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Por Tiago Bontempo

Getty Images

18 de junho de 2002. O Japão perde por 1x0 para a Turquia e é eliminado da Copa em casa nas oitavas de final.
29 de junho de 2010. O Japão perde para o Paraguai nos pênaltis e é eliminado da Copa da África do Sul nas oitavas de final.
2 de julho de 2018. O Japão perde para a Bélgica por 3x2, de virada, e é eliminado da Copa da Rússia nas oitavas de final.
5 de dezembro de 2022. O Japão perde para a Croácia nos pênaltis e é eliminado da Copa do Catar nas oitavas de final.

Pode-se dizer que o futebol japonês superou o maior trauma de sua história, a "Agonia de Doha" (como ficou conhecido o episódio em que a vaga na Copa de 1994 foi perdida com um gol sofrido no último minuto), e fez no Catar a sua melhor campanha em uma Copa do Mundo, derrotando Alemanha e Espanha na fase de grupos. Um feito e tanto para quem nunca havia derrotado uma seleção campeã mundial em uma Copa. Porém, mais uma vez os Samurais Azuis pararam na barreira das oitavas de final e não alcançaram por pouco o objetivo no torneio, que era ficar entre os oito primeiros. Assim como nas eliminações anteriores, ficou a sensação de que dava para ter ido mais longe.

O jogo contra a Croácia foi o mais equilibrado que o Japão disputou nesta Copa. Mas o time japonês tinha uma vantagem que não utilizou: o aspecto físico. O Japão rodou mais o elenco na fase de grupos e por isso tinha jogadores mais descansados. Apenas Gonda, Yoshida, Nagatomo e Kamada foram titulares em todos os quatro jogos, sendo que só os dois primeiros não foram substituídos nenhuma vez. Já a Croácia teve nove jogadores que foram titulares em todos os jogos, incluindo o trio de meias Brozovic-Modric-Kovacic, que estavam visivelmente esgotados no segundo tempo. Mas os nipônicos não aproveitaram essa chance e preferiram segurar o empate até a disputa de pênaltis.

O Japão manteve a formação com três zagueiros, desta vez com Tomiyasu titular (no lugar do suspenso Itakura) e com Doan começando no ataque — Foto: Futebol no Japão

Aliás, o jogo foi atípico porque desta vez, ao contrário das três primeiras rodadas, o Japão fez um bom primeiro tempo, jogou melhor que o adversário e foi para o intervalo em vantagem graças a um gol de Daizen Maeda. Porém, a equipe não teve resposta ao sofrer o empate no início da segunda etapa em um cabeceio perfeito de Ivan Perisic. O lance do gol expôs uma fraqueza do sistema do sistema 3-4-3 que Moriyasu quase nunca utilizou ao longo dos últimos quatro anos, mas que durante a Copa virou a formação preferencial porque deu certo na hora do desespero contra a Alemanha. No momento de defender, os alas recuam e a formação se torna um 5-4-1, mas ter jogadores ofensivos nas alas, que não estão acostumados a defender como se fossem laterais, pagou seu preço.

Junya Ito, que tentava segurar Perisic, não é um defensor, e isso era um risco de usar essa formação desde o início. Até por isso, Hiroki Sakai entrou em campo pouco depois do gol sofrido, para dar mais estabilidade pela ala direita e deixar Ito se concentrar no ataque. Pelo lado esquerdo, Mitoma também não está acostumado a jogar tão recuado e ter que defender. Se o plano fosse jogar assim desde o início, aí Reo Hatate poderia ter sido convocado, pois ele já fez essa função e poderia explorar melhor o talento de Mitoma como os dois faziam no Kawasaki Frontale. Mitoma como ala é "mottainai" (desperdício).

Gol de Daizen Maeda deu esperanças ao Japão, que pela primeira vez nesta Copa saiu na frente no placar — Foto: Getty Images

Um problema é que, com exceção de Mitoma, Moriyasu já tinha colocado suas melhores armas em campo desde o início. O banco, que foi o diferencial do Japão contra Alemanha e Espanha, não tinha mais aqueles jogadores que podiam entrar e fazer a diferença. Com Ito e Doan já cansados e sem Kubo (lesionado, foi desfalque nesse jogo, assim como o suspenso Itakura), Mitoma era a única válvula de escape, mas os outros substitutos pouco o ajudaram. Sem poder contar muito com um Minamino fora de forma ou um Asano que foi engolido pelos zagueiros croatas, só restava ao craque japonês tentar uma jogada individual. E ele quase fez um golaço em uma arrancada, mas o chute parou no goleiro Livakovic.

De qualquer forma, o Japão jogou com cautela nos minutos finais e mais ainda na prorrogação, como se esperasse a disputa de pênaltis. Aí, porém, apareceu mais um problema da convocação e escalação. Os batedores de pênalti não estavam lá. Kamada, que bateu três pênaltis pelo Eintracht Frankfurt na atual temporada (e acertou os três), já tinha sido substituído. O cobrador oficial em todo o ciclo era Yuya Osako, que não foi convocado para a Copa (e isso faz pensar em qual o propósito de ter levado os atacantes Ayase Ueda e Shuto Machino se nenhum deles estava pronto para o Mundial). Minamino, que era a segunda opção depois de Osako, fez valer a má fase e, com um chute fraco, facilitou a defesa de Livakovic na primeira cobrança. Em seguida, quem se voluntariou (Moriyasu não escolheu os batedores, os próprios jogadores decidiram na hora) foi Mitoma, que nunca tinha cobrado um pênalti na carreira. Como acontece com frequência no futebol, o craque do time também desperdiçou.

