is tipos de<br />

clorênquima: em paliçada (com células alongadas, compactadas) ou lacunoso (com grandes espaços intercelulares).<br />

O parênquima de reserva, por exemplo das raízes e caules tuberosos e das sementes, pode ser amiláceo, inulífero,<br />

oleaginoso ou sacarino consoante o tipo de reserva. Os catos e outras plantas xeromórficas 22 acumulam água num<br />

parênquima aquífero. O parênquima é o teci<strong>do</strong> base das partes edíveis (= comestíveis) <strong>do</strong>s frutos. O parênquima<br />

lenhoso tem um papel determinante na estrutura e funcionamento <strong>do</strong> lenho (vd. Estrutura secundária <strong>do</strong> caule).<br />

Embora a firmeza das plantas se deva, em grande parte, aos teci<strong>do</strong>s vasculares e aos teci<strong>do</strong>s de suporte<br />

(colênquima e esclerênquima), a células <strong>do</strong> parênquima quan<strong>do</strong> túrgidas têm também aqui um papel relevante. As<br />

plantas herbáceas murcham se os teci<strong>do</strong>s parenquimatosos perdem turgidez. A divisão celular de algumas células<br />

parenquimatosas com capacidade meristemática é reativada, por exemplo, após traumatismo (e.g. rotura de um<br />

ramo), com a diferenciação de um calo (vd. Felogene e riti<strong>do</strong>ma).<br />

No en<strong>do</strong>sperma, no contacto entre teci<strong>do</strong>s esporofíticos e gametofíticos ou nas terminações <strong>do</strong>s feixes<br />

vasculares <strong>do</strong>s frutos em desenvolvimento, folhas, nectários ou glândulas, por exemplo, observam-­‐se células<br />

especializadas, geralmente de tipo parenquimatoso, caracterizadas pela presença de invaginações na parede celular<br />

forradas pela membrana plasmática, que aumentam a relação superfície/volume das células. Estas células, ditas<br />

células de transferência, têm a <strong>função</strong> de facilitar o movimento de açúcares e aminoáci<strong>do</strong>s entre os espaços<br />

21<br />

Os teci<strong>do</strong>s secretores não são aborda<strong>do</strong>s neste texto. Remetem-­‐se os interessa<strong>do</strong>s no tema para a obra de (Moreira, Histologia<br />

Vegetal, 1983).<br />

22<br />

Com adaptações morfológicas à secura edáfica (<strong>do</strong> solo):


23 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

extracelulares e o interior das células (Offler, McCurdy, Patrick, & Talbot, 2003). As células de transferência<br />

associadas ao floema das folhas, por exemplo, carregam os açúcares produzi<strong>do</strong>s nas células <strong>do</strong> mesofilo e difundi<strong>do</strong>s<br />

pelo apoplasto no floema, que os redistribui pela planta.<br />

Colênquima e esclerênquima<br />

O colênquima e o esclerênquima desempenham uma <strong>função</strong> de suporte. Formam-­‐se a partir de células de<br />

parênquima por espessamento das suas paredes com celulose e lenhina, respetivamente. As células <strong>do</strong> colênquima,<br />

ao invés <strong>do</strong> esclerênquima, são “vivas”. Distinguem-­‐se das células parenquimatosas por apresentarem uma parede<br />

refringente ao microscópio, assimetricamente espessada, sobretu<strong>do</strong> com celulose (as paredes celulares <strong>do</strong><br />

colênquima não contêm lenhina). As células colenquimatosas são alongadas e flexíveis. Distendem-­‐se sob o efeito de<br />

forças de tração; suspendida a tração não regressam à forma inicial. Estas duas características permitem-­‐lhes<br />

acompanhar os órgãos em crescimento. As células colenquimatosas organizam-­‐se em feixes, frequentemente de<br />

posição subepidérmica. O colênquima está maioritariamente associa<strong>do</strong> aos órgãos primários (inc. folhas) sen<strong>do</strong><br />

determinante na resistência mecânica oferecida pelos caules jovens e folhas.<br />

Os espessamentos das células <strong>do</strong> esclerênquima contêm uma grande quantidade de lenhina. Este tipo de teci<strong>do</strong><br />

aparece tanto no corpo primário, como no corpo secundário. Reconhecem-­‐se <strong>do</strong>is tipos de células<br />

esclerenquimatosas: os escleritos e as fibras. Os escleritos 23 (= células pétreas) são células esclerenquimatosas<br />

isoladas, distribuídas ao acaso noutros tipos de teci<strong>do</strong>s, frequentemente isodiamétricas, com mais pontuações <strong>do</strong><br />

que as células das fibras; e.g. células que atribuem o gratina<strong>do</strong> característico das peras maduras. Constituem as<br />

fibras (= fibras esclerenquimatosas) células esclerenquimatosas muito mais compridas <strong>do</strong> que largas, agrupadas em<br />

feixes, associadas a uma enorme variedade de tipos de teci<strong>do</strong>s.<br />

As fibras esclerenquimatosas deformam-­‐se sob tensão mas têm tendência a retornar à forma inicial. São<br />

xilémicas (ing. xylematic fibers) ou extraxilémicas (ing. non-­‐xylematic fibers) consoante se encontrem, ou não,<br />

emersas no xilema, e primárias ou secundárias se têm origem em meristemas primários ou secundários. As fibras<br />

extraxilémicas (ing. bast fibers) situam-­‐se no córtex, na vizinhança (externa) <strong>do</strong> cilindro vascular ou no floema<br />

designan<strong>do</strong>-­‐se, respectivamente, por fibras corticais, fibras liberianas e fibras pericicíclicas ou perivasculares<br />

(Moreira, Histologia Vegetal, 1983). Nas monocotiledóneas as fibras extraxilémicas geralmente envolvem os feixes<br />

vasculares forman<strong>do</strong> feixes fibrovasculares, ou surgem isoladas no teci<strong>do</strong> fundamental. As fibras extraxilémicas têm<br />

uma grande importância têxtil, sen<strong>do</strong> extraídas em mais de 40 famílias de plantas. As fibras ditas macias ou moles,<br />

pela sua flexibilidade e elasticidade, são produzidas a partir das fibras extraxilémicas caulinares de dicotiledóneas;<br />

e.g. Corchorus capsularis (Malvaceae) «juta», Linum usitatissimum (Linaceae) «linho» e Cannabis sativa<br />

(Cannabaceae) «cânhamo». A fibras duras provêm das folhas de monocotiledóneas, das quais a Agave sisalana<br />

(Agavaceae) «sisal» é a mais conhecida.<br />

2.2.3. Teci<strong>do</strong>s definitivos complexos<br />

2.2.3.1. Epiderme<br />

A epiderme é uma camada celular contínua e compacta (sem espaços intercelulares), por regra unisseriada (com<br />

uma assentada de células), que cobre to<strong>do</strong> o exterior <strong>do</strong> corpo primário das plantas. A epiderme é múltipla (=<br />

plurisseriada ou pluriestratificada), por exemplo, nas folhas <strong>do</strong>s Ficus (Moraceae) «figueiras» e nas raízes com<br />

velâmen (vd. Metamorfoses da raiz). Nos órgãos com crescimento secundário a epiderme é substituída pela<br />

periderme.<br />

A epiderme de caules primários e folhas é constituída por vários tipos de células. Dominam este teci<strong>do</strong> células<br />

pouco especializadas, transparentes, de grandes vacúolos, com poucos a nenhuns cloroplastos, alongadas no senti<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> eixo longitudinal <strong>do</strong> órgão. Esta matriz celular é interrompida por tipos celulares particulares, como sejam as<br />

células-­‐guarda e as células anexas ou subsidiarias constituintes <strong>do</strong> complexo estomático (vd. Epiderme da folha),<br />

23 Esclereí<strong>do</strong>s na terminologia brasileira.


24 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

células motoras ou buliformes (vd. Epiderme da folha), células com paredes espessadas com sílica (células silicosas,<br />

vd. A célula vegetal) ou suberina (células suberosas), nectários e um sem número de emergências (e.g. (tricomas,<br />

papilas, células secretoras, vd. Emergências). Na epiderme da raiz diferenciam-­‐se pelos radiculares (vd. Estrutura<br />

primária da raiz). Como se explica nos pontos dedica<strong>do</strong>s à anatomia da raiz, caule e folha, identifica-­‐se, por vezes,<br />

por debaixo da epiderme, uma camada celular já pertencente ao teci<strong>do</strong> fundamental: a hipoderme. Embora só<br />

discrimináveis através de estu<strong>do</strong>s histológicos, as camadas internas da epiderme multisseriada e a hipoderme têm<br />

uma ontogénese distinta: epiderme, uni ou multisseriada, é diferenciada na protoderme, a camada mais externa <strong>do</strong>s<br />

meristemas apicais radicular e caulinar; a hipoderme provém <strong>do</strong> meristema fundamental.<br />

Reveste exteriormente a epiderme uma camada cerosa protetora – a cutícula –, por vezes complementada com<br />

expansões de ceras epicuticulares. O principal constituinte da cutícula – a cutina – é um composto lipídico hidrófobo.<br />

A cutícula, para além de conferir resistência a parasitas e a agentes físicos abrasivos (e.g. poeiras e cristais de cloreto<br />

de sódio), é largamente impermeável a gases e líqui<strong>do</strong>s, e reflete, difunde ou concentra os raios solares. A sua<br />

espessura é um factor determinante nas perdas de água por transpiração. A cutícula e a compactação das células<br />

epidérmicas providenciam, apesar de tu<strong>do</strong>, alguma sustentação mecânica aos teci<strong>do</strong>s primários. A cutícula de<br />

Copernicia prunifera (Arecaceae) «carnaúba», uma palmeira endémica <strong>do</strong> nordeste brasileiro, é suficientemente<br />

espessa para ser explorada comercialmente, obten<strong>do</strong>-­‐se a cera-­‐de-­‐carnaúba.<br />

2.2.3.2. Teci<strong>do</strong> fundamental<br />

O teci<strong>do</strong> fundamental encontra-­‐se nas partes <strong>do</strong> corpo primário das plantas não ocupadas pela epiderme, teci<strong>do</strong>s<br />

vasculares e cavidades (Rudal, Anatomy of Flowering Plants. An Introduction to Structure and Development, 2007).<br />

Corresponde a maior parte da massa <strong>do</strong> corpo primário das plantas. Tem uma <strong>função</strong> mecânica, de reserva ou<br />

fotossintética, sen<strong>do</strong> regra geral constituí<strong>do</strong> por uma matriz de parênquima (vd. Parênquima), variavelmente<br />

complementada com colênquima, esclerênquima (vd. Colênquima e esclerênquima) e teci<strong>do</strong>s secretórios. É<br />

diferencia<strong>do</strong> pelos meristemas apicais. Nas monocotiledóneas tanto os meristemas de espessamento primário e<br />

secundário como os meristemas intercalares também produzem teci<strong>do</strong> fundamental. Nas dicotiledóneas com<br />

crescimento secundário o câmbio cria teci<strong>do</strong> fundamental, na forma de fibras (xilémicas ou extraxilémicas) e de<br />

parênquima axial (disperso pelo floema e xilema secundários). A felogene produz a feloderme ou córtex secundário,<br />

com células parenquimatosas (vd. Estrutura secundária <strong>do</strong> caule).<br />

2.2.3.3. Teci<strong>do</strong> vascular<br />

O transporte de água e nutrientes<br />

Os fisiologistas nomeiam a componente não viva das plantas por apoplasto, e por simplasto o conjunto <strong>do</strong>s<br />

protoplastos. Integram o apoplasto as paredes celulares, os espaços intercelulares e o lúmen (= interior) <strong>do</strong>s<br />

elementos traqueais (por serem células mortas, vd. Xilema). Os plasmodesmos (vd. A célula vegetal) fazem <strong>do</strong><br />

simplasto um sistema contínuo que se alastra a toda a planta. No corpo das plantas, o movimento da água e<br />

nutrientes a curta distância faz-­‐se por duas vias: por difusão pelo apoplasto (via apoplástica), ou pelo interior das<br />

células (via simplástica). Nas raízes, as bandas de Caspary (vd. Meristemas e teci<strong>do</strong>s da raiz) obrigam os solutos a<br />

penetrar nas células da en<strong>do</strong>derme, interrompen<strong>do</strong> a via apoplástica. A cutícula e a periderme também<br />

interrompem o apoplasto. As células de transferência (vd. Parênquima) desempenham um importante papel no<br />

movimento de nutrientes entre o simplasto e o apoplasto.<br />

O transporte a longa distância de água e nutrientes nas plantas vasculares é assegura<strong>do</strong> pelos teci<strong>do</strong>s vasculares:<br />

o xilema e o floema, geralmente anatomicamente associa<strong>do</strong>s em feixes vasculares. O xilema transporta a água e os<br />

nutrientes absorvi<strong>do</strong>s e processa<strong>do</strong>s na raiz para a parte aérea; o floema redistribui os produtos da fotossíntese. O<br />

movimento <strong>do</strong> flui<strong>do</strong> xilémico 24 é governa<strong>do</strong> por forças físicas e faz-­‐se da raiz para as parte aérea. No xilema<br />

secundário ocorre algum movimento lateral através <strong>do</strong> parênquima <strong>do</strong>s raios xilémicos (vd. Espessamento<br />

24 Flui<strong>do</strong> xilémico ou seiva xilémica. Flui<strong>do</strong> floémico ou seiva floémica. Os termos seiva bruta e seiva elaborada estão a cair em<br />

desuso.


25 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

secundário nas gimnospérmicas e dicotiledóneas). O movimento <strong>do</strong> flui<strong>do</strong> floémico é multidirecional e consome<br />

energia. Faz-­‐se <strong>do</strong>s teci<strong>do</strong>s de reserva ou <strong>do</strong>s órgãos produtores (folhas e caules herbáceos) (ing. sources) para aos<br />

centros consumi<strong>do</strong>res (e.g. raiz, meristemas, flores, frutos, ou teci<strong>do</strong>s de reserva) (ing. sinks). O xilema como o<br />

floema primários são diferencia<strong>do</strong>s pelo procâmbio; o xilema e o floema secundários pelo câmbio vascular (vd. Os<br />

meristemas). A maior parte da biomassa das plantas lenhosas é constituída por xilema secundário, também<br />

conheci<strong>do</strong> por lenho. Nas plantas sem crescimento secundário o floema e o xilema primários não são renova<strong>do</strong>s e<br />

permanecem funcionais durante toda a vida da planta.<br />

Xilema<br />

O xilema acumula as funções de transporte, de suporte e de reserva. É composto por diferentes combinações de<br />

parênquima, fibras esclerenquimatosas, vasos lenhosos e traqueí<strong>do</strong>s. Menos constantes são os escleritos e os vasos<br />

lacticíferos (que produzem látex, vd. Produção de látex). Constituem os vasos lenhosos (= traqueias) e os traqueí<strong>do</strong>s<br />

maduros <strong>do</strong>is tipos de células, respectivamente, os traqueí<strong>do</strong>s (o termo traqueí<strong>do</strong> usa-­‐se na dupla aceção de célula e<br />

teci<strong>do</strong>) e os elementos <strong>do</strong>s vasos. Os traqueí<strong>do</strong>s (ing. tracheids) e os elementos <strong>do</strong>s vasos (ing. vessel elements) são<br />

genericamente designa<strong>do</strong>s por elementos traqueais (ing. tracheal elements). Têm em comum não possuírem<br />

protoplasma na maturidade (são células mortas) e exibirem abundantes em pontuações areoladas nas paredes<br />

laterais ou, em alternativa, espessamentos espirala<strong>do</strong>s, anelares ou escalariformes, por exemplo (Figura 7).<br />

Os traqueí<strong>do</strong>s (= tracóides) têm uma forma alongada (elevada relação<br />

comprimento/largura), uma parede secundária mais ou menos<br />

homogénea, e comunicam por intermédio das pontuações da parede (não<br />

possuem placas de perfuração). Os traqueí<strong>do</strong>s não se justapõem<br />

axialmente, antes lateralmente.<br />

Os elementos <strong>do</strong>s vasos são curtos e de grande diâmetro (quan<strong>do</strong><br />

compara<strong>do</strong>s com os traqueí<strong>do</strong>s) e dispõem de uma placa de perfuração em<br />

cada extremidade. A placa de perfuração pode ser simples (com uma única<br />

perfuração), ou múltipla, e compreender várias aberturas alongadas<br />

(designadas por barras) dispostas em paralelo como uma escada (placa de<br />

perfuração escalariforme), ou perfurações mais pequenas forman<strong>do</strong> um<br />

retículo (placas de perfuração reticuladas). Os vasos lenhosos organizam-­‐se<br />

pela justaposição axial (= longitudinal) de elementos <strong>do</strong>s vasos, sen<strong>do</strong> as<br />

paredes de contacto entre <strong>do</strong>is elementos de vaso sucessivos<br />

perpendiculares às paredes longitudinais, ou oblíquas. A resistência à<br />

circulação <strong>do</strong> flui<strong>do</strong> xilémico nos vasos lenhosos é substancialmente menor<br />

<strong>do</strong> que nos traqueí<strong>do</strong>s. O flui<strong>do</strong> xilémico circula pelas perfurações e pelas<br />

pontuações porque a parede celular secundaria não é permeável a soluções<br />

aquosas.<br />

Os traqueí<strong>do</strong>s são filogeneticamente mais primitivos <strong>do</strong> que os<br />

elementos <strong>do</strong>s vasos. As gimnospérmicas, salvo raras exceções (subclasse<br />

Gnetidae), só têm traqueí<strong>do</strong>s. Curiosamente os vasos lenhosos aparecem<br />

com alguma frequência nos ‘pteridófitos’, um importante exemplo de<br />

convergência evolutiva com as angiospérmicas. Nas angiospérmicas a folha<br />

geralmente só contém traqueí<strong>do</strong>s; no caule e na raiz coexistem vasos<br />

lenhosos e traqueí<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> mais abundantes os primeiros.<br />

No protoxilema, o primeiro xilema a ser diferencia<strong>do</strong> nos caules e raízes<br />

primários pelo procâmbio, os espessamentos da parede celular <strong>do</strong>s<br />

elementos traqueais, correspondentes à parede celular secundária, podem<br />

Figura 7. Espessamentos da parede<br />

celular <strong>do</strong>s elementos traqueais de<br />

protoxilema (a-­‐d) e metaxilema (e-­‐h).<br />

Legenda (corte longitudinal em cima,<br />

corte transversal em baixo):<br />

espessamentos anelares (a, b),<br />

espirala<strong>do</strong> (c, d, e) escalariforme (f),<br />

reticula<strong>do</strong> (g) e pontua<strong>do</strong> (h) (Deysson,<br />

1965)<br />

ser anelares (em forma de anel), espirala<strong>do</strong> (= helicoidal, em forma de hélice), escalariformes ou reticula<strong>do</strong>s (Figura<br />

7). As células <strong>do</strong> protoxilema, quan<strong>do</strong> situadas na proximidade ao meristema apical, estão sujeitas a forças de tração<br />

causadas pelo alongamento das células recém-­‐diferenciadas: a deposição incompleta da parede secundária facilita o<br />

seu alongamento. As paredes secundárias <strong>do</strong>s elementos traqueais <strong>do</strong> metaxilema (xilema primário mais tardio) ou


26 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

<strong>do</strong> xilema secundário são extensas e geralmente apenas interrompidas por pontuações areoladas. Os diâmetro <strong>do</strong>s<br />

elementos traqueais é maior no metaxilema e no xilema secundário <strong>do</strong> que no protoxilema (Figura 7).<br />

Floema<br />

Na constituição <strong>do</strong> floema das angiospérmicas sobressaem <strong>do</strong>is tipos celulares: os elementos crivosos e as células<br />

companheiras. Acompanham-­‐nos frequentemente parênquima de reserva, fibras liberianas, escleritos e vasos<br />

lacticíferos. Ao invés <strong>do</strong>s elementos de vaso xilémico e <strong>do</strong>s traqueí<strong>do</strong>s, as células especializadas no transporte <strong>do</strong><br />

flui<strong>do</strong> floémico – os elementos crivosos (ing. sieve elements) – são vivas. Os elementos crivosos maduros não têm<br />

núcleo, ribossomas, nem vacúolo, e o seu citoplasma confunde-­‐se com o flui<strong>do</strong> floémico. Conectam-­‐se pelo topo e<br />

dispõem-­‐se em fiadas axiais, designadas por tubos crivosos (ing. sieve tube). No interior <strong>do</strong>s elementos crivosos<br />

abunda a calose, um outro polímero de β glucose, como a celulose. Esta substância acumula-­‐se rapidamente nos<br />

tubos crivosos feri<strong>do</strong>s por acidentes ou por insectos impedi<strong>do</strong> a perda para o exterior de flui<strong>do</strong> floémico. As células<br />

companheiras (ing. companion cells), de natureza parenquimatosa, rodeiam os elementos crivosos, estan<strong>do</strong><br />

envolvidas na fisiologia <strong>do</strong> carregamento <strong>do</strong> flui<strong>do</strong> floémico com os produtos da fotossíntese. Tanto os elementos<br />

crivosos como as células companheiras não possuem parede celular secundária. O flui<strong>do</strong> floémico é transferi<strong>do</strong> entre<br />

os elementos traqueais floémicos pelas áreas crivosas (ing. sieve areas), i.e. por campos de poros sitos na parede<br />

celular, percorri<strong>do</strong>s por cordões microscópicos de protoplasma (de maior dimensão que os <strong>do</strong>s plasmodesmos), que<br />

conectam os elementos traqueais floémicos axialmente ou lateralmente contíguos. Na maioria das angiospérmicas<br />

as áreas crivosas estão concentradas nas extremidades <strong>do</strong>s elementos crivosos, constituin<strong>do</strong> placas crivosas (ing.<br />

sieve plates).<br />

Nas gimnospérmicas e em algumas angiospérmicas menos evoluídas, as áreas crivosas estão distribuídas por toda<br />

a parede celular. As células deste tipo, menos evoluídas que os elementos crivosos, tomam o nome de células<br />

crivosas (ing. sieve cells). Nas gimnospérmicas ocorrem células anatómica e fisiologicamente associadas às células<br />

crivosas, análogas às células companheiras das angiospérmicas, denominadas por células albuminosas (ing.<br />

albuminous cells).<br />

3. Organização <strong>do</strong> corpo das plantas-­‐com-­‐semente<br />

As raízes e os caules exibem a nível anatómico uma simetria radial (vd. Simetria) e, a maioria, tem um<br />

crescimento indetermina<strong>do</strong>. As folhas, pelo contrário, são, salvo raríssimas exceções 25 , determinadas e de simetria<br />

bilateral (vd. Simetria). Nos órgãos de crescimento determina<strong>do</strong>, como sejam as folhas e alguns tipos de caules (e.g.<br />

esporões), o crescimento e a diferenciação estão sujeitos a um estreito controlo genético, pouco sensível a factores<br />

ambientais. As folhas representam um caso extremo de determinação porque, concluída a sua diferenciação,<br />

mantêm a mesma forma e estrutura interna até à senescência (= morte).<br />

As folhas inserem-­‐se, num padrão regular, obliquamente nos nós (= verticilos caulinares). A porção de caule entre<br />

<strong>do</strong>is nós sucessivos chama-­‐se entrenó. Nas Ephedraceae «éfedras» e nas Casuarinaceae «casuarinas» os entrenós<br />

destacam-­‐se com facilidade, são articula<strong>do</strong>s. Na axila de cada folha encontra-­‐se, geralmente, pelo menos uma gema,<br />

i.e. um aglomera<strong>do</strong> de células indiferenciadas com capacidade meristemática (= capacidade de divisão celular),<br />

envolvi<strong>do</strong> por esboços de folhas, por vezes, com um revestimento externo de folhas de proteção escamiformes<br />

(catáfilos, vd. Tipos de filomas). Na extremidade distal <strong>do</strong>s ramos (vd. Quadro 5) situa-­‐se uma gema apical, e no seu<br />

interior um meristema apical caulinar. As gemas axilares, e os meristemas axilares caulinares, localizam-­‐se, como se<br />

depreende <strong>do</strong> termo, na axila das folhas. A queda das folhas deixa uma cicatriz foliar no nó, cuja forma tem valor<br />

diagnóstico em algumas famílias de plantas-­‐com-­‐flor (e.g. Moraceae).<br />

25 Estão descritas algumas excepções. As folhas têm crescimento indetermina<strong>do</strong>, por exemplo, na Welwitschia mirabilis<br />

(Welwitschiaceae, Gnetidae) e vários membros da família das Gesneriaceae (Magnoliidae).


27 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

O cormo das plantas-­‐com-­‐semente apresenta outros<br />

padrões que interessa explorar. As raízes inserem-­‐se,<br />

geralmente, no colo (região de encontro <strong>do</strong> caule com o<br />

sistema radicular) ou noutras raízes. As raízes adventícias<br />

(Quadro 5, por definição, surgem em qualquer ponto da parte<br />

aérea, sobretu<strong>do</strong> nos nós <strong>do</strong>s caules, imediatamente abaixo da<br />

inserção das folhas. As raízes jamais possuem folhas embora,<br />

por vezes, possam diferenciar gemas adventícias que mais<br />

tarde dão origem a novos caules (designa<strong>do</strong>s, respectivamente,<br />

nas plantas lenhosas por pôlas radiculares e nas plantas<br />

herbáceas vivazes por rebentos de raiz). Nas raízes inserem-­‐se<br />

outras raízes; nos caules, folhas com uma ou mais gemas<br />

axilares que, entretanto, podem evoluir em novos caules.<br />

Nas plantas-­‐com-­‐semente a formação <strong>do</strong> cormo inicia-­‐se<br />

com a germinação da semente e a retoma <strong>do</strong> crescimento <strong>do</strong><br />

embrião. Este consta geralmente de (Figura 8):<br />

Radícula (= raiz embrionária) – esboço de raiz;<br />

Cotilé<strong>do</strong>nes – filomas embrionários frequentemente<br />

ricas em reservas (vd. Tipos de filomas);<br />

Plúmula – esboço de caule com folhas embrionárias a<br />

envolverem um meristema apical.<br />

Dois entrenós caulinares – o hipocótilo e o epicótilo –<br />

conectam, respectivamente, os cotilé<strong>do</strong>nes das<br />

eudicotiledóneas s.l. com a radícula e a plúmula. Nas Poaceae<br />

(= gramíneas) o primeiro entrenó <strong>do</strong> caule acima <strong>do</strong> cotilé<strong>do</strong>ne<br />

(escutelo, vd. Semente e germinação de Zea mays (Poaceae)<br />

«milho-­‐graú<strong>do</strong>») designa-­‐se por mesocótilo. O colo, como se referiu, corresponde à zona de transição entre a raiz e o<br />

caule.<br />

Antes de prosseguir com o estu<strong>do</strong> da organização <strong>do</strong> corpo das plantas-­‐com-­‐semente convém <strong>do</strong>minar os termos<br />

e conceitos resumi<strong>do</strong>s no Quadro 5. A biologia da evolução de plantas é retomada e desenvolvida no <strong>Vol</strong>. II.<br />

Quadro 5. Alguns conceitos fundamentais de organografia vegetal e biologia da evolução uso corrente na<br />

bibliografia<br />

Conceito Definição<br />

Organografia<br />

vegetal<br />

Concrescência<br />

(= coerência)<br />

Adnação<br />

(= aderência)<br />

Partes semelhantes unidas entre si, desenvolven<strong>do</strong>-­‐se e crescen<strong>do</strong> em conjunto; e.g. em muitas<br />

espécies as pétalas estão soldadas entre si (i.e. concrescentes), forman<strong>do</strong> um tubo, dizen<strong>do</strong>-­‐se a<br />

corola simpétala<br />

Partes distintas unidas entre si, desenvolven<strong>do</strong>-­‐se e crescen<strong>do</strong> em conjunto; e.g. no cla<strong>do</strong> das<br />

asteridas os estames estão solda<strong>do</strong>s (= aderentes ou adna<strong>do</strong>s) ao tubo da corola dizen<strong>do</strong>-­‐se, por<br />

isso, epipétalos<br />

Conivência Partes, embora não concrescentes, indistintas de tão encostadas.<br />

Crescimento<br />

determina<strong>do</strong><br />

Crescimento<br />

indetermina<strong>do</strong><br />

Figura 8. Estrutura <strong>do</strong> embrião e <strong>do</strong> cormo. A)<br />

Embrião jovem: Co – cotilé<strong>do</strong>ne. B) Embrião<br />

maduro (de uma semente): Hy – hipocótilo; Ra –<br />

radícula. C) Plântula: Pw – raiz primária. D) Estrutura<br />

<strong>do</strong> cormo de uma angiospérmica: Gk – gema apical;<br />

Sw – raízes laterais; w – raízes adventícias; n.b.<br />

gemas axilares.<br />

Tipo de crescimento, geralmente rápi<strong>do</strong>, automaticamente interrompi<strong>do</strong> assim que uma estrutura<br />

geneticamente determinada é concluída.<br />

Tipo de crescimento eventualmente ilimita<strong>do</strong>, cuja suspensão ou interrupção não se deve a causas<br />

genéticas.


28 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Livre Vocábulo usa<strong>do</strong> para designar partes não concrescentes, nem aderentes; e.g. carpelos livres de um<br />

gineceu apocárpico<br />

Proximal (= anterior<br />

ou adaxial)<br />

Distal (= posterior<br />

ou abaxial)<br />

<strong>Vol</strong>ume e superfície nas plantas<br />

As plantas, e to<strong>do</strong>s os seres vivos que povoam o planeta Terra, são máquinas biológicas, e como tal sujeitas à<br />

segunda lei da termodinâmica: para crescerem, reproduzirem-­‐se ou, simplesmente, para permanecerem vivas,<br />

consomem e dissipam energia. A interrupção <strong>do</strong> consumo de energia acarreta a desorganização das células e a<br />

morte <strong>do</strong>s indivíduos. A energia consumida pelas plantas provém diretamente da luz visível emitida pelo sol<br />

capturada pela clorofila 26 . As plantas são pouco eficientes na conversão da radiação solar em energia química (ATP) e<br />

poder redutor (NADPH) através da fotossíntese. Por outro la<strong>do</strong>, o dióxi<strong>do</strong> de carbono, o principal nutriente<br />

carbona<strong>do</strong> das plantas, ocorre em concentrações muito baixas no ar. Consequentemente, a evolução da parte aérea<br />

das plantas foi pressionada no senti<strong>do</strong> de um aumento da superfície em detrimento <strong>do</strong> volume. O sistema radicular<br />

foi sujeito a uma pressão evolutiva análoga porque a solução <strong>do</strong> solo é muito diluída. A captura de nutrientes,<br />

sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s nutrientes de menor mobilidade (e.g. fósforo), depende da exploração de um grande volume de solo<br />

através de uma fina e extensa rede de raízes.<br />

O aumento da relação área/volume nas plantas fez-­‐se à custa de folhas laminares, e de raízes e caules de<br />

pequeno diâmetro. Como se acabou de referir, esta tendência evolutiva é uma consequência direta <strong>do</strong> facto das<br />

plantas serem seres fototróficos que concentram compostos inorgânicos a partir de soluções gasosas (ar) ou aquosas<br />

(regra geral água <strong>do</strong> solo) muito diluídas. F. Hallé (Hallé, 2002) estima que a superfície externa da parte aérea de<br />

uma árvore com 40 m de altura possa ultrapassar 1 ha. A superfície das raízes é ainda maior. A relação superfície da<br />

parte área/superfície da parte subterrânea é muito variável. (Hallé, 2002) refere um valor meramente indicativo de<br />

1:130. Portanto, a superfície externa das raízes de uma planta com 40 m de altura pode atingir os 130 ha!<br />

26 Secundariamente sem clorofila e heterotróficas (plantas parasitas e plantas saprófitas). Secundariamente porque os ancestrais<br />

das plantas heterotróficas eram foto-­‐autotróficos.<br />

Diz-­‐se da parte de um órgão que está mais próxima <strong>do</strong> eixo ou <strong>do</strong> ponto onde se insere; e.g. o<br />

pecíolo corresponde à parte proximal da folha<br />

O inverso de proximal; e.g. o ápice da folha corresponde à parte distal da folha e o estigma tem<br />

uma posição distal no pistilo<br />

Segmento Partes em que um to<strong>do</strong> se divide; e.g. segmento de folha secta<br />

Adventício Vocábulo usa<strong>do</strong> para coadjuvar a designação de órgãos situa<strong>do</strong>s posições atípicas; e.g. raízes de<br />

origem caulinar (= raízes adventícias)<br />

Deiscência Processo ou mecanismo natural mediante o qual um fruto, uma antera ou um esporângio, entre<br />

outros órgãos, abrem espontaneamente e libertam para o exterior o respectivo conteú<strong>do</strong><br />

Biologia da<br />

evolução<br />

Adaptação Carácter morfológico ou funcional, produzi<strong>do</strong> por seleção natural, que incrementa a probabilidade<br />

de sucesso reprodutivo <strong>do</strong>s indivíduos porta<strong>do</strong>res no seu ambiente natural; por consequência, um<br />

indivíduo diz-­‐se adapta<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> a sua forma, fisiologia e comportamento (nos animais) lhe<br />

conferem uma elevada probabilidade de sobrevivência e reprodução em condições naturais<br />

Metamorfose Conjunto das modificações morfológicas ocorridas numa planta, no decurso da sua história<br />

evolutiva, à escala <strong>do</strong> corpo (e.g. corpo das plantas aquáticas flutuantes <strong>do</strong> género Lemna<br />

[Araceae]) ou <strong>do</strong> órgão (e.g. folhas de proteção <strong>do</strong>s gomos). As metamorfoses adaptativas<br />

conferem vantagens reprodutivas aos indivíduos; algumas metamorfoses representam adaptações<br />

a ambientes <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> e não evidenciam uma <strong>função</strong> clara no presente; outras metamorfoses são<br />

exaptações, desempenham atualmente uma <strong>função</strong> distinta daquela sob cuja influência evoluíram<br />

(Gould & Vrba, 1982).


29 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Estrutura modular das plantas<br />

A maioria <strong>do</strong>s animais exibe um crescimento e estrutura determina<strong>do</strong>s, i.e. são seres unitários (= não modulares).<br />

As estruturas externa e interna <strong>do</strong>s animais unitários – e.g. o número de membros e a posição espacial <strong>do</strong> aparelho<br />

digestivo ou <strong>do</strong>s pulmões de um mamífero ou de uma ave – mantêm-­‐se praticamente inaltera<strong>do</strong>s durante to<strong>do</strong> o<br />

crescimento pós-­‐embrionário. O volume e a massa <strong>do</strong> corpo estabilizam atingi<strong>do</strong> o esta<strong>do</strong> adulto. Os insectos de<br />

metamorfoses completas (= insectos holometábolos) embora sofram modificações estruturais muito profundas<br />

durante o seu desenvolvimento, transitam de forma determinada entre os estádios de ovo, larva, crisálida e adulto,<br />

e os adultos são muito semelhantes entre si. A dimensão e as estruturas interna e externa <strong>do</strong>s seres unitários<br />

encontram-­‐se sob um controlo aperta<strong>do</strong> <strong>do</strong> genoma e são, por isso, pouco sensíveis aos factores ambientais.<br />

Consequentemente, o seu corpo só em parte pode ser ajusta<strong>do</strong> à disponibilidade de recursos. Este ajustamento<br />

ocorre ao nível da população através de variações da densidade populacional: se o alimento abunda multiplicam-­‐se<br />

com celeridade; na falta de alimento morrem de fome em massa.<br />

As partes em que se divide o corpo <strong>do</strong>s animais unitários estão organizadas hierarquicamente, são<br />

interdependentes e têm, aproximadamente, a mesma idade, ainda que coexistam células mais velhas e mais jovens.<br />

Hierarquiza<strong>do</strong>s porque são constituí<strong>do</strong>s por um eleva<strong>do</strong> número de tipos celulares especializa<strong>do</strong>s, organiza<strong>do</strong>s em<br />

números tipos de teci<strong>do</strong>s, de órgãos e, finalmente, de sistemas, com funções definidas e permanentes. A<br />

interdependência é tal que os indivíduos necessitam de todas, ou de quase todas, as suas partes para se manterem<br />

funcionais, e é impossível isolar os órgãos (e.g. numa cirurgia, durante grandes perío<strong>do</strong>s de tempo). A organização<br />

hierárquica e a interdependência funcional das partes resultaram, em muitas linhagens evolutivas de animais<br />

unitários, numa acentuada complexificação e numa estreita integração funcional <strong>do</strong> corpo. Em contrapartida, a<br />

totipotência celular 27 reduziu-­‐se, o que dificulta ou impede a reposição de partes perdidas por efeito da idade,<br />

<strong>do</strong>ença, acidente ou predação (e.g. senescência células cerebrais, teci<strong>do</strong> cardíaco necrosa<strong>do</strong>, perda de membros ou<br />

órgãos).<br />

As plantas, por oposição aos animais unitários, são organismos modulares de crescimento indefini<strong>do</strong>. Modulares<br />

porque constituí<strong>do</strong>s pela repetição de unidades multicelulares discretas, i.e. por módulos (= metâmeros), de grande<br />

autonomia funcional (semi-­‐autónomas). De crescimento indefini<strong>do</strong> pelo facto de crescerem continuamente até à<br />

senescência (= morte), ainda que este crescimento possa ser interrompi<strong>do</strong> por perío<strong>do</strong>s de quiescência (= suspensão<br />

<strong>do</strong> desenvolvimento) mais ou menos alarga<strong>do</strong>s, nas estações desfavoráveis ao crescimento das plantas.<br />

A estrutura modular apenas se concretiza na parte aérea <strong>do</strong> corpo das plantas. As raízes não se decompõem em<br />

módulos, ou pelo menos em módulos exteriormente evidentes, e têm um crescimento oportunístico, dirigi<strong>do</strong> pelos<br />

gradientes de oxigénio, água e nutrientes no solo. Os ramos, pelo contrário, são construí<strong>do</strong>s através <strong>do</strong> “encaixe”<br />

sucessivo, como numa construção de lego, de um módulo elementar – o fitómero – constituí<strong>do</strong> por um entrenó, um<br />

nó e uma ou mais folhas com os respectivos meristemas axilares. Este módulo elementar, por sua vez, organiza-­‐se<br />

em módulos de complexidade crescente; e.g. sistemas de ramos. O crescimento da parte aérea é menos<br />

oportunístico <strong>do</strong> que o das raízes, caso contrário, por exemplo, as copas das árvores seriam fortemente assimétricas<br />

e, nas latitudes mais elevadas <strong>do</strong> hemisfério norte, tombariam com a idade todas para sul. As flores são o módulo<br />

reprodutivo das angiospérmicas.<br />

As células vegetais são, genericamente, totipotentes. Esta propriedade, conjugada com a estrutura modular,<br />

permite que as plantas possam, com alguma facilidade, repor ou compensar a perda de partes. Quan<strong>do</strong> uma árvore<br />

perde uma fracção significativa da sua copa ativam-­‐se gomos <strong>do</strong>rmentes, ou diferenciam-­‐se meristemas adventícios,<br />

que iniciam a reconstrução da região danificada da copa. Em casos extremos a copa de uma árvore pode ser rolada<br />

(= totalmente eliminada) e novamente restaurada. Rolam-­‐se as copas das árvores de Castanea sativa (Fagaceae)<br />

«castanheiro» infectadas com <strong>do</strong>ença da tinta (Phytophthora cinnamomi, Heterokontophyta) para estimular a<br />

emissão de raízes sãs e conter o avanço da <strong>do</strong>ença no sistema radicular; poucos anos depois as árvores têm uma<br />

nova copa e um sistema radicular parcialmente renova<strong>do</strong>. Uma argumentação análoga é utilizada para explicar a<br />

facilidade com que se propagam vegetativamente as plantas, com fragmentos de caules, de raízes ou folhas, com<br />

gomos isola<strong>do</strong>s ou, ainda, com pequenos aglomera<strong>do</strong>s de células nas técnicas de micropropagação laboratorial.<br />

27<br />

A totipotência celular é a capacidade de uma célula retomar a capacidade de se multiplicar (= capacidade meristemática) e dar<br />

origem a to<strong>do</strong>s os tipos de células diferenciadas <strong>do</strong> organismo.


