Craque é planejado no Japão e surge por acaso no Brasil, diz Levir Culpi, descobridor de Kagawa

Paulo Vinícius Coelho, de Brasília, para o ESPN.com.br
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Levir Culpi no comando do Cerezo Osaka: descobridor de Kagawa, estrela da seleção japonesa
Levir Culpi no comando do Cerezo Osaka: descobridor de Kagawa, estrela da seleção japonesa

Levir Culpi tem 60 anos, seis deles vividos no Japão. Em 2007, depois de conseguir o acesso do Atlético à Série A do Brasileirão e o título mineiro, aceitou o desafio de dirigir o Cerezo Osaka. Pensava em passar um ano. Passou cinco, voltou ao Brasil, mas não resistiu a um novo convite, ano passado. Desta vez, queria passar quatro meses. Está lá há um ano.

Seu maior feito em Osaka foi promover ao time principal o meia Shinji Kagawa, sensação do futebol europeu, bicampeão alemão pelo Borussia Dortmund e campeão da Premier League na temporada passada pelo Manchester United. Da seleção japonesa presente à Copa das Confederações, Levir também lançou o meia Kiyotake e o atacante Inui. Por telefone, de Osaka, Levir falou sobre as descobertas do futebol japonês, hoje mais planejado e organizado para descobrir talentos do que o futebol brasileiro.

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ESPN - Como é sua relação com o Shinji Kagawa?
Levir -
Ele vai me trazer uma camisa agora. Dia 25 de julho, temos um amistoso contra o Manchester United, aqui em Osaka. Todos os ingressos vendidos. O presidente fez questão de marcar esse jogo, por causa do Kagawa. Ele é adorado aqui.

ESPN - Quando você o viu jogar pela primeira vez?
Levir -
Eu o puxei em 2007 do time sub-18. Era volante, mas tinha uma capacidade tão grande de correr o campo todo e se aproximar do ataque que decidi transformá-lo em meia. O Shinji tem uma resistência fora do normal. Ele me lembra o Dirceu, o Dirceuzinho, com quem joguei no Coritiba. O Dirceu foi o jogador de melhor condição física da história da seleção. Fazia 3.800 metros em 12 minutos. O Kagawa é assim. Corre o campo inteiro. Não dá para marcá-lo.

ESPN - O técnico Zaccheroni, do Japão, escalou-o algumas vezes como centroavante. Você gosta?
Levir -
Sinceramente, não. Prefiro o Shinji como meia de ligação, vindo de trás. Em alguns amistosos, o Zaccheroni escalou um trio ofensivo, formado também pelo Inui, do Eintracht Frankfurt, e o Kiyotake, do Nuremberg, jogadores que também ajudei a lançar. A formação fica melhor com eles ou com o Kagawa como meio-campista. O problema deles é não ter um centroavante tão bom.

ESPN - Zaccheroni pode escalar Okazaki, do Stuttgart...
Levir -
Mas não é do mesmo nível dos três que eu citei.

ESPN - Quais as qualidades do Kiyotake e do Inui?
Levir -
O Kiyotake é um meia de muita visão de jogo, ótimo para fazer enfiadas de bola por baixo, em velocidade. O Inui é mais agressivo. Faz bem as infiltrações e é artilheiro. Os dois são destros. O Kagawa é ainda mais agressivo e chuta bem com os dois pés. Os três são muito habilidosos. E tem o Honda, do CSKA, também. É uma espécie de Ganso, que sabe prender a bola e organizar o jogo.

 AS DESCOBERTAS DE LEVIR CULPI NO JAPÃO
 
Kiyotake
Hiroshi Kiyotake, meia, 12/11/1989, 1,72 m, nasceu em Oita. Jogou no Oita Trinita (2008 a 2009), Cerezo Osaka (2010-12), antes do Nuremberg (desde 2012).
HISTÓRIA NAS COPAS:  Nunca disputou.
 
Inui
Takashi Inui, atacante, 2/6/1988, 1,71 m, nasceu em Omihachiman. Jogou no Yokohama Marinos (2007-09), Cerezo Osaka (2008-11), Bochum (2011-12), antes do Eintracht Frankfurt.
HISTÓRIA NAS COPAS: Nunca disputou.

ESPN - A seleção japonesa pode vencer o Brasil?
Levir -
Eu falei há algum tempo que a única chance é fazer um gol no primeiro tempo e fazer a torcida se voltar contra a seleção do Felipão. O Japão tem um time muito técnico, mas os volantes, Endo e Hasebe, são lentos na recomposição. Isso facilita ao adversário encaixar bons contra-ataques. O time também é baixo. Quase não há jogadores acima de 1,80 m. Isso cria problemas nas bolas paradas, também.

ESPN - Como é a relação com jogadores japoneses. Mais fria?
Levir -
Houve alguns problemas, como com o Inui. Fizemos um jogo contra o Gamba Osaka, perto do momento em que ele seria negociado com a Alemanha. Eu o substituí e ele não gostou. Chegou ao vestiário e deu um soco numa porta de vidro. Rasgou o braço dele inteiro. Tivemos de escondê-lo, evitar entrevistas. Mas ninguém ficou sabendo e ele pôde ser negociado pouco depois.

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ESPN - Não há relação pessoal?
Levir -
A relação é mais fria, no sentido de que não há abraços. É assim no Japão até em casamentos. Os casais não se tocam. Mas há gratidão. Quando o Shinji foi vendido para o Dortmund, sua mãe veio me trazer um presente. Dizia que o sucesso era por minha causa. Não é. É por causa do trabalho dele.

ESPN - Quando você chegou ao Japão, pensou encontrar jogadores dessa qualidade?
Levir -
Não! Mas hoje é ainda mais fácil ver jogadores de muito talento, muito técnicos, aparecendo no futebol japonês.

ESPN - No seu time hoje tem alguém com potencial para fazer na Europa o que Kagawa faz?
Levir -
Tem, sim. Yoishiro Kakitani é um jogador da mesma geração do Shinji. Jogou comigo, mas o mandei embora por indisciplina. Passou um período na Segunda Divisão e voltou. Olha, o Kakitani é até mais habilidoso do que o Neymar. Ele é mais malabarista.

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ESPN - Num par ou ímpar você escolheria Neymar ou Shinji Kagawa?
Levir -
Putz! É difícil, hein! Putz! Que difícil... Acho que o Neymar. Os números são favoráveis a ele. Tem mais gols e mais assistências.

ESPN - O Kagawa tem potencial para ser o melhor jogador do mundo?
Levir -
Não! O melhor do Japão, sim.

ESPN - E o Neymar?
Levir -
(pensativo) Acho que tem, sim. Ele tem números expressivos demais para quem tem só 21 anos.

ESPN - Você citou uma série de grandes jogadores no Japão. Ter um jogador como Kagawa é acaso ou planejamento?
Levir -
É isso! É planejamento! É trabalho! Aqui no Japão, os jogadores são mais bem preparados em termos de fundamento do que no Brasil. Desde os 4, 5 anos, você vê garotinhos chutando de pé direito, de pé esquerdo, cabeceando... Eles não têm o dom que nós temos. Mas é trabalho. O Kagawa é fruto do trabalho e do planejamento. Aqui há trabalho de divisões de base, diferente do Brasil, onde é brincadeira de mau gosto. No Brasil, não temos didática nenhuma. Aqui, sim. Por isso, surgem mais grandes jogadores japoneses a cada dia.

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