A Croácia abriu dois gols de vantagem com Vlasic e Brozovic e só na terceira série, quando Asano converteu e Livaja chutou na trave, o Japão voltou a ter alguma esperança. Mas Yoshida errou o quarto pênalti japonês e Pasalic acertou em seguida, classificando os Quadriculados para as quartas de final. Detalhe que todos os pênaltis japoneses foram mal batidos, sem força, e o goleiro croata se consagrou ao defender três. Wataru Endo, que era cobrador de pênaltis no Shonan Bellmare desde o início da carreira, seria o quinto na sequência, mas a disputa terminou antes que ele pudesse chutar o seu.

O goleiro Livakovic defendeu as cobranças de Minamino, Mitoma e Yoshida — Foto: Getty Images

A tristeza era evidente nos jogadores japoneses. Vários choraram. Mitoma, um dos mais abatidos, não se conteve e chorou após perder o pênalti e na entrevista pós-jogo. "Faltou tudo hoje. Não temos escolha a não ser tentar vencer na próxima Copa do Mundo", disse em meio às lágrimas.

"Sinto muito por não termos vencido. Acho que não fui competente o suficiente", lamentou o treinador Hajime Moriyasu. "Não alcançamos um novo cenário nas oitavas de final, mas os jogadores mostraram um cenário maravilhoso ao derrotar Alemanha e Espanha e competir em pé de igualdade com a Croácia, seleções que estão no topo do topo do mundo. Acho que ainda há muitas coisas que temos que aprender com o mundo, mas os jogadores agora não apenas olham com respeito tentando alcançar o mundo, eles correm atrás para superar. Eles realmente mudaram a mentalidade."

A imprensa japonesa reportou que uma renovação de contrato de dois anos será oferecida a Moriyasu, com a possibilidade de extensão até a Copa de 2026. "Em primeiro lugar, eu quero continuar meu trabalho de treinador e estava pensando em fazer uma pequena pausa e ir para a Europa estudar", disse o técnico quando perguntado sobre seu futuro. "Estou acompanhando o noticiário, mas ainda não tive nenhuma conversa concreta. Ainda quero pensar sobre isso", continuou. "Eu tenho crescido pessoalmente através do futebol e pude treinar a seleção em um ambiente maravilhoso, diferente de um clube, o que levou ao meu próprio crescimento. Estou ficando velho, mas quero crescer mais ainda e quero contribuir com o futebol japonês, então quero seguir o fluxo."

"O pior dia da minha vida" - Takumi Minamino

"É claro, estou decepcionado com o resultado. Minha atuação foi um desastre e eu sinto muito pelo time. Eu preciso melhorar muito, muito para ajudar o time. Não merecemos vencer. Não consigo ficar orgulhoso. Não estou satisfeito com o que aconteceu. Preciso de um pouco de tempo para descansar e esquecer sobre futebol" - Takehiro Tomiyasu

"Jogamos de igual para igual com a Croácia. Sinto que a qualidade dos jogadores da seleção japonesa aumentou. Eu me pergunto se finalmente alcançamos uma base onde podemos lutar em pé de igualdade com o resto do mundo" - Wataru Endo

"Foi diferente de quatro anos atrás, acho que agora foi ainda mais cruel. Eu senti a grandeza que é uma Copa do Mundo" - Takuma Asano

"É claro que eu queria ficar em campo os 120 minutos e queria bater um pênalti. Eu me senti impotente assistindo do lado de fora. Joguei quatro partidas e terei 30 anos na próxima Copa, mas quero liderar o time com senso de responsabilidade. Quero voltar para o clube, jogar o máximo possível e aumentar o valor dos japoneses" - Daichi Kamada

"Joguei quatro Copas e perdi três vezes na mesma fase de oitavas de final, mas acho que o futebol japonês definitivamente cresceu. Só tenho gratidão aos jovens, que fizeram este tiozinho desajeitado jogar o seu melhor, e ao Moriyasu-san, o melhor técnico. Para crescer ainda mais, temos que desenvolver a J.League. A maioria dos jogadores aqui cresceram na J.League e agora jogam no exterior. Sempre há um time da J.League na área que você mora. Vá torcer por esse time. Se a J.League ficar mais popular, os jogadores vão crescer, a motivação vai subir e vários poderão ir para a Europa. É isso que eu quero transmitir" - Yuto Nagatomo

"Não levamos uma virada depois de estar 2x0 na frente, foi completamente diferente [de quatro anos atrás]. Daquela vez, só ficamos assistindo a um time forte se recuperar. É bem diferente. Mas é por isso que me sinto tão frustrado" - Hiroki Sakai