30 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Nas plantas, em alternativa ou em complemento à reposição, as partes perdidas podem ser compensadas por um<br />

crescimento mais vigoroso, mais ou menos descentraliza<strong>do</strong>, de outras. Os frutos das árvores-­‐de-­‐fruto comerciais têm<br />

maior calibre, e mais sementes, se um número significativo de flores for elimina<strong>do</strong> com uma poda em verde, por<br />

méto<strong>do</strong>s químicos ou por uma geada tardia. Algumas espécies arbustivas e as plantas herbáceas com intensa<br />

propagação vegetativa (e.g. por rizomas ou bolbos) são virtualmente imortais porque as partes que, por qualquer<br />

razão, colapsam são continuamente substituídas por outras novas. A resistência à herbivoria das plantas pratenses<br />

resulta, também, da sua estrutura modular: os animais herbívoros consomem biomassa aérea que posteriormente é<br />

restituída por meristemas intercalares e por meristemas axilares, localiza<strong>do</strong>s na proximidade da superfície <strong>do</strong> solo<br />

(vd. Corpo vegetativo das gramíneas).<br />

As plantas têm um corpo flexível em massa, volume e forma porque ajustam o número, a disposição espacial e,<br />

como se refere mais adiante, a forma e a natureza <strong>do</strong>s módulos às condições ambientais (e.g. temperatura) e à<br />

disponibilidade de recursos (e.g. luz e nutrientes). Diz-­‐se, por isso, que as plantas têm uma grande plasticidade<br />

fenotípica (vd. Variação morfológica intraespecífica). Quan<strong>do</strong> os recursos são abundantes os meristemas caulinares<br />

ativos são mais numerosos e produzem mais módulos, geralmente de maior dimensão. Por consequência, os caules<br />

são mais ramifica<strong>do</strong>s e mais longos, e as inflorescências são mais numerosas e têm mais flores. Em condições de<br />

escassez são construí<strong>do</strong>s menos módulos, por vezes mais curtos, e em casos extremos é reduzi<strong>do</strong> o número de<br />

partes, e.g. pela abcisão de ramos (= cla<strong>do</strong>ptose, vd. Alongamento, ramificação e cla<strong>do</strong>ptose) e/ou folhas por efeito<br />

<strong>do</strong> ensombramento ou da escassez de água. O crescimento por módulos possibilita que as plantas ultrapassem,<br />

parcialmente, a limitações impostas à captura de recursos pela sua natureza séssil (imobilidade). Pela mesma razão,<br />

os animais sésseis geralmente também têm uma estrutura modular (e.g. corais). A totipotência e a semi-­‐autonomia<br />

<strong>do</strong>s módulos que compõem as plantas permitem que o crescimento, ao nível <strong>do</strong> indivíduo, seja matematicamente<br />

modela<strong>do</strong> de forma análoga a uma comunidade de organismos similares e independentes, corresponden<strong>do</strong>, neste<br />

caso, cada “organismo” a um módulo individual.<br />

Entre as plantas, indivíduos com a mesma idade podem ter um tamanho e fisionomia muito distintas. Por outro<br />

la<strong>do</strong>, as células, os teci<strong>do</strong>s e os órgãos das plantas, ao contrário <strong>do</strong> ocorri<strong>do</strong> nos animais unitários, não têm a mesma<br />

idade. Num tronco as células diminuem de idade de dentro para fora e num ramo as folhas proximais são mais<br />

velhas <strong>do</strong> que as folhas distais. As plantas-­‐com-­‐flor (angiospérmicas) são mais plásticas que as restantes plantas-­‐<br />

vasculares (fetos e gimnospérmicas), facto que, aparentemente, ajuda a explicar o seu sucesso evolutivo. A<br />

modularidade tem ainda outra vantagem importante: permite que os módulos possam evoluir de forma quase<br />

independente sem alterar significativamente o funcionamento de outras partes. Por exemplo, as flores podem estar<br />

sujeitas a uma grande pressão de seleção pelos poliniza<strong>do</strong>res enquanto o corpo vegetativo se mantém inaltera<strong>do</strong><br />

(i.e. em estase evolutiva). Nos seres unitários as mutações somáticas (nas células não reprodutivas) não são,<br />

geralmente, transmitidas à descendência. Nos seres modulares nada impede que uma mutação somática ocorrida<br />

num determina<strong>do</strong> ponto da copa não possa ser transmitida, por via assexual ou sexual, à descendência.<br />

O crescimento <strong>do</strong>s organismos modulares, além no número de módulos e o mo<strong>do</strong> como estão espacialmente<br />

organiza<strong>do</strong>s, envolve, como se referiu, duas outras componentes: a forma e a natureza <strong>do</strong>s módulos. Por exemplo,<br />

num mesmo indivíduo, ao nível <strong>do</strong> módulo elementar caulinar, os entrenós podem ser longos ou curtos e as folhas<br />

apresentarem modificações mais ou menos acentuadas: os ramos mais expostos ao sol têm, frequentemente, folhas<br />

mais pequenas; os ramos estiola<strong>do</strong>s pela falta de luz exibem entrenós mais longos e folhas maiores e mais delgadas;<br />

as plantas pratenses sujeitas a uma herbivoria intensa têm folhas mais pequenas, entrenós mais curtos e um hábito<br />

prostra<strong>do</strong>, etc. To<strong>do</strong>s estes casos são exemplos de plasticidade fenotípica porque as alterações na forma são<br />

controladas por factores ambientais. Pelo contrário, a diferenciação de flores, a formação de tubérculos ou a<br />

formação de rosetas foliares implicam mudanças radicais na natureza <strong>do</strong>s módulos e têm um controlo genético<br />

direto.<br />

As plantas, ao contrário <strong>do</strong>s animais unitários, estão “condenadas” a crescer continuamente porque a<br />

imobilidade confere-­‐lhes uma grande susceptibilidade à herbivoria e à competição pela luz. A herbivoria só pode ser<br />

compensada pela reposição de partes perdidas e o acesso à luz depende, em muitas plantas, da capacidade de<br />

expandir folhas acima da canópia <strong>do</strong>s competi<strong>do</strong>res mais diretos. Nas plantas perenes a degradação <strong>do</strong>s sistemas<br />

fotossintético e vascular com o tempo é, também, resolvida pela continuidade <strong>do</strong> crescimento porque as plantas


31 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

têm capacidades limitadas de reparação daquelas funções. Ao nível <strong>do</strong> teci<strong>do</strong> vegetal e <strong>do</strong> órgão a substituição de<br />

partes é essencial parar assegurar a perenidade no funcionamento <strong>do</strong> corpo das plantas.<br />

Os mecanismos de degradação <strong>do</strong>s sistemas vascular e fotossintético estão bem esclareci<strong>do</strong>s. A água que<br />

preenche os vasos e traqueí<strong>do</strong>s <strong>do</strong> xilema encontra-­‐se sob tensão. Consequentemente, os gases têm tendência a<br />

segregar-­‐se em bolhas microscópicas que podem coalescer, formar bolhas maiores e obstruir os elementos<br />

condutores <strong>do</strong> xilema. Designa-­‐se este fenómeno por embolia. As plantas têm mecanismos para se defenderem da<br />

embolia que não evitam, porém, uma lenta perda de eficiência <strong>do</strong> sistema condutor (i.e. da condutância hidráulica).<br />

A capacidade de conversão da energia da luz em cadeias carbonadas de alta energia vai decain<strong>do</strong> à medida que as<br />

folhas vão envelhecen<strong>do</strong>. Por três razões:<br />

Fotodegradação <strong>do</strong> sistema fotossintético – a incidência da luz nas folhas acarreta a formação de radicais<br />

livres que danificam as membranas cloroplásticas e os fotopigmentos;<br />

Degradação mecânica, herbivoria e parasitismo das folhas – as folhas estão sujeitas a abrasão (e.g. danos<br />

causa<strong>do</strong>s por grãos de areia ou sais transporta<strong>do</strong>s a grande velocidade pelo vento) e rasgam-­‐se, sen<strong>do</strong><br />

consumidas ou parasitadas com alguma facilidade;<br />

Ensombramento das folhas por efeito <strong>do</strong> crescimento – uma vez que os ramos, enquanto funcionais, se<br />

alongam continuamente, as folhas mais velhas vão fican<strong>do</strong> relegadas para as camadas mais profundas da<br />

copa, cada vez mais ensombradas, até que os seus consumos respiratórios de energia ultrapassam os ganhos<br />

fotossintéticos.<br />

As estruturas reprodutivas das plantas, ao invés <strong>do</strong> corpo<br />

vegetativo, têm uma organização hierárquica e uma estrutura<br />

determinada. Na flor completa as pétalas sucedem-­‐se às sépalas, os<br />

estames às pétalas e o gineceu ao androceu. Esta sequência tem<br />

um controlo genético preciso. Com a formação da flor extingue-­‐se o<br />

meristema que lhe deu origem. A dimensão e a estrutura das partes<br />

<strong>do</strong>s órgãos reprodutivos das plantas são, por regra,<br />

intraespecificamente mais estáveis <strong>do</strong> que o corpo vegetativo. Este<br />

facto, soma<strong>do</strong> com a diversidade morfológica e funcional das<br />

estruturas reprodutivas e a sua estabilidade evolutiva, explica a sua<br />

importância na identificação e classificação <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> vegetal.<br />

A natureza modular das plantas torna a sua identificação<br />

bastante mais complexa que a <strong>do</strong>s animais unitários. Muitos destes<br />

animais podem ser positivamente identifica<strong>do</strong>s com base na<br />

silhueta, no tamanho, na cor, na postura corporal ou até no<br />

movimento. Por isso as aves ou os mamíferos são normalmente<br />

representa<strong>do</strong>s em corpo inteiro nos guias de campo. A fisionomia<br />

das plantas, por exemplo de uma árvore ou de um arbusto, é<br />

francamente menos informativa. A identificação das plantas obriga<br />

a uma observação visual de proximidade, por vezes com recurso a<br />

lupas de bolso, da inserção e forma das folhas, <strong>do</strong>s pelos das folhas,<br />

da estrutura da flor, <strong>do</strong>s frutos, entre outros aspectos. Ainda assim,<br />

sobretu<strong>do</strong> em ambientes tropicais, a forma das árvores e arbustos<br />

pode ser de grande utilidade para determinar a identidade de<br />

indivíduos, ou de populações de indivíduos de uma mesma espécie.<br />

Quan<strong>do</strong> se observam povoamentos arbóreos em fotografia aérea<br />

ou, a contraluz, é fácil distinguir a silhueta de uma Castanea sativa<br />

(Fagaceae) «castanheiro», de uma Tilia (Malvaceae, Tilioideae)<br />

«tília» ou de um Pinus pinea (Pinaceae) «pinheiro-­‐manso».<br />

Uma outra importante diferença separa as plantas <strong>do</strong>s animais. Nos animais, num estádio inicial <strong>do</strong> seu ciclo de<br />

vida diferencia-­‐se um grupo de células da qual derivarão os gâmetas. Estas células, ditas germinais, não ocorrem nas<br />

A<br />

B<br />

Figura 9. Simetria. A) Cistus ladanifer<br />

(Cistaceae): simetria radial: corola e androceu.<br />

Simetria por metameria: unidade entrenó e nó<br />

com duas folhas opostas. B) Viola riviniana<br />

(Violaceae): simetria bilateral: corola (n.b.<br />

existe apenas um plano de simetria porque as<br />

pétalas são distintas entre si, uma delas<br />

forman<strong>do</strong> um esporão na base) (de Bonnier &<br />

Douin, 1912-­‐1935).


32 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

plantas. Nas plantas as células que se diferenciam em gâmetas não estão pré-­‐determinadas numa fase embrionária<br />

porque o destino das células formadas nos meristemas é flexível.<br />

Simetria<br />

A simetria, por definição, consiste na repetição regular, geneticamente determinada, de elementos estruturais<br />

iguais ou similares (Figura 9). No Quadro 6 descrevem-­‐se os três tipos de simetria encontra<strong>do</strong>s no corpo das plantas.<br />

As regras das simetrias por metameria e radial codificadas no genoma controlam a disposição espacial <strong>do</strong>s<br />

módulos elementares que constituem o corpo das plantas (fitómeros). Nas plantas estes tipos de simetria emergem,<br />

diretamente, da sua natureza modular. A forma <strong>do</strong>s indivíduos resulta da interação dessas regras com o ambiente,<br />

e.g. com a disponibilidade de água e nutrientes no solo. Uma programação completa <strong>do</strong> corpo das plantas, para além<br />

de incompatível com a volatilidade temporal intrínseca <strong>do</strong>s habitats das plantas, exigiria muito mais informação <strong>do</strong><br />

que a requerida na programação da metameria, da simetria radial e da estrutura <strong>do</strong>s fitómeros. As regras de<br />

simetria, conjugadas com a estrutura modular, são, então, uma solução evolutiva parcimoniosa (simples e que exige<br />

pouca informação) para gerar, em resposta ao ambiente, formas complexas e plásticas (plasticidade fenotípica, vd.<br />

Variação morfológica intraespecífica), mas, ao mesmo tempo, evolutivamente flexíveis, i.e. sensíveis a pressões de<br />

seleção de ín<strong>do</strong>le diversa. A prontidão para mudar é uma característica fundamental das plantas.<br />

Quadro 6. Tipos de simetria<br />

Tipo de simetria Descrição Exemplo<br />

Simetria por<br />

metameria<br />

repetição de elementos estruturais<br />

ao longo de um eixo<br />

Simetria radial repetição de um número variável de<br />

elementos estruturais, com um<br />

mesmo ângulo, em torno de um eixo<br />

Simetria bilateral repetição de elementos estruturais<br />

nos <strong>do</strong>is la<strong>do</strong>s de um plano de<br />

simetria; simetria pre<strong>do</strong>minante no<br />

reino animal<br />

repetição <strong>do</strong> módulo elementar caulinar – o fitómero –<br />

constituí<strong>do</strong> por um entrenó, um nó e uma ou mais folhas<br />

com os respectivos meristemas axilares<br />

pétalas em re<strong>do</strong>r <strong>do</strong> eixo floral (= receptáculo) ou a<br />

disposição radial <strong>do</strong>s teci<strong>do</strong>s no caule e na raiz<br />

flores zigomórficas (com um plano de simetria) e folhas<br />

<strong>do</strong>rsiventrais; comum nas flores polinizadas por insectos.<br />

Homologia e analogia. Princípio da homologia<br />

Na determinação das relações de parentesco entre taxa – basilar nos sistemas de classificação cladísticos (vd.<br />

Sistemas cladísticos [vol. III]) – é essencial a distinção entre analogia e homologia. As analogias são semelhanças<br />

geneticamente determinadas, morfológicas, fisiológicas ou moleculares, que resultam da convergência evolutiva de<br />

linhagens independentes (Figura 10). As analogias são uma consequência de pressões de seleção semelhantes que<br />

arrastam consigo adaptações, a nível morfológico ou fisiológico, também semelhantes. A forma cactiforme<br />

(semelhante a cactos) de várias Euphorbia africanas e canarinas é um exemplo clássico de convergência evolutiva. A<br />

homologia implica a partilha de ancestrais comuns nos quais tiveram origem os caracteres responsáveis pelas<br />

semelhanças atuais.<br />

A morfologia externa e a posição espacial no corpo da planta facilitam a identificação de órgãos homólogos<br />

evolutivamente muito modifica<strong>do</strong>s (Figura 11). Os espinhos situa<strong>do</strong>s na axila de uma folha, ou com pequenas folhas<br />

dispersas, têm, certamente, uma origem caulinar. Um par de espinhos inseri<strong>do</strong>s na proximidade <strong>do</strong> pecíolo de uma<br />

folha provavelmente corresponde a um par de estípulas modificadas (vd. Apêndices foliares). As emergências (vd.<br />

Emergências) não são homologáveis (interpretáveis) como caules, folhas, raízes ou gemas modificadas porque têm<br />

origem na epiderme ou em teci<strong>do</strong>s subepidérmicos caulinares ou foliares (e.g. acúleos de uma roseira e espinhos<br />

foliares). Nos casos extremos em que a morfologia externa e a posição espacial sejam inconclusivos, as raízes, as<br />

folhas e os caules podem ser diferencia<strong>do</strong>s, nem sempre com sucesso, através de cortes histológicos e de estu<strong>do</strong>s


33 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

ontológicos (de desenvolvimento). A adnação de órgãos, por exemplo de caules com folhas ou de estames com o<br />

cálice, dificulta este tipo de interpretação. To<strong>do</strong>s estes exemplos ilustram o princípio da homologia segun<strong>do</strong> o qual a<br />

<strong>função</strong> não define a estrutura, a identidade de uma estrutura nas plantas é antes determinada pela sua posição<br />

relativa e ontogénese.<br />

A<br />

B C<br />

Figura 10. Homologia e analogia. A) Carlina vulgaris (Asteraceae). B) Eryngium campestre (Apiaceae). C) Daucus<br />

carota (Apiaceae) (imagens extraídas de (Bonnier & Douin, 1911-­‐1934)). O E. campestre é mais pareci<strong>do</strong> com a C.<br />

vulgaris mas filogeneticamente mais próximo <strong>do</strong> D. carota (pertencem à mesma família). A semelhança entre C.<br />

vulgaris e E. campestre resulta de convergência evolutiva: o hábito espinhoso é uma homologia.<br />

Variação morfológica intraespecífica<br />

A forma e a fisiologia das plantas variam intraespecificamente (entre os indivíduos da mesma espécie) por três<br />

causas fundamentais: variação ontogénica (= plasticidade ontogénica), variação ambiental (= plasticidade fenotípica)<br />

e variação genética (= plasticidade genética).<br />

A variação ontogénica abrange as diferenças entre os indivíduos, ou partes de indivíduos, juvenis e adultos. A<br />

transição da fase juvenil para a adulta está associada à capacidade de produzir flores: só as plantas ou as partes<br />

adultas de uma planta produzem flores. As alterações morfológicas e fisiológicas que subjazem esta transição são<br />

geneticamente determinadas. Nas plantas herbáceas a passagem da fase juvenil para a adulta é acompanhada por<br />

uma acentuada redução das taxas de crescimento. Nas plantas lenhosas a base da planta permanece com frequência<br />

juvenil, enquanto na extremidade da copa se diferenciam ramos adultos. Os ramos epicórmicos (vd. Intensidade <strong>do</strong><br />

alongamento) implicam uma regressão à condição juvenil. Para antecipar a floração das árvores de fruto colhem-­‐se<br />

garfos ou borbulhas na extremidade das copas árvores, evitan<strong>do</strong>-­‐se colher material para enxertia na base da copa ou<br />

ramos epicórmicos. As folhas juvenis, muitas vezes, são maiores (e.g. Eucalyptus), mais dentadas ou espinhosas (e.g.<br />

Quercus rotundifolia «azinheira»); a presença de espinhos é também frequente nos estádios juvenis (vd. espinhos).<br />

A plasticidade fenotípica é a capacidade demonstrada pelas plantas em modificar a sua morfologia e fisiologia em<br />

resposta a alterações ambientais. Esta capacidade tem um controlo genético indireto porque nem todas as plantas<br />

têm a mesma plasticidade fenotípica. O seu produto tem, porém, um controlo ambiental direto. A plasticidade<br />

fenotípica é, então, uma consequência da interação ambiente-­‐genoma. Como se referiu anteriormente, a<br />

plasticidade fenotípica é facilitada pela natureza modular das plantas (vd. Estrutura modular das plantas). Tem um<br />

grande valor adaptativo porque as plantas são sésseis e habitam um mun<strong>do</strong> com uma distribuição <strong>do</strong>s recursos<br />

espacial e temporalmente heterogénea.


34 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

As características genéticas de cada indivíduo são fixadas durante a fecundação, consequentemente, não são<br />

influenciadas pelo ambiente (embora a sua expressão o possa ser). Consequentemente, nem todas as diferenças<br />

observáveis na forma e na <strong>função</strong> entre os indivíduos de uma mesma espécie têm um controlo ambiental. A<br />

variabilidade genética intraespecífica é a matéria-­‐prima da evolução sobre a qual atua a seleção natural (vd. A<br />

síntese evolucionária moderna [vol. II]).<br />

As relações entre os mecanismos de regulação génica, os mecanismos fisiológicos e a variação morfológica<br />

intraespecífica (= plasticidade intraespecífica) estão para além <strong>do</strong>s objectivos deste <strong>do</strong>cumento.<br />

Adaptação e aclimatação<br />

Uma adaptação é uma característica morfológica ou fisiológica, geneticamente transmissível, favorecida por<br />

seleção natural. De acor<strong>do</strong> com o modelo de evolução por seleção natural originalmente postula<strong>do</strong> por Darwin, as<br />

características adaptativas primeiro surgem por acaso e só posteriormente a sua frequência é incrementada por<br />

seleção (vd. A síntese evolucionária moderna [vol. II]). O corpo vegetativo de um cacto xeromórfico (adapta<strong>do</strong> a<br />

climas de grande secura) envolveu a acumulação e a concatenação de um grande número de “acasos felizes”, i.e. de<br />

adaptações. Os raciocínios adaptativos simplistas <strong>do</strong> tipo “as plantas têm espinhos para se defenderem <strong>do</strong>s animais<br />

herbívoros” envolvem grandes riscos porque se sustentam em evidências circunstanciais potencialmente mal<br />

interpretadas (vd. Prólogo). A identificação de adaptações, i.e. a demonstração das vantagens adaptativas de<br />

caracteres, é complexa e morosa.<br />

O conceito de aclimatação é aplica<strong>do</strong> às modificações verificadas no corpo <strong>do</strong>s seres vivos em resposta a<br />

alterações <strong>do</strong> habitat, geralmente envolven<strong>do</strong> variáveis climáticas ou de solo. A adaptação é um processo<br />

genericamente lento, dirigi<strong>do</strong> pela seleção natural, acompanha<strong>do</strong> de alterações genéticas qualitativas e<br />

quantitativas sexualmente transmissíveis. A aclimatação, pelo contrário, não acarreta alterações genéticas mas tão-­‐<br />

somente modificações fenotípicas, na morfologia e/ou na fisiologia da planta: é uma consequência direta da<br />

plasticidade fenotípica. A colocação ao ar livre de plantas propagadas em estufa para melhor suportarem condições<br />

climáticas mais extremas é um exemplo prático de aclimatação. Recentemente, foi prova<strong>do</strong> que alguns tipos de<br />

aclimatação são, pelo menos em parte, sexualmente transmissíveis. Os descendentes de plantas aclimatadas a<br />

determinadas condições ambientais – e.g. solos secos ou pobre de nutrientes – frequentemente crescem mais, e<br />

reproduzem-­‐se com mais sucesso, nestas condições <strong>do</strong> que os descendentes de indivíduos não aclimata<strong>do</strong>s. A<br />

transmissão de caracteres adquiri<strong>do</strong>s por aclimatação está relacionada com modificações ao nível da repressão e<br />

expressão génica (e.g. metilação de genes), ainda não totalmente compreendidas. O estu<strong>do</strong> da transmissão de<br />

caracteres sem alterações <strong>do</strong> código genético – a epigenética – é uma área recente, de ponta e em franco progresso<br />

da biologia evolutiva (vd. Síntese evolucionária estendida [vol. II]).<br />

Espinhos<br />

4. Sistema vegetativo das plantas-­‐com-­‐semente<br />

4.1. Aspectos morfológicos comuns a to<strong>do</strong> o corpo vegetativo<br />

No corpo vegetativo das plantas é frequente a presença de vários tipos de estruturas aguçadas, geralmente, com<br />

a <strong>função</strong> de dissuadir a herbivoria e/ou de fincar as plantas a suportes. Reserva-­‐se o termo espinho para as<br />

estruturas pontiagudas, rijas e difíceis de destacar, providas de feixes vasculares, resultantes da modificação total ou<br />

parcial de ramos, folhas, estípulas ou gomos. Os acúleos, como mais adiante de esclarece, são emergências.<br />

A posição <strong>do</strong>s espinhos no cormo permite, muitas vezes, identificar o órgão que lhes deu origem (Figura 11). Os<br />

espinhos de origem caulinar situam-­‐se na axila de uma folha ou da sua cicatriz; e.g. espinhos de Echinospartum<br />

ibericum (Fabaceae) «cal<strong>do</strong>neira», Ulex (Fabaceae) «tojos» e Olea europaea var. sylvestris (Oleaceae) «zambujeiro».<br />

A superfície destes espinhos podem apresentar folhas mais ou menos modificadas ou as suas cicatrizes . Os espinhos<br />

de origem foliar por regra axilam uma gema ou um caule com origem numa gema axilar; e.g. espinhos de Cactaceae


35 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

«cactos». Os espinhos de origem estipular apresentam-­‐se dispostos aos pares, geralmente um de cada la<strong>do</strong> de uma<br />

folha, de uma gema ou de caule desenvolvi<strong>do</strong> a partir de uma gema axilar; e.g. Robinia pseu<strong>do</strong>acacia (Fabaceae)<br />

«robínia».<br />

Figura 11. Espinhos e acúleos. A) Tipos de espinhos e acúleos (adapta<strong>do</strong> de (van Wyk & van Wyk, 2006)). B)<br />

Ulex airensis (Fabaceae), um endemismo <strong>do</strong> CW de Portugal Continental.<br />

Emergências<br />

As emergências são estruturas constituídas por células de origem epidérmica e subepidérmica não sen<strong>do</strong>, por<br />

isso, identificáveis com raízes, caules, gomos ou folhas modificadas (Bell, 2008). Como não possuem conexões<br />

vasculares destacam-­‐se com alguma facilidade <strong>do</strong> órgão onde se inserem.<br />

A C<br />

B<br />

Figura 12. Emergências. A) Rubus brigantinus (Rosaceae): acúleos e glândulas estipitadas. B) Atriplex halimus<br />

(Amaranthaceae): folhas recobertas de glândulas salinas (foto A.J. Pereira, Flora-­‐on) C) Drosera intermedia<br />

(Droseraceae): planta carnívora com pelos glandulosos foliares envolvi<strong>do</strong>s na digestão externa de insectos.


36 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

As emergências espinhosas, +/-­‐ lenhosas, são muito frequentes nas plantas-­‐com-­‐flor. Designam-­‐se<br />

genericamente por acúleos, embora na bibliografia a sua nomenclatura seja inconsistente (Figura 12). Os acúleos são<br />

particularmente abundantes nas Rosaceae, tanto nos caules (acúleos caulinares), como no pecíolo (acúleos<br />

peciolares), como ainda nas nervuras das folhas (acúleos foliares), e.g. Rubus ulmifolius (Rosaceae) «silvas» e Rosa<br />

(Rosaceae) «roseiras». As emergências espinhosas localizadas na margem das folhas (e.g. em Ilex aquifolium<br />

[Aquifoliaceae] «azevinho») são, inapropriadamente, designadas por espinhos foliares. As folhas com emergências<br />

espinhosas nas margens dizem-­‐se espinescentes.<br />

Genericamente, designa-­‐se por indumento o revestimento de origem epidérmica constituí<strong>do</strong> por pó de natureza<br />

cerosa ou salina, placas cerosas, papilas, escamas, tricomas (= pelos) ou glândulas, que recobre as superfícies das<br />

folhas, caules herbáceos (sem crescimento secundário) ou peças da flor (sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong> cálice). As plantas podem<br />

combinar mais de um tipo de indumento. Por exemplo, as Lamiaceae «labiadas» possuem um ou mais tipos de<br />

glândulas e de pelos glandulosos, combina<strong>do</strong>s com pelos não glandulosos, simples ou ramifica<strong>do</strong>s. Os órgãos<br />

desprovi<strong>do</strong>s de indumento dizem-­‐se glabros; glabrescentes se este for raro e esparso. O indumento é<br />

particularmente importante na identificação das plantas ao nível da espécie. O início <strong>do</strong> crescimento secundário<br />

implica a eliminação <strong>do</strong> indumento <strong>do</strong>s caules. As folhas e as peças da flor não têm crescimento secundário mas<br />

podem perder parte <strong>do</strong> indumento com a idade.<br />

As papilas são pequenas projeções epidérmicas unicelulares em forma de mamilo. Nas escamas uma pequena<br />

projeção aplanada conecta-­‐se à epiderme por um pequeno “pé”. Os tricomas têm uma forma muito variável.<br />

Reconhecem-­‐se <strong>do</strong>is tipos principais: simples (não ramifica<strong>do</strong>s) – poden<strong>do</strong> ser unicelulares ou pluricelulares,<br />

glandulares ou não glandulares, pelta<strong>do</strong>s, ganchea<strong>do</strong>s, urticantes, etc.; ramifica<strong>do</strong>s – bifurca<strong>do</strong>s (em forma de T ou<br />

de Y), estrela<strong>do</strong>s (em forma de estrela, sésseis ou pedicula<strong>do</strong>s), dendríticos, etc.<br />

As glândulas 28 possuem capacidade secretória. A sua morfologia é muito diversa assim como os critérios usa<strong>do</strong>s<br />

na sua classificação; e.g. glândulas unicelulares ou pluricelulares, e glândulas sésseis ou providas de um pequeno pé<br />

flexível (pelos glandulosos) ou rígi<strong>do</strong> (glândulas estipitadas). As substâncias segregadas incluem enzimas<br />

proteolíticas, sais, resinas, óleos essenciais e substâncias urticantes. As glândulas produtoras de enzimas<br />

proteolíticas das plantas carnívoras participam na digestão externa de insectos e de outros organismos. As glândulas<br />

salinas desenvolvem-­‐se, com abundância, nas plantas adaptadas a solos salinos ricos em cloreto de sódio, como<br />

acontece nas Amaranthaceae <strong>do</strong>s sapais holárticos (e.g. gén. Atriplex) e em algumas plantas <strong>do</strong>s mangais tropicais<br />

(e.g. Avicennia africana [Acanthaceae] «mangue-­‐branco»). As glândulas que segregam óleos essenciais e/ou resinas<br />

têm, muitas vezes, uma forma globosa, quase microscópica, e cor amarela ou vermelha brilhante. Rompem-­‐se e<br />

libertam o seu conteú<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> perturbadas (e.g. passagem de um insecto). A abundância deste tipo de glândulas<br />

nas plantas-­‐com-­‐flor indicia a sua importância na proteção <strong>do</strong>s órgãos herbáceos contra a herbivoria, sobretu<strong>do</strong> por<br />

insectos. Nas Urtica (Urticaceae) «urtigas» os pelos glandulosos são ocos e preenchi<strong>do</strong>s com um líqui<strong>do</strong> venenoso e<br />

urticante. A extremidade <strong>do</strong> pelo é arre<strong>do</strong>ndada e parte-­‐se com facilidade em contacto com um corpo estranho. A<br />

parte remanescente toma a forma de uma agulha e penetra a pele <strong>do</strong>s mamíferos libertan<strong>do</strong> o seu conteú<strong>do</strong> no<br />

interior <strong>do</strong> corpo <strong>do</strong> animal.<br />

A terminologia associada ao indumento é muito especializada e diversa porque uma correta descrição das<br />

características da superfície <strong>do</strong>s órgãos aéreos das plantas é essencial em taxonomia. Os termos e conceitos mais<br />

utiliza<strong>do</strong>s na bibliografia de referência estão cita<strong>do</strong>s no Quadro 7 (Figura 13). O indumento desempenha uma, ou<br />

mais, das funções descritas no Quadro 8.<br />

Para além <strong>do</strong> indumento a superfície <strong>do</strong>s órgãos herbáceos pode ser: viscida – superfície viscosa, e.g. folhas e<br />

caules de Cistus ladanifer (Cistaceae) «esteva»; alveolada – com pequenas depressões separadas por pequenas<br />

arestas; perfurada – com pequenas perfurações.<br />

28<br />

Este termo é geralmente aplica<strong>do</strong> às glândulas epidérmicas. No entanto, as glândulas podem situar-­‐se em camadas celulares<br />

mais profundas e nesse caso não cabem no conceito de emergência.


37 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Quadro 7. Tipos de indumento. Basea<strong>do</strong> em (Vasconcellos, 1969).<br />

Tipo de indumento Descrição Exemplos<br />

Indumento não<br />

constituí<strong>do</strong> por<br />

pelos<br />

Pruinoso superfície com placas de cera turiões de Rubus ulmifolius (Rosaceae) «silva-­‐<br />

comum»<br />

Farinoso<br />

(=pulverulento)<br />

superfície coberta com um pó geralmente de<br />

natureza cerosa<br />

29 Termo por vezes usa<strong>do</strong> para designar, de forma genérica, qualquer tipo de revestimento de pelos.<br />

Atriplex halimus (Amaranthaceae) e página<br />

inferior das Primula (Primulaceae)<br />

Papiloso com pequenas papilas Folhas de algumas populações de Rumex<br />

acetosa (Polygonaceae)<br />

Indumento de<br />

pelos compri<strong>do</strong>s a<br />

intermédios<br />

Acetina<strong>do</strong><br />

(= ceríceo)<br />

de pelos aplica<strong>do</strong>s e densos que atribuem um<br />

brilho de cetim<br />

página inferior das folhas de Salix alba<br />

(Salicaceae) «salgueiro-­‐branco»<br />

Cilia<strong>do</strong> (= celhea<strong>do</strong>) pelos concentra<strong>do</strong>s na margem das folhas Erica tetralix e E. ciliata (Ericaceae)<br />

Flocoso de pelos que se destacam em flocos irregulares Verbascum pulverulentum (Scrophulariaceae)<br />

Hirsuto de pelos densos, um pouco rígi<strong>do</strong>s mas flexíveis,<br />

patentes ou quase<br />

Híspi<strong>do</strong> de pelos muito rígi<strong>do</strong>s, quase picantes, patentes e<br />

não muito densos<br />

Echium lusitanicum (Boraginaceae)<br />

muitas Boraginaceae<br />

Lanoso de pelos crespos (ondula<strong>do</strong>s) e macios, como a lã Marrubium vulgare (Lamiaceae)<br />

Piloso de pelos macios ergui<strong>do</strong>s e não ondula<strong>do</strong>s<br />

Setígero com sedas, i.e. pelos ásperos mais ou menos<br />

rígi<strong>do</strong>s e fortes<br />

Tearâneo<br />

(= aracnoide)<br />

com pelos finos e macios, tenuemente<br />

entrelaça<strong>do</strong>s, como uma teia de aranha<br />

Tomentoso com pelos moles enlea<strong>do</strong>s forman<strong>do</strong> um<br />

enfeltra<strong>do</strong> denso<br />

Echium tuberculatum e E. vulgare<br />

(Boraginaceae)<br />

Carthamus lanatus (Asteraceae)<br />

página inferior das folhas de Salix atrocinerea<br />

(Salicaceae) «borrazeira-­‐preta»<br />

Urticante de pelos urticantes Urtica (Urticaceae) «urtigas»<br />

Viloso de pelos longos, macios, direitos ou sinuosos, não<br />

muito densos, patentes ou subpatentes e não<br />

entrecruza<strong>do</strong>s<br />

Indumento de<br />

pelos curtos<br />

Aveluda<strong>do</strong> de pelos finos, densos e ergui<strong>do</strong>s, de toque e<br />

aspecto semelhante ao <strong>do</strong> velu<strong>do</strong><br />

folíolos <strong>do</strong> Lupinus albus (Fabaceae)<br />

«tremoceiro-­‐branco» e Vicia villosa (Fabaceae)<br />

Quercus pyrenaica (Fagaceae)<br />

Lanuginoso de pelos crespos e macios Chamaemelum nobile (Asteraceae) «macela»<br />

Puberulento de pelos muito curtos e esparsos Galium verum (Rubiaceae)<br />

Pubescente 29<br />

de pelos fracos e pouco densos Agrimonia eupatoria (Rosaceae)


38 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

A B<br />

Figura 13. Indumento. A) Tipos de indumento. Em cima (da esquerda para a direita): acetina<strong>do</strong>, viloso,<br />

hirsuto, lanoso, celhea<strong>do</strong>, híspi<strong>do</strong>. Em baixo (da esquerda para a direita): setígero, tearâneo, tomentoso,<br />

flocoso, pubescente, aveluda<strong>do</strong>, puberulento e lanuginoso (Vasconcellos, 1969). B) Indumento lanoso:<br />

Marrubium vulgare (Lamiaceae) (foto M.Porto, Flora-­‐on). C) Indumento híspi<strong>do</strong>: Picris echioides<br />

(Asteraceae) (foto S. Chosas, Flora-­‐on)<br />

Quadro 8. Funções <strong>do</strong> indumento<br />

Função Mecanismo<br />

Proteção contra o excesso de<br />

radiação<br />

Incremento da captura de luz<br />

para a fotossíntese<br />

ensombramento da superfície foliar através da reflexão ou absorção da radiação solar<br />

reflexão da radiação solar em direção às células fotossintéticas <strong>do</strong> mesofilo foliar<br />

Redução das perdas de água aumento da resistência à difusão de vapor de água conseguida com um aumento da<br />

espessura da camada limite e da formação de uma camada gasosa estável, rica em água,<br />

entre os pelos e a superfície foliar<br />

Isolamento térmico formação de uma camada gasosa estável entre os pelos e a superfície foliar e aumento da<br />

espessura da camada limite<br />

Retenção de nutrientes redução das perdas de iões por lixiviação da superfície foliar<br />

Tolerância à salinidade movimento ativo de sais <strong>do</strong> interior <strong>do</strong> mesofilo foliar para o exterior<br />

Defesa contra a herbivoria repulsão de insectos ou vertebra<strong>do</strong>s com pelos glandulosos<br />

Defesa contra<br />

microrganismos patogénicos<br />

afastamento <strong>do</strong> inóculo (e.g. esporos de fungos) da superfície foliar<br />

Proteção <strong>do</strong>s estomas redução <strong>do</strong>s riscos de bloqueio <strong>do</strong>s estomas com água ou partículas sólidas<br />

Digestão de insectos e outras<br />

“presas”<br />

produção de enzimas proteolíticas<br />

Corpos nutritivos, hidáto<strong>do</strong>s e nectários extraflorais<br />

Os corpos nutritivos são secreções sólidas de substâncias nutritivas, proteicas, lipídicas ou glicídicas, com <strong>função</strong><br />

de recompensa em relações mutualistas planta-­‐insecto, geralmente com formigas (Hymenoptera, Formicidae). As<br />

relações mutualistas planta-­‐fomigas designam-­‐se por mirmecofilia. Os corpos nutritivos diferem <strong>do</strong>s nectários pelo<br />

facto de serem integralmente consumi<strong>do</strong>s, e não apenas os produtos por eles secreta<strong>do</strong>s. Podem localizar-­‐se nas<br />

folhas, na base <strong>do</strong> pecíolo, nos caules ou mesmo na flor. Por exemplo, as formigas sul-­‐americanas <strong>do</strong> género<br />

Pseu<strong>do</strong>myrmex constroem formigueiros em espinhos ocos e consomem corpos nutritivos situa<strong>do</strong>s no ápice <strong>do</strong>s<br />

C


39 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Figura 14. Nectários extraflorais. Base <strong>do</strong> limbo<br />

de Prunus avium (Rosaceae) «cerejeira»<br />

folíolos de algumas Vachellia (e.g. Vachellia [Acacia] cornigera,<br />

Fabaceae), em contrapartida defendem a árvore <strong>do</strong> ataque de<br />

insectos e mamíferos herbívoros, eliminam folhas e caules de<br />

outras espécies de plantas que contactem com a árvore<br />

colonizada e suprimem as plantas que germinem na sua<br />

vizinhança (Rickson, 1975).<br />

Os hidáto<strong>do</strong>s são cavidades com um poro por onde é<br />

excretada solução xilémica; este fenómeno designa-­‐se por<br />

gutação e ocorre com mais frequência quan<strong>do</strong> o ar está satura<strong>do</strong><br />

de água. Os hidáto<strong>do</strong>s são particularmente frequentes nas<br />

plantas das florestas tropicais húmidas. Os nectários extraflorais,<br />

ao contrário <strong>do</strong>s hidáto<strong>do</strong>s excretam soluções açucaradas – as<br />

meladas – que actuam como recompensa em relações<br />

mutualistas com insectos. Enquanto os nectários florais oferecem recompensas a poliniza<strong>do</strong>res, os nectários<br />

extraflorais servem recompensas a insectos mutualistas que defendem a planta contra a herbivoria (e.g. formigas<br />

que atacam larvas herbívoras de borboletas e outros insectos herbívoros). Os nectários extraflorais geralmente<br />

localizam-­‐se no limbo ou nos extremos proximal ou distal <strong>do</strong> pecíolo das folhas, por vezes, em bolsas especializadas<br />

(<strong>do</strong>mácias); e.g. nectários extraflorais <strong>do</strong>s pecíolos das Passifloraceae «maracujazeiros» e da Prunus avium<br />

«cerejeira». Os apicultores conhecem bem o mel de melada, que tem um valor de merca<strong>do</strong> inferior ao mel de<br />

néctar.<br />

Galhas<br />

As galhas são crescimentos anormais causa<strong>do</strong>s por insectos, ácaros, fungos, bactérias ou feridas.<br />

Frequentemente, mostram formas características que permitem identificar, de forma indireta, o agente causal. As<br />

galhas são muito comuns em Quercus (Fagaceae) «carvalhos», e.g. galhas de Andricus quercustozae (Hymenoptera,<br />

Cynipidae) em Q. pyrenaica ou Q. faginea subsp. faginea, vulgarmente conhecidas por bugalhos, ou as galhas de<br />

Dryomyia lichtensteini (Diptera, Cecy<strong>do</strong>midae) em Q. suber e Q. rotundifolia. O nome vulgar da Pistacia terebinthus<br />

(Anacardiaceae) – «cornalheira» – deve-­‐se às galhas folheares corniformes produzidas pela Baizongia pistaciae<br />

(Homoptera, Pemphigidae). Nos ramos das oliveiras (Olea europaea, Oleaceae) varejadas com violência são comuns<br />

galhas de origem bacteriana – «tuberculose» – causadas por uma bactéria, a Pseu<strong>do</strong>monas savastanoi.<br />

A B<br />

Figura 15. Galhas. A) Galha de Neuroterus quercusbaccarum (Hymenoptera, Cynipidae) em Q. faginea subsp.<br />

faginea (ca. 6 mm). B e C) Bugalho de Andricus quercustozae (Hymenoptera, Cynipidae) em Quercus faginea<br />

subsp. faginea (ca. 3,5 cm) (duas primeiras fotos). D) Galhas de Baizongia pistaciae (Homoptera, Pemphigidae)<br />

em Pistacia terebinthus (última foto à direita)<br />

C<br />

D


40 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

4.2. Raiz<br />

A raiz é um <strong>do</strong>s três órgãos fundamentais das plantas. Ao invés <strong>do</strong>s caules e das folhas, o sistema radicular tem<br />

um geotropismo positivo e permanece, na maioria <strong>do</strong>s casos, oculto no solo durante to<strong>do</strong> o ciclo de vida das plantas.<br />

A raiz é a metade escondida das plantas.<br />

4.2.1. Funções da raiz<br />

As raízes desempenham seis grandes funções: absorção de água e nutrientes, exclusão de substâncias tóxicas,<br />

ancoragem ao substrato, trocas gasosas, síntese de compostos orgânicos e reserva (Quadro 9). A <strong>função</strong> de<br />

assimilação é rara na natureza.<br />

A morfologia e a configuração espacial (arquitetura) das raízes têm uma grande influência na eficiência da<br />

absorção de nutrientes, sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s nutrientes de menor mobilidade no solo, como o fósforo. Características que<br />

aumentem o volume de solo explora<strong>do</strong> pelas raízes, com reduzi<strong>do</strong>s custos metabólicos, são muito vantajosas em<br />

solos pobres em nutrientes de baixa mobilidade. A absorção <strong>do</strong> fósforo, por exemplo, é favorecida pela presença de<br />

aerênquima, de raízes pequeno diâmetro, de raízes superficiais muito ramificadas (porque as formas biodisponíveis<br />

deste nutriente estão concentradas nas camadas superficiais <strong>do</strong> solo), e pela produção abundante de pelos<br />

radiculares de grande comprimento. Nas plantas epífitas os nutrientes são extraí<strong>do</strong>s de resíduos orgânicos (e.g.<br />

folhas mortas), de partículas inorgânicas arrastadas pelo vento (e.g. argilas) e da água da chuva ou <strong>do</strong>s nevoeiros.<br />

Nas plantas parasitas a nutrição e o abastecimento em água são garanti<strong>do</strong>s, total ou parcialmente, pelos seus<br />

hospedeiros.<br />

Quadro 9. Funções da raiz<br />

Função Mecanismo<br />

Absorção de água e<br />

nutrientes<br />

Exclusão de substâncias<br />

tóxicas<br />

Função primordial da raiz; <strong>do</strong>s 27 elementos essenciais que constituem o corpo das plantas-­‐<br />

terrestres apenas o carbono e o oxigénio não são total, ou maioritariamente, absorvi<strong>do</strong>s pela raiz a<br />

partir da solução <strong>do</strong> solo (água <strong>do</strong> solo + nutrientes em solução)<br />

Assim como absorve eficientemente nutrientes <strong>do</strong> solo a raiz impede a entrada no corpo das<br />

plantas de substâncias tóxicas (e.g. cloreto de sódio em solos salinos)<br />

Ancoragem ao substrato Ancoragem ao solo e a outros tipos de suporte (e.g. outras plantas, afloramentos rochosos, etc.)<br />

Reserva Função particularmente importante nas raízes tuberosas<br />

Trocas gasosas Direta ou indiretamente todas as células vegetais efetuam trocas gasosas com a atmosfera ou com<br />

a atmosfera <strong>do</strong> solo; algumas espécies possuem raízes especializadas nessa <strong>função</strong><br />

(pneumatóforos)<br />

Síntese de compostos<br />

orgânicos<br />

Síntese de hormonas vegetais, em particular de citoquininas<br />

Assimilação Em raras orquídeas tropicais; e.g. na Dendrophylax lindenii «orquídea-­‐fantasma» os caules e as<br />

folhas estão ausentes ou muito reduzi<strong>do</strong>s e a <strong>função</strong> fotossintética é desempenhada pelas raízes<br />

Meristemas e teci<strong>do</strong>s<br />

4.2.2. Anatomia da raiz<br />

4.2.2.1. Estrutura primária da raiz<br />

A raiz primária é construída pelo meristema apical radicular. No centro <strong>do</strong> deste meristema distingue-­‐se um<br />

centro quiescente de células iniciais de baixa ou nula atividade mitótica e <strong>função</strong> mal compreendida, que se esbate,


41 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

ou anula, durante os perío<strong>do</strong>s de repouso vegetativo (Rudal, Anatomy of Flowering Plants. An Introduction to<br />

