João Moutinho: Pé ante pé rumo à galeria mais ilustre

moutinho(João Moutinho teve o seu ponto alto na Seleção em 2016 com a conquista do Europeu.)

17 de Agosto de 2005. Num encontro particular frente ao Egipto, disputado em São Miguel, Açores, Luiz Felipe Scolari põe em campo um misto de consagrados da selecção nacional e de jovens aspirantes a atingir esse estatuto, com a primeira estreia a ser promovida ao intervalo: para o campo entra João Moutinho, um menino de apenas 18 anos que havia sido lançado às feras no Sporting no início do ano (com o 28 previamente usado por Cristiano Ronaldo nas costas) e cujo impacto fora de tal ordem que se estabelecera como titular no meio-campo dos leões poucas semanas depois – na final da Taça UEFA perdida de forma dolorosa em pleno Estádio de Alvalade diante dos russos do CSKA, por exemplo, esteve em campo até aos 87 minutos, saindo então para dar o lugar a Hugo Viana (já bem mais batido na altura, embora fosse também ele um jovem de apenas 21 anos).

joaomoutinho8(Moutinho já representou Portugal em três Europeus – 2008, 2012 e 2016 – e dois Mundiais – 2014 e 2018.)

Quinze anos se passaram e muito mudou – no futebol, no mundo, na vida. Uma coisa, porém, permanece inalterada: João Moutinho continua de pedra e cal nas opções do seleccionador nacional, cargo ocupado desde 2015 por Fernando Santos. Depois dos dezassete jogos somados pela selecção sob o comando de Scolari (quatro dos quais no Euro 2008, sendo titular em duas ocasiões), o médio nascido no Barreiro em 1986 mas registado em Portimão (onde passou toda a infância e adolescência até se juntar aos escalões de formação leoninos) fez mais nove no consulado de Carlos Queiroz, acabando ainda assim por ficar de fora das opções para o Mundial 2010, numa das decisões que mais polémica causou na altura – Moutinho era capitão e peça absolutamente fulcral no Sporting, tendo mesmo sido essa a sua temporada mais goleadora de sempre (nove tentos).

joaomoutinhoestreia(João Moutinho durante o jogo em que se estreou pela Seleção A.)

Esse seria o ponto mais baixo da sua relação com a selecção nacional. A partir de então, e depois de ser suplente utilizado no primeiro jogo de Agostinho Oliveira como interino (4-4 caseiro frente ao Chipre no arranque do apuramento para o Euro 2012) e de nem entrar no segundo (derrota por 1-0 na Noruega), numa altura em que se havia mudado para o Porto, num negócio que muita tinta fez correr – José Eduardo Bettencourt, o presidente leonino de então, apelidou-o mesmo de “maçã podre” -, Moutinho tornou-se absolutamente imprescindível para Paulo Bento, que já o conhecia muito bem do Sporting (além de o treinar por quatro temporadas na equipa principal já o havia comandado na formação de juniores que se sagrou campeã nacional em 04/05): foram 45 jogos sob o comando do antigo médio e só um como suplente utilizado (um particular com a Finlândia em 2011), sendo totalista (jogos e minutos) no Euro 2012 e também no Mundial 2014.

joaomoutinhosub17(João Moutinho (8) sagrou-se, em 2003, Campeão Europeu de Sub-17 em Viseu.)

Por essa altura já se havia transferido para o Mónaco, depois de em três épocas de dragão ao peito ter conquistado praticamente tudo o que havia para ganhar (três campeonatos, uma Taça de Portugal, três Supertaças e uma Liga Europa, na mítica campanha de 2010/11). Nos monegascos continuou a ser o pêndulo de sempre, mantendo-se assim também nos primeiros meses de Fernando Santos na selecção – só na fase a eliminar do Euro 2016 acabaria por perder a titularidade, sendo suplente não utilizado nos oitavos-de-final diante da Croácia e entrando na segunda parte frente a Polónia, País de Gales e também na final com a França (onde está, de resto, envolvido no lance que resultaria no histórico golo de Éder e consequente conquista do torneio por parte de Portugal).

joaomoutinhoiniesta(João Moutinho vigia Iniesta no Portugal – Espanha do Euro 2012.)

Daí para cá tem alternado entre a titularidade e o banco de suplentes (na Taça das Confederações em 2017 foi titular em três dos cinco jogos; no Mundial 2018 iniciou os dois primeiros, sendo suplente utilizado no terceiro e ficando de fora do quarto; e na Liga das Nações foi suplente utilizado nos dois jogos da final-four), mas a verdade é que, apesar da veterania (fez 34 anos em Setembro), Fernando Santos nunca prescinde dele – a exemplo do que acontece com Nuno Espírito Santo no Wolverhampton, em Inglaterra, onde João Moutinho é peça fulcral há três temporadas. Ao todo, o médio de alma algarvia soma 57 partidas pela selecção nacional desde que Santos assumiu o cargo de seleccionador e a penúltima delas permitiu-lhe alcançar uma marca incrível: ao entrar em campo ao minuto 72 da partida frente à França no Estádio da Luz (na qual Portugal saiu derrotado, perdendo assim a oportunidade de revalidar o título de campeão da Liga das Nações), João Moutinho ultrapassou o mítico Luís Figo na lista de internacionalizações A pelo nosso país, no que foi o seu jogo 128 com a principal camisola das quinas ao peito (Figo somara 127). Entretanto viria a ser titular frente à Croácia, ascendendo assim às 129 internacionalizações A – à sua frente tem agora apenas Cristiano Ronaldo, o recordista máximo com 170.

joaomoutinhogolo(Jogos são muitos, golos nem por isso: Moutinho marcou apenas por sete vezes na Seleção A.) 

É preciso ainda lembrar que Moutinho somou 42 internacionalizações nas selecções jovens: 15 nos sub-17, escalão onde fez parte da equipa que venceu o Europeu em 2003, participando ainda no Mundial do mesmo ano; 5 nos sub-18; 4 nos sub-19; 17 nos sub-21, onde marcou presença nos Europeus de 2006 e 2007; e 1 na selecção B, no Torneio Internacional de Vale do Tejo disputado em 2006. Feitas as contas, João Moutinho tem já 171 jogos feitos em representação de Portugal ao longo da carreira: números que impõem muito respeito e que, acima de tudo, demonstram a consistência do percurso de um jogador que por vezes parece passar despercebido, quase entre os pingos da chuva, mas cuja influência nas respectivas equipas é absolutamente inquestionável – e o facto de ser titular indiscutível nos mais altos patamares do futebol há 17 temporadas consecutivas, seja em Portugal, França ou Inglaterra, só vem comprovar essa ideia. Se continuará a ser opção para o Europeu do próximo ano e o Mundial de 2022, só Fernando Santos poderá responder, mas para já parece claro que ainda é cedo para começar a pensar numa convocatória da selecção nacional sem lá constar o nome do segundo português mais internacional de sempre.

*Artigo redigido por Bruno Venâncio, jornalista com passagens pelos jornais “OJOGO”, “Sol” e “I”.

Deixe um comentário