"Eu me senti impotente porque não estava no campo lá. Se eu quiser ser um verdadeiro craque, tenho que estar em campo nesses momentos. Fazendo ou errando o gol, eu quero ser o responsável pelo destino do time. Por isso que me senti tão desamparado" - Ritsu Doan

Copa do Mundo - Oitavas de final
Japão 1x1 Croácia (1x3 pênaltis)
Al Janoub Stadium - Público: 42.523
Gols: Daizen Maeda (43'), Ivan Perisic (55')

Notas:
Shuichi Gonda - 6,0 -
Fez defesas importantes no tempo normal, como no chute frente a frente com Perisic e na bomba que Modric mandou de longe. Infelizmente, não conseguiu defender um pênalti.
Takehiro Tomiyasu - 5,5 - Bobeou no início da partida ao errar uma tentativa de recuo e quase dar um gol de presente ao adversário. Também vacilou em uma subida ao ataque quando recebeu a bola de Mitoma na área com espaço para chutar, mas tentou um passe e errou. No resto da partida, foi seguro na marcação.
Maya Yoshida - 6,0 - Jogo de altos e baixos. Tirando um passe errado na defesa que deu contra-ataque perigoso ao adversário, foi firme na marcação e ganhou todas pelo alto, além de ainda dar a assistência para o gol de Maeda. Porém, nas penalidades chutou mal e parou em Livakovic.
Shogo Taniguchi - 6,5 - O zagueiro de quem menos se esperava, mas o que jogou melhor. Afastou o perigo da área várias vezes e quase não cometeu erros.
Junya Ito - 6,0 - Ofensivamente fez um bom jogo, mas falhou na marcação no gol sofrido.
Wataru Endo - 7,0 - Excelente nos duelos, não deu vida fácil aos meias croatas. E ainda apareceu bem no ataque. Foi o melhor japonês em campo.
Hidemasa Morita - 6,5 - Fez uma partida correta na marcação.
Yuto Nagatomo - 6,0 - Dá para acreditar que o mais criticado dos laterais do elenco foi o melhor lateral japonês na Copa? Não por acaso ele disputou seu quarto Mundial e todos como titular. Nagatomo jogou com segurança hoje e até se arriscou um pouco mais no ataque; faltou só acertar alguns cruzamentos.
Ritsu Doan - 7,0 - O melhor japonês nesta Copa, pela terceira vez teve atuação muito boa, comandando o ataque e participando do gol de Maeda.
Daichi Kamada - 5,5 - A decepção do Japão na Copa, teve mais uma atuação apagada em que pouco produziu.
Daizen Maeda - 6,5 - Chegou atrasado em dois cruzamentos em que poderia ter desviado para o gol, um pelo chão e o outro pelo alto, mas na terceira oportunidade guardou o dele. Correu bastante, como esperado, e deu trabalho para a saída de bola croata.
Kaoru Mitoma - 5,5 - Mais uma vez, o craque japonês foi guardado para o segundo tempo e só entrou depois que o Japão sofreu o gol de empate. Desta vez ele não foi efetivo como em outros jogos, mas também não teve tanto apoio dos companheiros. Ainda assim, deu um passe que encontrou Tomiyasu livre na área e quase decidiu em jogada individual na prorrogação. Lamentavelmente, perdeu sua cobrança na disputa de pênaltis.
Takuma Asano - 5,0 - Entrou para revigorar o fôlego do ataque japonês, mas só facilitou a vida de Lovren e Gvardiol, já que não ganhou nenhuma disputa contra eles. Ainda deu um passe de cabeça errado para trás na prorrogação que quase matou de susto o torcedor. Foi o único a acertar um pênalti, o que não atenuou sua péssima atuação.
Hiroki Sakai - 6,0 - Recuperado da lesão que sofreu na primeira rodada, entrou no segundo tempo como ala pela direita para que Ito pudesse se concentrar mais no lado ofensivo. O Japão deixou de sofrer na defesa pelo seu lado depois que ele entrou.
Takumi Minamino - 5,0 - A última alteração no ataque, jogou como se tivesse entrado cansado, pois não produziu nada na frente. Foi o primeiro a bater nos pênaltis, mas chutou fraco e facilitou a vida do goleiro croata.
Ao Tanaka - Sem nota - Jogou só o segundo tempo da prorrogação e apareceu pouco.
Hajime Moriyasu - 5,0 - O 3-4-3/5-4-1 que adotou de forma improvisada nesta Copa e deu certo contra Alemanha e Espanha mostrou sua fraqueza no gol sofrido ao exigir que Junya Ito marcasse um adversário como um defensor que ele não é. A estratégia desta vez funcionou bem no primeiro tempo, mas o time teve pouca resposta depois do gol de empate. Usando Doan desde o início, só sobrou Mitoma como arma efetiva saindo do banco. Não aproveitou o fato de que os jogadores croatas estavam mais cansados e no final jogou mais pelo empate, esperando a disputa de pênaltis.
(peso das notas: 5,0 = muito ruim; 5,5 = ruim; 6,0 = razoável; 6,5 = bom; 7,0 = muito bom)

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