Structure and Development, 2007). O meristema apical radicular diferencia células para diante (distalmente) e para<br />

trás (proximalmente) <strong>do</strong> centro quiescente. O meristema apical<br />

caulinar só forma células para trás <strong>do</strong> promeristema e não apresenta<br />

um centro quiescente.<br />

O meristema apical radicular está permanentemente encapsula<strong>do</strong><br />

no interior <strong>do</strong> ápice radicular pela caliptra (= coifa), uma estrutura em<br />

forma de capuz que protege as células meristemáticas <strong>do</strong> contacto<br />

direto com as partículas <strong>do</strong> solo e lubrifica o avanço das raízes. À<br />

medida que as raízes se alongam, a caliptra liberta para o exterior uma<br />

mucilagem lubrificante – o mucigel – e as suas camadas celulares<br />

externas de natureza parenquimatosa desagregam-­‐se, sen<strong>do</strong><br />

substituídas por outras provenientes <strong>do</strong> meristema apical. Em posição<br />

distal em relação ao centro quiescente distingue-­‐se um grupo de<br />

células meristemáticas forma<strong>do</strong>ras da caliptra, a caliptrogene (ing.<br />

calyptrogen). Esta região meristemática pode, em algumas espécies,<br />

colaborar na construção da epiderme e <strong>do</strong> teci<strong>do</strong> fundamental.<br />

Numa posição anterior relativamente ao centro quiescente situa-­‐se<br />

o promeristema constituí<strong>do</strong> pelas células iniciais e suas descendentes<br />

mais diretas sem sinais de diferenciação celular. À semelhança <strong>do</strong><br />

meristema apical <strong>do</strong> caule, numa posição proximal relativamente ao<br />

promeristema, reconhecem-­‐se distinguem-­‐se três regiões teciduais de<br />

transição: a protoderme, o meristema fundamental e o procâmbio (vd.<br />

Os meristemas) (Figura 16).<br />

Num corte transversal de uma raiz primária diferenciada<br />

distinguem-­‐se <strong>do</strong> exterior para o interior, as seguintes camadas<br />

teciduais: a epiderme, o córtex primário e o cilindro central (= estela).<br />

As caraterísticas histológicas da epiderme, <strong>do</strong> parênquima e <strong>do</strong>s<br />

teci<strong>do</strong>s vasculares foram descritas no ponto dedica<strong>do</strong> à histologia<br />

vegetal (vd. Os teci<strong>do</strong>s das plantas vasculares).<br />

Epiderme e córtex<br />

Figura 16. Representação esquemática da<br />

anatomia <strong>do</strong> ápice radicular (corte radial<br />

<strong>do</strong> meristema apical e da zona de<br />

alongamento). N.b. a densidade <strong>do</strong>s pontos<br />

indica a intensidade das mitoses (adapta<strong>do</strong><br />

com modificações de (Jensen & Kavaljian,<br />

1958)<br />

A epiderme da raiz é normalmente unisseriada, e desprovida de cutícula e estomas. Como mais adiante se refere,<br />

na designada zona pilífera emergem das células epidérmicas pelos radiculares unicelulares.<br />

Constitui o córtex a porção de teci<strong>do</strong> fundamental, tipo parênquima (parênquima fundamental ou de reserva),<br />

localiza<strong>do</strong> entre a epiderme e o periciclo, exclusive. O córtex inclui ainda a hipoderme (nem sempre presente) e a<br />

en<strong>do</strong>derme. Na raiz primária o córtex é mais espesso <strong>do</strong> que o cilindro central. As células <strong>do</strong> córtex apresentam uma<br />

forma arre<strong>do</strong>ndada, paredes celulares delgadas e abundantes espaços intercelulares. Têm uma importante <strong>função</strong><br />

de reserva, óbvia nas raízes tuberosas (e.g. Daucus carota «cenoura» Apiaceae) e são, geralmente, transparentes. Na<br />

proximidade da epiderme, ou da en<strong>do</strong>derme, podem percorrer o córtex feixes de esclerênquima. O funcionamento<br />

das raízes contracteis depende de células corticais especializadas (vd. Metamorfoses da raíz).<br />

Na en<strong>do</strong>derme, a camada mais interna <strong>do</strong> córtex, observam-­‐se bandas de suberina ou lenhina – bandas de<br />

Caspary – a revestir as paredes radiais e transversais da en<strong>do</strong>derme (vd. Figura 17). As células ditas de passagem não<br />

apresentam bandas; por regra situam-­‐se de frente ao xilema e abundam nas raízes das dicotiledóneas. Nas<br />

monocotiledóneas as en<strong>do</strong>derme é particularmente nítida, com células em forma de barril espessadas em U (Figura<br />

17 B).<br />

A impermeabilização da parede celular en<strong>do</strong>dérmica – a suberina e a lenhina são substâncias hidrofóbicas –<br />

obriga a água e os nutrientes que circulam pelos espaços intercelulares, e pelas paredes celulares da epiderme e <strong>do</strong><br />

córtex (via apoplástica), a penetrar nas células (via simplástica) da en<strong>do</strong>derme. A en<strong>do</strong>derme tem, assim, um papel


42 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

fundamental na seletividade <strong>do</strong>s processos de absorção ocorri<strong>do</strong>s na<br />

raiz. Não surpreende, por isso, que seja funcional pouco abaixo <strong>do</strong><br />

ápice radicular, na zona pilífera (vd. <strong>Morfologia</strong> da extremidade<br />

radicular e ramificação). No córtex de muitas espécies, sobretu<strong>do</strong><br />

entre as monocotiledóneas, sobressai pela sua regularidade uma<br />

camada simples de células imediatamente abaixo da epiderme, uma<br />

hipoderme (vd. Epiderme). As paredes celulares da hipoderme podem<br />

apresentar bandas de Caspary a reforçar a seletividade radicular,<br />

toman<strong>do</strong> então o nome de exoderme (Schreiber & Franke, 2011).<br />

Cilindro central<br />

O cilindro central é delimita<strong>do</strong> exteriormente por uma camada<br />

geralmente unisseriada (unicelular) de células, o periciclo (Esau, 1977).<br />

Segue-­‐se-­‐lhe um cilindro vascular e, no centro da raiz, uma massa de<br />

células parenquimatosas ou esclerenquimatosas, a medula (Figura 17).<br />

O periciclo progride encrava<strong>do</strong> entre a en<strong>do</strong>derme e os teci<strong>do</strong>s<br />

vasculares. É constituí<strong>do</strong> por células com paredes espessadas,<br />

compactas, sem espaços intercelulares que mantêm capacidade<br />

meristemática até eventualmente serem destruídas pelo crescimento<br />

secundário. As raízes laterais diferenciam-­‐se no periciclo. Geralmente,<br />

o câmbio vascular e a primeira felogene têm também origem nas<br />

células <strong>do</strong> periciclo (vd. Estrutura secundária). Embora característico da<br />

raiz, em algumas espécies estende-­‐se até ao caule primário (Esau,<br />

1977).<br />

Em cortes histológicos transversais a vascularização primária da raiz<br />

mostra a seguinte estrutura básica (Figura 17): i) feixes radiais (=<br />

alternos) fecha<strong>do</strong>s – i.e. feixes alternantes de floema e xilema,<br />

separa<strong>do</strong>s por camadas estreitas de parênquima (parênquima<br />

vascular) ou esclerênquima, sem câmbio vascular, regra geral<br />

concentra<strong>do</strong>s na periferia <strong>do</strong> cilindro central; ii) feixes de xilema<br />

radialmente alonga<strong>do</strong>s forman<strong>do</strong> como que uma estrela.<br />

Consoante o número de pólos vasculares (pontos da periferia <strong>do</strong><br />

cilindro central a partir <strong>do</strong>s quais se formam teci<strong>do</strong>s vasculares) as<br />

raízes primárias dizem-­‐se diarcas, triarcas, tetrarcas (Figura 17 A) ou<br />

poliarcas. Geralmente, as raízes das dicotiledóneas s.l. são di, tri ou tetrarcas e as das monocotiledóneas poliarcas<br />

(Figura 17 B). As monocotiledóneas também podem apresentar um grande vaso lenhoso no centro da raiz. A<br />

diferenciação <strong>do</strong> xilema primário é centrípeta: primeiro diferencia-­‐se o protoxilema numa posição mais exterior, na<br />

vizinhança <strong>do</strong> periciclo; os elementos <strong>do</strong> metaxilema são de maior diâmetro, mais espessos (de espessamento<br />

reticula<strong>do</strong> ou pontua<strong>do</strong>) e ficam reti<strong>do</strong>s no interior <strong>do</strong> cilindro vascular (Figura 17). A diferenciação <strong>do</strong> xilema<br />

primário caulinar (e <strong>do</strong> xilema secundário quer no caule quer na raiz), pelo contrário, faz-­‐se de dentro para fora: é<br />

centrífuga. Diz-­‐se, por isso, que o xilema primário radicular é exarco, e o xilema primário caulinar endarco.<br />

A estrutura <strong>do</strong> floema primário é variável: pode resumir-­‐se a uns quantos tubos crivosos, ou envolver teci<strong>do</strong>s de<br />

suporte. A diferenciação o floema segue o mesmo padrão: o protofloema tem uma posição mais externa <strong>do</strong> que o<br />

metafloema, mas ao contrário <strong>do</strong> protoxilema e <strong>do</strong> metaxilema são difíceis de distinguir em cortes histológicos.<br />

<strong>Morfologia</strong> da extremidade radicular e ramificação<br />

Figura 17. Anatomia da raiz primária (corte<br />

transversal <strong>do</strong> cilindro central). A) Cilindro<br />

central de uma dicotiledónea – raiz tetrarca<br />

de Vicia faba (Fabaceae) «faveira» – a,<br />

córtex; b, en<strong>do</strong>derme (com grânulos de<br />

ami<strong>do</strong>); c, periciclo; d, fibras de<br />

esclerênquima; f, metaxilema; g, periciclo; h,<br />

xilema; i, floema. B) Cilindro central de uma<br />

monocotiledónea – raiz poliarca de Iris<br />

germanica (Iridaceae) «lírio» – a,<br />

en<strong>do</strong>derme com bandas de Caspary em U; b,<br />

células de passagem (de frente ao xilema); c,<br />

periciclo; d, xilema; f, floema; g, medula<br />

esclerificada (Belzung, 1900).<br />

As raízes recém-­‐formadas são delgadas e frágeis. Imediatamente atrás <strong>do</strong> ápice radicular situa-­‐se uma curta zona<br />

de alongamento, e logo a seguir a zona pilífera com não mais de um centímetro de comprimento (Figura 18). As<br />

células da raiz multiplicam-­‐se no meristema apical, e expandem-­‐se e diferenciam-­‐se nos vários teci<strong>do</strong>s que<br />

compõem a raiz na zona de alongamento. As células recém-­‐formadas alongam-­‐se mais de dez vezes empurran<strong>do</strong><br />

A<br />

B


43 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

para diante a raiz solo adentro. A zona pilífera está revestida de pelos radiculares de origem epidérmica, que<br />

aumentam a superfície de contacto da raiz com as partículas e a solução <strong>do</strong> solo. A maior parte da água e <strong>do</strong>s solutos<br />

consumi<strong>do</strong>s pelas plantas são absorvi<strong>do</strong>s nesta região da raiz. Os pelos radiculares desempenham um papel<br />

particularmente importante na absorção de nutrientes presentes em baixas concentrações na solução solo ou<br />

imobiliza<strong>do</strong>s nas frações sólidas <strong>do</strong> solo, sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong> fósforo. Os pelos radiculares têm uma parede celular muito<br />

delgada e são extraordinariamente frágeis: degradam-­‐se rapidamente (em poucos dias). O crescimento da raiz<br />

repõem, em contínuo, a zona pilífera. A zona pilífera dá então lugar à zona de<br />

ramificação, de onde irrompem raízes laterais e se inicia a diferenciação <strong>do</strong><br />

câmbio nas plantas com corpo secundário. Nas maioria das monocotiledóneas<br />

após a morte pelos radiculares, as células da epiderme destacam-­‐se da raiz e<br />

são substituídas por células parenquimatosas corticais suberificadas ou<br />

lenhificadas, diferencian<strong>do</strong>-­‐se uma exoderme. A persistência de uma<br />

epiderme com paredes engrossadas é menos frequente.<br />

A ramificação lateral da raiz, o tipo de ramificação <strong>do</strong>minante entre as<br />

plantas-­‐vasculares, tem uma origem endógena, geralmente em células <strong>do</strong><br />

periciclo, adjacentes ao xilema. Antes de entrar em contacto com o solo, as<br />

raízes laterais recém-­‐diferenciadas têm de rasgar o córtex radicular e a<br />

epiderme da raiz onde se inserem. As raízes laterais derivadas da raiz primária<br />

(embrionária) designam-­‐se quanto à ordem de formação por raízes<br />

secundárias; as raízes terciárias inserem-­‐se nas secundárias, e assim<br />

sucessivamente. As raízes adventícias são normalmente caulógenas mas<br />

podem ter origem no pecíolo, no limbo das folhas. Por regra diferenciam-­‐se de<br />

teci<strong>do</strong>s imediatamente exteriores aos teci<strong>do</strong>s vasculares. As raízes podem<br />

ainda diferenciar-­‐se de calos (vd. Os meristemas).<br />

4.2.2.2. Estrutura secundária<br />

Figura 18. Representação<br />

esquemática da morfologia da<br />

extremidade radicular. Legenda: a)<br />

coifa e meristema apical radicular,<br />

b) zona de alongamento, c) zona<br />

pilífera, d) zona de ramificação, e)<br />

ramificação.<br />

As plantas-­‐com-­‐semente alongam-­‐se pelas extremidades (crescimento primário) e só depois, eventualmente, nas<br />

plantas com crescimento secundário, engrossam. As raízes das gimnospérmicas e da grande maioria das<br />

dicotiledóneas s.l. sofrem um crescimento secundário. A partir <strong>do</strong> momento em que se inicia a formação <strong>do</strong> corpo<br />

secundário da raiz, através da atividade <strong>do</strong> câmbio vascular e da felogene – os meristemas secundários <strong>do</strong> caule e da<br />

raiz são os mesmos – as raízes perdem a capacidade de absorver água e nutrientes, deixam de se ramificar,<br />

aumentam de diâmetro e na sua superfície diferencia-­‐se uma periderme, em substituição da epiderme. Passam a ter<br />

uma <strong>função</strong> de suporte e fixação.<br />

O câmbio vascular é inicia<strong>do</strong> no periciclo ou a partir de células residuais <strong>do</strong> procâmbio alojadas no parênquima<br />

vascular. O câmbio acaba por coalescer forman<strong>do</strong> um cilindro contínuo de células meristemáticas. Numa fase inicial,<br />

na raiz o câmbio adquire uma forma ondulada, rodean<strong>do</strong> o xilema por fora, e o floema por dentro. O periciclo é<br />

empurra<strong>do</strong> para a periferia pelos teci<strong>do</strong>s vasculares secundários e eventualmente ganha capacidade meristemática e<br />

origina a felogene (Dubrovsky & Rost, 2012). Como acontece nos caules secundários, a formação da felogene e da<br />

periderme condena à morte as células da epiderme, <strong>do</strong> córtex primário e da en<strong>do</strong>derme. A suberina que reveste as<br />

paredes celulares <strong>do</strong> felema (= súber, vd. Felogene e riti<strong>do</strong>ma) minimiza as perdas de águas e solutos absorvi<strong>do</strong>s nas<br />

extremidades radiculares ainda de natureza primária. Ao mesmo tempo que a parte mais velha <strong>do</strong> sistema radicular<br />

aumenta de diâmetro são produzidas novas raízes na sua extremidade distal. Com o tempo, a estrutura interna <strong>do</strong>s<br />

caules e raízes secundárias é similar, embora possam diferir em alguns detalhes; e.g. o lenho <strong>do</strong> início e fim de<br />

estação geralmente não se consegue distinguir (vd. Xilema e floema secundários <strong>do</strong> caule) e o riti<strong>do</strong>ma é menos<br />

espesso (vd. Felogene e riti<strong>do</strong>ma). Esta estrutura é explicada com mais detalhe no capítulo dedica<strong>do</strong> ao caule (vd.<br />

Estrutura secundária <strong>do</strong> caule). Uma vez que o xilema primário na raiz tem uma formação centrípeta, importa ainda<br />

referir que nas raízes secundárias o metaxilema ocupa, frequentemente, a medula, sucedi<strong>do</strong>, em direção ao exterior,<br />

pelo protoxilema. Nos caules secundários a medula é normalmente parenquimatosa e contacta com o protoxilema


44 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

(o metaxilema tem uma posição mais externa). Estes caracteres são mais fáceis de observar em raízes e caules<br />

secundários jovens.<br />

As raízes carnudas seguem um modelo de crescimento secundário distinto das raízes secundarias lenhosas<br />

(Moreira, Anatomia das Plantas: Estruturas, 2010). Por exemplo, no Daucus carota (Apiaceae) «cenoura» o câmbio,<br />

além de xilema e floema, produz uma grande massa de parênquima de reserva. Na Beta vulgaris (Amaranthaceae)<br />

«beterraba» formam-­‐se numerosos câmbios concêntricos que dão origem à estrutura tecidular anelar característica<br />

da raiz tuberosa desta espécie.<br />

As monocotiledóneas, incluin<strong>do</strong> grande parte das monocotiledóneas com crescimento secundário caulinar, não<br />

apresentam crescimento secundário ao nível da raiz, consequentemente a epiderme persiste durante toda a vida da<br />

raiz ou é substituída, como se referiu anteriormente, por uma exoderme com células de parede espessada com<br />

suberina (Rudal, Anatomy of Flowering Plants. An Introduction to Structure and Development, 2007). O meristema<br />

de espessamento secundário das monocotiledóneas com crescimento secundário por vezes estende-­‐se à raiz.<br />

Tipos de radicação<br />

4.2.3. Aspectos gerais da morfologia externa da raiz<br />

Entende-­‐se por sistema radicular o conjunto de todas as raízes de uma planta. A raiz dita primária ou principal<br />

tem origem na radícula (= raiz embrionária) e funde-­‐se com o caule no colo (vd. Organização <strong>do</strong> corpo das plantas-­‐<br />

com-­‐semente). Em algumas espécies, sobretu<strong>do</strong> entre as monocotiledóneas, a raiz primária atrofia-­‐se rapidamente e<br />

é substituída por raízes adventícias. Distinguem-­‐se assim <strong>do</strong>is tipos de radicação: aprumada e fasciculada (Figura 19).<br />

No sistema radicular apruma<strong>do</strong> (= sistema radicular magnolioide) diferenciam-­‐se uma raiz principal de origem<br />

embrionária lateralmente ramificada, um grande número de raízes espessas e, em oposição ao sistema radicular<br />

fascicula<strong>do</strong>, poucas raízes finas e pelos radiculares. A baixa relação entre o volume de raízes com capacidade de<br />

absorção e o volume total <strong>do</strong> sistema radicular é compensada por associações micorrízicas. Sistema radicular<br />

característico das gimnospérmicas e da grande maioria das dicotiledóneas s.l.<br />

O sistema radicular fascicula<strong>do</strong> (= sistema radicular graminoide) é mais<br />

homogéneo: não apresenta uma raiz principal sen<strong>do</strong> constituí<strong>do</strong> por raízes<br />

adventícias semelhantes entre si, finas, delicadas, com abundantes pelos<br />

radiculares. A relação entre o volume de raízes com capacidade de absorção e<br />

o volume total <strong>do</strong> sistema radicular é elevada. Os primórdios radiculares<br />

adventícios diferenciam-­‐se nos caules (raízes caulógenas), regra geral em nós<br />

subterrâneos ou aéreos e próximos da superfície <strong>do</strong> solo, a partir de células<br />

próximas <strong>do</strong> sistema vascular (vd. Ramificação das raízes). A diferenciação de<br />

raízes adventícias na base de folhas é menos frequente. A importância das<br />

raízes adventícias nas monocotiledóneas explica por que razão muitas delas<br />

podem ser transplantadas com sistemas radiculares muito danifica<strong>do</strong>s (e.g.<br />

cebola e palmeiras). Admite-­‐se que este tipo de sistema radicular é mais<br />

eficiente <strong>do</strong> que a radicação aprumada (e por isso competitivamente<br />

vantajoso) na captura de água e nutrientes das camadas superficiais <strong>do</strong> solo,<br />

contu<strong>do</strong> é menos adequa<strong>do</strong> a ancorar plantas de grande dimensão ao solo e a<br />

absorver a água retida em camadas profundas <strong>do</strong> solo. Sistema radicular<br />

característico das monocotiledóneas e de algumas dicotiledóneas s.l. (e.g.<br />

Ranunculus [Ranunculaceae] «ranúnculos»).<br />

Figura 19. Tipos de sistema<br />

radicular. Sistema radicular<br />

apruma<strong>do</strong> de Malva (Malvaceae)<br />

«malvas» e sistema radicular<br />

fascicula<strong>do</strong> de uma Poaceae<br />

(Coutinho, 1898).<br />

Em algumas árvores (e.g. Salix [Salicaceae] «salgueiros») a raiz principal é tão rudimentar que a arquitetura <strong>do</strong><br />

sistema radicular se aproxima <strong>do</strong> modelo fascicula<strong>do</strong>. As plantas obtidas por estaca, ou por outros méto<strong>do</strong>s de<br />

propagação vegetativa que impliquem a formação de raízes adventícias, apresentam também um sistema radicular<br />

de morfologia intermédia.


45 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Direção e estrutura <strong>do</strong> sistema radicular<br />

A raiz principal de um sistema radicular apruma<strong>do</strong> possui um geotropismo positivo: diz-­‐se que é profundante. O<br />

geotropismo característico da raiz principal não se mantém, todavia, em todas as raízes laterais de um sistema<br />

radicular apruma<strong>do</strong>. Quanto à direção, as raízes secundárias, e de ordem superior, podem ser profundantes, pouco<br />

profundantes ou plagiotrópicas (próximas da horizontalidade). A plagiotropia facilita a disseminação tridimensional<br />

das raízes pelo solo e maximiza o volume de solo explora<strong>do</strong>. As raízes de plantas lenhosas que progridem na<br />

horizontal próximo da superfície <strong>do</strong> solo têm direito a uma designação especial: raízes pastadeiras. Estas raízes são<br />

fundamentais na nutrição das plantas porque exploram as camadas superiores <strong>do</strong> solo (horizonte A), mais ricas em<br />

nutrientes – resultantes da deposição de resíduos orgânicos ou da aplicação de fertilizantes – e de maior atividade<br />

biológica. Por essa razão, as oliveiras e outras fruteiras crescem mais, e são mais produtivas, nos pomares não<br />

mobiliza<strong>do</strong>s <strong>do</strong> que nos pomares ciclicamente mobiliza<strong>do</strong>s (lavra<strong>do</strong>s ou escarifica<strong>do</strong>s).<br />

Nas monocotiledóneas as raízes secundárias, pelo menos as de maior dimensão, são geralmente profundantes.<br />

No arroz (Oryza sativa, Poaceae), a planta modelo <strong>do</strong>s geneticistas de cereais, foram identifica<strong>do</strong>s quatro tipos de<br />

raízes. A raiz primária (seminal) emerge da semente aquan<strong>do</strong> da germinação. Em seguida formam-­‐se raízes<br />

adventícias (pós-­‐embrionárias), primeiro no nó <strong>do</strong> coleóptilo, e depois noutros nós da base <strong>do</strong> caule. Tanto a raiz<br />

embrionária como as raízes adventícias apresentam um geotropismo positivo. A ramificação destas raízes dá origem<br />

a mais <strong>do</strong>is tipos de raízes: raízes laterais de crescimento indetermina<strong>do</strong> profundantes, e raízes laterais<br />

determinadas, curtas e de geotropismo indefini<strong>do</strong>.<br />

Situação e consistência<br />

A tipologia básica da situação e consistência das raízes está condensada no Quadro 10.<br />

Quadro 10. Situação e consistência<br />

Critério Tipo/descrição<br />

Situação Subterrâneas – se imersas no solo; tipo mais frequente<br />

Tipos de metamorfose<br />

Aquáticas – próprias de plantas aquáticas, i.e. de plantas que vivem submersas ou na superfície de<br />

massas de água livre;<br />

Aéreas – muito frequentes em lianas e em plantas epífitas, i.e. plantas não enraizadas no solo,<br />

suportadas por outras plantas<br />

Consistência Herbáceas – raízes tenras, delgadas e flexíveis<br />

Lenhosas – raízes lenhificadas e rijas<br />

Carnudas (= tuberosas) – de grande volume e ricas em água e substâncias de reserva<br />

4.2.4. Metamorfoses da raiz<br />

As raízes apresentam vários tipos de adaptações com funções especializadas, por vezes associáveis a habitats<br />

particulares (e.g. zonas húmidas, sapais e florestas tropicais). As metamorfoses da raiz (= tipos radiculares) mais<br />

frequentes estão descritas no Quadro 11 (Figuras 20 e 21).


46 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Quadro 11. Tipos de metamorfose da raiz (tipos de raízes)<br />

Tipo Descrição Exemplos<br />

Raízes trepa<strong>do</strong>ras Raízes adventícias, aéreas, geralmente adesivas, que<br />

auxiliam as plantas trepadeiras a aderirem aos seus<br />

suportes<br />

Raízes tuberosas Raízes de grande volume de forma cónica a fusiforme<br />

com <strong>função</strong> de reserva (vd. Raízes tuberosas)<br />

Haustórios<br />

(= raízes suga<strong>do</strong>ras)<br />

Raízes aéreas ou subterrâneas, próprias de plantas<br />

parasitas especializadas na penetração e extração de<br />

água e nutrientes <strong>do</strong>s seus hospedeiros<br />

Raízes contrácteis Raízes produzidas periodicamente; inicialmente<br />

alongam-­‐se em profundidade, depois contraem-­‐se,<br />

aumentan<strong>do</strong> de diâmetro, e puxam os órgãos<br />

caulinares para o solo; distinguem-­‐se das restantes<br />

raízes pelo maior diâmetro e pela superfície enrugada<br />

Pneumatóforos (=<br />

raízes respiratórias)<br />

Raízes<br />

estrangula<strong>do</strong>ras<br />

Raízes aéreas emitidas por espécies adaptadas a zonas<br />

húmidas tropicais, para facilitar as trocas gasosas entre<br />

o sistema radicular e a atmosfera; frequentes nas<br />

plantas de mangal<br />

Após a germinação da semente, as raízes<br />

estrangula<strong>do</strong>ras descem pelo troco ou suspendem-­‐se<br />

da copa <strong>do</strong>s hospedeiros até atingirem o solo; finda<br />

esta fase, as plantas aceleram o seu crescimento,<br />

competem com o hospedeiro pelos recursos<br />

ambientais e envolvem-­‐no com uma rede raízes que<br />

acabam por coalescer e estrangulá-­‐lo; este processo<br />

termina quan<strong>do</strong> a espécie estrangula<strong>do</strong>ra ocupa o<br />

espaço anteriormente preenchi<strong>do</strong> pelo hospedeiro<br />

Raízes tabulares Raízes plagiotrópicas, com <strong>função</strong> de suporte, muito<br />

engrossadas na face oposta ao solo, geralmente<br />

emergentes à superfície nas árvores mais velhas;<br />

frequentes nas grandes árvores tropicais<br />

Raízes escora Raízes com <strong>função</strong> de suporte emitidas da base <strong>do</strong><br />

tronco e das pernadas; a Zea mays «milho-­‐graú<strong>do</strong>» e o<br />

Panicum milliaceum «milho-­‐miú<strong>do</strong>» emitem raízes<br />

adventícias anormalmente espessas a partir <strong>do</strong>s nós<br />

inferiores <strong>do</strong> caule, visíveis acima <strong>do</strong> solo,<br />

interpretáveis como raízes escora<br />

Velâmen<br />

(= velame)<br />

Consiste numa espessa epiderme multisseriada (com<br />

várias camadas de células), esponjosa, de células de<br />

paredes espessadas, mortas na maturidade,<br />

esbranquiçada quan<strong>do</strong> seca, que se mantém inchada e<br />

húmida por muito tempo quan<strong>do</strong> para de chover; tem<br />

por <strong>função</strong> a absorção de água e nutrientes e a<br />

proteção das camadas mais interna da raiz, onde se<br />

encontram os teci<strong>do</strong>s vasculares<br />

Hedera sp.pl. (Araliaceae) «heras» e<br />

várias espécies de Piper (Piperaceae);<br />

Daucus carota (Apiaceae) «cenoura»<br />

Orobanche (Orobanchaceae)<br />

«orobanca» e Cuscuta<br />

(Convolvulaceae)<br />

Frequentes em plantas bulbosas (e.g.<br />

Lilium [Liliaceae]), nas gramíneas e nas<br />

Arecaceae «palmeiras»<br />

Rizophora mangle (Rizophoraceae)<br />

«mangue-­‐vermelho» e Avicennia<br />

africana (Acanthaceae) «mangue-­‐<br />

branco»<br />

Raízes aéreas emitidas por algumas<br />

espécies tropicais de Ficus (Moraceae)<br />

«figueiras» de germinação epífita (na<br />

parte aérea <strong>do</strong> hospedeiro)<br />

Ceiba pentandra (Bombacoideae,<br />

Malvaceae) «sumaumeira»; também<br />

nas árvores mais velhas e maior<br />

dimensão de Ficus carica (Moraceae)<br />

«figueira»<br />

Pandanus (Pandanaceae) «pandanos»<br />

e Rizophora mangle (Rizophoraceae)<br />

«mangue-­‐vermelho»<br />

Comum em espécies epífitas tropicais,<br />

em particular das famílias Orchidaceae<br />

e Araceae


47 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

A<br />

C<br />

B<br />

! !<br />

Figura 20. Tipos de raiz. A) Dois nós com raízes escora em Panicum miliaceum (Poaceae). B) Raiz tabular e raízes escora<br />

(canto esquer<strong>do</strong> e la<strong>do</strong> direiro da imagem) de Ficus macrophylla (Moraceae). C) Pneumatóforos (raízes que emergem da<br />

água em torno da árvore) em Avicennia africana (Acanthaceae) «mangue-­‐branco» (foto da autoria <strong>do</strong>s alunos <strong>do</strong>s 12º<br />

ano da Escola Portuguesa de Luanda, 2007)<br />

Raízes tuberosas<br />

A B C<br />

Figura 21. Tipos de raiz. A) Raízes tuberoso-­‐aprumada de Daucus carota (Apiaceae) «cenoura» e tuberoso-­‐fasciculada<br />

Asphodelus (Asphodelaceae) «asfódelos». B) Duas plantas parasitas sem clorofila – Orobanche (Orobanchaceae)<br />

«orobanca» à esquerda e Cuscuta (Convolvulaceae) «cuscuta» à direita – a parasitar por intermédio de haustórios (não<br />

visíveis na Figura) os respectivos hospedeiros. C) Raízes aéreas trepa<strong>do</strong>ras de um ramo juvenil de Hedera helix<br />

(Araliaceae) «hera» (Coutinho, 1898).<br />

Entende-­‐se por tuberização das raízes o processo de engrossamento causa<strong>do</strong> pela acumulação de reservas<br />

(Figura 21). Consoante as espécies, e por vezes entre variedades da mesma espécie, a tuberização das raízes pode<br />

prolongar-­‐se até ao colo ou ao caule; e.g. prolonga-­‐se até ao caule na Brassica rapa (Brassicaceae) «nabo»,<br />

concretamente até ao hipocótilo, e a mais de um entrenó caulinar em algumas variedades de Beta vulgaris subsp.<br />

vulgaris (Amaranthaceae) «beterraba-­‐sacarina». As substâncias de reserva mais frequentes nas raízes tuberosas são<br />

o ami<strong>do</strong> (um polímero de glucose), a inulina (um polímero <strong>do</strong>mina<strong>do</strong> pela frutose) ou os açúcares solúveis<br />

(sobretu<strong>do</strong> sacarose, um dissacarídeo de glucose e frutose). Acumulam ami<strong>do</strong>, i.e. são raízes amiláceas, as raízes de<br />

Manihot esculenta (Euphorbiaceae) «mandioca» (21-­‐35% da MS) e de Ipomoea patatas (Convolvulaceae) «batata-­‐<br />

<strong>do</strong>ce» (67-­‐79% da MS); inulina, as raízes de Cichorium intybus var. sativum (Asteraceae) «chicória» (15-­‐20% da MS),<br />

<strong>do</strong> Tragopogon porrifolius (Asteraceae) «salsifi» (4-­‐11%) (Van Loo, Coussement, Leenheer, Hoebregs, & Smits, 1995)<br />

e <strong>do</strong>s inhames <strong>do</strong> género Dioscorea (Dioscoreaceae) (teores muito variáveis); sacarose, a raiz de beterraba-­‐sacarina


48 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

(os açucares atingem 60-­‐70% da MS). As raízes tuberosas são, geralmente, uma adaptação a habitats onde, chegada<br />

a estação favorável, é particularmente vantajoso iniciar no ce<strong>do</strong> o crescimento vegetativo (e.g. comunidades<br />

herbáceas de regiões com uma estação seca pronunciada) ou a produção de flores (e.g. pra<strong>do</strong>s e florestas<br />

caducifólias). A tuberização das raízes, frente à <strong>do</strong>s caules, tem em seu favor a proteção conferida pelo solo contra<br />

preda<strong>do</strong>res.<br />

As raízes ditas tuberoso-­‐aprumadas (= tuberculoso-­‐aprumadas) derivam de um sistema radicular apruma<strong>do</strong>; e.g.<br />

Daucus carota (Apiaceae) «cenoura». As raízes tuberoso-­‐fasciculadas (= tuberculoso-­‐fasciculadas) derivam de um<br />

sistema radicular fascicula<strong>do</strong>; e.g. Asphodelus (Asphodelaceae) «asfódelos». Vários géneros de orquídeas terrestres –<br />

e.g. Dactylorhiza, Ophrys e Orchis, to<strong>do</strong>s eles indígenas de Portugal continental – possuem, durante o perío<strong>do</strong> de<br />

floração, duas raízes tuberosas: uma delas, formada no ano anterior e de aspecto engelha<strong>do</strong>, suportou o arranque<br />

<strong>do</strong> crescimento <strong>do</strong> caule atual, a outra, mais lisa, com poucos meses de crescimento, sustentará o crescimento inicial<br />

<strong>do</strong> caule no ano seguinte.<br />

Micorrizas<br />

4.2.5. Modificações causadas por microrganismos<br />

As micorrizas são associações simbióticas radiculares entre fungos e plantas. As plantas recebem <strong>do</strong> fungo água,<br />

nutrientes, sobretu<strong>do</strong> fósforo, e proteção contra infecções radiculares fúngicas e toxinas presentes no solo (e.g.<br />

metais pesa<strong>do</strong>s). Os fungos, em troca, têm acesso aos produtos da fotossíntese da planta. 80% a 90% das plantas-­‐<br />

com-­‐semente têm micorrizas. As micorrizas são mais frequentes em solos pobres em nutrientes ou tóxicos. A<br />

dependência das plantas-­‐vasculares das associações simbióticas micorrízicas é variável: as Proteaceae não têm<br />

micorrizas, as Betula (Betulaceae) «bi<strong>do</strong>eiros» desenvolvem-­‐se adequadamente sem estas associações, o<br />

crescimento <strong>do</strong>s Quercus (Fagaceae) «carvalhos» e <strong>do</strong>s Pinus (Pinaceae) «pinheiros» é muito deprimi<strong>do</strong> sem<br />

micorrizas, as sementes de Orchidaceae «orquídeas» dependem de associações com fungos para germinar.<br />

Existem <strong>do</strong>is tipos principais de micorrizas: vesículo-­‐arbusculares (= en<strong>do</strong>micorrizas, micorrizas en<strong>do</strong>tróficas) e<br />

forma<strong>do</strong>ras de manto (= ectomicorrizas, micorrizas ectotróficas). As micorrizas de Ericaceae (e famílias<br />

evolutivamente próximas) e de Orchidaceae enquadram-­‐se em <strong>do</strong>is tipos especiais não desenvolvi<strong>do</strong>s no texto.<br />

Nas micorrizas vesículo-­‐arbusculares o fungo invade as células corticais das plantas e a maior parte da massa<br />

fúngica situa-­‐se no interior das raízes. Este tipo micorriza limita-­‐se a complementar o papel das raízes na absorção de<br />

nutrientes <strong>do</strong> solo, sen<strong>do</strong> as raízes infectadas semelhantes às raízes normais. Consomem 1-­‐15% <strong>do</strong> carbono fixa<strong>do</strong><br />

pelos hospedeiros e apresentam uma baixa especificidade fungo-­‐planta hospedeira. São mais frequentes em solos<br />

com matéria orgânica bem humificada. Os fungos das micorrizas vesículo-­‐arbusculares pertencem à divisão<br />

Glomeromycota (= Zygomycetes p.p.), uma das sete divisões atualmente reconhecidas no reino Fungi. Tipo<br />

<strong>do</strong>minante nas florestas tropicais, também presente nas gramíneas e muitas outras plantas herbáceas de óptimo<br />

tempera<strong>do</strong>.<br />

Nas micorrizas forma<strong>do</strong>ras de manto o fungo invade os espaços intercelulares <strong>do</strong> córtex radicular e forma uma<br />

fina camada de micélio, conhecida por manto micorrízico, que cobre a raízes finas. As raízes infectadas perdem os<br />

pelos radiculares e param de crescer; o fungo emite longos sistemas ramifica<strong>do</strong>s de hifas através <strong>do</strong> solo que<br />

substituem, quase por completo, as raízes infectadas na absorção de nutrientes. Consomem 15% ou mais <strong>do</strong><br />

carbono fixa<strong>do</strong> pelas plantas hospedeiras e demonstram uma grande especificidade fungo-­‐planta hospedeira. São<br />

mais frequentes em solos de matéria orgânica ácida e pouco humificada. Os fungos das micorrizas forma<strong>do</strong>ras de<br />

manto enquadram-­‐se nas divisões Basidiomycota, Ascomycota e Glomeromycota. Alguns cogumelos edíveis – e.g. ds<br />

géneos Lactarius e Boletus – são ectomicorrízicos. Tipo de micorriza presente em 90% das árvores temperadas e<br />

boreais.<br />

As plantas-­‐terrestres estabeleceram relações simbióticas com fungos Glomeromycota num momento muito<br />

recua<strong>do</strong> da sua evolução. As en<strong>do</strong>micorrizas são a condição ancestral da micorrizia; provavelmente auxiliaram as<br />

primeiras plantas-­‐terrestres a conquistar a terra emersa (Smith & Read, 2008). As ectomicorrizas e as<br />

en<strong>do</strong>ssimbioses com bactérias fixa<strong>do</strong>ras de azoto são em termos evolutivos mais tardias.


49 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Simbioses com bactérias diazotróficas<br />

O azoto é o macronutriente mais escasso e que mais<br />

condiciona a produtividade vegetal nos agroecossistemas e nos<br />

ecossistemas naturais. Para fazer face a esta limitação alguns<br />

grupos de plantas-­‐vasculares conseguiram estabelecer relações<br />

simbióticas com bactérias fixa<strong>do</strong>ras de azoto (= bactérias<br />

diazotróficas), macromorfologicamente expressas a nível<br />

radicular pela formação de nódulos radiculares (= nódulos<br />

bacterianos) 30 (Figura 22). As plantas-­‐com-­‐flor com simbiontes<br />

fixa<strong>do</strong>res de azoto forma<strong>do</strong>res de nódulos são quase exclusivas<br />

no cla<strong>do</strong> das rosidas I. As Gunneraceae, uma família basal das<br />

eudicotiledóneas superiores (vd. vol. III), são a única exceção.<br />

Evoluíram depois das micorrizas, no Mesozoico.<br />

As simbioses mais frequentes na Natureza desenvolvem-­‐se<br />

entre plantas não leguminosas e actinomicetas <strong>do</strong> género<br />

Frankia. Os seus nódulos, de assinalável tamanho (2-­‐3 cm de<br />

diâmetro), observam-­‐se com facilidade, por exemplo, em raízes<br />

de Alnus glutinosa (Betulaceae) «amieiro», Myrica faya<br />

(Myricaceae) «samouco», Casuarina (Casuarinaceae)<br />

«casuarinas» e Hippophae (Elaeagnaceae). As simbioses mais<br />

conhecidas, mais estudadas e de maior importância económica<br />

desenvolvem-­‐se entre alfa-­‐proteobactérias e plantas da família das Fabaceae. Na associação entre a bactéria azul-­‐<br />

esverdeada fixa<strong>do</strong>ra de azoto Anabaena azollae e as ‘pteridófitas’ aquáticas <strong>do</strong> género Azolla não se diferenciam<br />

nódulos. A Azolla filiculoides é uma temível invasora em águas paradas ricas em nutrientes em Portugal. Este e<br />

outras espécies são de há muito intensivamente utilizadas para incorporar azoto nos sistemas de agricultura de arroz<br />

em campos alaga<strong>do</strong>s na África e na Ásia (Roger, 1996).<br />

90% das plantas da família das Fabaceae estabelecem simbioses com pelo menos 12 géneros de alfa-­‐<br />

proteobactérias fixa<strong>do</strong>ras de azoto (e.g. Rhizobium, Mesorhizobium, Sinorhizobium e Bradyrhizobium). Num primeiro<br />

estádio da infecção bacteriana das raízes, os rizóbios 31 penetram nas plantas através <strong>do</strong>s pelos radiculares. Uma vez<br />

estabeleci<strong>do</strong>s estimulam a atividade meristemática e a proliferação de células <strong>do</strong> córtex ou <strong>do</strong> periciclo. Os nódulos<br />

têm uma forma esférica ou mais ou menos alongada, similar a uma raiz lateral curta e espessa. Quan<strong>do</strong> funcionais,<br />

após esmagamento, exibem uma cor rosada causada por uma substância quimicamente próxima da hemoglobina, a<br />

leghemoglobina. Os simbiontes bacterianos localizam-­‐se na zona mais central <strong>do</strong>s nódulos. Reconhecem-­‐se <strong>do</strong>is<br />

tipos de nódulos entre as Fabaceae: nódulos determina<strong>do</strong>s – de forma esférica, com alguns dias a pouca semanas de<br />

duração; nódulos indetermina<strong>do</strong>s – de forma alongada, com vários meses de duração, alongan<strong>do</strong>-­‐se à custa de um<br />

meristema apical.<br />

4.2.6. As raízes das árvores<br />

A B<br />

Figura 22. Nódulos. A) Nódulos indetermina<strong>do</strong>s<br />

em Trifolium (Fabaceae). B) Azolla pinnata subsp.<br />

africana (Azollaceae) em mosaico com folhas<br />

emergentes (de 4 folíolos) de Marsilea<br />

coromandeliana (Marsileaceae); n.b. a simbiose<br />

estabelecida entre a A. pinnata subsp. africana e a<br />

bactéria azul-­‐esverdeada Anabaena azollae é<br />

determinante na produtividade <strong>do</strong> arroz na Guiné-­‐<br />

Bissau (foto: Gabú, Guiné-­‐Bissau).<br />

Tradicionalmente, admite-­‐se que a estrutura <strong>do</strong> sistema radicular das árvores reflete, de algum mo<strong>do</strong>, a<br />

estrutura da copa: as raízes pouco ultrapassam a projeção vertical da copa e ocupam homogeneamente o solo em<br />

profundidade. Na realidade, as raízes das árvores acumulam-­‐se nas camadas superficiais <strong>do</strong> solo e estendem-­‐se<br />

muito para lá da projeção da copa (4 a 7 vezes o raio da copa) (Figura 23). Nos solos mais espessos as árvores<br />

emitem raízes profundantes (em maior número em solos pouco compactos) até encontrarem algum imperme, água<br />

30 Nem todas as relações simbióticas com bactérias diazotróficas formam nódulos. Por exemplo, bactérias fixa<strong>do</strong>ras de azoto <strong>do</strong><br />

género Burkholderia foram detectadas em Zea mays «milho-­‐graú<strong>do</strong>» e Saccharum officinarum «cana-­‐de-­‐açúcar», duas plantas<br />

cultivadas da família das Poaceae «gramíneas» (Perin, et al., 2006).<br />

31 O vocábulo rizóbio, num senti<strong>do</strong> estrito, refere-­‐se apenas às bactérias <strong>do</strong> género Rhizobium. Na bibliografia tem geralmente um<br />

senti<strong>do</strong> mais lato sen<strong>do</strong> aplica<strong>do</strong> às espécies capazes de nodular as raízes das leguminosas e fixar azoto atmosférico <strong>do</strong> género<br />

Rhizobium, ou de géneros aparenta<strong>do</strong>s. Recentemente, foram isoladas em leguminosas bactérias não pertencentes aos grupos<br />

tradicionais de alfa-­‐proteobacterias fixa<strong>do</strong>ras de azoto (Willems, 2006).


