Cristiano Ronaldo pode até ser banco nas quartas de final da Copa do Mundo, mas, se há uma certeza no time de Portugal para o jogo contra Marrocos, no próximo sábado, é que o meia Otávio estará entre os titulares. O brasileiro é uma das peças-chave do time de Fernando Santos e vive o melhor momento de sua carreira justamente no Catar.
Aos 27 anos, pouca gente conhece a fundo a personalidade discreta de um dos dois brasileiros a serviço da seleção lusitana — o outro é bem mais conhecido, o zagueiro Pepe. Na verdade, apenas os torcedores do Internacional guardam mais lembranças de Otávio no Brasil. Ele chegou ao Beira-Rio com 14 anos, em 2010, e deu por lá os primeiros passos no futebol profissional. Estreou no Colorado em 2012 e fez 62 jogos, com sete gols marcados.
Mas... E antes disso? Quem é o camisa 25 de Portugal? O ge foi atrás das raízes do menino que deixou João Pessoa para encantar os gajos e hoje é casado com a gaúcha Diandra Machado, e pai de Alice, de 7 anos; Téo, de 6; e Ayla, de 4 — esta, a única da família que realmente nasceu em Portugal.
Para falar de Otávio é preciso voltar às origens. Mais precisamente à escolinha de futsal do Esporte Clube Cabo Branco, de João Pessoa. Clube tradicional da capital paraibana, força do futebol estadual nas décadas de 1910 a 1930, o Cabo Branco virou uma referência na bola pesada. Foi lá que o hoje meia de Portugal deu os primeiros passos.
— Otávio sempre me pedia para treinar num time. Pedia isso desde que tinha 4 anos. Certo dia, numa folga que tive, aproveitei para levá-lo para o Cabo Branco. Começou na escolinha e logo foi convidado para os times principais — lembra o pai, Otávio Júnior.
No Cabo Branco, Otávio teve alguns anjos da guarda. O primeiro deles foi Nildo Gonçalves, que recebeu pai e filho nas escolinhas do clube. O treinador morreu em 2020, deixando como legado não só ter descoberto Otávio, mas também o zagueiro Rafael Thyere (hoje no Sport) e o atacante Matheus Cunha (do Atlético de Madrid).
Ex-goleiro da seleção brasileira de futsal, Mazureik Lima também foi técnico de Otávio nas categorias de base do Cabo Branco. E lembra bem o talento do garoto. Parecia um prodígio, muito acima de sua categoria.
— Otávio desde pequenino era diferenciado. Ele chutava muito bem, tinha uma vontade incrível, era guerreiro, tinha muita competitividade. Ele ficou comigo a partir dos 10 anos e era campeão de tudo que era competição. Era assim... Bola para ele e gol! Falta de qualquer lugar, ele cobrava... E gol! Foi um prazer acompanhá-lo no início da carreira e vê-lo agora, em alto nível, na seleção portuguesa - emociona-se Mazureik.
O futebol vistoso não passou despercebido. E não demorou para Otávio trocar o Cabo Branco pelo Santa Cruz, visto pelo técnico Barão — um dos olheiros mais famosos do Nordeste. A distância entre João Pessoa e Recife não chegava a ser um problema, e o garoto cansou de ir e vir pegando os 130km de rodovia entre as duas cidades. Tudo para conciliar suas duas paixões: futebol e família.
— Aos 9 anos recebemos o convite da diretoria de futsal do Santa Cruz. Eu levava o Otávio três dias na semana — terça, quinta e sábado —, para o Recife. Na época, eu fazia transporte escolar e colocava outra pessoa no meu lugar só para deixar ele no Santa Cruz. Seja no Cabo Branco ou no Santa Cruz, ele ganhou tudo no futsal — lembra Otávio Júnior, todo orgulhoso.
Foram dois anos no Santa, até que a coisa ficou séria. O próximo passo na carreira veio quase por acaso — como em todo conto de fadas. O pai lembra com carinho esse capítulo da história do hoje meia lusitano.
— O Santa Cruz decidiu pegar o time de futsal para jogar o Campeonato Pernambucano Sub-13. Isso no futebol de campo. O Santa foi vice-campeão. A final foi sábado, na Ilha do Retiro. No mesmo dia, o Inter estava treinando lá para um jogo contra o Náutico, no dia seguinte, pelo Campeonato Brasileiro. Eles acompanharam a decisão, que foi num sábado, e na terça-feira me ligaram para levar o Otávio para Porto Alegre — disse Otávio Júnior.
Otávio deixava pela primeira vez o Nordeste. Nas categorias de base do Colorado, terminou a sua formação antes de trocar de vez o futsal pelo futebol. Em 2012, então com 17 anos, estreava nos profissionais numa partida contra o Santos, pelo Brasileirão.
Logo no segundo ano como profissional, fez parte do elenco do Inter que conquistou o Gauchão em 2013. Num time treinado por Dunga e que tinha D'Alessandro como grande nome, Otávio foi se acostumando aos holofotes. No ano seguinte, conquistou com o Colorado o bicampeonato estadual, já sob o comando de Abel Braga. O Brasil começava a ficar pequeno para o talento do paraibano.
O Porto topou pagar 5 milhões de euros pelo meio-campista em 2014. Um valor que hoje pode parecer irrisório para um jogador de seleção, mas que na época era uma aposta para o garoto de 19 anos. Otávio, no entanto, ainda passou por uma espécie de "estágio" no Vitória de Guimarães, onde ficou por empréstimo durante três temporadas.
Depois disso, a consagração no futebol português. Voltou ao Porto, onde virou ídolo do time nas últimas sete temporadas. Já são 217 jogos pelo Dragão, com 25 gols marcados e nada menos que 61 assistências. E foi campeão português em 2017/18, 2019/20 e 2021/22. Números que justificaram a convocação para a sua primeira Copa do Mundo.
Otávio foi titular contra Gana, na estreia, e na partida contra a Suíça, pelas oitavas de final. Na zona mista após a partida contra os suíços, o jogador do Porto afirmou que a seleção portuguesa teve uma atuação melhor que a do Brasil, na última segunda, quando venceu a Coreia do Sul por 4 a 1.
— Portugal jogou melhor (risos) — disse o meia, quando questionado por um jornalista português.
No sábado, contra Marrocos, o brasileiro pode seguir escrevendo a história que começou no futsal do Cabo Branco há mais de duas décadas.
Otávio, jogador de Portugal, é o único paraibano na Copa do Catar
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