50 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

ou atmosferas <strong>do</strong> solo demasia<strong>do</strong> pobres em<br />

oxigénio. As raízes profundantes atingem 1-­‐2<br />

m de profundidade; nos solos com<br />

características físicas mais favoráveis (menos<br />

compactos e mais areja<strong>do</strong>s) atingem os 3-­‐5 m<br />

de profundidade (Thomas, 2000). Para<br />

facilitar a ancoragem ao solo, a maioria das<br />

árvores desenvolve uma rede complexa de<br />

raízes laterais mais ou menos horizontais,<br />

rígidas e de grande espessura na proximidade<br />

<strong>do</strong> colo, que a poucos metros da projeção da<br />

copa se assemelham a cordas. Estas raízes<br />

ramificam-­‐se, sobrepõem-­‐se, enxertam-­‐se<br />

umas nas outras, envolvem grandes pedras e<br />

penetram fissuras forman<strong>do</strong> uma estrutura<br />

sólida de grande resistência à tração. A<br />

enxertia radicular é um fenómeno frequente<br />

entre indivíduos vizinhos da mesma espécie.<br />

4.3. Caule<br />

Nas plantas-­‐com-­‐semente a formação <strong>do</strong> caule inicia-­‐se com a germinação da semente. À medida que a planta<br />

cresce e se desenvolve, novos caules são gera<strong>do</strong>s a partir de outros de ordem inferior. Pontualmente, os caules têm<br />

origem em raízes (pôlas radiculares e rebentos de raiz). Caules vigorosos diferencia<strong>do</strong>s de raízes são utiliza<strong>do</strong>s na<br />

propagação de algumas plantas lenhosas (e.g. Salix [Salicaceae] «salgueiros»). A diferenciação de caules a partir de<br />

folhas é muito rara na natureza. As plantas sem caules aparentes dizem-­‐se acaules.<br />

Os caules são entendi<strong>do</strong>s como eixos quan<strong>do</strong> nele se inserem, de forma hierarquizada, outros elementos, e.g. o<br />

tronco (eixo primário das árvores) relativamente aos ramos, estes relativamente às folhas, o pedúnculo de uma<br />

inflorescência relativamente aos pedicelos das flores, etc. De acor<strong>do</strong> com a ordem de inserção reconhecem-­‐se eixos<br />

principais (= primários), secundários, etc. O mesmo raciocínio foi já anteriormente aplica<strong>do</strong> às raízes.<br />

4.3.1. Funções <strong>do</strong> caule<br />

A B<br />

Figura 23. As raízes das árvores. A) Modelo tradicional (em cima) e<br />

estrutura real <strong>do</strong>s sistema radicular (em baixo) das árvores (Thomas,<br />

2000). B) Rede de raízes laterais, mais ou menos horizontais, com a<br />

<strong>função</strong> de ancorar a árvore ao solo (Thomas, 2000).<br />

O caule desempenha as cinco grandes funções: expor as folhas à luz; expor as flores aos agentes poliniza<strong>do</strong>res;<br />

transportar água e substâncias nutritivas entre a raiz e as folhas (em ambos os senti<strong>do</strong>s); armazenar substâncias de<br />

reserva; realizar a fotossíntese nos caules não lenhosos com clorofila. A presença de folhas e, concomitantemente,<br />

de nós são as características macromorfológicas mais marcantes <strong>do</strong>s caules, que permitem a sua diferenciação<br />

imediata das raízes.<br />

4.3.2. Anatomia <strong>do</strong> caule das plantas-­‐com-­‐semente<br />

O caule primário é forma<strong>do</strong> pelos meristemas apicais primários, nas monocotiledóneas por regra auxilia<strong>do</strong>s pelos<br />

meristemas de espessamento primário (vd. Os meristemas). A organização <strong>do</strong>s teci<strong>do</strong>s no caule primário é mais<br />

complexa <strong>do</strong> que na raiz porque o caule suporta folhas (e as respetivas gemas axilares) e, por isso, tem que<br />

compreender feixes vasculares (traços) para as abastecer de nutrientes e delas drenar os produtos da fotossíntese.<br />

Como se referiu a respeito da raiz, com o tempo, a estrutura interna <strong>do</strong>s caules e raízes secundárias é idêntica.


51 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Teci<strong>do</strong>s e meristemas<br />

4.3.2.1. Estrutura primária<br />

Uma vez que a estrutura e nomenclatura <strong>do</strong>s meristemas e teci<strong>do</strong>s caulinares foram abordadas, com algum<br />

detalhe, no ponto Os teci<strong>do</strong>s das plantas vasculares importa apenas recordar aqui que o meristema apical caulinar,<br />

ao contrário <strong>do</strong> que sucede na raiz, se caracteriza pela formação reiterada de entrenós e folhas nos seus flancos.<br />

Estes apêndices laterais são diferencia<strong>do</strong>s a intervalos regulares de tempo designa<strong>do</strong>s por plastocronos. Depois da<br />

diferenciação floral o meristema apical caulinar passa a diferenciar peças florais, em vez de folhas (vd. Os<br />

meristemas).<br />

Num corte transversal de um caule primário distinguem-­‐se <strong>do</strong> exterior para o interior, as seguintes estruturas:<br />

epiderme, córtex (primário) e cilindro central.<br />

Epiderme e córtex<br />

A epiderme <strong>do</strong> caule primário tem menos<br />

estomas <strong>do</strong> que a epiderme foliar e rompe-­‐se, e<br />

exfolia, mal se inicia o funcionamento <strong>do</strong> câmbio<br />

nas plantas com crescimento secundário. O córtex<br />

primário caulinar corresponde à porção de teci<strong>do</strong><br />

fundamental localiza<strong>do</strong> entre a epiderme e a região<br />

vascular. Ao contrário da raiz, nos caules primários<br />

o córtex está ausente (na maioria das<br />

monocotiledóneas), ou é menos espesso <strong>do</strong> que o<br />

cilindro central e a sua fronteira pouco nítida<br />

(condição característica das gimnospérmicas e<br />

dicotiledóneas).<br />

Quan<strong>do</strong> presente, no córtex primário caulinar é<br />

frequente a diferenciação, por debaixo da<br />

epiderme, de uma hipoderme (vd. Meristemas e<br />

teci<strong>do</strong>s da raiz) com várias células de espessura,<br />

geralmente enrijecida com abundante colênquima.<br />

O colênquima é profuso sobretu<strong>do</strong> nos caules<br />

angulosos, imediatamente por dentro da epiderme<br />

(e.g. caules de Lamiaceae). Nas gramíneas, e outras<br />

monocotiledóneas, o teci<strong>do</strong> de sustentação<br />

subepidérmico é constituí<strong>do</strong> por feixes, por vezes<br />

contínuos e em anel, de fibras de esclerênquima.<br />

Esta zona tecidular leva também o nome de<br />

hipoderme. As células parenquimatosas mais<br />

externas <strong>do</strong> córtex primário são frequentemente<br />

fotossintéticas: constituem um clorênquima e<br />

contribuem para a cor verde da maioria <strong>do</strong>s caules<br />

primários. Dispersos pelo parênquima cortical<br />

surgem, por exemplo, escleritos, fibras de<br />

esclerênquima, feixes de colênquima, e células ou<br />

canais secretores (e.g. de látex na Euphorbiaceae).<br />

Nas plantas aquáticas desenvolve-­‐se um<br />

aerênquima no córtex caulinar, assim como no<br />

A<br />

Figura 24. Anatomia <strong>do</strong> caule primário das dicotiledóneas<br />

(corte transversal). A) Caule primário de Ricinus communis<br />

(Euphorbiaceae) «rícino» – a, epiderme; b, córtex; c, bainha<br />

en<strong>do</strong>dermóide com células ricas em grãos de ami<strong>do</strong>; d, células<br />

parenquimatosas; g, parênquima; h, metaxilema; i, protoxilema;<br />

k, parênquima medular (Belzung, 1900). B) Representação<br />

esquemática <strong>do</strong> caule primário de rícino no momento da<br />

diferenciação <strong>do</strong> câmbio vascular (comparar com figura A) – a,<br />

epiderme; b, córtex; c, bainha en<strong>do</strong>dermóide; células de<br />

parênquima; f, floema; g, câmbio; h raio medular; f, xilema; m,<br />

medula (Belzung, 1900). C) Caule de Cannabis sativa<br />

(Cannabaceae) «cânhamo» com evidências de crescimento<br />

secundário – a, epiderme; b fibra de esclerênquima corticais; d,<br />

bainha en<strong>do</strong>dermóide; f, fibras de esclerênquima; g, floema; h,<br />

câmbio; i, xilema (Belzung, 1900).<br />

córtex radicular (vd. Teci<strong>do</strong>s definitivos simples). Com o tempo as paredes das células parenquimatosas corticais<br />

podem lenhificar-­‐se, i.e. acumular lenhina nas suas paredes secundárias.<br />

B<br />

C


52 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

No interior <strong>do</strong> caule das dicotiledóneas o córtex contacta directamente com um anel mais ou menos defini<strong>do</strong> de<br />

feixes vasculares (cilindro vascular), ou é delimita<strong>do</strong> por uma camada regular de células ditas en<strong>do</strong>dermóides<br />

(semelhantes às células da en<strong>do</strong>derme), desenvolven<strong>do</strong>-­‐se uma bainha en<strong>do</strong>dermóide 32 (Rudal, Anatomy of<br />

Flowering Plants. An Introduction to Structure and Development, 2007). A bainha de ami<strong>do</strong> é uma bainha<br />

en<strong>do</strong>dermóide de células ricas em ami<strong>do</strong>. Em algumas plantas as células da bainha en<strong>do</strong>dermóide chegam a<br />

desenvolver tiras de Caspary. Ainda nas dicotiledóneas, na interface córtex – cilindro vascular pode desenvolver-­‐se<br />

um cilindro contínuo de fibras de esclerênquima, com origem no meristema fundamental (fibras perivasculares) ou<br />

no procâmbio (fibras floémicas primárias), que genericamente se podem designar por fibras extraxilémicas primárias<br />

(vd. Colênquima e esclerênquima) (Esau, 1977).<br />

Cilindro central<br />

O cilindro central <strong>do</strong> caule primário é composto por: i) feixes vasculares duplos (com floema e xilema acopla<strong>do</strong>s)<br />

discretos, organiza<strong>do</strong>s (gimnospérmicas e dicotiledóneas), ou não (monocotiledóneas), num anel de teci<strong>do</strong> vascular<br />

(cilindro vascular) mais ou menos evidente, de contorno análogo ao contorno exterior <strong>do</strong> caule; ii) medula. No caule<br />

não ocorre en<strong>do</strong>derme, nem periciclo, duas camadas celulares características da raiz. A medula pode estar<br />

preenchida por teci<strong>do</strong> fundamental (e.g. parênquima de reserva ou aerênquima) ou estar ausente (na maioria das<br />

monocotiledóneas). Muitas gramíneas têm um caule fistuloso, oco por dentro.<br />

Através de cortes transversais sucessivos ao longo <strong>do</strong>s entrenós constata-­‐se que os feixes vasculares desenham<br />

espirais caule acima. Em cortes longitudinais ou tangenciais<br />

comprova-­‐se ainda que os feixes vasculares, quaisquer que seja o<br />

seu tipo, possuem ramificações laterais que divergem em direção<br />

às folhas (= traços foliares), gemas ou ramificações (caules), ou<br />

ao encontro de outros feixes vasculares estabelecen<strong>do</strong> uma<br />

densa rede.<br />

A disposição <strong>do</strong>s feixes vasculares no caule primário tem uma<br />

forte correlação filogenética, sobretu<strong>do</strong> na dicotomia<br />

monocotiledóneas – eudicotiledóneas. A sua descrição tem três<br />

componentes: i) a arrumação <strong>do</strong> xilema e <strong>do</strong> floema nos feixes<br />

vasculares; ii) a disposição espacial <strong>do</strong>s feixes vasculares nos<br />

entrenós (anatomia entrenodal); ii) disposição <strong>do</strong>s feixes<br />

vasculares nos nós (anatomia nodal).<br />

Os tipos de feixes vasculares mais relevantes no caule<br />

primário das plantas-­‐com-­‐semente são: i) feixes colaterais – com<br />

um feixe de xilema e outro de floema contíguos (condição mais<br />

frequente nas gimnospérmicas e dicotiledóneas); ii) feixes<br />

bicolaterais – <strong>do</strong>is feixes de floema a flanquear um feixe de<br />

xilema (tipo comum nas apocináceas, cucurbitáceas e<br />

solanáceas); iii) feixes concêntricos – floema ao centro envolvi<strong>do</strong><br />

por xilema (feixes anfivasais; tipo frequente nas<br />

monocotiledóneas, e.g. liliáceas e ciperáceas), ou floema a<br />

circundar o xilema (feixes anficrivais).<br />

Nos entrenós <strong>do</strong>s caules primários das dicotiledóneas (e das<br />

gimnospérmicas) os feixes vasculares são colaterais ou<br />

bicolaterais, abertos (com câmbio vascular entre o xilema e o<br />

floema), em número limita<strong>do</strong>, de tamanho uniforme e dispostos<br />

num anel concêntrico, o cilindro vascular (Figura 24). O floema é<br />

constituí<strong>do</strong> por elementos crivosos, células companheiras e<br />

células parenquimatosas. Os feixes são separa<strong>do</strong>s por assentadas<br />

32 Muitos autores não coíbem de designar por en<strong>do</strong>derme esta camada celular.<br />

Figura 25. Anatomia <strong>do</strong> caule primário das<br />

monocotiledóneas (corte transversal). A) e B)<br />

Caule primário de Zea mays (Poaceae) «milho» –<br />

a, metaxilema; b, protoxilema; c, células<br />

companheiras; d, elementos crivosos; c, lacuna; f,<br />

fibras de esclerênquima organizadas numa<br />

bainha; g, parênquima. N.b. feixes fibrovasculares<br />

dispersos numa matriz de parênquima na figura A<br />

(Sass, 1951).


53 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

de células parenquimatosas, conheci<strong>do</strong>s como raios medulares.<br />

Nas monocotiledóneas os feixes vasculares são de tipo colateral, bicolateral ou anfivasal, fecha<strong>do</strong>s, numerosos,<br />

de tamanho variável e geralmente envolvi<strong>do</strong>s por uma bainha de esclerênquima (Figura 25 A), constituin<strong>do</strong> feixes<br />

fibrovasculares. Estes feixes apresentam-­‐se dispersos numa matriz de teci<strong>do</strong> fundamental, embora mais<br />

concentra<strong>do</strong>s em direção à periferia (Figura 25 A). O floema é unicamente composto por elementos crivosos e<br />

células companheiras (Figura 25 B). Nas monocotiledóneas, não é clara a diferenciação <strong>do</strong>s raios medulares e, na<br />

maior parte das espécies, como se referiu, <strong>do</strong> córtex, <strong>do</strong> cilindro vascular e da medula (Figura 25 A). Não cabe neste<br />

<strong>do</strong>cumento explorar as muitas exceções a estes <strong>do</strong>is modelos, genéricos, de anatomia entrenodal de dicotiledóneas<br />

e monocotiledóneas.<br />

Na maior parte das plantas com megafilos 33 (vd. Teoria telomática de W. Zimmermann), na vizinhança <strong>do</strong>s nós<br />

destacam-­‐se um ou mais feixes vasculares – os traços foliares (= rastros foliares) – que arqueiam em direção, e se<br />

conectam a um órgão de natureza foliar. Em cortes histológicos transversais na proximidade <strong>do</strong>s nós observa-­‐se uma<br />

alteração na disposição <strong>do</strong>s feixes vasculares característica <strong>do</strong>s entrenós. Designa-­‐se por lacuna foliar o hiato no<br />

cilindro vascular preenchi<strong>do</strong> com parênquima causa<strong>do</strong> pela divergência <strong>do</strong>s traços. Por cima (em posição distal) <strong>do</strong>s<br />

traços foliares divergem, geralmente em número de <strong>do</strong>is, os traços das gemas, ou <strong>do</strong>s ramos jovens resultantes da<br />

ativação das gemas. A anatomia nodal tem uma grande consistência taxonómica e filogenética. O seu estu<strong>do</strong> pode<br />

ser considera<strong>do</strong> um tema avança<strong>do</strong> de anatomia vegetal.<br />

4.3.2.2. Estrutura secundária<br />

Espessamento secundário nas gimnospérmicas e dicotiledóneas<br />

A iniciação <strong>do</strong> câmbio por entre os feixes primários de floema e xilema, mais concretamente entre o metafloema<br />

e o metaxilema, marca o início <strong>do</strong> crescimento secundário nos caules de gimnospérmicas e dicotiledóneas (recorde-­‐<br />

se que as monocotiledóneas não têm câmbio). Os primeiros estádios <strong>do</strong> crescimento secundário são fáceis de<br />

confirmar em cortes histológicos transversais pela presença de xilema secundário e, em particular, de raios xilémicos<br />

(vd. mais adiante) (Figura 26). O crescimento secundário inuma as células <strong>do</strong> proto e <strong>do</strong> metaxilema no interior <strong>do</strong>s<br />

órgãos cilíndricos e as suas funções acabam por ser substituídas pelos novos elementos traqueais diferencia<strong>do</strong>s pelo<br />

cambio vascular. Tanto nas raízes como nos caules secundários jovens o xilema primário é identificável pela ausência<br />

de raios xilémicos, e pela persistência de feixes de xilema radialmente alonga<strong>do</strong>s (no centro da raiz), ou de pequenas<br />

protuberâncias de xilema primário na margem da medula (no caule) (A. Carvalho, com. pessoal). O reconhecimento<br />

macroscópico da posição anatómica <strong>do</strong> câmbio tem um enorme interesse prático em agronomia. Nas enxertias,<br />

sejam elas de encosto, garfo ou borbulha (vd. Reprodução assexuada, vol. III), procura-­‐se um contacto íntimo entre o<br />

câmbio <strong>do</strong> enxerto e <strong>do</strong> cavalo. O sucesso das enxertias depende <strong>do</strong> desenvolvimento de um câmbio e,<br />

implicitamente, de um sistema vascular comuns.<br />

No câmbio das gimnospérmicas e angiospérmicas reconhecem-­‐se <strong>do</strong>is tipos de células: iniciais fusiformes e<br />

iniciais <strong>do</strong>s raios, as primeiras axialmente alongadas, as segundas sem uma dimensão maior, ambas dividin<strong>do</strong>-­‐se<br />

periclinalmente com intensidade. Ciclicamente ocorrem divisões anticlinais radiais de mo<strong>do</strong> a que o câmbio possa<br />

acompanhar o aumento de diâmetro <strong>do</strong> caule (vd. A célula vegetal). As iniciais fusiformes formam o chama<strong>do</strong><br />

sistema axial, constituí<strong>do</strong> por células axialmente alongadas de elementos traqueais (traqueí<strong>do</strong>s, vasos lenhosos,<br />

elementos crivosos ou células crivosas), células albuminosas (nas gimnospérmicas), células companheiras (nas<br />

angiospérmicas), fibras xilémicas e floémicas, e parênquima axial (Figura 26). As iniciais <strong>do</strong>s raios formam o sistema<br />

radial: bandas estreitas radiais de células parenquimatosas, conhecidas por raios vasculares ou raios medulares<br />

secundários (ing. vascular rays, secondary medullary rays), tanto no xilema como no floema. Os raios xilémicos<br />

(associa<strong>do</strong>s ao xilema, ing. xylem rays) e os raios floémicos (intercala<strong>do</strong>s no floema, ing. phloem rays) são<br />

necessariamente contíguos. O parênquima <strong>do</strong> xilema, seja ele axial ou radial, designa-­‐se por parênquima lenhoso. O<br />

parênquima lenhoso radial pode ser unisseria<strong>do</strong>, se tiver uma célula de espessura num corte tangencial, ou<br />

33<br />

Nas plantas vasculares com microfilos (licopodiidas) e nos Equisetum (equisetidas, já com megafilos) o cilindro central <strong>do</strong> caule<br />

primário é contínuo.


54 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

plurisseria<strong>do</strong>s se ostentar mais de duas células de espessura. Nas gimnospérmicas, além <strong>do</strong> parênquima lenhoso,<br />

fazem parte <strong>do</strong>s raios xilémicos traqueí<strong>do</strong>s transversais.<br />

A B<br />

Figura 26. Estrutura secundária <strong>do</strong> caule. A) Caule secundário de Spartium juncem (Fabaceae) ainda com<br />

epiderme primária – a, parênquima cortical clorofilino; b, lentícula; c, esclerênquima; d, epiderme; e, parênquima<br />

cortical; f, floema; g, câmbio; h, xilema secundário; i, parênquima medular: j, lacuna central (Palhinha & Cunha,<br />

1939). B) Cortes transversal, tangencial e radial de um tronco de angiospérmica (Ferreirinha, 1958)<br />

A produção de teci<strong>do</strong> vascular secundário oculta rapidamente a estrutura primária. O floema secundário<br />

comporta, como o floema primário, elementos crivosos (ou células crivosas) e células companheiras (ou células<br />

albuminosas), frequentemente acompanhadas por fibras floémicas e parênquima axial floémico. A massa e o volume<br />

<strong>do</strong> floema secundário são residuais quan<strong>do</strong> compara<strong>do</strong>s com o xilema secundário. O crescimento secundário é<br />

<strong>do</strong>mina<strong>do</strong> pelos elementos traqueais <strong>do</strong> xilema secundário (= lenho). Como os traqueí<strong>do</strong>s e os vasos lenhosos são<br />

constituí<strong>do</strong>s por células mortas, qualquer árvore combina um espesso e mecanicamente rígi<strong>do</strong> “core” de teci<strong>do</strong><br />

morto, grosso mo<strong>do</strong> com a forma de um cone, com um delga<strong>do</strong> revestimento de células vivas (câmbio + floema +<br />

vários tipos de parênquima e alguns tipos celulares de menor importância), exteriormente protegi<strong>do</strong> por um<br />

riti<strong>do</strong>ma.<br />

Nas madeiras de árvores de climas tempera<strong>do</strong>s e mediterrânicos, e nas áreas tropicais com estação seca o<br />

câmbio têm uma atividade sazonal: no início da estação de crescimento produz células xilémicas de paredes mais<br />

finas e de maior diâmetro (lenho de início de estação, inicial ou de Primavera), e no final da estação células de<br />

paredes mais espessas e de menor diâmetro (lenho de fim de estação, final ou de Outono). Os <strong>do</strong>is tipos de lenho<br />

depõem-­‐se sob a forma de bandas (anéis), em muitas espécies visíveis à vista desarmada, sen<strong>do</strong> o lenho de<br />

Primavera mais claro que o de Outono. Nos anos de Primavera seca a estrutura <strong>do</strong> lenho de Primavera aproxima-­‐se<br />

da <strong>do</strong> Outono. O somatório destas duas camadas constitui um anel de crescimento (= camada de crescimento).<br />

A organização espacial de os tipos celulares produzi<strong>do</strong>s pelo câmbio tem um grande valor diagnóstico na<br />

identificação microscópica de madeiras (Ferreirinha, 1958). Nas gimnospérmicas o lenho é constituí<strong>do</strong> apenas por<br />

traqueí<strong>do</strong>s (excepto Gnetidae) e os raios são muito estreitos. Nas espécies com resina – as resinosas na gíria silvícola<br />

– desenvolvem-­‐se canais de resina por entre os traqueí<strong>do</strong>s. Os traqueí<strong>do</strong>s transversais assim como os canais de<br />

resina são exclusivos das gimnospérmicas. Ao invés das árvores angiospérmicas, nas gimnospérmicas o lenho de<br />

Primavera é mais espesso <strong>do</strong> que o lenho de Outono. A estrutura das madeiras das folhosas, i.e. das árvores<br />

angiospérmicas, envolve arranjos muito varia<strong>do</strong>s de vasos lenhosos, traqueí<strong>do</strong>s e vários tipos de parênquima axial e<br />

radial que não cabe aqui aprofundar. Um padrão que se repete, porém, é a redução <strong>do</strong> número e diâmetro <strong>do</strong>s vasos<br />

lenhosos ao longo da estação de crescimento. Na terminologia silvícola é habitual falar-­‐se em lenho homogéneo e<br />

lenho heterogéneo para diferenciar o lenho das gimnospérmicas (sem elementos <strong>do</strong>s vasos) <strong>do</strong> lenho das<br />

angiospérmicas (com elementos <strong>do</strong>s vasos).<br />

Nos caules primários ou com escasso crescimento secundário, as ramificações são abastecidas por feixes<br />

vasculares provenientes <strong>do</strong> eixo principal (os rastos): há uma continuidade entre os teci<strong>do</strong>s vasculares <strong>do</strong>s eixos e


55 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

das ramificações. Nas plantas lenhosas o teci<strong>do</strong> vascular secundário das ramificações forma uma espécie de cunha<br />

sobre o qual se sobrepõe o crescimento secundário <strong>do</strong> eixo onde se insere o ramo. Os teci<strong>do</strong>s vasculares <strong>do</strong>s eixos e<br />

das ramificações não estão orienta<strong>do</strong>s no mesmo senti<strong>do</strong>, e não são contínuos.<br />

Nos caules secundários as partes mais velhas <strong>do</strong> lenho perdem a <strong>função</strong> de transporte e de reserva (mantêm a de<br />

suporte), e ficam relegadas para as camadas mais profundas <strong>do</strong> caule. No intuito de aumentar a resistência a<br />

parasitas, muitas espécies enchem estas células com resinas, gomas e ceras produzidas no câmbio, e transportadas e<br />

depositadas pelas células <strong>do</strong>s raios xilémicos. Diferencia-­‐se, assim, uma parte mais escura e interna <strong>do</strong> lenho – o<br />

cerne, durame, duramen ou lenho inativo – de outra parte clara, externa e parcialmente funcional – o alburno ou<br />

lenho ativo. O cerne e o durame nem sempre se apresentam bem<br />

defini<strong>do</strong>s.<br />

Espessamento primário e secundário nas<br />

monocotiledóneas<br />

O câmbio vascular, como se referiu anteriormente, é exclusivo das<br />

dicotiledóneas. Contu<strong>do</strong>, muitas monocotiledóneas sem crescimento<br />

secundário produzem caules de assinalável espessura, e outras ainda<br />

demonstram crescimentos secundários. A espessura <strong>do</strong> caule da<br />

maioria das monocotiledóneas deve-­‐se à ação simultânea de um<br />

meristema apical e de um meristema de espessamento primário<br />

(MEP) (Rudal, Lateral meristems and stem thickening growth in<br />

monocotyle<strong>do</strong>ns, 1991) (Figura 27). O MEP localiza-­‐se na proximidade<br />

<strong>do</strong> meristema apical, entre o córtex e a região vascularizada <strong>do</strong> caule.<br />

A sua conexão com o meristema apical é variável mas na maioria das<br />

monocotiledóneas pouco se afasta <strong>do</strong> meristema apical. Consiste<br />

numa camada com várias células de espessura de células<br />

meristemáticas que produzem para fora parênquima e para dentro<br />

feixes vasculares individualiza<strong>do</strong>s numa matriz parenquimatosa,<br />

como é próprio das monocotiledóneas (Figura 27). Em algumas<br />

espécies forma células com paredes espessadas com suberina. Além<br />

<strong>do</strong> engrossamento primário, o MEP é ainda responsável pelo<br />

estabelecimento de ligações vasculares entre o caule e a raiz e as<br />

folhas e, em algumas espécies, pela formação de raízes adventícia na<br />

base <strong>do</strong>s caules.<br />

O crescimento secundário nas monocotiledóneas pode ser difuso<br />

ou resultar da atividade de um meristema de espessamento<br />

secundário (MES) (Rudal, Anatomy of Flowering Plants. An<br />

Introduction to Structure and Development, 2007). O crescimento<br />

difuso faz-­‐se pela divisão contínua e alargamento das células<br />

parenquimatosas <strong>do</strong> teci<strong>do</strong> fundamental. O assinalável diâmetro<br />

atingi<strong>do</strong> pelas palmeiras (Arecaceae) resulta da conjugação de um<br />

MEP de grande dimensão com o crescimento difuso. O MES, ao<br />

contrário <strong>do</strong> MEP, afasta-­‐se <strong>do</strong> meristema apical e desce pelos<br />

caules, toman<strong>do</strong> uma posição lateral como o câmbio (Figura 28).<br />

Todavia o MES funciona de forma distinta <strong>do</strong> câmbio: diferencia<br />

centrifugamente (para fora) parênquima e centriptamente<br />

parênquima com feixes vasculares dispersos (para dentro),<br />

radialmente alonga<strong>do</strong>s (Figura 28). Praticamente todas as<br />

monocotiledóneas com MES enquadram-­‐se na ordem Asparagales<br />

(Rudal, Anatomy of Flowering Plants. An Introduction to Structure<br />

and Development, 2007), na qual se enquadram entre outros, três<br />

Figura 27. Estrutura <strong>do</strong> meristema de<br />

espessamento primário numa<br />

monocotiledónea. Corte radial adapta<strong>do</strong> de<br />

(DeMason, 1983).<br />

Figura 28. Crescimento secundário nas<br />

monocotiledóneas. Corte transversal de um<br />

caule de Dracaena sp. «dragoeiro» com<br />

crescimento secundário recente. b, rastro<br />

foliar; e, epiderme; g feixes vasculares<br />

primários; k, periderme; r, córtex; x,<br />

meristema de espessamento secundário no<br />

qual se diferenciam já feixes vasculares<br />

secundários (g*) e teci<strong>do</strong> fundamental<br />

secundário (st) (Sachs, 1874).


56 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

géneros muito cultiva<strong>do</strong>s em Portugal: Agave (Agavaceae), Aloe (Xanthorrhoeaceae), Cordyline (Asparagaceae) e<br />

Dracaena (Asparagaceae).<br />

A ausência de câmbio vascular nas monocotiledóneas dificulta e limita a sua ramificação aérea. Nas<br />

monocotiledóneas, em particular nas lenhosas, os primeiros nós das ramificações laterais são curtos e de diâmetro<br />

progressivamente maior. Este facto cria uma zona de fragilidade mecânica na proximidade das ramificações (óbvias<br />

em Dracaena draco «dragoeiro»), aproveitadas por algumas espécies para se propagarem vegetativamente.<br />

Felogene e riti<strong>do</strong>ma<br />

O aumento de diâmetro <strong>do</strong>s caules secundário – tanto nas<br />

monocotiledóneas como das dicotiledóneas e nas gimnospérmicas – cria<br />

tensões mecânicas em to<strong>do</strong>s os teci<strong>do</strong>s exteriores ao câmbio. Sem o<br />

apoio de um meristema especializa<strong>do</strong> na produção de periderme – a<br />

felogene (= câmbio suberoso ou câmbio subero-­‐felodérmico) – os caules<br />

abririam fendas expon<strong>do</strong> as células vivas <strong>do</strong> floema e <strong>do</strong> câmbio ao<br />

exterior. A felogene produz felema para o exterior e feloderme para o<br />

interior (Figura 29). O felema (= suber) é um teci<strong>do</strong> de células mortas na<br />

maturação, espessadas com suberina, uma substância hidrofóbica, por<br />

vezes complementada com lenhina. A suberina tem por <strong>função</strong> reduzir as<br />

perdas de água e proteger as plantas contra parasitas, impactos de<br />

objetos e a radiação solar. A feloderme (= córtex secundário) é um teci<strong>do</strong><br />

parenquimatoso de reserva. Algumas árvores, sobretu<strong>do</strong> nos trópicos,<br />

têm troncos verdes, porque as células da feloderme possuem<br />

cloroplastos. O conjunto “feloderme + felogene + felema” constitui a<br />

periderme. A periderme substitui a epiderme nos caules e raízes com<br />

crescimento secundário. A felogene (e a periderme) pode ainda<br />

diferenciar-­‐se numa ferida ou nas regiões de abcisão de folhas e frutos.<br />

No primeiro caso contribui para a reparação de feridas, e no segun<strong>do</strong> ao<br />

formar uma zona de abcisão impele a queda de folhas e frutos.<br />

Numa fase inicial <strong>do</strong> crescimento secundário <strong>do</strong> caule os estomas são<br />

circunda<strong>do</strong>s por teci<strong>do</strong> suberoso (felema), que se destaca no fun<strong>do</strong> verde<br />

da epiderme pela sua cor acastanhada ou avermelhada. Nos ramos<br />

lenhosos os estomas são substituí<strong>do</strong>s por pequenas saliências na casca,<br />

com um pequeno poro no centro, designadas por lentículas. Constituem<br />

Figura 29. Diferenciação da periderme<br />

num caule com crescimento secundário.<br />

Corte transversal de um caule de Ribes<br />

rubrum (Grossulariaceae) «groselheira»).<br />

b, floema; c, felogene; epiderme (e) e<br />

córtex (pr) já mortos, em vias de<br />

exfoliação; K, periderme; k, felema; pd,<br />

feloderme; h, pelo (Sachs, 1874).<br />

as lentículas aglomera<strong>do</strong>s pouco organiza<strong>do</strong>s de células (mortas), não ou escassamente impregnadas de suberina,<br />

por onde todavia se realizam algumas trocas gasosas. As lentículas são difíceis de identificar nos caules lenhosos de<br />

riti<strong>do</strong>ma espesso e escuro<br />

Nas plantas lenhosas as feridas que não atingem o câmbio são reparadas rapidamente. A recuperação das feridas<br />

mais profundas envolve, em primeiro lugar, o isolamento e a consequente aniquilação (compartimentalização) das<br />

células danificadas de mo<strong>do</strong> a impedir a penetração microrganismos patogénicos. Por debaixo das células<br />

danificadas diferencia-­‐se um calo (vd. Os meristemas), usualmente a partir de células <strong>do</strong> parênquima lenhoso <strong>do</strong>s<br />

raios <strong>do</strong> xilema. Das células <strong>do</strong> calo inicia-­‐se um câmbio ao mesmo tempo que se regenera uma felogene (Pallardy,<br />

2007). A cicatrização das feridas avança <strong>do</strong> bor<strong>do</strong> para o interior. A eficiência deste processo varia de espécie para<br />

espécie, e depende <strong>do</strong> vigor e da idade das plantas, e da severidade das feridas. A reparação das feridas ocorridas<br />

durante os perío<strong>do</strong>s de atividade cambial (na Primavera-­‐início <strong>do</strong> Verão nas áreas de clima tempera<strong>do</strong> ou<br />

mediterrânico) é mais rápida (Pallardy, 2007).<br />

O aumento <strong>do</strong> diâmetro obriga, a uma renovação cíclica da felogene, geralmente anual, com a diferenciação de<br />

uma nova felogene por dentro da anterior. O novo felema isola e induz a morte de to<strong>do</strong>s os teci<strong>do</strong>s a ele exteriores,<br />

processo que leva ao enriquecimento da periderme com novas camadas de teci<strong>do</strong> morto. Nas plantas lenhosas<br />

adultas apelida-­‐se por riti<strong>do</strong>ma (= casca seca) o complexo de teci<strong>do</strong>s exteriores à felogene ativa, onde sempre<br />

pre<strong>do</strong>mina o felema. O entrecasco (= casca interna) engloba os teci<strong>do</strong>s vivos conti<strong>do</strong>s entre o câmbio e a felogene. O


57 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

termo casca genericamente é aplica<strong>do</strong> ao conjunto <strong>do</strong>s teci<strong>do</strong>s exteriores ao câmbio (entrecasco + riti<strong>do</strong>ma), entre<br />

os quais se inclui o floema e o riti<strong>do</strong>ma. Algumas espécies produzem bandas de células de paredes delgadas para<br />

facilitar a rotura <strong>do</strong> riti<strong>do</strong>ma e a sua acomodação ao aumento <strong>do</strong> diâmetro <strong>do</strong> caule. Assim se explica que em certas<br />

espécies as casca se destaque, por exemplo, em fitas horizontais (e.g. Betula alba<br />

«bi<strong>do</strong>eiro» Betulaceae), em fitas verticais (e.g. Eucalyptus globulus «eucalipto»<br />

Myrtaceae) ou em placas Platanus orientalis [Platanaceae] «plátano»).<br />

A casca destaca-­‐se com facilidade (pelo câmbio) durante os perío<strong>do</strong>s de intensa<br />

atividade cambial, sobretu<strong>do</strong> nos caules jovens. Este facto é aproveita<strong>do</strong>, por exemplo,<br />

para realizar enxertias de borbulha. Em contrapartida fragiliza os caules tornan<strong>do</strong>-­‐os<br />

mais sensíveis a toques de máquinas agrícolas e outros acidentes mecânicos. O câmbio<br />

em contato com o exterior morre e forma-­‐se uma ferida. As plantas lenhosas possuem,<br />

como se referiu, mecanismos de reparação de feridas de pequena dimensão. Se a casca<br />

é retirada em re<strong>do</strong>r de to<strong>do</strong> o tronco, i.e. caso se verifique uma incisão anelar, deixa de<br />

haver uma continuidade no floema. Primeiro morrem as raízes de fome, e em seguida a<br />

planta colapsa. A casca <strong>do</strong> sobreiro pode ser extraída pela feloderme sem danificar o<br />

câmbio. A árvore gera uma nova feloderme e o crescimento <strong>do</strong> riti<strong>do</strong>ma – da cortiça –<br />

é retoma<strong>do</strong>.<br />

Lenho de reação<br />

O crescimento e a consequente acumulação de massa suscitam, nas plantas<br />

lenhosas, fortes tensões na proximidade <strong>do</strong> ponto de inserção <strong>do</strong>s ramos próximos da<br />

horizontal (patentes). Os teci<strong>do</strong>s lenhosos estão sujeitos a forças de tração ou de<br />

compressão consoante se situem na parte superior, ou inferior, da base <strong>do</strong>s ramos<br />

patentes. O stress imposto pela gravidade incrementa a velocidade da divisão celular<br />

no câmbio vascular e uma sobreprodução de xilema. Este excesso de xilema é<br />

designa<strong>do</strong> por lenho de reação. Nas angiospérmicas o lenho de reação acumula-­‐se na<br />

parte superior <strong>do</strong>s ramos – lenho de tração – e nas gimnospérmicas na parte inferior –<br />

lenho de compressão. O lenho de reação diminui a qualidade tecnológica das madeiras<br />

e, geralmente, é perceptível através da observação macroscópica <strong>do</strong>s ramos,<br />

particularmente nas árvores de casca lisa.<br />

4.3.3. Alongamento, ramificação e cla<strong>do</strong>ptose<br />

O crescimento <strong>do</strong>s caules nas plantas com corpo secundário tem duas componentes<br />

– o alongamento e o espessamento – respectivamente conduzidas pelo meristema<br />

apical e pelo câmbio vascular nas dicotiledóneas s.l., ou pelo meristema de<br />

espessamento secundário, nas monocotiledóneas com crescimento secundário (vd. Os<br />

meristemas). A ramificação é governada por meristemas axilares ou adventícios. Uma<br />

vez ativa<strong>do</strong>s, estes meristemas adquirem a <strong>função</strong> e as características <strong>do</strong>s meristemas<br />

apicais.<br />

Gemas<br />

Os meristemas não contactam diretamente com o exterior: enquanto funcionais<br />

permanecem envolvi<strong>do</strong>s por várias camadas de folhas. Estas podem ser simples<br />

esboços foliares (= folhas em início de desenvolvimento, recém-­‐diferenciadas no<br />

meristema periférico) ou folhas modificadas, geralmente escamiformes, rijas e sem<br />

clorofila, designadas por catáfilos (vd. Tipos de filomas) (Figura 30). A estrutura<br />

constituída pelos esboços foliares, pelos catáfilos (nem sempre presentes) e pelas<br />

células caulinares recém-­‐diferenciadas, mais o meristema que lhes deu origem designa-­‐<br />

se por gema. A gema pode achar-­‐se ativa, a diferenciar caule e folhas, ou quiescente (=<br />

inativa), apresentan<strong>do</strong>-­‐se, ou não, envolvida por folhas de proteção especializadas.<br />

A<br />

B<br />

C<br />

Figura 30. Importância<br />

taxonómica da morfologia<br />

gomos. A forma das<br />

escamas <strong>do</strong>s gomos e a<br />

presença de resinas<br />

permite distinguir alguns<br />

Pinus (Pinaceae): A) P.<br />

pinaster «pinheiro-­‐bravo»<br />

e B) P. pinea «pinheiro-­‐<br />

manso». C) Sorbus<br />

<strong>do</strong>mestica (Rosaceae)<br />

«sorveira-­‐comum» tem<br />

gomos viscosos; embora<br />

de morfologia semelhante<br />

o S. aucuparia «sorveira-­‐<br />

<strong>do</strong>s-­‐passarinhos» tem<br />

gomos secos.


58 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Os meristemas, sobretu<strong>do</strong> enquanto ativos, são muito frágeis: quebram ou esmagam-­‐se com facilidade e<br />

necrosam em condições ambientais extremas. O funcionamento <strong>do</strong>s meristemas é interrompi<strong>do</strong> no início <strong>do</strong> perío<strong>do</strong><br />

desfavorável ao crescimento vegetal nos territórios com uma estação demasia<strong>do</strong> fria, ou demasia<strong>do</strong> seca, para evitar<br />

danos irreparáveis nas células meristemáticas e nos teci<strong>do</strong>s jovens. Até ao final da estação desfavorável os<br />

meristemas permanecem protegi<strong>do</strong>s em gemas apicais, ou axilares. Na maioria das plantas perenes das regiões com<br />

uma estação fria a quiescência <strong>do</strong>s gomos, i.e. a interrupção da sua atividade, tem um controlo genético, por via<br />

hormonal. Por isso, a exposição a condições ambientais favoráveis não é suficiente para uma retoma da atividade<br />

meristemática. Este tipo de quiescência, conheci<strong>do</strong> por <strong>do</strong>rmência, assegura a sincronização <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> de<br />

crescimento com a estação favorável.<br />

A prefolheação e a vernação, são, respectivamente, a forma como os esboços foliares se arrumam<br />

individualmente ou em grupo no gomo (vd. Ptixia e vernação). O número de folhas diferenciadas retidas no interior<br />

<strong>do</strong>s gomos varia de espécie para espécie. Nos trópicos as folhas expandem-­‐se pouco depois da sua diferenciação:<br />

verifica-­‐se uma neoformação de folhas sempre que os gomos estejam ativos. Nos gomos hibernantes da maioria das<br />

árvores de clima tempera<strong>do</strong> (e.g. maioria das Rosaceae de frutos edíveis) existe uma pré-­‐formação das folhas: os<br />

gomos encerram os esboços de todas as folhas a serem expandidas, por alargamento celular, na Primavera. A forma<br />

<strong>do</strong>s esboços foliares preforma<strong>do</strong>s assemelha-­‐se à das folhas adultas e cada esboço axila já um pequeno meristema<br />

axilar. Exemplos intermédios entre a neo e a pré-­‐formação de folhas são também frequentes.<br />

Na quebra da <strong>do</strong>rmência, além de um relógio interno das próprias plantas – a <strong>do</strong>rmência esbate-­‐se com o tempo,<br />

– participam diversos sinais ambientais, e.g. exposição a temperaturas baixas, exposição a temperaturas elevadas e<br />

comprimento <strong>do</strong> dia. A combinação e a intensidade <strong>do</strong>s sinais necessários para a quebra da <strong>do</strong>rmência nas plantas<br />

cultivadas varia de espécie para espécie, e ao nível da cultivar. No início da estação favorável os gomos abrolham: a<br />

atividade meristemática é reiniciada, os gomos incham, o alongamento <strong>do</strong> caule afasta as folhas de proteção e o<br />

meristema encapsula<strong>do</strong> por folhas imaturas emerge <strong>do</strong> interior <strong>do</strong> gomo. Os catáfilos acabam por se destacar <strong>do</strong><br />

caule e tombar no solo, deixan<strong>do</strong> uma cicatriz. As cicatrizes <strong>do</strong>s catáfilos apresentam-­‐se agrupadas num anel (anel<br />

cicatricial), mais ou menos marca<strong>do</strong>, por vezes ligeiramente deprimi<strong>do</strong>, muito útil para monitorizar o crescimento<br />

<strong>do</strong>s ramos <strong>do</strong> ano. Estes anéis permitem, em muitas espécies (e.g. Rosaceae lenhosas temperadas), identificar a<br />

idade <strong>do</strong>s ramos não poda<strong>do</strong>s – o número de anéis cicatriciais coincide com número de anos – e determinar com<br />

precisão a idade das plantas jovens.<br />

Nos regiões tropicais húmidas as plantas crescem permanentemente, com pequenas interrupções irregulares<br />

nem sempre correlacionadas com variáveis ambientais. Tanto nos trópicos como nas áreas de clima tempera<strong>do</strong> ou<br />

mediterrânico mais benigno, durante os perío<strong>do</strong>s desfavoráveis os meristemas quiescentes por regra não estão<br />

protegi<strong>do</strong>s por catáfilos. Os meristemas <strong>do</strong>s caules aquáticos também raramente têm catáfilos.<br />

Reconhecem-­‐se <strong>do</strong>is tipos de gemas: gomos e olhos (Vasconcellos, 1969). Os gomos são gemas protegidas por<br />

catáfilos ( 30); e.g. olhos da batata. As gemas não ou escassamente protegidas por catáfilos tomam a designação de<br />

olhos 34 (= gomos nus). A classificação das gemas tem uma grande importância prática, por exemplo, é indispensável<br />

em propagação e na poda de plantas ornamentais ou de árvores fruteiras. Os gomos (e os olhos) são classifica<strong>do</strong>s de<br />

acor<strong>do</strong> com seis critérios expostos no Quadro 12.<br />

Quadro 12. Tipologia <strong>do</strong>s gomos (Vasconcellos, 1969) com adições<br />

Critério de<br />

classificação/tipo<br />

Quanto à situação<br />

Aéreos<br />

Subterrâneos<br />

Descrição<br />

forma<strong>do</strong>s em caules aéreos (inc. superficiais – se forma<strong>do</strong>s na proximidade da superfície <strong>do</strong> solo,<br />

e.g. no colo de uma árvore)<br />

localiza<strong>do</strong>s abaixo da superfície <strong>do</strong> solo<br />

34 Em fruticultura – ramo da agronomia dedica<strong>do</strong> ao cultivo de espécies fruteiras – o termo olho é aplica<strong>do</strong> aos gomos folheares.


59 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Aquáticos<br />

Quanto à natureza<br />

Folheares<br />

Florais (= botões)<br />

Mistos<br />

Quanto à posição<br />

Terminais<br />

(= apicais)<br />

Axilares<br />

(= laterais)<br />

Adventícios<br />

Quanto à inserção<br />

Alternos<br />

Opostos<br />

Verticila<strong>do</strong>s<br />

Quanto à disposição<br />

submersos na água<br />

dão origem a caules estéreis (sem flores), curtos (braquiblastos estéreis) ou longos (macroblastos<br />

estéreis); condição mais comum<br />

produzem um caule curto (braquiblasto florífero, vd. Posição das inflorescências nos ramos <strong>do</strong><br />

ano de plantas lenhosas) com uma flor ou uma inflorescência, provi<strong>do</strong> ou não de folhas<br />

especializadas na <strong>função</strong> de assimilação (= nomofilos); e.g. frequentes nas pomoideas e<br />

prunoideas<br />

produzem caules, mais ou menos longos (macroblastos floríferos), com flores solitárias ou<br />

inflorescências, estan<strong>do</strong> estas previamente diferenciadas na axila de esboços foliares conti<strong>do</strong>s no<br />

gomo (e.g. castanheiro) ou terem uma posição terminal (e.g. castanheiro-­‐da-­‐índia)<br />

localiza<strong>do</strong>s na extremidade <strong>do</strong>s eixos caulinares; abrigam, no seu interior, meristemas apicais;<br />

algum gomos correntemente interpreta<strong>do</strong>s como apicais são na realidade gomos axilares em<br />

posição terminal em consequência <strong>do</strong> abortamento <strong>do</strong> gomo apical (e.g. castanheiro)<br />

forma<strong>do</strong>s na axila das folhas, consequentemente localiza<strong>do</strong>s abaixo de um gomo terminal;<br />

acolhem, no seu interior, um ou mais meristemas axilares (= meristemas laterais)<br />

forma<strong>do</strong>s, a posteriori, numa posição atípica, sem relação com a extremidade <strong>do</strong>s eixos<br />

caulinares ou a axila das folhas; contêm meristemas adventícios<br />

posiciona<strong>do</strong>s na axila de folhas alternas. Podem ainda ser: espirala<strong>do</strong>s – dispostos em espiral ao<br />

longo <strong>do</strong>s caules; dísticos (= distica<strong>do</strong>s) – dispostos no mesmo plano; condição mais frequente<br />

diferencia<strong>do</strong>s na axila de folhas opostas; quan<strong>do</strong> os gomos de <strong>do</strong>is nós sucessivos se encontram<br />

em <strong>do</strong>is planos ortogonais (perfazen<strong>do</strong> um ângulo de 90°) dizem-­‐se oposto-­‐cruza<strong>do</strong>s (=<br />

decussa<strong>do</strong>s); e.g. oleáceas<br />

forma<strong>do</strong>s na axila de folhas verticiladas<br />

Colaterais 2 ou mais gomos, uns ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong>s outros; e.g. pessegueiro (3 gomos) e videira-­‐europeia (2 ou 3<br />

gomos) (Figura 31 B)<br />

Sobrepostos<br />

Quanto à evolução<br />

Prontos<br />

Hibernantes<br />

Dormentes<br />

Quanto ao número<br />

de meristemas<br />

2 ou mais gomos, na direção <strong>do</strong> eixo caulinar (longitudinalmente justapostos); e.g. nogueira-­‐<br />

europeia (Figura 31 A)<br />

evoluem na mesma estação de crescimento em que são forma<strong>do</strong>s; e.g. gomo lateral da videira-­‐<br />

europeia<br />

abrolham no ano seguinte à sua formação; e.g. a maioria <strong>do</strong>s gomos das árvores fruteiras de<br />

climas tempera<strong>do</strong>s<br />

permanecem num esta<strong>do</strong> de vida latente durante <strong>do</strong>is ou mais anos, poden<strong>do</strong> nunca abrolhar;<br />

condição frequente nas plantas lenhosas<br />

Simples com um meristema; condição mais frequente nas plantas-­‐com-­‐flor<br />

Compostos com <strong>do</strong>is ou mais meristemas; e.g. gomos compostos hibernantes da videira-­‐europeia (Figura 32)


60 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

A “inserção <strong>do</strong>s gomos” (e <strong>do</strong>s olhos) depende da<br />

disposição espacial das folhas (= filotaxia) e tem um efeito<br />

muito marca<strong>do</strong> na estrutura das copas das árvores (vd.<br />

Filotaxia). O critério “disposição <strong>do</strong>s gomos” reflete o facto de<br />

na axila das folhas poderem coexistir vários gomos.<br />

Os gomos são particularmente difíceis de interpretar na<br />

videira-­‐europeia. Os nós <strong>do</strong>s sarmentos <strong>do</strong> ano de videira-­‐<br />

europeia apresentam um gomo lateral pronto, mais um ou,<br />

raramente, <strong>do</strong>is gomos compostos hibernantes (Vasconcelos,<br />

Greven, Winefield, Trought, & Raw, 2009) (Figura 32 A). O<br />

gomo lateral pronto dá origem às netas (ramos laterais); se<br />

não abrolhar acaba por senescer (morre) no Outono ou no<br />

Inverno deixan<strong>do</strong> para trás uma cicatriz (Figura 32 B e C). Os<br />

gomos compostos hibernantes são folheares ou mistos; na<br />

Primavera seguinte à sua formação dão origem a um<br />

sarmento que poderá apresentar, ou não, cachos de flores<br />

opostos às folhas basais. O gomo lateral é axila<strong>do</strong> pela folha <strong>do</strong> sarmento; os gomos hibernantes diferenciam-­‐se na<br />

primeira, ou na primeira e segunda folhas (profilos muito modifica<strong>do</strong>s, vd. Tipos de filomas) <strong>do</strong> gomo lateral. Cada<br />

gomo composto hibernante, por sua vez, comporta 3 gemas, uma principal, e duas secundárias, formadas na axila<br />

<strong>do</strong>s <strong>do</strong>is primeiros esboços (profilos) foliares da gema primária (Figura 32 C); a gema primária, consoante as<br />

variedades, produz 10 a 12 esboços foliares antes de entrar em <strong>do</strong>rmência, destina<strong>do</strong>s a expandirem-­‐se na estação<br />

de crescimento seguinte.<br />

c<br />

Número<br />

a<br />

A B<br />

b<br />

a<br />

b<br />

c<br />

A B<br />

Figura 31. Tipologia <strong>do</strong>s gomos. A) Juglans regia<br />

(Juglandaceae) «nogueira»: a) gomo apical, b) cicatriz<br />

foliar, c) gomos sobrepostos. B) Gomos colaterais em<br />

Prunus persica (Rosaceae) «pessegueiro»: os <strong>do</strong>is<br />

gomos laterais são florais e o central folhear.<br />

Figura 32. Tipologia <strong>do</strong>s gomos de Vitis vinífera (Vitaceae). A) Sarmento <strong>do</strong> ano de Vitis vinífera (Vitaceae):<br />

a) neta proveniente de um gomo lateral pronto, b) gomo composto hibernante, c) folha. B) Sarmento<br />

atempa<strong>do</strong>: a) cicatriz de um gomo lateral pronto aborta<strong>do</strong>, b) gomo composto hibernante, c) cicatriz da folha.<br />

C) Corte transversal de um gomo composto hibernante: a) cicatriz foliar, b) cicatriz de um gomo lateral pronto<br />

aborta<strong>do</strong>, c) gema secundária, d) gema primária, e) gema secundária.<br />

As plantas podem ter um a muitos caules. Em algumas famílias, sobretu<strong>do</strong> entre as Poaceae «gramíneas»,<br />

Cyperaceae e Juncaceae «juncos», muitas espécies afilham com facilidade, i.e. diferenciam um grande número de<br />

novos caules a partir <strong>do</strong>s meristemas axilares das folhas basais. Nestas plantas de cada axila emerge um único caule;<br />

os caules filhos, por sua vez, podem originar novos caules, e assim por diante. Nas plantas ditas cespitosas estes<br />

caules brotam compacta<strong>do</strong>s em grande número numa pequena toiça, próximo da superfície <strong>do</strong> solo. Nas plantas<br />

lenhosas o conceito de número só é aplica<strong>do</strong> aos arbustos. A formação de novos caules nas plantas vivazes – plantas<br />

perenes que renovam anualmente a parte aérea, – nos arbustos e nas árvores, salvo raras exceções, deve-­‐se à<br />

diferenciação e ativação de gomos apicais ou axilares.<br />

C<br />

a<br />

b<br />

a<br />

b<br />

c<br />

c<br />

d e


61 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Alongamento rameal<br />

Consoante o comportamento <strong>do</strong> meristema apical de um eixo caulinar assim se reconhecem <strong>do</strong>is tipos de<br />

alongamento rameal: monopodial e simpodial (Figuras 33 e 34). Nos ramos de alongamento monopodial (ing.<br />

monopodial growth), i.e. nos monopódios, o alongamento faz-­‐se pela justaposição de unidades monopodiais<br />

formadas durante os perío<strong>do</strong>s de atividade <strong>do</strong> meristema apical. Este sistema de alongamento é <strong>do</strong>minante nas<br />

gimnospérmicas. O Ilex aquifolium (Aquifoliaceae) «azevinho» é uma conhecida angiospérmica de alongamento<br />

monopodial.<br />

No alongamento de tipo simpodial (ing. sympodial growth), o meristema apical <strong>do</strong> eixo caulinar no final, ou ainda<br />

durante o perío<strong>do</strong> de crescimento aborta ou diferencia-­‐se numa flor, numa gavinha ou num espinho. No perío<strong>do</strong> de<br />

crescimento seguinte o alongamento <strong>do</strong>s ramos é continua<strong>do</strong> por um <strong>do</strong>s meristemas axilares mais próximos <strong>do</strong><br />

ápice caulinar, necessariamente situa<strong>do</strong> na axila de uma folha ou de uma cicatriz foliar. Um simpódio é constituí<strong>do</strong><br />

por unidades simpodiais (= caulómeros). O alongamento simpodial é <strong>do</strong>minante nas angiospérmicas, sobretu<strong>do</strong> nas<br />

monocotiledóneas, e evolutivamente anterior ao alongamento monopodial (Carlquist, 2009). A identificação de um<br />

simpódio nem sempre é fácil porque o gomo apical pode estar condensa<strong>do</strong> na extremidade distal <strong>do</strong> ramo com um<br />

grande número de gomos axilares, como acontece nos Quercus (Fagaceae). O alongamento simpodial é fácil de<br />

reconhecer em Vitis vinifera (Vitaceae) «videira-­‐europeia», Corylus avellana (Betulaceae) «aveleira», Aesculus<br />

(Sapindaceae) «castanheiros-­‐da-­‐índia» e em numerosas plantas anuais, e.g. Ranunculus (Ranunculaceae)<br />

«ranúnculos» e Solanum lycopersicum (Solanaceae) «tomateiro». Na videira e nas solanáceas cultivadas, entre<br />

outros exemplos, o alongamento simpodial coloca os cachos numa posição oposta a uma folha (Figura 34).<br />

A B<br />

Figura 34. Ramos simpodiais e monopodiais. A) Ramo simpodial de Aesculus hippocastanum (Sapindaceae) «castanheiro-­‐<br />

da-­‐índia»; n.b. que o alongamento se fez com um gomo axilar e, por esse motivo, se identifica uma ondulação no contacto<br />

entre da madeira <strong>do</strong> 2º ano e o ramo <strong>do</strong> ano (imagem da esquerda). B) Ramo monopodial de Malus <strong>do</strong>mestica (Rosaceae)<br />

«macieira»; n.b. lentículas (pequenas pontuações suberosas dispersas no ramo <strong>do</strong> ano).<br />

A B<br />

Figura 33. Simpódio. A) Formação de um simpódio no qual o meristema apical se diferencia numa flor, ou numa<br />

inflorescência, que acaba por tomar uma posição lateral; n.b. ausência de folha axilante na flor ou inflorescência<br />

(inspira<strong>do</strong> em van Wyk & van Wyk, 2006). B) Simpódio de videira-­‐europeia: a) gavinha de origem caulinar, b) gomo<br />

composto hibernante, c) cacho senescente; n.b. que tanto a gavinha como o cacho se opõem a um gomo composto<br />

hibernante de acor<strong>do</strong> com o modelo exposto na Figura A).<br />

B<br />

b<br />

a<br />

a<br />

b<br />

c<br />

c


62 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Os sistemas de alongamento monopodial e simpodial repetem-­‐se nos rizomas e nas inflorescências. Assim,<br />

existem rizomas monopodiais e simpodiais. As inflorescências monopodiais dizem-­‐se indefinidas e as simpodiais<br />

definidas (vd. Inflorescência, Tipos fundamentais).<br />

Intensidade <strong>do</strong> alongamento<br />

Como se referiu anteriormente, os caules alongam-­‐se pela<br />

extremidade. O comprimento atingi<strong>do</strong> por um caule durante uma<br />

estação de crescimento depende <strong>do</strong> comprimento <strong>do</strong>s entrenós e <strong>do</strong><br />

número de entrenós produzi<strong>do</strong>s pelo meristema apical. O<br />

comprimento <strong>do</strong>s entrenós – i.e. a intensidade <strong>do</strong> alongamento – varia<br />

de espécie para espécie, e entre os caules de um mesmo indivíduo.<br />

Distinguem-­‐se <strong>do</strong>is tipos fundamentais de caules quanto à intensidade<br />

<strong>do</strong> alongamento: macroblastos e braquiblastos. Os macroblastos são<br />

caules mais ou menos compri<strong>do</strong>s e de entrenós longos; e.g. sarmento,<br />

turião e ramos vegetativos da maioria das árvores e arbustos. Os<br />

braquiblastos, pelo contrário, têm entrenós curtos, por vezes<br />

indistintos ou quase a olho nu e, se presentes, com folhas dispostas em<br />

roseta (i.e. que parecem sair todas <strong>do</strong> mesmo ponto, em fascículos). Os<br />

géneros Cedrus «cedros», Larix «larícios» ou Pinus «pinheiros», da<br />

família das Pinaceae, produzem todas ou a maioria das folhas em<br />

braquiblastos; são também muito frequentes nas angiospérmicas<br />

lenhosas (e.g. Rosaceae) (Figura 35).<br />

Figura 35. Intensidade <strong>do</strong> alongamento.<br />

Prunus avium (Rosaceae) «cerejeira»<br />

braquiblastos e macroblastos. Legenda: a)<br />

macroblastos (ramo normal), b)<br />

braquiblasto (esporão); n.b. que o<br />

braquiblasto tem 3 anos de idade<br />

(identificam-­‐se 3 anéis cicatriciais)<br />

Muitas das adaptações demonstradas pelas plantas ao nível <strong>do</strong>s órgãos vegetativos envolveram o alongamento<br />

ou o encurtamento <strong>do</strong>s entrenós. Estas adaptações são recorrentes em diversas linhagens de plantas-­‐com-­‐flor, e<br />

evolutivamente reversíveis, talvez porque exijam pouca informação génica (reduzi<strong>do</strong> número de genes envolvi<strong>do</strong>s).<br />

Os escapos e os estolhos – <strong>do</strong>is tipos particulares de caule mais adiante descritos – têm os entrenós<br />

desmesuradamente longos. As rosetas de folhas, os bolbos e a flor, a maior de todas as inovações evolutivas das<br />

angiospérmicas, implicaram um encurtamento <strong>do</strong>s entrenós. Nos Populus (Salicaceae) «choupos», nos Fraxinus<br />

(Oleaceae) «freixos», nos Acer (Sapindaceae) «bor<strong>do</strong>s» e em muitas árvores com frutos de interesse económico –<br />

e.g. Juglans regia (Juglandaceae) «nogueira» ou entre as Rosaceae, Prunus dulcis «amen<strong>do</strong>eira», Prunus persica<br />

«pessegueiro», Malus «macieiras», Pyrus «pereiras» e Sorbus «sorveiras» – coexistem macroblastos e braquiblastos,<br />

respectivamente especializa<strong>do</strong>s na produção de gomos folheares e florais.<br />

Os braquiblastos rugosos e muito curtos são designa<strong>do</strong>s por esporões (Figura 35). A rugosidade é devida às<br />

cicatrizes resultantes da inserção de folhas e pedúnculos florais. A maioria <strong>do</strong>s gomos <strong>do</strong>s esporões é de tipo floral,<br />

sen<strong>do</strong> o alongamento opera<strong>do</strong> por um ou mais gomos folheares. Podem ser rectos (de grande comprimento em<br />

Prunus avium «cerejeira») ou tortuosos (e.g. Pyrus «pereiras») consoante se alonguem por gomos folheares apicais<br />

(alongamento monopodial) ou axilares (alongamento simpodial); raramente são ramifica<strong>do</strong>s. Nos esporões de Pyrus<br />

«pereiras», Malus «macieiras» e na Magnolia x soulangeana (Magnoliaceae) «magnólia-­‐de-­‐soulange» formam-­‐se<br />

um ou mais entrenós engrossa<strong>do</strong>s, com <strong>função</strong> de reserva, designa<strong>do</strong>s por bolsas. Na pereira os esporões são<br />

precedi<strong>do</strong>s pelos dar<strong>do</strong>s: a partir de um gomo axilar evoluciona, no segun<strong>do</strong> ano, um braquiblasto, ainda sem gomos<br />

florais, encima<strong>do</strong> gomo terminal folhear aguça<strong>do</strong> – o dar<strong>do</strong>; o dar<strong>do</strong> pode, eventualmente, permanecer anos sem se<br />

diferenciar num esporão, evento que ocorre quan<strong>do</strong> se diferenciam gomos florais. Os esporões são muito frequentes<br />

e longevos entre as Rosaceae. um termo de uso corrente em pomicultura.<br />

Nas plantas lenhosas, além <strong>do</strong>s esporões, distinguem-­‐se outros tipos peculiares de ramos em <strong>função</strong> das<br />

características <strong>do</strong> alongamento. Os ramos epicórmicos 35 são ramos erectos ou suberectos, estéreis (juvenis, sem<br />

flores), de entrenós longos de comprimento variável, provenientes de gomos <strong>do</strong>rmentes ou adventícios situa<strong>do</strong>s em<br />

qualquer ponto da copa, na proximidade <strong>do</strong> colo – pôlas – ou, menos frequentemente, nas raízes – pôlas<br />

35<br />

Correctamente o termo ramo epicórmico dever-­‐se-­‐ia restringir aos lançamentos provenientes de gomos <strong>do</strong>rmentes, por<br />

definição de origem caulinar.<br />

b<br />

a


63 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

radiculares 36 . Se muito possantes retiram vigor às partes mais velhas da copa sen<strong>do</strong>, neste caso, designa<strong>do</strong>s por<br />

ramos ladrões, chupões ou mamões.<br />

Prolepsia e silepsia<br />

O alongamento e a ramificação nas plantas perenes pode ser imediata (= silepsia) ou protelada no tempo (=<br />

prolepsia). Nas regiões de clima tempera<strong>do</strong> ou mediterrânico a ramificação rameal, regra geral, ocorre através de<br />

gomos hibernantes, por definição, situa<strong>do</strong>s nos ramos <strong>do</strong> ano anterior. Dominam, portanto, os ramos prolépticos. A<br />

ramificação imediata, implicitamente baseada em gomos prontos, é mais frequente em famílias de plantas de<br />

origem tropical, e.g. Lauraceae. Os ramos prolépticos normalmente têm cicatrizes na base resultantes da inserção<br />

<strong>do</strong>s catáfilos <strong>do</strong>s gomos; o mesmo não acontece nos ramos silépticos. Este pormenor tem grande importância<br />

prática na interpretação <strong>do</strong> crescimento e <strong>do</strong> vigor das árvores fruteiras.<br />

Tipo e grau da ramificação<br />

Todas as folhas de angiospérmicas axilam um ou mais meristemas axilares (vd. Os meristemas).; nas<br />

gimnospérmicas a presença de meristemas axilares não é constante. A ramificação lateral (= ramificação axilar), o<br />

tipo de ramificação mais frequente entre as plantas-­‐com-­‐semente, depende destes meristemas. Na maioria das<br />

‘pteridófitas’ os meristemas laterais situam-­‐se obliquamente, por debaixo da inserção das folhas: neste grupo de<br />

plantas, é pouco apropria<strong>do</strong> utilizar os conceitos de “meristema axilar” e de “ramificação axilar”. As Lycopodiidae<br />

«licófitas» e as Ophioglossidae «ophioglossidas» ramificam-­‐se de forma dicotómica: o meristema apical fende-­‐se e<br />

dá origem a <strong>do</strong>is ramos inicialmente semelhantes entre si. Pontualmente dividem-­‐se dicotomicamente as<br />

Cycadaceae «cicas», uma família de gimnospérmicas, as Arecaceae «palmeiras» e os Pandanus (Pandanaceae)<br />

«pandanos», <strong>do</strong>is grupos de angiospérmicas monocotiledóneas.<br />

O aspecto geral das plantas (= hábito ou porte), e o aspecto <strong>do</strong>s ramos depende, entre outros factores (vd.<br />

Direção e orientação), <strong>do</strong> grau de ramificação. A partir de um eixo principal (e.g. um troco de uma árvores) formam-­‐<br />

se ramos de primeira ordem ou primários; os ramos de segunda ordem ou secundários partem <strong>do</strong>s ramos de<br />

primeira ordem, e assim sucessivamente. O grau de ramificação, i.e. a extensão da ramificação, varia de espécie para<br />

espécie; e.g. as rosáceas arbustivas ramificam-­‐se mais intensamente <strong>do</strong> que as giestas (tribo Cytiseae e algumas<br />

Genista, Fabaceae). A Dominância e controlo apicais têm, como adiante se explica, são determinantes no grau de<br />

ramificação.<br />

Nas plantas lenhosas reserva-­‐se o termo raminho para os ramos de última ordem forma<strong>do</strong>s no próprio ano ou no<br />

ano anterior, enquanto não se reinicia o crescimento vegetativo. Os raminhos não ou escassamente atempa<strong>do</strong>s, i.e.<br />

de cor ainda verde ou em processo de lenhificação, são genericamente conheci<strong>do</strong>s por rebentos ou renovos. O<br />

termo lançamento é indiferentemente usa<strong>do</strong> para raminhos ou para caules vigorosos emiti<strong>do</strong>s em qualquer local da<br />

copa, ou mesmo das raízes (Vasconcellos, 1969).<br />

Direção e orientação<br />

O caule, ao invés das raízes, tem geralmente um geotropismo negativo: alonga-­‐se em direções opostas ao solo.<br />

Consoante a direção, ou direções, tomadas em relação ao plano representa<strong>do</strong> pelo solo, os caules são classifica<strong>do</strong>s<br />

em oito tipos (termos indistintamente aplica<strong>do</strong>s a caules herbáceos, lenhosos, pouco ou muito ramifica<strong>do</strong>s, e ramos)<br />

(Quadro 13).<br />

A orientação <strong>do</strong> crescimento <strong>do</strong>s ramos laterais frente ao eixo principal pode ser: ortotrópico – na vertical – ou<br />

plagiotrópico – oblíquo ou na horizontal. Consoante o ângulo de inserção no eixo principal os eixos plagiotrópicos<br />

podem ser: fastigia<strong>do</strong>s – ângulo de inserção muito agu<strong>do</strong>; erecto-­‐patentes – ângulo com cerca de 45°; patentes –<br />

ângulo próximo de 90°; divarica<strong>do</strong>s – ângulo muito aberto > 90°.<br />

Frequentemente, numa mesma planta, os eixos plagiotrópicos e ortotrópicos têm uma morfologia distinta, e.g.<br />

na forma das folhas e potencial para produzir flores. Na oliveira os ramos ortotrópicos não produzem fruto sen<strong>do</strong><br />

ativamente elimina<strong>do</strong>s pela poda. Em fruticultura existe a preocupação de colher garfos em ramos plagiotrópicos<br />

porque induzem entradas mais precoces em frutificação.<br />

36<br />

Nas plantas herbáceas vivazes, as estruturas equivalentes às pôlas e às pôlas radiculares das plantas lenhosas podem ser,<br />

respectivamente, designadas por rebentos <strong>do</strong> colo e rebentos de raiz.


64 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Quadro 13. Tipos de orientação <strong>do</strong>s caules (Vasconcellos, 1969)<br />

Tipo Tipo<br />

Ascendente Caules inicialmente prostra<strong>do</strong>s curvan<strong>do</strong>, de seguida, para uma posição quase vertical;<br />

quan<strong>do</strong> <strong>do</strong>bram em joelho num nó dizem-­‐se genicula<strong>do</strong>s<br />

Erecto Caules verticais ou quase na vertical<br />

Suberecto Caules quase verticais<br />

Subprostra<strong>do</strong> Caules quase aderentes ao solo<br />

Prostra<strong>do</strong> Caules aderentes ao solo<br />

Difuso Caules muito ramifica<strong>do</strong> com várias direções<br />

Decumbente Caules inicialmente erecto ou suberecto vergan<strong>do</strong> distalmente em direção ao solo<br />

Trepa<strong>do</strong>r ou<br />

escandente<br />

Apoio <strong>do</strong>s caules das plantas trepa<strong>do</strong>ras<br />

São várias as soluções evolutivas seguidas pelas plantas trepa<strong>do</strong>ras para se suspenderem nos seus tutores: caules<br />

volúveis (vd. Metamorfoses <strong>do</strong> caule), pecíolos volúveis (que se enrolam em torno <strong>do</strong> tutor, e.g. Clematis sp.pl.<br />

[Ranunculaceae] e Kickxia cirrhosa [Plantaginaceae), raízes trepa<strong>do</strong>ras (vd. Metamorfoses da raiz), acúleos (vd.<br />

Emergências), espinhos (vd. Espinhos), gavinhas caulinares (vd. Metamorfoses <strong>do</strong> caule) e gavinhas foliares (vd.<br />

Metamorfoses da folha). As Bougainvillea (Nyctaginaceae) «bougainvílleas», entre outras plantas, suspendem-­‐se<br />

emitin<strong>do</strong> caules por entre os ramos ou anfractuosidades <strong>do</strong> tutor.<br />

Dominância e controlo apicais<br />

Direção em <strong>função</strong> <strong>do</strong>s suportes (e.g. muros, ramos, taludes, etc.); tipo próprio das lianas<br />

(= plantas trepadeiras ou plantas escandentes)<br />

A ativação <strong>do</strong>s meristemas laterais de um caule é condicionada, em muitas plantas, pela sua proximidade ao<br />

meristema apical (ou a um meristema lateral que o substitua, vd. Alongamento rameal). Este fenómeno, conheci<strong>do</strong><br />

por <strong>do</strong>minância apical, pode ser forte, e suprimir o desenvolvimento de um grande número de gemas, ou fraco, e<br />

apenas uma pequena proporção das gemas se manter <strong>do</strong>rmente. Nas plantas perenes a <strong>do</strong>minância apical pode<br />

exercer-­‐se no ramo <strong>do</strong> ano ou propagar-­‐se, com variável intensidade, aos ramos com mais de um ano.<br />

As plantas lenhosas produzem mais meristemas axilares <strong>do</strong> que os necessários. Nem to<strong>do</strong>s os meristemas<br />

axilares originam novos lançamentos, caso contrário os ramos ensombrar-­‐se-­‐iam uns aos outros, num emaranha<strong>do</strong><br />

caótico e energeticamente ineficiente de caules e folhas. Consequentemente, a maior parte <strong>do</strong>s meristemas laterais<br />

acaba por nunca ser ativa<strong>do</strong>, aborta ou permanece <strong>do</strong>rmente no interior da copa, com grande probabilidade,<br />

durante to<strong>do</strong> o ciclo de vida da planta. A supressão <strong>do</strong>s meristemas laterais nas partes velhas e profundas da copa já<br />

não cabe no conceito de <strong>do</strong>minância apical.<br />

Os lançamentos <strong>do</strong>s meristemas laterais podem ser, ou não, mais curtos e débeis <strong>do</strong> que o lançamento <strong>do</strong><br />

meristema apical, falan<strong>do</strong>-­‐se neste caso de controlo apical. Os conceitos de acrotonia, de mesotonia e de basitonia 37<br />

são defini<strong>do</strong>s em <strong>função</strong> <strong>do</strong> vigor (controlo apical) <strong>do</strong>s ramos diferencia<strong>do</strong>s a partir de gomos <strong>do</strong>rmentes, desde a<br />

parte proximal à parte distal, numa determinada unidade de crescimento de uma planta lenhosa. Nos caules<br />

acrótonos os lançamentos laterais distais (mais próximos <strong>do</strong> ápice) alongam-­‐se mais <strong>do</strong> que os lançamento próximos<br />

da base. Na condição basítona os crescimentos proximais alongam-­‐se mais <strong>do</strong> que os lançamentos próximos <strong>do</strong><br />

ápice. A mesotonia corresponde a uma condição intermédia. Os efeitos de qualquer uma destas condições<br />

propagam-­‐se no tempo, sen<strong>do</strong> legíveis na arquitetura das plantas adultas.<br />

A interação da <strong>do</strong>minância apical com o controlo apical tem um efeito muito marca<strong>do</strong> na configuração espacial<br />

(arquitetura) das plantas lenhosas, e, implicitamente no seu aspecto geral (= hábito ou porte) (vd. Tipo, grau e<br />

37 A terminologia em torno da ramificação e alongamento das plantas é bastante confusa. Alguns autores com o mesmo senti<strong>do</strong><br />

de basitonia e acrotonia preferem os conceitos de ramificação monopodial e ramificação simpodial.


65 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

disposição da ramificação). Na fase de plântula a <strong>do</strong>minância e o controlo apical são exerci<strong>do</strong>s por um único<br />

meristema apical. Há medida que as estações de crescimento se sucedem os ramos laterais, assumem, mais ou<br />

menos rapidamente, um papel semelhante ao meristema apical original.<br />

Muitos arbustos, como sejam, na flora portuguesa, as giestas (Cytiseae, Fabaceae) e as urzes (Erica, Ericaceae),<br />

combinam uma forte <strong>do</strong>minância apical com basitonia. Os ramos têm tendência a ramificar-­‐se com pouca<br />

intensidade, particularmente na extremidade distal, e as gemas distais, por seu turno, abortam com frequência ou<br />

diferenciam flores. As ramificações mais próximas da base da planta alongam-­‐se com mais vigor. Os ramos mais<br />

longos são ciclicamente renova<strong>do</strong>s a partir da base em consequência <strong>do</strong> fogo ou corte. Em algumas espécies a toiça a<br />

alarga-­‐se desmesuradamente forman<strong>do</strong>-­‐se então um xilopódio com abundantes reservas (particularmente evidente<br />

nas plantas sujeitas fogos cíclicos); Erica australis (Ericaceae) e numerosas plantas das savanas africanas, sul-­‐<br />

americanas e australianas.<br />

Nas árvores a <strong>do</strong>minância apical é também intensa mas o desenvolvimento <strong>do</strong>s ramos é tendencialmente<br />

acrótono. Os crescimentos ocorrem pre<strong>do</strong>minantemente na extremidade <strong>do</strong>s ramos (zonas periféricas da copa).<br />

Com o tempo acaba por se formar um tronco bem defini<strong>do</strong> e um hábito arbóreo. Nas gimnospérmicas arbóreas a<br />

<strong>do</strong>minância <strong>do</strong>s meristemas apicais mantém-­‐se quase inaltera<strong>do</strong> durante to<strong>do</strong> o ciclo de vida, por conseguinte o<br />

número de meristemas laterais ativa<strong>do</strong>s (e de ramificações laterais) mantêm-­‐se escasso. As árvores crescem<br />

permanentemente em altura e mantêm um eixo primário bem defini<strong>do</strong> <strong>do</strong> solo até à flecha (parte distal da copa). As<br />

angiospérmicas arbóreas, regra geral, seguem um sistema intermédio – acrotonia <strong>do</strong>minante.<br />

A intensidade da acrotonia nas angiospérmicas varia de espécie para espécie e com a idade. Comparan<strong>do</strong> a<br />

macieira (Malus <strong>do</strong>mestica, Rosaceae) com a pereira (Pyrus communis, Rosaceae), duas importantes fruteiras<br />

temperadas, constata-­‐se nos indivíduos jovens, que a macieira tem tendência a formar ramos na parte inferior <strong>do</strong>s<br />

eixo, enquanto a pereira se ramifica intensamente na parte mais alta <strong>do</strong> eixo. A macieira é mais basítona (e menos<br />

acrótona) <strong>do</strong> que a pereira. A poda da pereira é mais exigente que a da macieira porque é muito difícil manter copas<br />

guarnecidas de ramos na base das pereiras, região onde é mais fácil (e barato) colher os frutos.<br />

À medida que as árvores angiospérmicas envelhecem, a <strong>do</strong>minância e o controlo apical esbatem-­‐se: os raminhos<br />

<strong>do</strong> ano (cada vez mais curtos) ramificam-­‐se abundantemente e o padrão de crescimento <strong>do</strong>s ramos situa<strong>do</strong>s na orla<br />

da copa aproxima-­‐se <strong>do</strong> modelo basítono. A forma e a altura da copa acabam por se estabilizar nas árvores adultas<br />

(o eixo primário desvanece-­‐se), ao mesmo tempo que se intensifica a desrama natural (queda natural de ramos, vd.<br />

Cla<strong>do</strong>ptose). Ao contrário <strong>do</strong> que acontece nas gimnospérmicas, o interior da copa fica pouco denso em ramos<br />

enquanto a orla permanece densamente revestida de raminhos. No início de cada estação de crescimento, regra<br />

geral, novos caules são emiti<strong>do</strong>s pelos meristemas apicais e axilares <strong>do</strong>s caules forma<strong>do</strong>s no ano imediatamente<br />

anterior, porém, sobretu<strong>do</strong> nas árvores velhas, ou com alterações profundas e recentes na conformação da copa<br />

(e.g. por poda, parasitismo ou acidente), surgem ramos epicórmicos (vd. Intensidade <strong>do</strong> alongamento), por vezes<br />

muito possantes e eficientes na competição pelos nutrientes radiculares com os ramos da copa.<br />

Cla<strong>do</strong>ptose<br />

Nas primeiras páginas deste volume defendeu-­‐se que as plantas estão condenadas a crescer (vd. Estrutura<br />

modular das plantas): a produção de ramos e folhas e a expansão da copa para capturar a luz é uma inevitabilidade<br />

nestes organismos. Nas plantas lenhosas a acumulação de ramos em grande número, ainda que modera<strong>do</strong> pela<br />

<strong>do</strong>minância apical, aumenta os gastos energéticos (todas as células vivas consomem energia), a resistência à<br />

deslocação <strong>do</strong>s flui<strong>do</strong>s floémicos e xilémicos, o risco de ensombramento e de lesões mecânicas nas folhas, e o risco<br />

de ruptura de ramos e pernadas por efeito <strong>do</strong> peso ou da ação mecânica <strong>do</strong> vento. Por conseguinte, a rejeição <strong>do</strong>s<br />

ramos em excesso na copa e a aquisição evolutiva de mecanismos para este efeito são potencialmente vantajosos.<br />

A abcisão de ramos chama-­‐se cla<strong>do</strong>ptose. Esta redução ativa da massa rameal, à semelhança da abcisão de<br />

folhas, flores abortadas, frutos maduros ou sementes, envolve a formação de camadas de teci<strong>do</strong>s especializa<strong>do</strong>s que<br />

acabam por cortar as conexões vasculares e provocar a morte <strong>do</strong>s ramos. Num processo distinto da cla<strong>do</strong>ptose, o<br />

peso e o vento forçam também a queda passiva <strong>do</strong>s ramos em excesso, selecionan<strong>do</strong>, preferencialmente, ramos<br />

ensombra<strong>do</strong>s, <strong>do</strong>entes ou mal inseri<strong>do</strong>s (os ramos cruza<strong>do</strong>s e sobrepostos são mais resistentes à força <strong>do</strong> vento e,<br />

por isso, passíveis de serem arrasta<strong>do</strong>s pelos filetes de ar). As árvores servem-­‐se <strong>do</strong> vento para limpar as suas copas.<br />

As ventanias e os temporais afinal podem ter um papel importante na saúde das árvores.


66 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Buck-­‐Sorlin & Bell (1998, cit. Bell 2008) recolheram <strong>do</strong> solo, durante um ano, sob a copa de uma árvore de<br />

Quercus robur, cerca de 37.000 fragmentos (excluin<strong>do</strong> folhas). As árvores não são eficientes por igual a libertarem-­‐se<br />

<strong>do</strong>s ramos em excesso. O Pinus pinaster (Pinaceae) «pinheiro-­‐bravo» desrama naturalmente, sobretu<strong>do</strong> em<br />

povoamentos densos. Os Cupressus (Cupressaceae) «ciprestes», não. À medida que os troncos de Cupressus<br />

engrossam incorporam no lenho a base <strong>do</strong>s ramos mais velhos, estejam eles vivos ou mortos. Para se obterem boas<br />

madeiras, por exemplo de C. lusitanica «cipreste-­‐<strong>do</strong>-­‐buçaco», é necessário desramar ciclicamente as árvores.<br />

Situação e consistência<br />

4.3.4. Aspectos gerais da morfologia externa <strong>do</strong> caule<br />

Quanto à situação os caules podem ser: aéreos – tipo <strong>do</strong>minante; aquáticos – e.g. caules de Ranunculus subgén.<br />

Batrachium (Ranunculaceae) «ranúnculos-­‐aquáticos»; subterrâneos – e.g. tubérculos de Solanum tuberosum<br />

(Solanaceae) «batateira». Quanto à consistência reconhecem-­‐se três tipos de caules: herbáceo – caule tenro<br />

normalmente verde; lenhoso – não verde e com a consistência da madeira; suculento ou carnu<strong>do</strong> – caules<br />

engrossa<strong>do</strong>s ricos em água e substâncias de reserva.<br />

Superfície<br />

Os caules herbáceos normalmente são verdes, lisos, de secção mais ou menos circular, glabros (sem pelos) ou<br />

revesti<strong>do</strong>s de indumento. Menos vezes apresentam-­‐se estria<strong>do</strong>s, sulca<strong>do</strong>s ou angulosos. Consoante a estrutura da<br />

medula os caules herbáceos podem ser: fistulosos – ocos, i.e. com uma cavidade tubulosa, e.g. caule da maioria das<br />

Poaceae «gramíneas»; medulosos – preenchi<strong>do</strong> por um teci<strong>do</strong> esponjoso, e.g. Sambucus nigra (A<strong>do</strong>xaceae)<br />

«sabugueiro»; maciços (= sóli<strong>do</strong>s) – medula não esponjosa, condição mais frequente.<br />

À semelhança <strong>do</strong> que acontece nas folhas, as células vivas <strong>do</strong>s caules herbáceos realizam as trocas gasosas<br />

necessárias à respiração celular através de estomas dispersos pela epiderme. A formação <strong>do</strong> corpo secundário pelos<br />

câmbios líbero-­‐lenhoso e subero-­‐felodérmico implica a lenhificação <strong>do</strong>s caules herbáceos. To<strong>do</strong>s os caules lenhosos<br />

são inicialmente herbáceos; a consistência lenhosa é uma consequência <strong>do</strong> crescimento secundário, assim como a<br />

formação de lentículas (vd. Estrutura secundária <strong>do</strong> caule).<br />

A superfície <strong>do</strong>s caules lenhosos é particularmente variável. A periderme pode ser castanha, cinzenta (e.g. Celtis<br />

australis [Cannabaceae] «lódão-­‐bastar<strong>do</strong>»), creme ou mesmo branca (e.g. Betula [Betulaceae] «bi<strong>do</strong>eiro»). Depois<br />

de extraída a cortiça no Quercus suber «sobreiro» a periderme é inicialmente rosa toman<strong>do</strong>, pouco depois, uma cor<br />

vermelho-­‐ocre e mais tarde castanha. A periderme pode ainda ser brilhante (e.g. Pinus nigra [Pinaceae] «pinheiro-­‐<br />

negro») ou baça (Quercus [Fagaceae]), espessa (e.g. Q. suber) ou delgada (e.g. Rosa [Rosaceae] «roseiras»), mole<br />

(e.g. Sequoia sempervirens [Cupressaceae] «sequoia») ou dura (codição mais frequente), lisa (e.g. Celtis australis),<br />

sulcada (e.g. Quercus) ou destacar-­‐se em placas (e.g. Platanus orientalis [Platanaceae] «plátano»), em fitas verticais<br />

(e.g. Eucalyptus [Myrtaceae] «eucaliptos») ou em fitas horizontais (e.g. Prunus avium [Rosaceae] «cerejeira»). No<br />

Populus nigra (Salicaceae) «choupo-­‐negro», entre outras espécies, formam-­‐se bolsas com rebentos epicórmicos no<br />

tronco, algo que não acontece nos choupos-­‐híbri<strong>do</strong>s (e.g. P. x canadensis).<br />

4.3.5. Metamorfoses <strong>do</strong> caule<br />

O caule é evolutivamente mais versátil <strong>do</strong> que a raiz. Entre os casos descritos de adaptações caulinares referem-­‐<br />

se: caules de reserva; suculência; caules com funções foliares; caules com <strong>função</strong> de defesa (vd. Emergências e<br />

Espinhos); caules com <strong>função</strong> de suporte. Os caules de reserva mais frequentes em climas sazonais quan<strong>do</strong> são<br />

necessárias reservas de fácil mobilização para iniciar o crescimento no início da estação favorável, e.g. tubérculos,<br />

rizomas e bolbos (vd. Quadro 14). Além <strong>do</strong>s caules espinhosos ou aculea<strong>do</strong>s, entre as lianas observam-­‐se as<br />

seguintes soluções adaptativas com <strong>função</strong> de suporte: caules volúveis e gavinhas caulinares.<br />

No Quadro 14 resumem-­‐se as principais características <strong>do</strong>s mais importantes tipos de caules (metamorfoses <strong>do</strong><br />

caule).


67 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Quadro 14. Metamorfose <strong>do</strong> caule (tipos de caule)<br />

Tipo Descrição/exemplos<br />

Rizoma caule subterrâneo, vertical (Elytrigia juncea, Poaceae), horizontal (e.g. Ammophila arenaria «estorno»,<br />

Poaceae) ou oblíquo (e.g. Chrysanthemum «crisântemos», Asteraceae), ramifica<strong>do</strong> ou não, com<br />

abundantes raízes adventícias caulógenas, geralmente inseridas nos nós, revesti<strong>do</strong> de folhas escamiformes<br />

(catáfilos) que axilam gemas ou os caules aéreos gera<strong>do</strong>s pelas gemas; com frequência engrossa<strong>do</strong> (rizoma<br />

tuberoso) e com funções de reserva, e.g. Iris «lírios» (Iridaceae) e Zingiber officinale «gengibre»<br />

(Zingiberaceae); as partes mais velhas <strong>do</strong>s rizomas vão morren<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> substituídas por outras de forma<br />

monopodial (rizomas monopodiais) ou simpodial (rizomas simpodiais, tipo mais comum). A posição<br />

horizontal próxima da superfície <strong>do</strong> solo de muitos rizomas facilita a disseminação vegetativa das plantas;<br />

não surpreende, por isso, que os rizomas sejam muito frequentes em habitats ciclicamente perturba<strong>do</strong>s<br />

que promovam a fragmentação e transporte <strong>do</strong>s rizomas; e.g. margens de cursos de água e sistemas<br />

dunares (Figura 36)<br />

Estolho caule aéreo, prostra<strong>do</strong> e com raízes adventícias caulógenas emitidas nos nós; o Cyno<strong>do</strong>n dactylon «grama»<br />

e o Stenotaphrum secundatum «gramão, grama-­‐de-­‐jardim», entre muitas outras Poaceae, emitem caules<br />

radicantes nos nós, os quais, consoante mergulham ou emergem <strong>do</strong> solo, são classifica<strong>do</strong>s como rizomas<br />

ou estolhos (Figura 36)<br />

Tubérculo caule engrossa<strong>do</strong>, com abundantes reservas, folhas reduzidas a pequenas escamas com uma gema axilar e<br />

sem raízes adventícias; geralmente formam-­‐se na extremidade de caules aéreos ou de rizomas; em<br />

condições apropriadas as gemas axilares dão origem a novos caules; os tubérculos podem ser:<br />

subterrâneos – ocultos no solo; e.g. Solanum tuberosum (Solanaceae) «batateira; Aéreos – forma<strong>do</strong>s acima<br />

da superfície <strong>do</strong> solo; e.g. Dioscorea alata «inhame-­‐de-­‐são-­‐tomé»<br />

Prato ou<br />

disco <strong>do</strong>s<br />

bolbos<br />

Cormos 38<br />

(= bolbos<br />

sóli<strong>do</strong>s)<br />

caule curto e de entrenós curtos, geralmente subterrâneo ou localiza<strong>do</strong> à superfície <strong>do</strong> solo, de<br />

crescimento vertical e com um grande número de raízes adventícias na base, revesti<strong>do</strong> por uma ou mais<br />

folhas carnudas de reserva e, nos bolbos entunica<strong>do</strong>s, por uma túnica externa constituída por uma ou mais<br />

folhas membranosas de proteção (catáfilos); o conjunto prato <strong>do</strong> bolbo + folhas recebe o nome de bolbo<br />

(vd. Bolbos e bolbilhos )<br />

resultam <strong>do</strong> engrossamento, na vertical, de um segmento de caule com um ou mais entrenós, revesti<strong>do</strong><br />

por uma ou mais folhas de proteção e com raízes adventícias na base; as inflorescências inserem-­‐se no<br />

ápice <strong>do</strong>s cormos; a renovação <strong>do</strong>s cormos faz-­‐se pela produção de um ou mais cormos-­‐filho pela gema<br />

apical ou por gemas laterais; a subordinação <strong>do</strong> cormo ao conceito de bolbo (vd. Bolbos e bolbilhos) é<br />

imprópria porque os cormos são morfológica e funcionalmente mais próximos <strong>do</strong> rizoma (os rizomas<br />

distinguem-­‐se <strong>do</strong>s cormos por não se apresentarem revesti<strong>do</strong>s por folhas membranosas); os cormos muito<br />

pequenos caem no conceito de bolbilho (vd. Bolbos e bolbilhos); e.g. Poa bulbosa (Poaceae), Crocus sativus<br />

(Iridaceae) «açafrão», Gladiolus (Iridaceae) «gladíolos», Freesia (Iridaceae) «frésia», Sinningia speciosa<br />

(Gesneriaceae) «gloxinia» e Begonia (Begoniaceae) «begónias» tuberosas; os pseu<strong>do</strong>bolbos de muitas<br />

orquídeas tropicais são, na realidade, cormos revesti<strong>do</strong>s de folhas espessas (Figura 37)<br />

Escapo caule mais ou menos longo, geralmente sem folhas (áfilo), por vezes com brácteas (vd. Brácteas), que<br />

termina numa flor ou numa inflorescência, provi<strong>do</strong> ou não de uma roseta de folhas na base, as quais, como<br />

ele, originadas num bolbo, num rizoma ou em raízes tuberosas; e.g. Bellis (Asteraceae) «margaridas» e<br />

Hyacinthus (Hyacinthaceae) «jacintos»<br />

Colmo caules, geralmente herbáceos, de nós bem marca<strong>do</strong>s, frequentemente ocos (fistulosos), revesti<strong>do</strong>s pelas<br />

bainhas das folhas; caule característico da família das Poaceae<br />

Espique caule não ramifica<strong>do</strong>, revesti<strong>do</strong> por restos de folhas, geralmente cilíndrico e esguio, culmina<strong>do</strong> por uma<br />

roseta de grandes folhas, com feixes líbero-­‐lenhosos fecha<strong>do</strong>s em grande número e dispostos<br />

irregularmente; caule das Arecaceae «palmeiras»<br />

Tronco caule lenhoso, próprio das árvores gimnospérmicas e da maioria das angiospérmicas de hábito arbóreo,<br />

desprovi<strong>do</strong> de ramos na base, geralmente cónico e engrossan<strong>do</strong> com a idade<br />

Sarmento caule lenhoso, muito longo, delga<strong>do</strong> e flexível que, apoia<strong>do</strong> em outras plantas, se pode elevar; os<br />

sarmentos jovens, não atempa<strong>do</strong>s (i.e. de cor ainda verde), recebem o nome de pâmpanos; e.g. Vitis<br />

vinifera (Vitaceae) «videira-­‐europeia»<br />

Turião rebentos, frequentemente vigorosos, de origem subterrânea (e.g. Asparagus (Asparagaceae) «espargos»)<br />

38 O termo cormo tem <strong>do</strong>is significa<strong>do</strong>s; não confundir com cormo sensu corpo das plantas.


68 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Filocládio 39<br />

(= cladódio)<br />

Caules<br />

suculentos<br />

Caules<br />

volúveis<br />

Gavinhas<br />

caulinares<br />

A<br />

ou aérea (e.g. Rosa (Rosaceae) «roseiras»), com folhas (por vezes rudimentares) e sem flores, emiti<strong>do</strong>s na<br />

estação de crescimento por plantas vivazes ou perenes; em Rubus e Rosa as flores formam-­‐se nos ramos<br />

<strong>do</strong> ano laça<strong>do</strong>s pelos turiões nasci<strong>do</strong>s no ano anterior<br />

caule achata<strong>do</strong>, mais ou menos laminar, que desempenha a <strong>função</strong> clorofilina, no qual por vezes se<br />

inserem ramos, folhas reduzidas ou flores; na maior parte <strong>do</strong>s casos são adaptações à secura edáfica; os<br />

caules de Ruscus aculetus (Ruscaceae) «gilbardeira» e de Opuntia (Cactaceae) são <strong>do</strong>is exemplos clássicos<br />

de filocládio (Figura 37)<br />

caules volumosos, ricos em água, de diâmetro variável consoante a disponibilidade de água no solo; folhas<br />

frequentemente ausentes ou reduzidas a espinhos; e.g. Cactaceae «cactos» e muitas Euphorbiaceae<br />

africanas e macaronésicas de climas semi-­‐ári<strong>do</strong>s a ári<strong>do</strong>s<br />

caules que se adaptam à superfície ou enrolam em torno <strong>do</strong> tutor; e.g. Aristolochia sp.pl.<br />

(Aristolochiaceae), Ipomoea sp.pl. (Convolvulaceae) e Jasminum sp.pl. (Oleaceae) «jasmineiros»; consoante<br />

as espécies os caules volúveis enrolam-­‐se tanto para a direita – caules dextrorsos, e.g. Phaseolus<br />

(Fabaceae) «feijoeiros» – como para a esquerda – caules sinistrorsos, condição mais rara, e.g. Humulus<br />

lupulus (Cannabaceae) «lúpulo»<br />

extremidades delgadas de caules flexíveis, ramificadas ou não, desprovidas de nomofilos, adaptadas a<br />

envolver ramos ou outros tipos de suportes; e.g. gavinhas de Vitis vinifera (Vitaceae) «videira» e Passiflora<br />

(Passifloraceae) «maracujazeiros»; as gavinhas podem ter ainda origem foliar (vd. Outras metamorfoses da<br />

folha); em ambos os casos, depois de contactarem com os tutores, o enrolamento da gavinha é força<strong>do</strong> por<br />

um crescimento mais lento <strong>do</strong>s teci<strong>do</strong>s mais próximos <strong>do</strong> tutor <strong>do</strong> que os teci<strong>do</strong>s externos<br />

Figura 36. Rizoma e tubérculo. a) Rizoma de Cyno<strong>do</strong>n dactylon (Poaceae) «grama» e tubérculo de Solanum tuberosum<br />

(Solanaceae) «batateira» (Coutinho, 1898). b) Estolhos de Fragaria vesca (Rosaceae) «morangueiro-­‐bravo» (Coutinho,<br />

1898).<br />

A B C<br />

39 Alguns autores restringem o termo filocládio aos braquiblastos análogos a folhas (e.g. Ruscus) e apelidam de platicla<strong>do</strong> os<br />

macroblastos laminares (e.g. Opuntia).<br />

B<br />

Figura 37. Mais metamorfoses <strong>do</strong> caule. A) Cormos de Arrhenatherum bulbosum subsp. baeticum (Poaceae)<br />

«balanquinho». B) Filocládio de Ruscus aculetatus (Ruscaceae) «gilbardeira». C) Filocládios de Opuntia elongata


69 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

O tronco (= fuste, na terminologia silvícola) suporta a copa, a parte aérea<br />

ramificada e com folhas das árvores. Na Figura 38 está resumida a<br />

terminologia mais comum para designar as ramificações que nas árvores se<br />

sucedem ao tronco. As primeiras ramificações são designadas por pernadas; a<br />

seguir inserem-­‐se as braças e depois os ramos e os ramos <strong>do</strong> ano (raminhos).<br />

O ami<strong>do</strong> e inulina são as substâncias de reserva mais frequentes nos<br />

rizomas tuberosos e nos tubérculos (vd. Metamorfoses da raíz): os rizomas de<br />

Helianthus tuberosus (Asteraceae) «tupinambo» têm cerca de 14-­‐19% de<br />

inulina na MS (Van Loo, Coussement, Leenheer, Hoebregs, & Smits, 1995); as<br />

batatas (Solanum tuberosum, Solanaceae) contêm 60-­‐80% de ami<strong>do</strong> na MS.<br />

4.3.6. Produção de látex<br />

Algumas angiospérmicas exsudam, naturalmente ou por feridas, líqui<strong>do</strong>s<br />

de diferente cor e viscosidade. Os exsuda<strong>do</strong>s mais ou menos viscosos, não<br />

translúci<strong>do</strong>s, de cor branca, amarela, laranja, vermelha ou negra são<br />

designa<strong>do</strong>s por látex. O látex é uma emulsão complexa de proteínas, açúcares, resinas, gomas e alcaloides, por vezes<br />

de grande toxicidade, que coagula e seca quan<strong>do</strong> exposta ao ar. Podem existir canais lacticíferos nos caules, raízes,<br />

folhas e frutos, porém são sempre mais abundantes no caule. O látex desempenha três funções maiores: proteção<br />

contra fungos e bactérias; proteção contra a herbivoria; eliminação de subprodutos tóxicos <strong>do</strong> metabolismo.<br />

Mais de 12.000 espécies de plantas-­‐com-­‐flor produzem látex. A sua presença, cor e abundância têm grande<br />

interesse taxonómico, sobretu<strong>do</strong> entre a flora arbórea e lianoide tropical. As espécies lacticíferas mais frequentes na<br />

flora Portuguesa pertencem à subfamília Cichorioideae das Asteraceae e ao género Euphorbia (Euphorbiaceae)<br />

«eufórbias». Pertence, igualmente, à família Euphorbiaceae a Hevea brasiliensis «árvore-­‐da-­‐borracha» cujo látex é<br />

utiliza<strong>do</strong> no fabrico da borracha-­‐natural. Muitas outras famílias compreendem espécies produtoras de látex:<br />

Moraceae (e.g. géneros Ficus «figueiras» e Morus «amoreiras»), Caricaceae (e.g. Carica papaya «mamão»),<br />

Apocynaceae (e.g. lianas africanas <strong>do</strong> género Lan<strong>do</strong>lphia) e Anacardiaceae (e.g. Rhus coriaria «sumagre»). O látex é<br />

também muito frequente nas plantas da família Papaveraceae: o látex de Papaver «papoilas» é rico em alcaloides<br />

psicotrópicos (e.g. morfina, um deriva<strong>do</strong> da fenilalanina) e o látex amarelo de Cheli<strong>do</strong>nium majus «celidónia ou erva-­‐<br />

das-­‐verrugas» serve para cauterizar cravos e verrugas.<br />

4.4. Folha<br />

A folha é um órgão lateral inseri<strong>do</strong> nos caules, usualmente de forma laminar e estrutura <strong>do</strong>rsiventral (= bifacial),<br />

de crescimento rápi<strong>do</strong> e por regra finito (crescimento determina<strong>do</strong>). A <strong>do</strong>rsiventralidade implica que as superfícies<br />

(páginas) superior e inferior sejam claramente distintas e que, geralmente, exista um só plano de simetria. A página<br />

superior está especializada na intercepção e no processamento bioquímico da sua luz, a página inferior está<br />

optimizada para absorver CO2. As plantas-­‐vasculares só secundariamente 40 não têm folhas ou estas estão reduzidas a<br />

bainhas ou pequenas escamas, dizen<strong>do</strong>-­‐se então áfilas.<br />

4.4.1. Funções da folha<br />

As folhas desempenham várias funções. As mais relevantes estão sistematizadas no Quadro 15.<br />

40 Secundariamente porque os ancestrais das plantas áfilas dispunham de folhas.<br />

Figura 38. Designações correntes<br />

das ramificações das árvores.<br />

Legenda: a) tronco, b) pernada, c)<br />

braça, d) ramo, e) raminho e f)<br />

rebento (adapta<strong>do</strong> de Vasconcellos,<br />

1968)


70 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Quadro 15. Funções das folhas<br />

Função Descrição/comentários<br />

Assimilação<br />

(fotossíntese)<br />

na maior parte das plantas a produção de fotoassimila<strong>do</strong>s ocorre ao nível das folhas<br />

Transpiração por definição a perda de água sob a forma de vapor pela cutícula ou pelos estomas; fundamental no<br />

arrefecimento das plantas e na génese das forças de sucção responsáveis pela circulação de água e<br />

nutrientes nas plantas; a turgidez excessiva reduz o crescimento, a transpiração ao reduzir o teor de água<br />

das células, dentro de determina<strong>do</strong>s limites, incrementa a taxa de crescimento das plantas<br />

Proteção os meristemas estão sempre protegi<strong>do</strong>s por esboços foliares (= folhas recém-­‐diferenciadas ainda imaturas)<br />

ou por folhas “modificadas” para o efeito (catáfilos)<br />

Reserva as folhas que revestem os bolbos são o exemplo mais conheci<strong>do</strong> de folhas de reserva; e.g. Allium cepa<br />

(Alliaceae) «cebola»<br />

Reprodução as peças florais são folhas muito modificadas; raramente, por via assexuada, obtêm-­‐se novas plantas a<br />

partir de pequenas gemas diferenciadas na margem das folhas ou de folhas com capacidade de emitir<br />

raízes adventícias peciolares, e.g. Begonia (Begoniaceae) «begónias»<br />

Absorção de<br />

nutrientes<br />

90% da matéria seca em peso das plantas é constituída, em partes aproximadamente iguais, por carbono e<br />

oxigénio; as folhas capturam <strong>do</strong> ar o carbono e a maioria <strong>do</strong> oxigénio; nos ecossistemas naturais as folhas<br />

desempenham um papel significativo na absorção <strong>do</strong> azoto (sob a forma de amoníaco gasoso e dióxi<strong>do</strong> de<br />

azoto) e <strong>do</strong> fósforo (sobretu<strong>do</strong> nos ecossistemas tropicais)<br />

Suporte através de folhas reduzidas a gavinhas (vd. Outras metamorfoses da folha)<br />

4.4.2. Anatomia da folha<br />

As folhas têm origem nas folhas primordiais <strong>do</strong> embrião ou em pequenas projeções cónicas (esboços foliares)<br />

diferenciadas na superfície <strong>do</strong>s meristemas apicais caulinares. Num momento muito precoce da diferenciação da<br />

folha das gramíneas e outras monocotiledóneas, o crescimento deste órgão depende de um meristema intercalar<br />

folhear (Quadro 4), fracciona<strong>do</strong> em duas partes na região de contacto entre a bainha e o limbo. O alongamento foliar<br />

realiza-­‐se, então, pela extremidade distal da bainha e na base (parte proximal) <strong>do</strong> limbo (vd. O corpo das gramíneas).<br />

A respeito <strong>do</strong> crescimento da folha nas restantes angiospérmicas importa apenas referir que ao invés <strong>do</strong> limbo, o<br />

crescimento é ce<strong>do</strong> suprimi<strong>do</strong> no pecíolo. A anatomia <strong>do</strong> pecíolo aproxima-­‐se da <strong>do</strong> caule primário pelo que não<br />

será desenvolvida neste texto.<br />

Os três sistemas de teci<strong>do</strong>s descritos no ponto Teci<strong>do</strong>s vegetais estão também presentes na folha: teci<strong>do</strong> dérmico<br />

– epiderme; teci<strong>do</strong> vascular – feixes vasculares; e teci<strong>do</strong> fundamental – na folha genericamente nomea<strong>do</strong> por<br />

mesofilo 41 . A anatomia da folha é francamente mas diversa <strong>do</strong> que a da raiz e <strong>do</strong> caule. O seu estu<strong>do</strong> resumir-­‐se-­‐à,<br />

porém, às folhas de <strong>do</strong>rsiventrais e equifaciais de eudicotiledóneas e às folhas <strong>do</strong>rsiventrais de monocotiledóneas<br />

(vd. Posição das folhas).<br />

Epiderme<br />

À semelhança <strong>do</strong>s restantes órgãos primários, designa-­‐se por epiderme a camada celular mais externa das folhas<br />

(vd. Teci<strong>do</strong>s definitivos complexos). Eventualmente a epiderme pode ter mais de uma célula de espessura (=<br />

multisseriada) (Figura 39). O mesofilo da folha corresponde à massa de células entre a epiderme da página superior e<br />

a epiderme da página inferior. A forma das células epidérmicas foliares é variável. Nas folhas das poáceas são<br />

alongadas no senti<strong>do</strong> <strong>do</strong>s feixes vasculares e, implicitamente, <strong>do</strong> eixo maior das folhas. Em muitas poáceas, por<br />

exemplo, a células epidérmicas “normais” são interrompidas por células de grandes dimensões, de paredes delgadas<br />

e grande vacúolo – as células buliformes (= células motoras) – que desempenham um importante papel no<br />

enrolamento das folhas quan<strong>do</strong> as raízes são incapazes de repor as perdas de água por evapotranspiração na parte<br />

41 O termo mesófilo, com acentuação aguda, usa-­‐se em ecologia para qualificar as plantas adaptadas a condições de humidade<br />

intermédia <strong>do</strong> solo.


71 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

aérea (Figura 40). Este enrolamento é uma forma elegante das folhas reduzirem as suas perdas de água. Ainda nas<br />

poáceas são frequentes na epiderme corpos de sílica (vd. A célula vegetal).<br />

Como acontece no caule primário, a folha está recoberta por<br />

uma cutícula (vd. Teci<strong>do</strong>s definitivos complexos) interrompida por<br />

estomas e vários outros tipos de estruturas. Os estomas (ing.<br />

stoma, pl. stomata) são pequenos poros (= ostíolos) que pontuam<br />

a epiderme, margina<strong>do</strong>s por duas células-­‐guarda de geometria<br />

variável (fecham e abrem o poro), ricas em cloroplastos, com uma<br />

parede celular desigualmente espessada, reniformes (em forma<br />

rim) na maior parte das plantas, ou halteriformes (em forma de<br />

haltere) nas gramíneas e ciperáceas. As células em contato com as<br />

células-­‐guarda têm, frequentemente, um papel importante na sua<br />

fisiologia, sen<strong>do</strong> então designadas por células subsidiárias (=<br />

células anexas). O conjunto “estoma + células subsidiárias”<br />

constitui o complexos estomático (= aparelho estomático). Por<br />

debaixo <strong>do</strong> estoma, no mesofilo da folha, situa-­‐se uma câmara<br />

estomática. A disposição espacial destes tipos celulares deu<br />

origem a uma complexa tipologia <strong>do</strong>s estomas que não cabe aqui<br />

desenvolver. Os estomas regulam as trocas gasosas com o<br />

exterior. Ocorrem nas folhas, nos caules primários e em algumas<br />

peças da flor.<br />

Nas folhas <strong>do</strong>rsiventrais os estomas foliares concentram-­‐se na<br />

página inferior, poden<strong>do</strong> ou não estar presentes na página<br />

superior. Algumas plantas aquáticas de folhas flutuantes só têm<br />

estomas na página superior. Em muitas espécies xeromórficas, e.g.<br />

na Olea europaea «oliveira» (Oleaceae) ou no Nerium oleander<br />

«loendro» (Apocynaceae), os estomas estão abriga<strong>do</strong>s em<br />

reentrâncias (criptas estomáticas) mais ou menos recobertas de<br />

pelos com a <strong>função</strong> de reduzirem as perdas de água por transpiração (Figura 39). Os nectários foram aborda<strong>do</strong>s no<br />

ponto referente aos Corpos nutritivos, hidáto<strong>do</strong>s e nectários extraflorais. Outro importante grupo de estruturas<br />

observáveis na superfície das folhas, de que são exemplo os acúleos e o indumento, está descrito no ponto dedica<strong>do</strong><br />

às Emergências.<br />

Mesofilo. Anatomia da folha.<br />

Figura 39. Anatomia da folha <strong>do</strong>rsiventral de<br />

uma dicotiledónea (Nerium oleander «loendro»<br />

Apocynaceae). p, parênquima em paliçada; l,<br />

parênquima lacunoso; ep, epiderme<br />

multisseriada; estomas encerra<strong>do</strong>s numa cripta<br />

estomática; m, inclusão de oxalato de cálcio (Van<br />

Tieghem, 1898).<br />

Sobretu<strong>do</strong> em espécies xeromórficas (com adaptações à secura edáfica) desenvolve-­‐se frequentemente uma<br />

epiderme multisseriada ou, adjacente à epiderme, uma hipoderme com uma ou mais camadas ordenadas de células<br />

não fotossintéticas de paredes espessas.<br />

Nas folhas <strong>do</strong>rsiventrais das dicotiledóneas distingue-­‐se <strong>do</strong>is tipos de clorênquima (parênquima clorofilino):<br />

parênquima em paliçada e parênquima lacunoso (Figura 39). O parênquima em paliçada situa-­‐se por debaixo da<br />

epiderme da página superior. É constituí<strong>do</strong> por células com abundantes cloroplastos, cilíndricas, dispostas numa<br />

espécie de muralha (paliçada) compacta, de eixo maior perpendicular à superfície da folha. O verde mais escuro que<br />

caracteriza a página superior das folhas <strong>do</strong>rsiventrais deve-­‐se ao parênquima em paliçada. O parênquima lacunoso<br />

tem uma posição abaxial . As suas células apresentam uma forma variada, tem uma parede celular delgada, menos<br />

cloroplastos <strong>do</strong> que as células <strong>do</strong> parênquima em paliçada e dispõem-­‐se irregularmente crian<strong>do</strong> abundantes espaços<br />

intercelulares (lacunas), algum <strong>do</strong>s quais abrem para o exterior através <strong>do</strong>s estomas. Nas dicotiledóneas de folhas<br />

equifaciais (e.g. Eucalyptus, Myrtaceae) o mesofilo é preenchi<strong>do</strong> com parênquima em paliçada, estan<strong>do</strong> o<br />

parênquima lacunoso ausente ou reduzi<strong>do</strong> a uma faixa estreita no centro da folha (Moreira, Anatomia das Plantas:<br />

Estruturas, 2010).<br />

A folhas <strong>do</strong>rsiventrais nas monocotiledóneas apresentam diferenças anatómicas notáveis frente às folhas<br />

<strong>do</strong>rsiventrais das dicotiledóneas. A distribuição <strong>do</strong>s estomas é muito mais regular entre as duas faces das folhas nas


72 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

monocotiledóneas <strong>do</strong> que nas dicotiledóneas. O mesofilo está<br />

preenchi<strong>do</strong> com um clorênquima esponjoso, não se distinguin<strong>do</strong><br />

parênquima em paliçada e parênquima lacunoso (Figura 40).<br />

Os feixes vasculares sobressaem no limbo sob a forma de<br />

nervuras. Nas dicotiledóneas têm uma posição mediana, entre os<br />

parênquimas em paliçada e lacunoso, com o xilema numa posição<br />

adaxial, e o floema abaxial. Na maior parte <strong>do</strong>s casos, o pecíolo da<br />

folha tem um grande feixe vascular colateral fecha<strong>do</strong>, coadjuva<strong>do</strong><br />

ou não por outros feixes análogos. A disposição colateral <strong>do</strong><br />

xilema e <strong>do</strong> floema prolonga-­‐se pelo limbo foliar, geralmente já só<br />

com um feixe vascular por nervura. Nas nervuras terminais os<br />

feixes vasculares estão reduzi<strong>do</strong>s ao xilema. Os feixes bicolaterais<br />

e anfibasais são infrequentes ao nível da folha. Nas<br />

angiospérmicas é comum observar-­‐se uma bainha compacta, com<br />

uma ou duas células de espessura, a envolver radialmente as<br />

nervuras mais finas. Nas monocotiledóneas estas bainhas<br />

envolvem parênquima e esclerênquima. Como adiante se explica,<br />

a bainha de parênquima é distinta nas plantas ditas C3 e C4 (vd.<br />

Anatomia de Kranz). Os tipos de nervação <strong>do</strong> limbo estão<br />

discuti<strong>do</strong>s no Quadro 18.<br />

Em muitas espécies a rigidez das folhas é atribuída por feixes<br />

longitudinais de teci<strong>do</strong>s mecânicos, de colênquima e/ou<br />

esclerênquima, localiza<strong>do</strong>s na margem das folhas ou em torno<br />

<strong>do</strong>s feixes vasculares. Os feixes vasculares das nervuras principais são mais espessos e reforça<strong>do</strong> com teci<strong>do</strong>s<br />

mecânicos <strong>do</strong> que os restantes. A disposição espacial <strong>do</strong>s teci<strong>do</strong>s de suporte tem um grande interesse taxonómico<br />

em alguns géneros de gramíneas (e.g. Festuca). As folhas de Euphorbia (Euphorbiaceae) e de Ficus (Moraceae), entre<br />

outros géneros produtores de látex, são percorridas por canais lacticíferos. Muitas mirtáceas (e.g. Eucalyptus) e os<br />

citrinos (plantas <strong>do</strong> género Citrus, Rutaceae) apresentam bolsas secretórias de óleos essenciais embebidas no<br />

mesofilo foliar, visíveis a olho nu.<br />

Anatomia de Kranz<br />

Existem três tipos de metabolismo<br />

fotossintético nas plantas terrestres: C3, C4 e<br />

metabolismo áci<strong>do</strong> das crassuláceas (plantas<br />

CAM) (Teixeira & Ricar<strong>do</strong>, 1993). Os modelos C3<br />

e C4 têm uma tradução a nível anatómico. As<br />

designações C3 e C4 referem-­‐se à estrutura<br />

carbonada <strong>do</strong> primeiro produto da fixação<br />

biológica <strong>do</strong> CO2. Nas plantas C3 o CO2 é fixa<strong>do</strong><br />

nas células <strong>do</strong> mesofilo foliar pela enzima mais<br />

abundante <strong>do</strong> planeta, a ribulose bifosfato<br />

carboxilase/oxigenase, de acrónimo RuBP ou<br />

RuBisCo, produzin<strong>do</strong>-­‐se uma molécula de 3<br />

Figura 40. Anatomia da folha de uma<br />

monocotiledónea (Zea mays «milho» Poaceae).<br />

a, fibras de esclerênquima; b, floema; c, xilema;<br />

d, epiderme; e, bainha de Kranz; f, células<br />

buliformes. N.b. pelo na figura B (Sass, 1951)<br />

Figura 41. Anatomia de Kranz. Representação diagramática de um<br />

corte histológico transversal da folha. Legenda: V) feixes vasculares;<br />

P) células de parênquima em paliçada; K) bainha de Kranz.<br />

carbonos. Nas plantas C4 o CO2 primeiro é metaboliza<strong>do</strong> nas células <strong>do</strong> mesofilo. Um áci<strong>do</strong> em C4 é depois<br />

transporta<strong>do</strong> para as células da bainha de Kranz. O áci<strong>do</strong> em C4 é então descarboxila<strong>do</strong> e as moléculas de CO2<br />

cedidas à RuBisCo, retoman<strong>do</strong>-­‐se o mecanismo anabólico de fixação <strong>do</strong> CO2 característico das plantas C3 (ciclo de<br />

Calvin-­‐Benson).<br />

As células de Kranz contêm grânulos de ami<strong>do</strong> e um grande número de cloroplastos de grande dimensão.<br />

Envolvem radialmente os feixes vasculares, até à nervuras de ordem superior, desenhan<strong>do</strong> uma bainha unicelular,<br />

com duas camadas de células em algumas monocotiledóneas. As células <strong>do</strong> parênquima, por sua vez, estão


73 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

orientadas radialmente para a bainha de Kranz (Figuras 40 e 41). Nas plantas C3 as células que embainham os feixes<br />

vasculares podem ou não possuir clorofila. A fotossíntese C4 evolui pelo menos 66 vezes de forma independente a<br />

partir de ancestrais C3 (Sage, Sage, & Kocacinar, 2012). Por causas fisiológicas que não cabe aqui desenvolver a<br />

fotossíntese C4 é vantajosa sob duas condições ambientais: baixas concentrações de CO2 e/ou elevadas<br />

temperaturas. É particularmente frequente nas monocotiledóneas, sobretu<strong>do</strong> nas Poaceae (e.g. Saccharum<br />

officinarum «cana-­‐<strong>do</strong>-­‐açucar» e Zea mays «milho-­‐graú<strong>do</strong>») (Figura 40) e nas Cyperaceae de climas tropicais.<br />

Adaptações anatómicas ao nível da folha<br />

As espécies xeromórficas, i.e. adaptadas a climas secos, exibem várias adaptações a nível anatómico, entre as<br />

quais: cutícula de grande espessura, câmaras estomáticas, revestimento de tricomas, epiderme multisseriada ou<br />

hipoderme, feixes densos de esclerênquima para impedir o colapso das folhas e suculência foliar. Características<br />

inversas ocorrem nas plantas de locais sombrios e húmi<strong>do</strong>s.<br />

4.4.3. Filomas<br />

Teoria telomática de W. Zimmermann<br />

A teoria telomática de W. Zimmermann tem<br />

servi<strong>do</strong>, desde os anos 30 <strong>do</strong> século passa<strong>do</strong>, para<br />

explicar as inovações evolutivas verificadas ao nível<br />

<strong>do</strong> caule e da folha, nas primeiras fases da evolução<br />

das plantas-­‐vasculares. De acor<strong>do</strong> com esta teoria,<br />

a condição ancestral <strong>do</strong> cormo das plantas-­‐<br />

vasculares resumir-­‐se-­‐ia a um sistema<br />

tridimensional de caules áfilos (sem folhas), com<br />

um único feixe vascular, dicotomicamente<br />

ramifica<strong>do</strong>s, representa<strong>do</strong> pelos fósseis de Rhynia<br />

(Rhyniophyta). A evolução da fisionomia e da<br />

anatomia das traqueófitas ancestrais poderia ser<br />

explanada com base num conjunto reduzi<strong>do</strong> de<br />

Figura 42. Eventos elementares ocorri<strong>do</strong>s ao nível <strong>do</strong>s<br />

telomas. Formação <strong>do</strong>s megafilos a partir de um sistema de<br />

telomas envolven<strong>do</strong> uma sequência de três processos<br />

elementares: A – culminação (ing. overtopping), B – planação<br />

(ing. planation) e C – concrescência (ing. webbing) (Bold et al.,<br />

1987).<br />

processos elementares ocorri<strong>do</strong>s ao nível <strong>do</strong>s segmentos terminais estéreis <strong>do</strong>s caules (telomas), entre os quais<br />

(Beerling, 2005): culminação – diferenciação de ramos laterais determina<strong>do</strong>s (telomas) <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>s por caules (eixos)<br />

de crescimento indetermina<strong>do</strong>; planação – torção <strong>do</strong>s sistemas de ramos laterais (telomas) de mo<strong>do</strong> a ocuparem um<br />

mesmo plano; concrescência – união de telomas; redução – simplificação e redução <strong>do</strong>s telomas a estruturas de<br />

pequena dimensão.<br />

A folha, num senti<strong>do</strong> lato, evoluiu, pelo menos, por duas vezes nas plantas-­‐vasculares 42 , sob a forma de microfilo<br />

e de megafilo. Os microfilos são estruturas foliares pequenas, em forma de agulha (aciculares), com uma única<br />

nervura não ramificada e sem lacunas foliares. Crescem de forma difusa, de forma mais intensa na base, pela ação<br />

de meristemas intercalares. Estão presentes nas Ophioglossidae «ophioglossidas» e nas Lycopodiidae «licófitas»; os<br />

microfilos <strong>do</strong>s fetos-­‐ophioglossi<strong>do</strong>s são secundários, i.e. resultam de uma simplificação de megáfilos. Os megafilos (=<br />

eufilos ou folhas verdadeiras) apresentam uma forma laminar, secundariamente acicular, um sistema vascular<br />

complexo e lacunas foliares. Os megafilos diferenciam-­‐se em meristemas de posição apical ou lateral. São<br />

característicos da maioria <strong>do</strong>s Euphyllophyta (= cormófitas): Equisetidae «equisetos», Polypodiidae «fetos-­‐<br />

verdadeiros», gimnospérmicas e Magnoliidae «plantas-­‐com-­‐flor».<br />

De acor<strong>do</strong> com W. Zimmermann (Berling, 2007) os microfilos são telomas reduzi<strong>do</strong>s. Os megafilos teriam<br />

evoluí<strong>do</strong> a partir de sistemas tridimensionais de telomas, envolven<strong>do</strong> uma série hipotética de três transformações<br />

(Figura 42): diferenciação de telomas <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>s (culminação); planação <strong>do</strong>s sistemas de telomas <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>s;<br />

42 Os filódios, nome atribuí<strong>do</strong> às estruturas foliares das briófitas, desenvolvem-­‐se nos gametófitos enquanto os microfilos e os<br />

megafilos das traqueófitas são característicos da geração esporofítica: não têm uma origem evolutiva comum, não são<br />

homólogos.


74 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

diferenciação de limbos foliares através da conexão <strong>do</strong>s telomas aplana<strong>do</strong>s por expansões laterais de mesofilo<br />

clorofilino (concrescência). Ainda no âmbito da teoria telomática, os caules provi<strong>do</strong>s de sistemas vasculares<br />

complexos, que caracterizam as traqueófitas mais evoluí<strong>do</strong>s, teriam resulta<strong>do</strong> da concrescência de <strong>do</strong>is ou mais<br />

telomas.<br />

A ideia de que a evolução da forma das plantas-­‐terrestres pode ser reduzida a um conjunto elementar de<br />

mecanismos atuantes numa estrutura elementar – o teloma – é muito apelativa. Embora continue a ser<br />

referenciada, e a sua terminologia permaneça útil, a teoria telomática é impossível de testar, falhan<strong>do</strong> o principal<br />

critério de separação entre o que é, e o que não é, uma teoria científica (Stein & Boyer, 2006). Várias outras<br />

hipóteses em torno da evolução de microfilos e megafilos têm si<strong>do</strong> propostas a substituir a teoria telomática. Por<br />

exemplo, os microfilos poderão ter evoluí<strong>do</strong> de emergências espiniformes (em forma de espinho), inicialmente<br />

avasculares, <strong>do</strong> caule, e os megafilos de um caule determina<strong>do</strong> com expansões laterais concrescentes. A complicar<br />

ainda mais a interpretação evolutiva da folha está a rejeição <strong>do</strong> conceito <strong>do</strong> megafilo pugnada por (Tomescu, 2008),<br />

entre outros. Não só a distinção entre microfilo e megafilo não é límpida, como também existem evidências de que<br />

estruturas complexas tipo megafilo (ao contrário <strong>do</strong>s microfilos) evoluíram mais <strong>do</strong> que uma vez entre as plantas<br />

vasculares (os megafilos não são homólogos).<br />

Tipos de filomas<br />

Os múltiplos tipos de megafilos das plantas-­‐vasculares são genericamente designa<strong>do</strong>s por filomas. A construção<br />

<strong>do</strong> corpo das espermatófitas tem início na germinação de uma semente. Desde o estádio de plântula (planta<br />

recentemente germinada) até à senescência (morte) sucedem-­‐se e coexistem, em maior ou menor número, no<br />

corpo das plantas, vários tipos de filomas (Quadro 16).<br />

Quadro 16. Tipos de filomas<br />

Função Descrição/comentários<br />

Cotilé<strong>do</strong>nes Filomas embrionários, frequentemente ricos em reservas; interpretáveis como profilos de um caudículo<br />

embrionário (caule embrionário)<br />

Folhas<br />

primordiais<br />

Filomas de transição, próprios das plântulas recém-­‐germinadas, localiza<strong>do</strong>s entre os cotilé<strong>do</strong>nes e os<br />

nomofilos.<br />

Nomofilos Filomas especializa<strong>do</strong>s na <strong>função</strong> de respiração e assimilação.<br />

Profilos Filoma(s) <strong>do</strong> primeiro ou <strong>do</strong> primeiro e segun<strong>do</strong>s nós de um caule lateral (Figura 43).<br />

Catáfilos Filomas com <strong>função</strong> de proteção, geralmente em forma de escama (escamiformes), sem clorofila, rígi<strong>do</strong>s e<br />

sem meristemas na sua axila; frequentes a envolver bolbos, cormos, rizomas e gomos.<br />

Hipsofilos<br />

(= brácteas)<br />

Filomas, geralmente modifica<strong>do</strong>s na cor, forma, dimensão, consistência, situa<strong>do</strong>s nas inflorescências (vd.<br />

Brácteas); conforme se refere mas adiante (vd. Inflorescência, Constituição) as bractéolas são profilos.<br />

Antofilos Folhas profundamente modificadas que constituem a flor.<br />

Os profilos são em número de um nas monocotiledóneas e nas dicotiledóneas basais, e geralmente 2 nas<br />

dicotiledóneas (vd. estrutura <strong>do</strong>s gomos de Vitis vinífera em Gemas). Nas monocotiledóneas têm uma posição<br />

adaxial, sen<strong>do</strong> escamiformes e adpressos ao caule; e.g. espata da inflorescência das Arecaceae. Nas eudicotiledóneas<br />

apresentam uma posição lateral (inseri<strong>do</strong>s num plano perpendicular ao plano forma<strong>do</strong> pelo eixo principal e pela sua<br />

ramificação) (Figura 43). Ainda nas eudicotiledóneas são, por regra, semelhantes ou distintos <strong>do</strong>s nomofilos,<br />

respectivamente, nos ramos silépticos (e.g. Lauraceae) e prolépticos (e.g. Rosaceae e Fabaceae; vd. Prolepsia e<br />

silepsia) (Keller, 2004).<br />

Reconhecem-­‐se <strong>do</strong>is tipos de antofilos: estéreis – antofilos especializa<strong>do</strong>s na proteção da flor ou na atração de<br />

poliniza<strong>do</strong>res, e.g. tépalas, sépalas e pétalas; e férteis – antofilos com funções reprodutivas, e.g. estames e carpelos.


75 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Situação<br />

A B<br />

Figura 43. Profilos. A) Posição <strong>do</strong>s profilos nos ramos laterais das mono e eudicotiledóneas (corte transversal). Legenda:<br />

a) eixo primário; b) profilos; c) ramo lateral; d) folha tetriz (axilante). N.b. a folha tetriz insere-­‐se no eixo primário e axila<br />

uma ramificação lateral; profilo em posição adaxial nas mococotiledóneas. B) Profilos numa eudicotiledónea (adapta<strong>do</strong><br />

de (Keller, 2004)). N.b. profilos similares aos nomofilos inseri<strong>do</strong>s num plano perpendicular ao plano forma<strong>do</strong> pelo eixo<br />

primário e pela sua ramificação; os profilos são geralmente designa<strong>do</strong>s com as letras α e β.<br />

4.4.4. Aspectos gerais da morfologia externa da folha<br />

Quanto à situação as folhas podem ser: aéreas – tipo mais frequente; aquáticas – flutuantes ou submersas na<br />

água livre; ou subterrâneas – ocultas no solo e normalmente <strong>do</strong> tipo catáfilo.<br />

Diferenciação<br />

Nas folhas ditas completas reconhecem-­‐se as seguintes partes, a saber: bainha – parte proximal da folha,<br />

alargada e que envolve parcialmente o caule, com a <strong>função</strong> de proteger o meristema axilar; pecíolo – parte da folha,<br />

normalmente cilíndrica, situada entre o limbo e a bainha ou que conecta, diretamente, o limbo ao caule; e limbo –<br />

parte distal da folha, de ordinário laminar onde, geralmente, se concentra a <strong>função</strong> fotossintética da folha. As folhas<br />

pecioladas (folhas sem bainha) e as folhas sésseis (folhas sem pecíolo) são <strong>do</strong>is tipos frequentes de folhas<br />

incompletas.<br />

Figura 44. Diferenciação da folha. 1. Folha completa de Arum (Araceae). 2. Folha peciolada. 3. Folha séssil de Poaceae.<br />

4. Folha séssil. 5. Folhas reduzidas à bainha de Juncus (Juncaceae) «juncos». 6. Filódios e folhas recompostas de Acacia<br />

(Fabaceae) «acácias» (Coutinho, 1898).


76 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

A bainha é muito comum nas monocotiledóneas e rara nas dicotiledóneas. Na fase vegetativa das Poaceae<br />

herbáceas e nas Musa (Musaceae) «bananeiras» as bainhas das folhas estão sobrepostas e comprimidas num<br />

pseu<strong>do</strong>caule. Nas Arecaceae «palmeiras» as bainhas, frequentemente, desfazem-­‐se em fibras ou dispõem de<br />

espinhos. Os pecíolos podem estar reduzi<strong>do</strong>s a espinhos (vd. Adaptações). Nas folhas compostas observa-­‐se, muitas<br />

vezes, uma pequena articulação no pecíolo (vd. Divisão ou composição). A morfologia <strong>do</strong> limbo é descrita em<br />

pormenor mais adiante (vd. Forma <strong>do</strong> limbo).<br />

No movimento reversível de folhas ou folíolos estão envolvi<strong>do</strong>s pequenos engrossamentos circunscritos à base,<br />

ou ao ápice <strong>do</strong> pecíolo, conheci<strong>do</strong>s por pulvinos. Nas Fabaceae os pulvinos comandam o movimento <strong>do</strong>s folíolos ao<br />

toque na Mimosa pudica «mimosa-­‐púdica» e a sobreposição <strong>do</strong>s folíolos em Trifolium em consequência da falta de<br />

água, ou, na Samanea saman «árvore-­‐da-­‐chuva», em resposta aos dias nebula<strong>do</strong>s. A sobreposição <strong>do</strong>s folíolos em<br />

Trifolium diminui a exposição sol e as perdas por evaporação; na Samanea reduz os potenciais efeitos negativos das<br />

chuvas e <strong>do</strong>s ventos violentos tropicais. Os nós salientes das Poaceae da subfamília Pooideae também cabem no<br />

conceito de pulvino.<br />

O conceito de folha completa é um artifício pedagógico; não é um carácter primitivo a partir <strong>do</strong> qual teriam<br />

emergi<strong>do</strong> as folhas pecioladas ou sésseis. Os pecíolos das dicotiledóneas s.l. e das monocotiledóneas têm uma<br />

ontogénese distinta, não são homólogos. Por esse motivo, a constrição localizada entre a bainha e o limbo nos<br />

Bambus (Poaceae, Bambusoideae) e noutras monocotiledóneas deveria ser designada por pseu<strong>do</strong>pecíolo.<br />

Quadro 17. Classificação das folhas quanto à posição<br />

Tipo Descrição/exemplos<br />

Folha<br />

<strong>do</strong>rsiventral<br />

(= bifacial)<br />

Folha<br />

equifacial<br />

Folha<br />

unifacial<br />

Posição<br />

Página superior (= ventral ou adaxial) e a página inferior (= <strong>do</strong>rsal ou abaxial) diferem na morfologia externa,<br />

na anatomia – por exemplo pela presença de parênquima em paliçada adaxial e de parênquima lacunoso<br />

abaxial –, na saliência das nervuras, no número de estomas e no tipo e disposição <strong>do</strong> indumento<br />

Faces da folha de morfologia e anatomia semelhante; e.g. folhas adultas de Eucalyptus globulus (Myrtaceae)<br />

«eucalípto-­‐comum»<br />

Nestas folhas ocorre um sobredesenvolvimento da parte central da página superior (conduzi<strong>do</strong> pelo<br />

meristema adaxial da folha) em detrimento da página inferior e da expansão lateral da folha; as folhas<br />

unifaciais podem ser comprimidas lateralmente (folha ensiforme 43 , e.g. tipo comum nas iridáceas) ou<br />

cilíndricas, neste último caso apresentan<strong>do</strong>-­‐se maciças (e.g. folhas gordas de Sedum [Crassulaceae]) ou ocas<br />

(e.g. Allium [Alliaceae] «alhos»)<br />

Quanto à posição as folhas são classificadas em três tipos<br />

(Quadro 17).<br />

Nervação <strong>do</strong> limbo<br />

As nervuras foliares surgem, a olho nu, como<br />

espessamentos lineares, muito delga<strong>do</strong>s, normalmente em<br />

alto ou baixo-­‐relevo e de cor mais clara <strong>do</strong> que o parênquima<br />

foliar. Cortes histológicos transversais mostram que as<br />

nervuras são constituídas por feixes vasculares – xilema na<br />

face superior da folha e floema na inferior – frequentemente<br />

reforça<strong>do</strong>s por teci<strong>do</strong>s mecânicos (esclerênquima e/ou<br />

colênquima).<br />

Figura 45. Nervação reticulada. Ficus benjamina<br />

(Moraceae). N.b. nervura média (em cima) células,<br />

nervura marginal e submarginal (canto inferior<br />

esquer<strong>do</strong>), nervuras anastomosadas e aréolas (vd.<br />

43<br />

Ou isobilateral. Alguns autores designam por isobilaterais as folhas cujo mesofilo não se diferencia em parênquima em paliçada<br />

e parênquima lacunoso.


77 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

As nervuras das folhas desempenham duas importantes funções: i) transporte de substâncias – importação de<br />

água, nutrientes e hormonas via xilema, e exportação <strong>do</strong>s produtos da fotossíntese via floema; ii) estabilização<br />

mecânica da folha – através <strong>do</strong> xilema e <strong>do</strong>s teci<strong>do</strong>s mecânicos associa<strong>do</strong>s aos feixes vasculares, caben<strong>do</strong> ainda à<br />

cutícula, à epiderme e à pressão de turgescência das células parenquimatosas um papel importante neste processo.<br />

A nervação das folhas é um tema muito especializa<strong>do</strong> e de grande importância na filogenética das plantas-­‐<br />

vasculares. A categorização da nervação das folhas inicia-­‐se com o reconhecimento de <strong>do</strong>is mo<strong>do</strong>s de ramificação<br />

(Roth-Nebelsick, Uhl, Mosbrugger, & Kerp, 2001): nervação aberta e fechada (Quadro 18). Consoante se explicita<br />

no Quadro 18, reconhecem-­‐se três tipos maiores de nervação fechada (Figura 45 e 46).<br />

Quadro 18. Tipos de nervação <strong>do</strong> limbo<br />

Mo<strong>do</strong>s de<br />

ramificação<br />

Descrição/comentários<br />

Nervação aberta Nervuras organizadas em árvore e que terminam, de forma livre, no interior <strong>do</strong> mesofilo foliar, ou na<br />

sua margem; tipo mais primitivo de nervação; e.g. Ginkgo biloba (Ginkgoaceae) «ginkgo», comum em<br />

fetos, raríssima e secundária nas angiospérmicas.<br />

Nervação<br />

fechada(=<br />

nervação<br />

reticulada ou<br />

nervação em<br />

rede)<br />

Tipos maiores de<br />

nervação<br />

fechada<br />

Peninérvea<br />

(= penada)<br />

Palminérvea (=<br />

palmatinérvea)<br />

Na nervação fechada as nervuras apresentam-­‐se anastomosadas e organizadas de forma hierárquica.<br />

As nervuras dizem-­‐se anastomosadas quan<strong>do</strong> se ramificam numa rede onde as nervuras mais finas<br />

circundam, e por vezes penetram, pequenas células fechadas (= aréolas foliares); a anastomosação<br />

facilita a difusão de líqui<strong>do</strong>s na folha, a nutrição de zonas danificadas da folha e a sobrevivência em<br />

climas ári<strong>do</strong>s. A natureza hierárquica da nervação fechada evidencia-­‐se pela presença de uma, ou mais,<br />

nervuras principais (nervuras de 1ª ordem), nas quais se inserem nervuras de 2ª ordem (secundárias),<br />

por sua vez subdivididas em nervuras de ordem superior. A nervação fechada evoluiu mais que uma vez<br />

a partir de tipos primitivos de nervação aberta; tipo <strong>do</strong>minante em fetos, gimnospérmicas e<br />

angiospérmicas.<br />

Descrição/comentários<br />

Uma nervura principal (nervura média) que herda os feixes vasculares principais <strong>do</strong> pecíolo; nervuras<br />

secundárias inserem-­‐se ao longo da nervura primária como as barbas na ráquis de uma pena de ave, e<br />

terminam, frequentemente, num hidáto<strong>do</strong> na margem da folha (vd. Corpos nutritivos, hidáto<strong>do</strong>s e<br />

nectários extraflorais); quan<strong>do</strong> se identifica apenas a nervura média as folhas dizem-­‐se uninérveas; na<br />

maioria das plantas-­‐vasculares as nervuras secundárias atingem a margem, terminan<strong>do</strong> ou não num<br />

dente, anastomosam-­‐se sem atingir a margem ou arqueiam-­‐se em direção ao ápice sem o alcançar;<br />

nervação característica de eudicotiledóneas e magnoliidas; rara entre as monocotiledóneas (e.g.<br />

Zingiberales); algumas nervuras das folhas peninérveas merecem designações especiais, e.g. nervura<br />

marginal – percorre to<strong>do</strong> o limbo próximo da margem da folha.<br />

Três ou mais nervuras principais inseridas na base (partin<strong>do</strong> <strong>do</strong> ápice <strong>do</strong> pecíolo), ou próximo da base<br />

<strong>do</strong> limbo, de onde divergem radialmente, como os de<strong>do</strong>s numa mão; consoante as espécies as nervuras<br />

secundárias são rectas e divergentes (e.g. Malva [Malvaceae] «malvas») ou curvilíneas e convergentes<br />

em direção ao ápice (e.g. Tamus communis [Dioscoreaceae] «norça-­‐preta»), neste caso<br />

impropriamente cunhadas de curvilíneo-­‐paralelinérveas; tipo de nervação frequente nas mono e<br />

eudicotiledóneas.<br />

Paralelinérvea Duas ou mais nervuras principais, normalmente de espessura e dimensão semelhante, paralelas ao<br />

longo da folha e convergentes no ápice; nervuras principais conectadas por nervuras de ordem superior<br />

geralmente inseridas perpendicularmente às nervuras de ordem inferior; nervação característica das<br />

monocotiledóneas, rara nas eudicotiledóneas (e.g. Plantago lanceolata, Plantaginaceae).


78 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

A B<br />

Figura 46. Nervação da folha. A) 1. Folha peninérvea. 2. Folha palminérvea. 3. Folha paralelinérvea. 4. Folha palminérvea<br />

(curvilíneo-­‐paralelinérvea) (Coutinho, 1898). B) Tipos de nervação de L. Hickey (Hickey, Classification of the architecture<br />

of dicotyle<strong>do</strong>nous leaves, 1973).<br />

A tipologia enunciada não abarca to<strong>do</strong>s os tipos de nervação fechada conheci<strong>do</strong>s nas plantas-­‐com-­‐flor, sobretu<strong>do</strong><br />

nos trópicos ou no registo fóssil. Para obviar esta dificuldade é cada mais utilizada a classificação de (Hickey, A<br />

revised classification of the architecture of dicotyle<strong>do</strong>nous leaves, 1979) (Quadro 19).<br />

Quadro 19. Tipologia da nervação foliar de (Hickey, A revised classification of the architecture of dicotyle<strong>do</strong>nous<br />

leaves, 1979) (versão simplificada)<br />

Camptódroma (ing.<br />

camptodromous)<br />

Broquidódroma (ing.<br />

brochi<strong>do</strong>dromous)<br />

Eucamptódroma (ing.<br />

eucamptodromous)<br />

Craspedódroma (ing.<br />

craspe<strong>do</strong>dromous)<br />

Tipo Descrição Exemplos<br />

Campilódroma<br />

(= curvilíneo-­‐paralelinérvea)<br />

(ing. campylodromous)<br />

Hifódroma<br />

(= uninérvea)<br />

Actinódroma<br />

(= palminérvea s.str.)<br />

Acródroma<br />

(= curvinérvea)<br />

Paralelódroma<br />

(= paralelinérvea) (ing.<br />

parallelodromous)<br />

Palinactinódroma<br />

(= pedada)<br />

Folhas peninérveas com as nervuras secundárias<br />

curvadas para cima em direção à margem da folha.<br />

Folhas camptódromas com nervuras secundárias<br />

forman<strong>do</strong> arcos regularmente curvadas para cima,<br />

tocan<strong>do</strong>-­‐se de forma sucessiva.<br />

Folhas camptódromas cujas nervuras secundarias<br />

não se tocam.<br />

Folhas peninérveas com as nervuras secundárias<br />

mais ou menos paralelas.<br />

Folhas de arcos mais acentua<strong>do</strong>s <strong>do</strong> que na nervação<br />

acródroma.<br />

Nervuras secundarias ausentes, rudimentares ou<br />

ocultas num mesofilo carnu<strong>do</strong> ou coriáceo.<br />

Três ou mais nervuras primárias inseridas na base,<br />

ou próximo da base, de onde divergem radialmente.<br />

Nervuras primárias e/ou secundárias forman<strong>do</strong> arcos<br />

convergentes em direção ao ápice da folha.<br />

Folhas com duas ou mais nervuras primárias<br />

paralelas entre si até ao ápice, onde convergem.<br />

Nervuras primárias divergin<strong>do</strong> numa série de<br />

ramificações dicotómicas.<br />

V.i.<br />

Linaceae, Prunus avium<br />

(Rosaceae) muitas Apocynaceae<br />

tropicais<br />

Cornus (Cornaceae), numerosas<br />

Rubiaceae tropicais<br />

Quercus suber (Fagaceae)<br />

«sobreiro»<br />

Smilax aspera (Smilacaceae)<br />

«salsaparilha-­‐bastarda»<br />

Muitas Apocynaceae<br />

Tilia (Tilioideae, Malvaceae)<br />

«tílias»<br />

Celtis australis (Cannabaceae)<br />

«lódão-­‐bastar<strong>do</strong>»<br />

Poaceae<br />

Platanus orientalis (Platanaceae)<br />

«plátano»


79 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Forma <strong>do</strong> limbo e recorte<br />

Na descrição da forma <strong>do</strong> limbo das folhas há<br />

que considerar os seguintes aspectos: forma geral<br />

<strong>do</strong> limbo, ângulo da base, ângulo <strong>do</strong> ápice, forma<br />

da base, forma <strong>do</strong> ápice, recorte e simetria.<br />

A classificação da forma <strong>do</strong> limbo baseia-­‐se na<br />

posição <strong>do</strong> eixo de maior largura e na relação<br />

comprimento/largura. Em <strong>função</strong> <strong>do</strong> primeiro<br />

critério definem-­‐se quatro formas fundamentais de<br />

folhas planas e simétricas a reter: elíptica, obovada,<br />

ovada e oblonga (Figura 47).<br />

Figura 47. Formas <strong>do</strong> limbo mais frequentes. Consoante a<br />

posição <strong>do</strong> eixo de maior largura das folhas assim se definem<br />

os tipos: A) elíptico, B) obova<strong>do</strong>, C) ova<strong>do</strong> e D) oblongo (Leaf<br />

Architecture Working Group, 1999).<br />

Figura 48. Forma <strong>do</strong> limbo em folhas planas e simétricas. E.g. as folhas semelhantes ao modelo D3 são ovadas e<br />

as semelhantes ao modelo E2 estreitamente-­‐obovadas. N.b. nem to<strong>do</strong>s valores da relação comprimento/lagura e<br />

nem todas as posições <strong>do</strong> eixo de maior largura estão considera<strong>do</strong>s na figura; para as condições intermédias<br />

usam-­‐se designações compósitas tipo “folha oblongo-­‐elíptica” ou “linear-­‐oblonga” (Systematics Association<br />

Committee for Descriptive Biological Terminology, 1962).<br />

Cruzan<strong>do</strong> os critérios posição <strong>do</strong> eixo de maior largura, angulosidade da folha e a relação comprimento/largura<br />

obtem-­‐se uma terminologia mais complexa, resumida na Figura 48. Alguns exemplos: folhas elípticas – Diospyros<br />

kaki (Ebenaceae) «diospireiro»; folhas orbiculares – Eichornia crassipes (Pontederiaceae); folhas oblongas –<br />

Pittosporum undulatum (Pittosporaceae) «incenso»; folhas ovadas – Citrus sinensis (Rutaceae) «laranjeira-­‐<strong>do</strong>ce»;<br />

folhas obovadas – Salix atrocinerea (Salicaceae) «borrazeira-­‐preta»; folhas lineares – gramíneas; folhas ova<strong>do</strong>-­‐


80 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

angulosas – Solanum nigrum (Solanaceae) «erva-­‐moira»; folhas triangulares (= folhas deltoides) – Populus nigra<br />

(Salicaceae) «choupo-­‐negro» e Tetragonia tetragonoides (Aizoaceae). No Quadro 20 reúnem-­‐se algumas outras<br />

formas foliares de uso corrente na bibliografia botânica. A designação “folha lanceolada” (em forma de lança) é<br />

dúbia e deve, por isso, ser evitada embora seja recorrente na bibliografia.<br />

Quadro 20. Outras formas foliares de uso corrente<br />

Tipo Descrição Exemplo<br />

Acicular Em forma de agulha folhas clorofiladas de Pinus (Pinaceae) «pinheiros»<br />

Cilíndrica Em forma de cilindro, oco ou maciço Allium cepa (Alliaceae) «cebola»<br />

Cordiforme Maior largura próximo da base <strong>do</strong> limbo e duas<br />

aurículas na base, em forma de coração estiliza<strong>do</strong><br />

Tamus communis (Dioscoriaceae) e Ipomoea<br />

purpurea (Convolvulaceae) «batata-­‐<strong>do</strong>ce»<br />

Escamiforme Em forma de escama Folhas de Cupressus (Cupressaceae) «ciprestes»<br />

Espatulada Em forma de espátula Pittosporum tobira (Pittosporaceae)<br />

Ensiforme folha unifacial lateralmente comprimida Iridaceae<br />

Falciforme Em forma de foice folhas adultas de Eucalyptus globulus (Myrtaceae)<br />

Flabelada Em forma de leque Ginkgo biloba (Ginkgoaceae) «ginkgo»<br />

Hastada Com a folha pontiaguda com lóbulos da base muito<br />

divergentes, com a forma da folha das alabardas<br />

Peltada De mais ou menos contorno circular com o pecíolo<br />

inseri<strong>do</strong> no centro ou na sua proximidade<br />

Rumex angiocarpus (Polygonaceae)<br />

Tropaeolum majus (Tropaeolaceae) «chagas» e<br />

Ricinus communis (Euphorbiaceae) «rícino<br />

Reniforme Em forma de rim Calystegia soldanella (Convolvulaceae)<br />

Sagitada De contorno triangular agu<strong>do</strong> prolongan<strong>do</strong>-­‐se, na<br />

base, em duas aurículas ou lóbulos agu<strong>do</strong>s, dirigi<strong>do</strong>s<br />

mais ou menos divergentes<br />

A B<br />

Zantedeschia aetyopica (Araceae) «jarro»<br />

Figura 49. Forma <strong>do</strong> limbo, <strong>do</strong> ápice e da base das folhas. A) Outras formas <strong>do</strong> limbo das folhas: 1 espatulada, 2<br />

cordiforme, 3 hastada, 4 sagitada, 5 obcordiforme, 6 peltada, 7 falcada (Díaz Gonzalez, Fernandez-­‐Carvajal<br />

Alvarez, & Fernández Prieto, 2004). B) Ângulos da base e <strong>do</strong> ápice. Ângulo da base: A) agu<strong>do</strong> e B) obtuso. Ângulo<br />

<strong>do</strong> ápice: C) agu<strong>do</strong> e D) obtuso (Leaf Architecture Working Group, 1999).


81 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

O (Leaf Architecture Working Group, 1999) propõe que o ângulo da base seja medi<strong>do</strong> definin<strong>do</strong> três pontos: um<br />

vértice situa<strong>do</strong> na inserção <strong>do</strong> pecíolo no limbo e outros <strong>do</strong>is pontos resultantes da intercepção da margem com<br />

uma linha perpendicular ao eixo da folha, situada a ¼ <strong>do</strong> comprimento da folha (a partir da base). O Quadro 21 e a<br />

Figura 49 apresenta os tipos fundamentais de forma da base. A forma da base auriculada é subdividida nos seguintes<br />

tipos (Figura 49): hastada – auriculada de lóbulos divergentes; sagitada – auriculada de lóbulos ligeiramente<br />

divergentes a mais ou menos convergentes, definin<strong>do</strong> um seio peciolar; cordiforme (= cordada na base) – com<br />

aurículas pequenas e arre<strong>do</strong>ndadas; amplexicaule – aurículas envolven<strong>do</strong> parcialmente o caule onde se inserem;<br />

termo ainda aplica<strong>do</strong> a brácteas e estípulas.<br />

Quadro 21. Forma da base das folhas<br />

Tipo Descrição<br />

Acunheada Em forma de cunha, i.e. triangular<br />

Decorrente Base de margens côncavas que se prolongam pelo pecíolo<br />

Convexa Base de margens convexas<br />

Arre<strong>do</strong>ndada Base quase circular<br />

Truncada Base abruptamente interrompida numa margem perpendicular ao eixo de maior comprimento<br />

Auriculada Base com lóbulos (= aurículas)<br />

Assimétrica Aurículas direita e esquerda de distinta forma ou dimensão<br />

A avaliação <strong>do</strong> ângulo <strong>do</strong> ápice segue uma lógica similar à determinação <strong>do</strong> ângulo da base (Leaf Architecture<br />

Working Group, 1999): os ângulos <strong>do</strong> ápice e da base são agu<strong>do</strong>s ou obtusos consoante os respectivos ângulos<br />

sejam inferiores ou superiores a 90°. Os tipos morfológicos <strong>do</strong> ápice foliar estão explicita<strong>do</strong>s no Quadro 22.<br />

Quadro 22. Forma <strong>do</strong> ápice das folhas<br />

Tipo Descrição<br />

Acumina<strong>do</strong> Ápice agu<strong>do</strong> e de margens côncavas<br />

Atenua<strong>do</strong> Ápice agu<strong>do</strong> e de margens pouco côncavas ou rectas<br />

Arre<strong>do</strong>nda<strong>do</strong> Ápice convexo em semi-­‐círculo<br />

Assovela<strong>do</strong> (= subula<strong>do</strong>) Ápice terminan<strong>do</strong> num ponta aguda, mais ou menos longa, semelhante a uma sovela<br />

Trunca<strong>do</strong> Ápice abruptamente interrompi<strong>do</strong> numa margem perpendicular ao comprimento; termo ainda<br />

aplica<strong>do</strong> a brácteas, sépalas e pétalas<br />

Retuso Ápice com um entalhe superficial<br />

Chanfra<strong>do</strong> (= emargina<strong>do</strong>,<br />

escota<strong>do</strong>)<br />

Ápice com um entalhe mais ou menos profun<strong>do</strong>; e.g. folíolos de Ceratonia siliqua (Fabaceae,<br />

Caesalpinioideae) «alfarrobeira»<br />

Mucrona<strong>do</strong> Ápice agu<strong>do</strong> ou obtuso provi<strong>do</strong> de um mucrão, i.e. de uma ponta curta mais ou menos rígida<br />

As folhas não recortadas dizem-­‐se inteiras. Dois tipos fundamentais de recorte: marginal e profun<strong>do</strong>, cada um<br />

<strong>do</strong>s quais com vários subtipos (Quadro 23, Figura 50).


82 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Quadro 23. Tipos de recorte foliar<br />

Tipo Descrição<br />

Recorte marginal<br />

Crena<strong>do</strong> com crenos, i.e. com recortes arre<strong>do</strong>nda<strong>do</strong>s; com crenos muito pequenos diz-­‐se crenula<strong>do</strong><br />

Denta<strong>do</strong> com dentes, i.e. com recortes triangulares, não inclina<strong>do</strong>s e mais ou menos pontiagu<strong>do</strong>s; com<br />

dentes ergui<strong>do</strong>s muito pequenos diz-­‐se denticula<strong>do</strong><br />

Serra<strong>do</strong> com dentes inclina<strong>do</strong>s, como os de uma serra, dirigi<strong>do</strong>s para o ápice; com dentes inclina<strong>do</strong>s<br />

muito pequenos diz-­‐se serrilha<strong>do</strong>; Camelia japonica (Theaceae) «camélia»<br />

Recorte profun<strong>do</strong><br />

Lobadas recorte não alcança a ½ da aba da folha; e.g. Quercus robur (Fagaceae) «carvalho-­‐roble»<br />

Fendidas recortes até ca. ½ da aba da folha<br />

Partidas recorte ultrapassa ½ da aba da folha; e.g. Q. pyrenaica (Fagaceae) «carvalho-­‐negral»<br />

Sectas recorte prolonga<strong>do</strong> até à nervura<br />

Figura 50. Recorte da folha. Recorte marginal: 1. folha crenada; 2. folha dentada; 3. folha serrada. Recorte profun<strong>do</strong>: 4.<br />

folha penatilobada; 5. folha palmatilobada; 6. folha penatipartida; 7. folha penatissecta. Simetria: 8. Folha assimétrica de<br />

Ulmus minor (Ulmaceae) «ulmeiro» (Coutinho, 1898)<br />

Os recortes das folhas lobadas ou fendidas designam-­‐se por lobos; nas folhas partidas a sectas reconhecem-­‐se<br />

segmentos. Consoante o tipo de nervação os tipos de recorte profun<strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong>s no Quadro 23 são combina<strong>do</strong>s<br />

com os prefixos “palmati” e “penati”; e.g. palmatiloba<strong>do</strong>, palmatissecto, penatifendi<strong>do</strong> e penatiparti<strong>do</strong>. As folhas<br />

podem combinar recorte marginal com recorte profun<strong>do</strong>; e.g. a Malva sylvestris (Malvaceae) têm folhas<br />

palmatifendidas com lobos denta<strong>do</strong>s.<br />

Regra geral as folhas são simétricas, i.e. a aba esquerda e a aba direita são a imagem no espelho uma da outra.<br />

Dois exemplos clássicos de folhas assimétricas: folhas adultas falciformes de Eucalyptus globulus (Myrtaceae)<br />

«eucalipto-­‐comum» e folhas assimétricas na base de Ulmus (Ulmaceae) «ulmeiros» (Figura 50).<br />

Divisão ou composição<br />

As folhas simples têm apenas um limbo, não articula<strong>do</strong>. Nas folhas compostas (= folhas folioladas 44 ) reconhecem-­‐<br />

se um ou mais limbos independentes – os folíolos – geralmente semelhantes entre si e provi<strong>do</strong>s de uma pequena<br />

articulação no peciólulo. A articulação identifica-­‐se pela presença de uma constrição anelar, acompanhada ou não<br />

44 O uso <strong>do</strong> sufixo “folia<strong>do</strong>” a substituir “foliola<strong>do</strong>” deve ser evita<strong>do</strong> (Font Quer, 1985).


83 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

por um pequeno engrossamento. A abcisão (=queda) das folhas compostas dá-­‐se, geralmente, pela articulação. As<br />

folhas compostas não devem ser confundidas com folhas sectas, nem com ramos de folhas oposto-­‐disticadas. Os<br />

segmentos das folhas sectas, ao contrário <strong>do</strong>s folíolos, são distintos entre si, frequentemente assimétricos e nunca<br />

possuem uma articulação na base. As folhas compostas têm crescimento determina<strong>do</strong> e não dispõem de meristemas<br />

na axila <strong>do</strong>s folíolos. A tipologia das folhas compostas fundamenta-­‐se no número e disposição <strong>do</strong>s pecíolos (Quadro<br />

24, chave dicotómica 1).<br />

Quadro 24. Tipologia das folhas compostas<br />

Tipo Descrição Exemplos<br />

Unifolioladas<br />

(= 1-­‐folioladas)<br />

Bifolioladas<br />

(= 2-­‐folioladas)<br />

Trifolioladas<br />

(= 3-­‐folioladas)<br />

Com 1 folíolo Citrus (Rutaceae) «citrinos»; em C. aurantium «laranjeira-­‐amarga» o<br />

pecíolo é ala<strong>do</strong> sen<strong>do</strong> a articulação <strong>do</strong> folíolo particularmente evidente<br />

Com 2 folíolos Colophospermum mopane (Fabaceae), um <strong>do</strong>s arbustos mais frequentes<br />

<strong>do</strong> Sul de Angola e de Moçambique<br />

Com 3 folíolos Trifolium (Fabaceae) «trevos»<br />

Multifolioladas Com 4 ou mais folíolos Pistacia lentiscus (Anacardiaceae) «aroeira»<br />

Reconhecem-­‐se <strong>do</strong>is tipos fundamentais de folhas compostas multifolioladas (chave dicotómica 1, Figura 51 A):<br />

palmaticompostas e penaticompostas. Nas folhas palmaticompostas (= digitadas) to<strong>do</strong>s os folíolos estão inseri<strong>do</strong>s no<br />

ápice <strong>do</strong> pecíolo, como os de<strong>do</strong>s de uma mão; e.g. Aesculus hippocastanum (Sapindaceae) «castanheiro-­‐da-­‐índia»<br />

(Figura 51 A). Nas folhas penaticompostas (= pinadas 45 ) os folíolos inserem-­‐se em duas fiadas opostas, ao longo de<br />

um eixo (= ráquis) disposto no prolongamento <strong>do</strong> pecíolo. Consoante o número de folíolos seja par ou ímpar (com<br />

um folíolo na ponta) as folhas penaticompostas são imparipinadas (= imparifolioladas, e.g. Ailanthus altissima<br />

(Simaroubaceae) «ailanto») ou paripinadas (= parifolioladas, e.g. Ceratonia siliqua (Fabaceae) «alfarrobeira»).<br />

As folhas duas ou mais vezes compostas dizem-­‐se recompostas (Chave dicotómica 1). Nas folhas bipinadas (=2-­‐<br />

penaticompostas ou 2-­‐pinadas), o tipo mais frequente de folhas recompostas, os folíolos estão inseri<strong>do</strong>s em duas<br />

fiadas geralmente opostas ao longo de eixos secundários, constituin<strong>do</strong> pínulas (Beentje, 2012). As pínulas, por sua<br />

vez, inserem-­‐se em duas fiadas geralmente opostas na ráquis da folha; e.g. a grande maioria das fabáceas<br />

mimosóideas. As folhas bipinadas são paripinuladas ou imparipinuladas consoante disponham um número par ou<br />

ímpar de pínulas. As folhas recompostas podem ainda ser 3, 4 ou mesmo 5 vezes compostas.<br />

As folhas da bananeira e de muitas palmeiras embora se assemelhem a folhas composta são, na realidade, folhas<br />

sectas cujo recorte resulta da rotura de um único limbo através de linhas de fragilidade. Alguns autores atribuem-­‐<br />

lhes a designação de folhas pseu<strong>do</strong>compostas.<br />

A produção de folhas grandes é, teoricamente, vantajosa quan<strong>do</strong> as plantas competem ferozmente pela luz. No<br />

entanto, as folhas de grande dimensão, por estarem envolvidas por uma espessa camada limite, acabam por ter<br />

dificuldade em absorver o dióxi<strong>do</strong> de carbono e estão submetidas a tensões mecânicas que as podem partir ou<br />

rasgar. As folhas compostas, à semelhança das folhas profundamente recortadas, sobrevieram, de forma<br />

independente, em várias linhagens de plantas-­‐com-­‐flor por serem uma solução evolutiva eficiente para este trade-­‐<br />

off.<br />

Não é claro se as folhas compostas são homologáveis a caules de crescimento determina<strong>do</strong> ou a folhas simples.<br />

No primeiro caso os folíolos e as folhas simples seriam homólogos; no segun<strong>do</strong>, os folíolos corresponderiam a<br />

subdivisões de uma folha simples e a ráquis (no caso das folhas penaticompostas) coincidiria com a nervura média<br />

(Champagne & Sinha, 2004) (Figura 51 B).<br />

45 Na bibliografia as folhas pinadas são também designadas por pinuladas. Com a mesma raiz resistem os termos bipinulada, 2-­‐<br />

pinulada, paripinuladas ou imparipinulada. A folha penada tem uma nervação peninérvea, não confundir com o conceito de folha<br />

pinada.


84 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Chave dicotómica 1. Tipos de folhas compostas (Bell, 2008) (Beentje, 2012)<br />

1. Folhas com 1 limbo não articula<strong>do</strong> ................................................................................................................. folhas simples<br />

-­‐ Folhas com 1 limbo articula<strong>do</strong> ou com 2 ou mais limbos semelhantes entre si ....................................................................2<br />

2. Folhas uma vez compostas...................................................................................................................................................3<br />

-­‐ Folhas recompostas (= 2 ou mais vezes compostas)..............................................................................................................6<br />

3. Folhas com 1, 2 ou 3 limbos ........................................ Respectivamente, folhas unifolioladas, bifolioladas ou trifolioladas<br />

-­‐ Folhas com 4 ou mais limbos ...........................................................................................................[folhas multifolioladas] 4<br />

4. Folíolos inseri<strong>do</strong>s no mesmo ponto, como os de<strong>do</strong>s numa mão ...................................................folhas palmaticompostas<br />

-­‐ Folíolos inseri<strong>do</strong>s em 2 fiadas ao longo de um eixo..................................................................... [folhas penaticompostas] 5<br />

5. Número par de folíolos............................................................................................................................. folhas paripinadas<br />

-­‐ Número ímpar de folíolos ...................................................................................................................... folhas imparipinadas<br />

6. Pínulas com 3 folíolos inseri<strong>do</strong>s no mesmo ponto, como os de<strong>do</strong>s numa mão...................................................................7<br />

-­‐ Pínulas com 4 ou mais folíolos inseri<strong>do</strong>s em 2 fiadas opostas ao longo de um eixo .............................................................8<br />

7. Folhas 2 vezes compostas .......................................................................................................................... folhas biternadas<br />

-­‐ Folhas 3 vezes compostas ........................................................................................................................... folhas triternadas<br />

8. Folhas 2 vezes compostas ............................................................................................................................folhas 2-­‐pinadas<br />

-­‐ Folhas 3 vezes compostas ..............................................................................................................................folhas 3-­‐pinadas<br />

A B<br />

Figura 51. Composição da folha. A) Composição das folhas: 1. folha paripinada; 2. folha imparipinada; 3. folha digitada;<br />

4. folha 2-­‐pinada paripinulada (Coutinho, 1898). B) Hipóteses explicativas da origem das folhas compostas. Hipótese a): a<br />

folha composta é homologável a um caule de crescimento determina<strong>do</strong>. Hipótese b): a folha composta é homologável de<br />

uma folha (inspira<strong>do</strong> em (Champagne & Sinha, 2004))<br />

Apêndices foliares<br />

As estípulas e as lígulas são<br />

os apêndices foliares mais<br />

frequentes e de maior<br />

interesse taxonómico. As<br />

estípulas inserem-­‐se no<br />

pecíolo das folhas ou nos nós<br />

(Figura 52). Geralmente,<br />

possuem uma forma laminar,<br />

chegan<strong>do</strong> em alguns grupos<br />

de plantas a tomar forma e a<br />

Figura 52. Tipos de estípulas. 1 estípulas livres, 2 estípulas aderentes ao pecíolo, 3<br />

ócrea (estrutura estipular tubulosa), 4 estípula inserida por debaixo <strong>do</strong> pecíolo. 5<br />

estípula intrapeciolar, 6 estípula interpeciolar (adapta<strong>do</strong> de<br />

http://www.anbg.gov.au/glossary/webpubl/glossik.htm ).


85 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

dimensão de folhas (estípulas foliáceas) ou folíolos; e.g. Lotus (Fabaceae). As estípulas são raras nas<br />

monocotiledóneas e frequentes nas dicotiledóneas. As dicotiledóneas, geralmente, apresentam duas estípulas, uma<br />

de cada la<strong>do</strong> de um pecíolo ou de um nó. Primordialmente, têm a <strong>função</strong> de proteger os primórdios foliares ou os<br />

meristemas axilares, após a expansão da folha. As estípulas podem apresentar-­‐se transformadas em espinhos (vd.<br />

Espinhos) ou, raramente, em gavinhas (vd. Metamorfoses da folha). As estípulas são classificadas em <strong>função</strong> <strong>do</strong> local<br />

onde se inserem e da sua concrescência (vd. Figura 52). O tipo de estípulas é muito importante na identificação de<br />

algumas famílias de óptimo tropical, e.g. Rubiaceae. Estas estruturas surgiram de forma independente em muitas<br />

linhagens de angiospérmicas, e.g. as estípulas de Rubiaceae, Fabaceae, ou de Brassicaceae não homólogas (Bell,<br />

2008).<br />

As lígulas são apêndices membranosos de origem epidérmica, por vezes transforma<strong>do</strong>s numa fiada de pelos,<br />

situa<strong>do</strong>s no encontro da bainha com o limbo de muitas monocotiledóneas (Figura 60 B). São particularmente<br />

frequentes na família das Poaceae. Também presentes, por exemplo, em Hedychium gardnerianum (Zingiberaceae)<br />

«conteira». Admite-­‐se que se destinam a proteger a bainha da água da chuva ou de insectos.<br />

Superfície e epifilia<br />

A superfície das folhas e demais órgãos aéreos herbáceos – caules herbáceos e peças da flor – é muito diversa e,<br />

por isso, rica em informação taxonómica (vd. Emergências). O termo epifilia refere-­‐se ao desenvolvimento de<br />

estruturas na superfície das folhas. Algumas das estruturas passíveis de serem encontradas nas folhas estão expostas<br />

no Quadro 25.<br />

Quadro 25. Estruturas passíveis de serem encontradas na superfície das folhas<br />

Tipo Comentários/exemplos<br />

Gemas adventícias muito raras na natureza; e.g. em Begonia (Begoniaceae) «begónias» e Bryophyllum (Crassulaceae)<br />

(Figura 53) formam-­‐se pequenas gemas na margem das folhas que dão origem as novos caules,<br />

usa<strong>do</strong>s na multiplicação vegetativa comercial destas espécies<br />

Raízes adventícias infrequentes; e.g. Saintpaulia ionantha (Gesneriaceae) «saintpaulia»<br />

Espinhos localiza<strong>do</strong>s na superfície ou na margem da folha (vd. Espinhos)<br />

Indumento aborda<strong>do</strong> no ponto Emergências<br />

Consistência e cor<br />

Quanto à consistência as folhas podem ser: herbáceas – folhas tenras, e.g. maioria das gramíneas; coriáceas – de<br />

consistência semelhante à <strong>do</strong> couro, e.g. Quercus suber<br />

(Fagaceae) «sobreiro»; carnudas – espessas e ricas em<br />

água, e.g. Sedum sp.pl. (Crassulaceae).<br />

As folhas são geralmente verdes poden<strong>do</strong>, consoante<br />

a concentração relativa <strong>do</strong>s pigmentos, mostrar-­‐se<br />

amarelas, purpúreas, etc. Entre as plantas ornamentais<br />

são frequentes cultivares, ou clones, de folhas<br />

variegadas ou listadas de diversas cores, e.g. Agave<br />

americana cv. Variegata (Agavaceae) «piteira». As folhas<br />

(e outros órgãos) com tons azula<strong>do</strong>s ou verde-­‐mar<br />

dizem-­‐se glaucas. Pouco antes da abcisão (queda) das<br />

folhas, muitos constituintes foliares são desmantela<strong>do</strong>s<br />

e desloca<strong>do</strong>s para centros de crescimento ativo (e.g.<br />

gemas) ou armazenamento, e as folhas mudam de cor.<br />

Nas plantas caducifólias a desmobilização <strong>do</strong>s nutrientes<br />

Figura 53. Gemas adventícias. Gemas adventícias foliares<br />

em Bryophyllum (Kalanchoe) daigremontiana<br />

(Crassulaceae), n.b. folhas e raízes adventícias suspensas<br />

nas gemas adventícias.


86 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

das folhas é despoletada e sincronizada por factores ambientais (e.g. comprimento <strong>do</strong> dia) o que explica a mudança,<br />

quase simultânea, da cor da copa das árvores <strong>do</strong>s bosques tempera<strong>do</strong>s de folha caduca no Outono.<br />

Duração<br />

As folhas são órgãos de duração muito limitada. Nas plantas anuais e bienais as folhas basais, muitas vezes<br />

organizadas em rosetas, entram em senescência à medida que os caules se alongam e as ensombram. Fin<strong>do</strong> o ciclo<br />

de vida as folhas sobreviventes morrem quase em simultâneo. Nas plantas perenes as folhas mais velhas têm que<br />

ser, de algum mo<strong>do</strong>, substituídas por outras novas, fotossinteticamente mais eficientes (vd. Estrutura modular das<br />

plantas). As plantas perenes seguem duas estratégias na renovação das folhas: caducifolia e perenifolia.<br />

Nas plantas de folha caduca (= caducifólias) a copa renova-­‐se no início da estação favorável cain<strong>do</strong> as folhas,<br />

quase em simultâneo, no início da estação desfavorável. As plantas de folha caduca podem ser caducifólias de<br />

inverno ou de estação seca 46 . A Adansonia digitata (Bombacoideae, Malvaceae) «embondeiro», uma importante<br />

árvore das zonas áridas africanas, e a Euphorbia pedroi (Euphorbiaceae), um endemismo da Serra da Arrábida, estão<br />

despidas de folhas na estação seca. Uma boa parte da flora lenhosa portuguesa é caducifólia de Inverno, e.g.<br />

Quercus pyrenaica (Fagaceae) «carvalho-­‐negral», Betulaceae «bi<strong>do</strong>eiros, amieiros e aveleiras», Salicaceae<br />

«salgueiros», Ulmaceae «ulmeiros» e ainda as Rosaceae arbustivas e arbóreas indígenas de Portugal (excepto Prunus<br />

azorica, P. hixa e P. lusitanica).<br />

A B<br />

Figura 54. Perenifolia, marcescência e caducifolia. A) Euphorbia pedroi<br />

(Euphorbiaceae) uma espécie caducifólia de Verão. B) Pinus halepensis<br />

(Pinaceae), uma árvore de folhas persistentes e pinhas marcescentes.<br />

Nas plantas de folha persistente (= de<br />

folha perene, perenifólias) a copa<br />

apresenta-­‐se revestida de folhas durante<br />

to<strong>do</strong> ano. Nestas plantas raramente<br />

permanecem folhas funcionais (i.e. verdes)<br />

com mais de 3 anos. Nas regiões com uma<br />

estação desfavorável bem marcada a<br />

queda das folhas nas plantas perenes<br />

normalmente é concentrada no tempo e<br />

antecede, ou ocorre em simultâneo, com a<br />

produção de novas folhas. Assim acontece,<br />

por exemplo, com a Mangifera indica<br />

(Anacardiaceae) «mangueira» na Guiné-­‐<br />

Bissau ou no nordeste brasileiro no início<br />

da estação das chuvas.<br />

As plantas semi-­‐caducifólias retêm parte das folhas durante a estação desfavorável, permanecen<strong>do</strong> muitas delas<br />

funcionais. O Quercus faginea subsp. broteroi (Fagaceae) «carvalho-­‐cerquinho» é o exemplo mais conheci<strong>do</strong> da flora<br />

portuguesa. Curiosamente, os indivíduos indígenas de Q. robur «carvalho-­‐roble», apesar de pertencerem ao subgén.<br />

Quercus, são também semi-­‐caducifólios. A retenção de órgãos secos – e.g. folhas, sépalas, pétalas, frutos e<br />

frutificações – designa-­‐se por marcescência. Os indivíduos jovens de Q. pyrenaica «carvalho-­‐negral» têm folhas<br />

marcescentes, carácter que se esbate e desaparece nos indivíduos adultos. No Pinus halepensis (Pinaceae) são<br />

marcescentes as pinhas e em muitas Lamiaceae os cálices.<br />

Filotaxia<br />

Num senti<strong>do</strong> lato entende-­‐se por filotaxia a descrição abreviada <strong>do</strong>s padrões de disposição espacial de estruturas<br />

similares nas plantas, e.g. caules, folhas, brácteas, flores e peças da flor. A regularidade da disposição <strong>do</strong>s ramos de<br />

ordem superior nos ramos de ordem inferior, das folhas nos caules ou das brácteas e das flores nas inflorescências,<br />

são uma consequência direta da regularidade temporal e espacial da diferenciação de estruturas na periferia <strong>do</strong>s<br />

meristemas apicais. Estes padrões têm um aperta<strong>do</strong> controlo genético que se expressa ao nível <strong>do</strong>s meristemas.<br />

46<br />

Nos territórios mediterrânicos a estação mais quente é a mais seca; nas áreas tropicais as temperaturas médias mais baixas<br />

verificam-­‐se na estação seca.


87 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Ao nível da folha reconhecem-­‐se três tipos de fundamentais de filotaxia descritos no Quadro 25 (Figura 55). O<br />

ângulo estabeleci<strong>do</strong> entre duas folhas alternas sucessivas designa-­‐se por ângulo de divergência φ, um conceito<br />

indispensável na descrição <strong>do</strong>s subtipos de filotaxia alterna (Quadro 26).<br />

Quadro 26. Tipologia filotáxica<br />

Tipo Descrição e exemplos<br />

Alternas Uma folha por nó; tipo mais frequente de filotaxia; as folhas arrosetadas – folhas de caules com entrenós muito curtos e,<br />

por isso, colapsadas umas sobre as outras – têm, regra geral, filotaxia alterna. As folhas alternas dispõem-­‐se em hélice<br />

em torno <strong>do</strong> caule; o ângulo de divergência φ permite diferenciar três subtipos (vd. mais adiante)<br />

Oposta Duas folhas por nó; as folhas opostas, sésseis, soldadas na base parecen<strong>do</strong> perfuradas pelo caule dizem-­‐se adunadas (e.g.<br />

Lonicera implexa [Caprifoliaceae] «madresilva-­‐entrelaçada»); distinguem-­‐se os três subtipos de folhas opostas em <strong>função</strong><br />

da disposição relativa das folhas em <strong>do</strong>is nós sucessivos (vd. mais adiante)<br />

Verticilada Três ou mais folhas por nó; e.g. Nerium oleander (Apocynaceae) «loendro» e Catalpa bignonioides (Bignoniaceae)<br />

«catalpa»<br />

Tipos de folhas<br />

alternas<br />

Dísticas<br />

(= disticadas<br />

Descrição e exemplos<br />

Folhas dispostas num mesmo plano (φ = 180°); e.g. Fagus sylvatica (Fagaceae) «faia», Ulmus (Ulmaceae) «ulmeiros» e<br />

Poaceae «gramíneas»<br />

Trísticas Folhas dispostas em três planos (φ = 120°); e.g. Carex (Cyperaceae) «cárices»<br />

Helicoidais<br />

(= espiraladas)<br />

Tipos de folhas<br />

opostas<br />

Folhas oposto-­‐<br />

disticadas<br />

Oposto-­‐cruzadas<br />

(= decussadas)<br />

Termo genericamente usa<strong>do</strong> para designar os restantes tipos de divergência (φ < 120°); tipo mais frequente; e.g. Quercus<br />

(Fagaceae) «carvalhos». As folhas alternas helicoidais podem ocupar um mesmo plano por torção <strong>do</strong> pecíolo (e.g. Abies<br />

alba [Pinaceae] «abeto-­‐europeu») ou <strong>do</strong> caule (e.g. comum no género Asclepias [Apocynaceae]), dizen<strong>do</strong>-­‐se então<br />

pseu<strong>do</strong>dísticas<br />

Descrição e exemplos<br />

Folhas de <strong>do</strong>is nós sucessivos no mesmo plano<br />

Folhas de <strong>do</strong>is nós sucessivos em planos perpendiculares; e.g. Olea europaea (Oleaceae) «oliveira»<br />

Numa mesma planta pode co-­‐existir mais<br />

de um tipo de filotaxia. Por exemplo, os ramos<br />

juvenis de Eucalyptus globulus (Myrtaceae) têm<br />

folhas opostas e os adultos folhas alternas. Em<br />

outras plantas as folhas <strong>do</strong>s ramos verticais<br />

(ramos ortotrópicos, vd. Orientação) são<br />

alternas helicoidais e as <strong>do</strong>s ramos próximos da<br />

horizontalidade (ramos plagiotrópicos) alternas<br />

disticadas.<br />

A regularidade da disposição das folhas nas<br />

plantas tem si<strong>do</strong> explorada pelos botânicos<br />

desde o século XVII. A disposição espacial das<br />

A<br />

Figura 55. Inserção das folhas. a) 1. Folhas alternas; 2. Folhas<br />

opostas; folhas verticiladas (Coutinho, 1898). b) Plantago coronopus<br />

(Plantaginaceae): roseta de folhas.<br />

folhas é, normalmente, representada por um rácio em que o numera<strong>do</strong>r corresponde ao número de espirais<br />

necessárias até à sobreposição de duas folhas (quan<strong>do</strong> observadas <strong>do</strong> topo <strong>do</strong> caule) e o denomina<strong>do</strong>r ao número de<br />

folhas que medeiam duas folhas sobrepostas. Por exemplo, o rácio 2/5, característico de plantas como os Quercus<br />

(Fagaceae) «carvalhos» ou o Prunus avium (Rosaceae) «cerejeira», significa que são necessárias duas espirais para<br />

que duas folhas se sobreponham e, entre estas (contan<strong>do</strong> apenas uma das folhas <strong>do</strong>s extremos da espiral), contam-­‐<br />

se 5 folhas. Na Natureza observam-­‐se os rácios (espirais de Fibonacci) 1/2, 1/3, 2/5, 3/8, 5/13, 8/21, etc. Constata-­‐se<br />

que o denomina<strong>do</strong>r de cada rácio corresponde à soma <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is denomina<strong>do</strong>res imediatamente anteriores – e.g.<br />

B


88 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

13=8+5 ou 21= 13+8 – perfazen<strong>do</strong> a sequência numérica principal de Fibonacci. A divisão entre denomina<strong>do</strong>res<br />

sucessivos – e.g. 8/5, 13/8, 21/13, etc. – converge no número de Fibonacci ou proporção áurea, 0.618034, usada em<br />

arquitectura desde a antiguidade e recorrente na organização de muitos seres vivos (e.g. conchas de Nautilus<br />

«nautilus», Mollusca, Nautilidae). A sequência de ângulos 360°*1/2, 360°*1/3, 360°*2/5, etc., por sua vez, converge<br />

no chama<strong>do</strong> ângulo de Fibonacci.<br />

A diferenciação de primórdios no ápice <strong>do</strong> meristema apical é controlada por processos de repulsão ou inibição<br />

entre primórdios, de fisiologia não esclarecida, que compelem o primórdio em diferenciação a formar-­‐se na posição<br />

o mais distante possível <strong>do</strong>s primórdios anteriores. Ten<strong>do</strong> em consideração esta constatação empírica, conhecida<br />

por regra de Hofmeister (Kirchoff, 2003), foi demonstra<strong>do</strong> que as espirais de Fibonacci anteriormente enunciadas,<br />

emergem espontaneamente se (Douady & Couder, 1996): o ápice <strong>do</strong> meristema for longitudinalmente simétrico; a<br />

velocidade a que se diferenciam os primórdios foliares, i.e. o plastocrono, for constante; a velocidade da migração<br />

radial <strong>do</strong>s primórdios foliares no ápice caulinar for constante; não houver uma reorganização espacial <strong>do</strong>s primórdios<br />

foliares após a sua diferenciação. Por conseguinte, a sequência numérica de Fibonacci não está inscrita no genoma:<br />

tem um controlo genético indireto. Não existe uma numerologia <strong>do</strong> vivo!<br />

Ptixia e vernação<br />

Entende-­‐se por ptixia a forma como os esboços foliares se <strong>do</strong>bram, individualmente, nos gomos. A vernação (=<br />

prefolheação ou prefoliação) é um conceito distinto de ptixia porque se refere ao arranjo das folhas, umas em<br />

relação às outras, no gomo folhear (Bell, 2008) (Keller, 2004) 47 . O estu<strong>do</strong> da ptixia e da vernação envolve o corte<br />

transversal de gemas <strong>do</strong>rmentes ou recém-­‐abrolhadas, e a sua observação à lupa. Uma vez que a terminologia é<br />

comum, a ptixia e a vernação da são discutidas no ponto dedica<strong>do</strong> à Ptixia e estivação.<br />

Heterofilia<br />

As plantas heterofilas possuem <strong>do</strong>is ou mais tipos morfológicos de folhas. Já anteriormente se aludiu às folhas<br />

juvenis e adultas de Eucalyptus ou de Quercus rotundifolia «azinheira» (vd. Variação morfológica intraespecífica). O<br />

mesmo fenómeno ocorre na Hedera helix (Araliaceae) «hera» (Figura 56). Um dimorfismo foliar igualmente evidente<br />

ocorre em muitas plantas aquáticas entre as folhas submersas e flutuantes, e.g. Ranunculus sp.pl. (Ranunculaceae) e<br />

Callitriche sp.pl. (Plantaginaceae). Na Pyrancantha coccinea (Rosaceae) «piracanta» a forma e a dimensão <strong>do</strong>s<br />

nomofilos varia, de forma contínua, à escala <strong>do</strong> indivíduo e entre indivíduos. Nos Quercus caducifólios as folhas de<br />

sombra e de sol, e a folhas de Primavera e de Verão, são, por vezes, tão distintas que é difícil identificar a espécie em<br />

alguns exemplares de herbário.<br />

A B<br />

Figura 56. Heterofilia, dimorfismo foliar. Hedera helix s.l.<br />

(Araliaceae) «hera». a) Ramos juvenis (ramos estéreis): monopodiais,<br />

prostra<strong>do</strong>s, finca<strong>do</strong>s no tutor através de raízes adventícias adesivas e<br />

com folhas lobadas de inserção dística. b) Ramos adultos (ramos<br />

férteis): simpodiais, erectos, sem raízes adventícias e com folhas<br />

inteiras de inserção espiralada.<br />

A heterofilia é patente ao longo <strong>do</strong> eixo das<br />

plântulas ou <strong>do</strong>s ramos laterais provenientes <strong>do</strong><br />

abrolhamento de gomos <strong>do</strong>rmentes. Estas<br />

sequências temporais de folhas, designadas por<br />

séries heteroblásticas (Bell, 2008), nos eixos<br />

das plântulas incluem 1 ou 2 cotilé<strong>do</strong>nes, folhas<br />

primordiais e nomofilos. Nos lançamentos<br />

caulinares das plantas lenhosas das regiões com<br />

uma estação desfavorável verifica-­‐se,<br />

geralmente, a seguinte sequência temporal de<br />

filomas: 1 (nas monocotiledóneas e<br />

dicotiledóneas basais) ou 2 (nas dicotiledóneas<br />

s.l.) profilos, um número variável de nomofilos<br />

e, no final da estação de crescimento, a<br />

formação de catáfilos a envolver o meristema<br />

apical. Esta sequência é modificada com a diferenciação de flores ou inflorescências: aos nomofilos sucedem-­‐se<br />

então hipsofilos e, nas inflorescências determinadas, os antofilos que compõem a flor.<br />

47 Conceitos sinonimiza<strong>do</strong>s por muitos autores.


89 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

4.4.5. Metamorfoses da folha<br />

A folha é <strong>do</strong>s três órgãos fundamentais das plantas o órgão evolutivamente mais versátil na forma e na <strong>função</strong>. A<br />

bibliografia é pródiga em exemplos de adaptações especializadas ao nível da folha.<br />

Bolbos e bolbilhos<br />

Os bolbos são constituí<strong>do</strong>s por um caule<br />

curto (prato ou disco <strong>do</strong> bolbo), geralmente<br />

vertical, de entrenós curtos e com um grande<br />

número de raízes adventícias muitas vezes<br />

contrácteis na base, revesti<strong>do</strong> por folhas<br />

carnudas de reserva e com uma gema apical<br />

muito desenvolvida. Reconhecem-­‐se <strong>do</strong>is tipos<br />

de bolbos: entunica<strong>do</strong>s e escamosos (Figura<br />

57). Nos bolbos entunica<strong>do</strong>s possuem um<br />

grande número de folhas carnudas de reserva<br />

perfeitamente sobrepostas e exteriormente<br />

envolvidas por uma ou mais folhas<br />

membranosas (túnica). As folhas de reserva<br />

podem estar reduzidas a bainhas (e.g. Allium<br />

cepa [Alliaceae] «cebola»), possuírem uma base<br />

alargada de reserva e prologarem-­‐se num limbo mais ou menos longo (falsos bolbos) (e.g. Amaryllis<br />

[Amaryllidaceae]) ou incluírem folhas escamiformes e folhas com limbo (e.g. Narcissus [Amaryllidaceae] «narcisos»).<br />

Caracterizam os bolbos escamosos folhas escamiformes carnudas imbricadas, i.e. imperfeitamente sobrepostas,<br />

como as telhas de um telha<strong>do</strong>; e.g. Lilium candidum (Liliaceae) «açucena».<br />

A cabeça-­‐de-­‐alho (Allium sativum) corresponde a um terceiro tipo de bolbo que poderíamos apelidar de bolbo de<br />

bolbilhos. Na cabeça-­‐de-­‐alho os bolbilhos (dentes de alho) não se sobrepõem completamente, como no bolbo<br />

escamoso, sen<strong>do</strong> revesti<strong>do</strong>s por uma túnica membranosa. Algo similar ocorre no Allium neapolitanum (=<br />

Nothoscordum ino<strong>do</strong>rum) «alho-­‐falso».<br />

A renovação <strong>do</strong>s bolbos nas plantas perenes geralmente faz-­‐se pela<br />

diferenciação de um bolbo-­‐filho na extremidade <strong>do</strong> bolbo-­‐mãe (bolbos<br />

monopodiais) ou pela diferenciação de novos bolbos a partir de gemas<br />

situadas na axila de folhas carnudas ou membranosas (bolbos simpodiais); os<br />

bolbos-­‐filhos geralmente ficam encapsula<strong>do</strong>s pelos catáfilos <strong>do</strong> bolbo-­‐mãe<br />

(e.g. cabeças-­‐de-­‐alho). Nas bulbosas bienais (e.g. Allium cepa «cebola») o<br />

bolbo forma-­‐se no final <strong>do</strong> primeiro ano de crescimento; no final <strong>do</strong> segun<strong>do</strong><br />

ano as plantas renovam-­‐se por semente. Os bolbos diferenciam inflorescências<br />

terminais a partir da gema localizada no centro <strong>do</strong> bolbo, ou inflorescências<br />

laterais inseridas na axila de uma folha carnuda. Tanto os bolbos como os<br />

bolbilhos são mais frequentes nas monocotiledóneas.<br />

Os bolbilhos são bolbos ou cormos de pequenas dimensões diferencia<strong>do</strong>s<br />

numa inflorescência (e.g. Allium vineale), na axila de uma folha, tipo catáfilo<br />

ou não, de um bolbo-­‐mãe (e.g. dentes de Allium sativum [Alliaceae] «alho»),<br />

ou ainda pelo engrossamento de um ou mais entrenós, geralmente na base <strong>do</strong><br />

caule (e.g. Poa bulbosa [Poaceae]) (Figura 58). No alho os bolbilhos (dentes de<br />

alho) são constituí<strong>do</strong>s por uma folha externa membranosa adaxial<br />

(corresponde a um profilo) que reveste uma espessa folha carnuda tubulosa,<br />

Figura 57. Bolbo e cormo. 1. bolbo entunica<strong>do</strong> (corte longitudinal);<br />

n.b. bolbo envolvi<strong>do</strong> por folhas escamosas e raízes adventícias<br />

fasciculadas inseridas no prato <strong>do</strong> bolbo. 2. bolbo entunica<strong>do</strong> (cortes<br />

longitudinal e transversal); n.b. prato <strong>do</strong> bolbo e folhas carnudas. 3.<br />

bolbo escamoso. 4. cormo (= bolbo sóli<strong>do</strong>, vd. quadro 14) (Coutinho,<br />

1898).<br />

Figura 58. Bolbilhos. Bolbilhos de<br />

Poa bulbosa (Poaceae).<br />

no interior da qual se dispõem várias folhas, não carnudas e de limbo reduzi<strong>do</strong>, em torno de uma gema.<br />

Os bolbos e os bolbilhos desempenham duas funções: reprodução e reserva de energia, água e nutrientes. A<br />

separação <strong>do</strong>s bolbos-­‐filho e <strong>do</strong>s bolbilhos da planta-­‐mãe é uma forma de reprodução assexuada. As reservas têm


90 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

um grande valor adaptativo em climas com uma estação seca muito longa (e.g. clima mediterrânico ou tropical com<br />

estação seca) ou em habitats onde seja vantajoso produzir flores e folhas muito ce<strong>do</strong> (e.g. antes <strong>do</strong> abrolhamento<br />

das árvores nos bosques caducifólios ou antes <strong>do</strong> encanamento das gramíneas nos pra<strong>do</strong>s). Nestes ambientes as<br />

reservas <strong>do</strong>s bolbos antecipam a acumulação de biomassa e o crescimento no arranque da estação favorável ao<br />

crescimento das plantas. As espécies bulbosas podem então cumprir o seu ciclo fenológico antes das plantas mais<br />

competitivas. Os rizomas, os cormos e as raízes tuberosas desempenham funções análogas aos bolbos.<br />

Outras metamorfoses<br />

Outras metamorfoses frequentes da folha estão resumidas no Quadro 27.<br />

Quadro 27. Metamorfoses da folha mais frequentes<br />

Tipo Descrição Exemplos<br />

Filódios Folhas reduzidas a um pecíolo (e.g. Asparagus<br />

[Asparagaceae] «espargos») ou a um ráquis (e.g. Acacia<br />

[Fabaceae] «acácias») dilata<strong>do</strong> e achata<strong>do</strong>, semelhante a um<br />

limbo foliar; a presença de meristemas axilares comprova a<br />

natureza foliar <strong>do</strong>s filódios; geralmente os filódios são uma<br />

adaptação à secura<br />

Folhas<br />

gordas<br />

Folhas espessas, ricas em água, frequentemente de contorno<br />

arre<strong>do</strong>nda<strong>do</strong>; representam, geralmente, adaptações à secura<br />

Espinhos As folhas podem estar reduzidas a espinhos – espinhos<br />

foliares – de origem peciolar ou estipular (vd. Espinhos); os<br />

espinhos têm uma ontogénese distinta das emergências<br />

espinhosas dispersas na margem ou no limbo das folhas<br />

epinescentes (vd. Emergências)<br />

Gavinhas<br />

foliares<br />

Armadilhas<br />

de origem<br />

foliar<br />

Folhas modificadas adaptadas a envolver ramos ou outros<br />

tipos de suporte; presentes em muitas lianas; as gavinhas de<br />

origem foliar podem resultar da modificação <strong>do</strong> limbo de<br />

uma folha simples, de um ou mais folíolos de uma folha<br />

composta, ou muito raramente, de estípulas<br />

As plantas ditas carnívoras servem-­‐se de armadilhas de<br />

origem foliares para capturar insectos ou pequenos<br />

organismos multicelulares; a carnivoria é entendida como<br />

uma adaptação a habitats pobres em nutrientes, e.g. turfeiras<br />

Em muitas Acacia – e.g. A. melanoxylon<br />

«acácia-­‐austrália» – observam-­‐se ramos<br />

com filódios, folhas recompostas e folhas de<br />

morfologia intermédia, com um filódio<br />

encima<strong>do</strong> por uma ou mais pínulas (vd.<br />

Divisão ou composição)<br />

Crassuláceas <strong>do</strong> género Sedum (Figura 59 A)<br />

Espinhos das Cactaceae<br />

Gavinhas estipulares – Vicia [Fabaceae]<br />

«ervilhacas; gavinhas estipulares – Smilax<br />

[Smilacaceae]<br />

Exemplos no Quadro 28<br />

As plantas carnívoras servem-­‐se de vários tipos de armadilhas de origem foliar para capturar as suas “presas”<br />

expressas no Quadro 28 (Figuras 12 C e 59 B).<br />

Quadro 28. Tipos de armadilhas foliares nas plantas carnívoras<br />

Tipo Exemplos<br />

Armadilhas pegajosas ou<br />

adesivas<br />

Os géneros indígenas de Portugal Drosophyllum (Drosophyllaceae) «erva-­‐pinheira-­‐orvalhada» e<br />

Drosera (Droseraceae) têm pelos glandulosos pegajosos (Figura 12 C); em Pinguicula<br />

(Lentibulariaceae) todas a superfície das folhas é pegajosa<br />

Armadilhas articuladas Dionaea muscipula (Droseraceae), uma carnívora norte-­‐americana<br />

Armadilhas escorregadias Géneros extra-­‐europeus Sarracenia (Sarraceniaceae) e Nepenthes (Nepenthaceae) (figura 59 B)<br />

Armadilhas por sucção Utricularia (Utriculariaceae), um género cosmopolita presente em Portugal continental


91 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Em pontos anteriores foram descritos mais<br />

exemplos de adaptações: catáfilos e hipsofilos.<br />

Os antofilos são a mais surpreendente<br />

metamorfose foliar, a ser discutida, mais<br />

adiante nos pontos referentes à flor.<br />

4.5. O corpo das<br />

gramíneas<br />

As gramíneas têm um sistema radicular<br />

fascicula<strong>do</strong>. A raiz primária nesta família de<br />

monocotiledóneas senesce num estádio<br />

precoce <strong>do</strong> desenvolvimento. Nos cereais de<br />

Outono-­‐Inverno a raiz primária permanece<br />

funcional até à entrada <strong>do</strong> Inverno, quan<strong>do</strong> tem<br />

início o afilhamento.<br />

As gramíneas possuem quatro tipos de meristemas: apicais, axilares, folheares e intercalares <strong>do</strong> caule. Os<br />

meristemas apicais e axilares, no início <strong>do</strong> ciclo vegetativo, produzem fitómeros encaixa<strong>do</strong>s de forma linear e, mais<br />

tarde, inflorescências. A velocidade a que se formam novos fitómeros depende, sobretu<strong>do</strong>, das características<br />

genéticas das plantas e da temperatura. À medida que os meristemas caulinares apicais progridem deixam para trás<br />

agrega<strong>do</strong>s de células com capacidade meristemática com a <strong>função</strong> de alongar as folhas (meristemas intercalares<br />

folheares) ou de alongar os entrenós <strong>do</strong> caule (meristemas intercalares caulinar). Ao contrário <strong>do</strong>s meristema apicais<br />

e axilares, estes <strong>do</strong>is tipos de meristema estão encrava<strong>do</strong>s entre teci<strong>do</strong>s definitivos (vd. Os meristemas). Muitas<br />

espécies gramíneas são capazes de repor, parcialmente, a perda por herbivoria da extremidade <strong>do</strong> limbo na última<br />

fase <strong>do</strong> crescimento da folha, quan<strong>do</strong> esta emerge da bainha da folha imediatamente anterior pela ação <strong>do</strong>s<br />

meristemas folheares. Os meristemas intercalares <strong>do</strong> caule desempenham um papel importante no alongamento<br />

<strong>do</strong>s entrenós na fase reprodutiva, e na emergência da inflorescência.<br />

Nas gramíneas temperadas e mediterrânicas os metâmeros caulinares (fitómeros) forma<strong>do</strong>s no Outono e no<br />

Inverno são muito curtos. Nesta altura <strong>do</strong> ano as folhas apresentam um limbo pequeno e as bainhas sobrepostas e<br />

comprimidas num pseu<strong>do</strong>caule (Figura 60). Pouco depois da emergência – nos cereais a partir <strong>do</strong> estádio fenológico<br />

de 3-­‐folhas, – ainda no Outono nas regiões de climas não tropical, em consequência da ativação de meristemas<br />

axilares, formam-­‐se novos caules na axila das folhas recém-­‐diferenciadas, ou na axila das folhas de estolhos ou<br />

rizomas que persistiram no solo durante a<br />

estação desfavorável ao crescimento.<br />

Iniciada a formação <strong>do</strong>s novos caules, estes<br />

meristemas passam a ser identifica<strong>do</strong>s<br />

como meristemas apicais. Em cada axila<br />

foliar insere-­‐se apenas um novo caule: um<br />

colmo, um estolho ou um rizoma. A origem<br />

axilar obriga os novos estolhos ou rizomas a<br />

perfurar uma ou mais bainhas foliares da<br />

planta-­‐mãe, antes despontarem,<br />

respectivamente, no exterior à superfície<br />

<strong>do</strong> solo. Os filhos – i.e. os colmos pós-­‐<br />

embrionários, inseri<strong>do</strong>s noutros colmos<br />

mais velhos – alongam-­‐se entre a bainha e<br />

o colmo da planta-­‐mãe.<br />

Nas Poaceae anuais a formação de<br />

novos caules axilares pelos meristemas<br />

A B<br />

Figura 59. Adaptações ao nível da folha. a) Folhas gordas, equifaciais<br />

e cilíndricas, de Sedum caespitosum (Crassulaceae); n.b. fruto múltiplo<br />

de folículos semelhante a uma estrela. b) Nepenthes x ventrata<br />

(Nepenthaceae); n.b. parte distal da folha metamorfizada num<br />

armadilha escorregadia em forma de jarra (ascídeo) com uma tampa<br />

que evita a entrada da água da chuva e a diluição <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong>.<br />

A B<br />

Figura 60. O corpo das gramíneas. a) Corpo vegetativo das gramíneas.<br />

N.b. folhas alternas disticadas». b) Pseu<strong>do</strong>caule e filhos. Lolium rigidum<br />

(Poaceae) «erva-­‐febra».


92 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

aloja<strong>do</strong>s na axila das folhas da base designa-­‐se afilhamento. Nos cereais de Outono-­‐Inverno (e.g. trigo, centeio,<br />

cevada e aveia) este processo ocorre no final <strong>do</strong> Outono e durante o Inverno, e depende fatores internos<br />

(características genéticas das plantas) ou externos (e.g. temperatura, precipitação, nutrientes e radiação solar). O<br />

trigo afilha mais <strong>do</strong> que o centeio por isso, em solos de igual fertilidade, a densidade de sementeira (número de<br />

sementes/ha) <strong>do</strong> centeio deve ser superior à <strong>do</strong> trigo. Curiosamente, nos sistemas tradicionais de agricultura as<br />

densidades de sementeira <strong>do</strong> trigo e <strong>do</strong> centeio eram semelhantes porque o trigo ocupava os melhores solos; as<br />

terras menos férteis eram reservadas para o centeio. Obtinha-­‐se, assim, como convém, um número de colmos/ha<br />

superior nas terras melhores (de trigo), <strong>do</strong> que nas de pior qualidade (de centeio). A radiação solar tem um efeito<br />

muito marca<strong>do</strong> no afilhamento: quanto maior a quantidade de luz recebida pelas plantas, por exemplo, em<br />

resulta<strong>do</strong> de baixas densidades de sementeiras, mais intenso é o afilhamento. Nas Poaceae vivazes, nas Cyperaceae<br />

e em outras famílias de monocotiledóneas, os filhos designam-­‐se por inovações. Salvo raras exceções, as inovações<br />

produzem flores ou inflorescências no próprio ano.<br />

5. Referências<br />

Adl, S. M., Simpson, A., Farmer, M., Andersen, R., Andersen, O., Barta, J., et al. (2005). The new higher level<br />

classification of eukaryotes with emphasis on the taxonomy of protists. J. Eukaryot. Microbiol. , 52, 399-­‐451.<br />

Angiosperm Phylogeny Group. (2009). An update of the Angiosperm Phylogeny Group classification for the orders<br />

and families of flowering plants: APG III. Bot. J. Linn. Soc. , 161, 105-­‐121.<br />

Beck, C. B. (2010). An Introduction to Plant Structure and Development: Plant Anatomy for the Twenty-­‐First Century<br />

(2º ed. ed.). Cambridge: Cambridge University Press.<br />

Beentje, H. (2012). The Kew Plant Glossary. Richmond: Royal Botanic Gardens, Kew.<br />

Bell, A. (2008). Plant Form. An Ilustrated Guide to Flowering Plant Morphology. Portlans: Timber Press.<br />

Belzung, E. (1900). Anatomie et physiologie végétales: à l'usage des étudiants en sciences naturelles des universités,<br />

des élèves à l'Institut agronomique, des écoles d'agriculture, etc.ves. Paris: Félix Alcan.<br />

Berling, D. (2007). The Emerald Planet: How Plants Changed Earth's History. Oxford: Oxford University Press.<br />

Bingre, P., Aguiar, C., Espírito-­‐Santo, D., Arsénio, P., & Monteiro-­‐Henriques, T. (2007). Guia de Árvores e Arbustos de<br />

Portugal Continental. In J. Sande Silva (Ed.), Árvores e Florestas de Portugal (<strong>Vol</strong>. 9). Lisboa: LPN.<br />

Bonnier, G., & Douin, R. (1911-­‐1934). Flore complète illustrée en couleurs de France, Suisse et Belgique (comprenant<br />

la plupart des espèces d'Europe). Paris: Librairie Générale de l'Enseignement, Delachaux et Niestlé, E. Orlhac, J.<br />

Lebègue.<br />

Brickell, C., Alexander, C., David, J., Hetterscheid, W., Leslie, A., Malecot, V., et al. (Edits.). (2009). International Code<br />

of Nomenclature for Cultivated Plants (ICNCP or Cultivated Plant Code). Scripta Horticulturae , 10, 1-­‐184.<br />

Carlquist, S. (2009). Xylem heterochrony: an unappreciated key to angiosperm origin and diversifications. Bot. J. Linn.<br />

Soc. , 161, 26-­‐65.<br />

Champagne, C., & Sinha, N. (2004). Compound leaves: equal to the sum of their parts? Development , 131, 4401-­‐<br />

4412.<br />

Chase, M., & Reveal, J. (2009). A phylogenetic classification of the land plants to accompany APG III. Bot. J. Lin. Soc. ,<br />

161, 122-­‐127.<br />

Christenhusz, J., Reveal, J., Martin, F., Robert, R., & Chase, W. (2011). A new classification and linear sequence of<br />

extant gymnosperms. Phytotaxa , 19, 55-­‐70.


93 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Christenhusz, J., Zhang, X., & Schneider, H. (2011). A linear sequence of extant families and genera of lycophytes and<br />

ferns. Phytotaxa , 19, 7-­‐54.<br />

Coutinho, A. X. (1898). Atlas de Botânica: para uso <strong>do</strong>s lyceus (I, II, III e IV classes). Lisboa: Companhia Nacional<br />

Editora.<br />

DeMason, D. (1983). The primary thickening meristem: definition and function in monocotyle<strong>do</strong>ns. American Journal<br />

of Botany , 70, 955-­‐962.<br />

Deysson, G. (1965). Eléménts d'Anotomie des Plantes Vasculaires. Paris: Société d'Édition d'Enseignement Supérieur.<br />

Díaz Gonzalez, T., Fernandez-­‐Carvajal Alvarez, M., & Fernández Prieto, J. (2004). Curso de Botánica. Gijón: Ediciones<br />

Treaa-­‐Ciencia.<br />

Douady, S., & Couder, Y. (1996). Phyllotaxis as a dynamical delf organizing process. Part I: the spiral modes resulting<br />

from time-­‐periodic iterations. J. Theor. Biol. , 178, 255-­‐274.<br />

Dubrovsky, D., & Rost, T. (2012). Pericycle. eLS . Chichester: John Wiley & Sons, Ltd. Obti<strong>do</strong> em 5 de 1 de 2012, de<br />

eLS.<br />

Esau, K. (1977). Anatomy of Seed Plants (2 ed.). New York: John Wiley & Sons.<br />

Evert, R. (2006). Esau's Plant Anatomy: Meristems, Cells, and Tissues of the Plant Body -­‐ Their Structure, Function,<br />

and Development. New Jersey: Wiley-­‐Blackwell.<br />

Fernandes, R. (1972). Glossário de termos botânicos. Anuário da Sociedade Broteriana , 38, 181-­‐292.<br />

Ferreirinha, M. (1958). Elementos de anatomia das madeiras. Folhosas portuguesas. Memórias da Junta de<br />

Investigações <strong>do</strong> Ultramar , 3.<br />

Font Quer, P. (Ed.). (1985). Diccionario de Botânica (9 ed.). Barcelona: Editorial Labor.<br />

Gould, S., & Vrba, E. (1982). Exaptation; a missing term in the science of form. Paleobiology , 8, 4-­‐15.<br />

Hallé, F. (2002). In Praise of Plants. Portland: Timber Press.<br />

Heywood, V. (Ed.). (1993). Flowering Plants of the World. Oxford: Oxford University Press.<br />

Hickey, L. (1979). A revised classification of the architecture of dicotyle<strong>do</strong>nous leaves. In C. Metcalf, & L. Chalk<br />

(Edits.), Anatomy of the Dicotyle<strong>do</strong>ns (2 ed., <strong>Vol</strong>. 1, pp. 25-­‐39). Oxford: Claren<strong>do</strong>n Press.<br />

Hickey, L. (1973). Classification of the architecture of dicotyle<strong>do</strong>nous leaves. American Journal of Botany , 60, 17-­‐33.<br />

Ingrouille, M., & Eddie, B. (2006). Plants: Diversity and Evolution. Cambridge: Cambridge University Press.<br />

Jensen, W., & Kavaljian, L. (1958). An analysis of cell morphology and the periodicity of division in the root tip of<br />

Allium cepa. Amer. Jour. Bot. , 45, 365-­‐372.<br />

Judd, W., Campbell, C., Kellog, E., Stevens, P., & Donoghue, M. (2007). Plant Systematics. A Phylogenetic Approach (3<br />

ed.). Sunderland: Sinauer Associates.<br />

Keller, R. (2004). Identification of Tropical Woody Plants in the Absence of Flowers (2 ed.). Basel: Birkhäuser Verlag.<br />

Khan, A. (2002). Plant Anatomy and Physiology. New Delhi: Kalpaz Publications.<br />

Kirchoff, B. (2003). Shape matters: Hofmeister's rule, primordium shape and flower orientation. Int. J. Plant Sci. , 164,<br />

505-­‐517.<br />

Leaf Architecture Working Group. (1999). Manual of Leaf Architecture: Morphological Description of Dicotyle<strong>do</strong>nous<br />

and Net-­‐Veined Monocotyle<strong>do</strong>nous Angiosperms. Washington, D.C.: Smithsonian Institution.<br />

Leliaert, F., Smith, D., Moreau, H., Herron, M., Verbruggen, H., Delwiche, C., et al. (2012). Phylogeny and molecular<br />

evolution of the green algae. Critical Reviews in Plant Sciences , 31, 1-­‐46.<br />

McNaughton, S., & Tarrants, J. (1983). Grass leaf silicification: Natural selection for an inducible defense against


94 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

herbivores. Proc. Natl. Acad. Sci. USA , 80, 790-­‐791.<br />

McNeill, J., Barrie, F., Buck, W., Demoulin, V., Greuter, W., Hawksworth, D., et al. (Edits.). (2012). International Code<br />

of Nomenclature for algae, fungi and plants (Melbourne Code) a<strong>do</strong>pted by the Eighteenth International Botanical<br />

Congress Melbourne, Australia, July 2011. Regnum Vegetabile , 154.<br />

Moreira, I. (2010). Anatomia das Plantas: Estruturas. Lisboa: ISA Press.<br />

Moreira, I. (1983). Histologia Vegetal (3 ed.). Lisboa: Didáctica Editora.<br />

Offler, C., McCurdy, D., Patrick, J., & Talbot, M. (2003). Transfer cells: cells specialized for a special purpose. Annual<br />

Review of Plant Biology , 54, 431-­‐454.<br />

Palhinha, H., & Cunha, A. (1939). Curso de Botânica. Lisboa: J. Rodrigues & C.ª.<br />

Pallardy, S. (2007). Physiology of Woody Plants. San Diego: Academic Press.<br />

Pérez-­‐Morales, C. (1999). Morfología de Espermatófitos. Léon: Editorial Celarayn.<br />

Perin, L., Martínez-­‐Aguilar, L., Castro-­‐González, R., Estrada-­‐de los Santos, P., Cabellos-­‐Avelar, T., Guedes, V., et al.<br />

(2006). Diazotrophic Burkholderia Species Associated with Field-­‐Grown Maize and Sugarcane. Appl Environ<br />

Microbiol. , 75, 3103-­‐3110.<br />

Refrégier, G., Höft, H., & Venhettes, S. (2012). La cellulose , un acier végétal. Dossier Pour la Science , 77, 14-­‐21.<br />

Rickson, F. (1975). The ultrastructure of Acacia cornigera L. beltian body tissue. American Journal of Botany , 62, 913-­‐<br />

922.<br />

Roger, P. (1996). Biology and Management Floodwater Ecosystem in Ricefields. Manila: lnternational Rice Research<br />

Institute.<br />

Ronse De Craene, L. (2010). Floral Diagrams: An Aid to Understanding the Flower Morphology and Evolution.<br />

Cambridge: Cambridge University Press.<br />

Ronse De Craene, L., & Wanntorp, L. (2011). Introduction: establishing the state of the art – the role of morphology<br />

in plant systematics. In L. Wanntorp, & L. Ronse de Craene (Edits.), Flowers on The Tree of Life (pp. 1-­‐7).<br />

Cambridge: Cambridge University Press.<br />

Roth-­‐Nebelsick, A., Uhl, D., Mosbrugger, V., & Kerp, H. (2001). Evolution and function of leaf venation architecture: A<br />

review. Annals of Botany , 87, 553-­‐566.<br />

Rudal, P. (2007). Anatomy of Flowering Plants. An Introduction to Structure and Development (3 ed.). Cambridge:<br />

Cambridge University Press.<br />

Rudal, P. (1991). Lateral meristems and stem thickenin g growth in monocotyle<strong>do</strong>ns. Bot. Rev. , 57.<br />

Rudal, P. (1991). Lateral meristems and stem thickening growth in monocotyle<strong>do</strong>ns. Bot. Rev. , 57.<br />

Sablowski, R. (2007). Flowering and determinacy in Arabi<strong>do</strong>psis. Journal of Experimental Botany , 58, 899-­‐907.<br />

Sachs, J. (1874). Traité de Botanique Conforme à l'État Présent de la Science. Paris: Librarie F. Savi.<br />

Sage, R., Sage, T., & Kocacinar, F. (2012). Photorespiration and the Evolution of C4 Photosynthesis. Annual Review of<br />

Plant Biology , 63, 19-­‐47.<br />

Sass, J. (1951). Botanical Microtechnique (2 ed.). Ames: The Iowa State College Press.<br />

Schreiber, L., & Franke, R. (2011). En<strong>do</strong>dermis and exodermis in roots. eLS . (L. John Wiley & Sons, Ed.) Chichester.<br />

Obti<strong>do</strong> em 5 de 1 de 2012, de DOI: 10.1002/9780470015902.a0002086.pub2<br />

Sitte, P., Weller, E., Bresinsky, A., Kadereit, J., & Korner, C. (2003). Strasburger: Trata<strong>do</strong> de Botánica. Barcelona:<br />

Editorial Omega.<br />

Smith, S., & Read, D. (2008). Mycorrhizal Symbiosis. Lon<strong>do</strong>n: Academic Press.


95 Escola Superior Agrária de Bragança -­‐ Botânica para Ciências Agrárias e <strong>do</strong> Ambiente<br />

Spichiger, R.-­‐E., Savoilainen, V., Figeat, M., & Jeanmonod, D. (2004). Systematic Botany of Flowering Plants: A New<br />

Phytogenetic Approach of the Angiosperms of the Temperate and Tropical Regions (2 ed.). Enfield: Science<br />

Publishers.<br />

Stein, W., & Boyer, J. (2006). Evolution of land plant architecture: beyond the telome theory. Paleobiology , 450-­‐482.<br />

Stevens, P. (2001+). Obti<strong>do</strong> em 5 de 1 de 2012, de Angiosperm Phylogeny Website:<br />

http://www.mobot.org/MOBOT/research/APweb/<br />

Systematics Association Committee for Descriptive Biological Terminology. (1962). II. Terminology of Simple<br />

Symmetrical Plane Shapes (Chart 1). Taxon , 11, 145-­‐156.<br />

Teixeira, A., & Ricar<strong>do</strong>, C. (1993). Fotossíntese (2 ed.). Lisboa: Didáctica Editora.<br />

Thomas, P. (2000). Trees: Their Natural History. Cambridge: Cambridge University Press.<br />

Tomescu, A. (2008). Megaphylls, microphylls and the evolution of leaf development. Trends in Plant Science , 15, 5-­‐<br />

12.<br />

Van Loo, J., Coussement, P., Leenheer, L., Hoebregs, H., & Smits, G. (1995). On the presence of inulin and<br />

oligofructose as natural ingredients in the western diet. Crit. Rev. Food Sci. Nutr. , 35, 525-­‐552.<br />

Van Tieghem, P. (1898). Éléments de botanique (3 ed., <strong>Vol</strong>. I). Paris: Masson et Cie.<br />

van Wyk, B., & van Wyk, P. (2006). Field Guide to Trees of Southern Africa. Cape Town: Struik Publishers.<br />

Vasconcellos, J. (1969). Noções sobre a <strong>Morfologia</strong> Externa das Plantas Superiores. Lisboa: Ministério da Economia,<br />

Direcção Geral <strong>do</strong>s Serviços Agrícolas.<br />

Vasconcelos, M., Greven, M., Winefield, C., Trought, C., & Raw, V. (2009). The flowering process of Vitis vinifera: a<br />

review. Am. J. Enol. Vitic. , 60, 411-­‐434.<br />

Vogt, L., Bartolomaeus, T., & Giribet, G. (2009). The linguistic problem of morphology: structure versus homology and<br />

the standardization of morphological data. Cladistics , 26, 301-­‐325.<br />

Vozzo, J. (Ed.). (2002). Tropical Tree Seed Manual. Washington, D.C.: U.S. Department of Agriculture, Forest Service,<br />

Southern Research Station.<br />

Whittaker, R. (1969). New concepts of king<strong>do</strong>ms of organisms. 163, 150-­‐160.<br />

Willems, A. (2006). The taxonomy of rhizobia: an overview. Plant Soil , 287, 3-­‐14.<br />

Woese, C., Kandler, O., & Wheelis, M. (1990). Towards a natural system of organisms: proposal for the <strong>do</strong>mains<br />

Archaea, Bacteria, and Eucarya. Proc Natl Acad Sci USA , 87, 4576-­‐4579.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!