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RETROSPECTIVA 2010: Coritiba vai do inferno ao céu para voltar à Série A

Depois da tragédia no Couto Pereira em 2009, capitão Jeci conta que o segredo para a conquista do título da Série B é a união da 'Família do Coxa'

Por Rio de Janeiro

Curitiba, 6 de dezembro de 2009. Era domingo, dia de assistir ao jogo do Coxa e usar verde. Verde da esperança. Verde de quem acreditava que era possível espantar o fantasma da Série B. A torcida compareceu em bom número ao Couto Pereira e incentivou, com gritos de guerra. Um presságio da imagem que seria vista em seguida. Apito final, e a cor no estádio muda para vermelho. Vermelho-sangue. Começa a barbárie. Cerca de 300 torcedores invadem o gramado e transformam o estádio em um campo de batalha. Feridos, presos e a confirmação do empate com o Fluminense. Não havia mais tempo para sonhar com festa no ano do Centenário. Virou pesadelo. O Coritiba foi rebaixado à Série B do Brasileirão.

Passa o tempo, corre o calendário. Chega em 9 de novembro de 2010. Menos de um ano depois, as marcas da tragédia ainda trazem sofrimento às vítimas e um prejuízo de R$ 12 milhões em danos financeiros, segundo o vice-presidente de futebol, Vilson Ribeiro. Mas o sol voltou a brilhar na capital paranaense. Com angústia, para não perder o costume. Depois de abrir 2 a 0 sobre o Duque de Caxias, o Coxa deixou empatar aos 41 do segundo tempo. Momento de tensão, jogadores ansiosos, torcida roendo as unhas. Tcheco, então, recebeu a bola, fez fila na defesa e tocou para Marcos Aurélio mandar para o fundo das redes. Era o gol da consagração do atacante que também tinha marcado na final do Paranaense, vencida sobre o rival Atlético-PR. O gol do retorno à Série A. O gol da redenção.

Coritiba é campeão da Série BCoritiba comemora o título de campeão da Série B menos de um ano após a tragédia (Foto: Ag. Estado)

Hora de reunir a 'Família do Coxa'

A guerra entre torcedores assistida no último jogo no Couto Pereira não saía da cabeça dos jogadores. Mas um novo ano tinha começado, e eles precisavam se reapresentar ao técnico Ney Franco. A referência do clube, no entanto, não estava mais aberta ao elenco. O Couto Pereira foi interditado pelo STJD, e o Coritiba só pôde atuar no estádio pelo Campeonato Paranaense a partir de fevereiro. No entanto, a liminar ainda determinava um exílio de 29 jogos durante a Série B do Brasileirão, que foram disputados em Joinville-SC. Fora de casa, o time sabia que a missão para se reabilitar seria ainda mais difícil.

- Sabíamos que seria um ano muito complicado. Tivemos de nos apresentar no dia 4 de janeiro, menos de um mês depois do acontecido. Então, tudo ainda estava muito forte para a gente. Tinha desconfiança da torcida, da diretoria. A tarefa era muito difícil. Só que nos juntamos e decidimos que seríamos nós contra tudo e todos – garantiu o capitão Jeci.

marcos aurélio comemora gol do coritiba sobre o icasaMarcos Aurélio comemora gol sobre o Icasa no jogo 
do título (Foto: Hedeson Alves / Agência Estado)

Aos poucos, o tempo foi passando, e as vitórias foram chegando. No Paranaense, o Coxa deu o primeiro passo para fazer as pazes com a torcida. Somou nove triunfos consecutivos, uma única derrota e conquistou o título sobre o rival, Atlético-PR, com gols do ex-atleticano, Marcos Aurélio, e Geraldo.

- De repente, a torcida começou a acreditar na gente de novo. Foi ao estádio, nos deu força. Daí, engrenou uma harmonia no time que foi fora do comum. Ficamos todos juntos, em busca de um ideal. Às vezes, as pessoas me perguntam qual é o segredo da reconstrução do time. E eu respondo: “Formamos a Família do Coxa” – lembra Jeci, emocionado.

O grupo, então, seguiu seu caminho. A taça do Estadual já estava nas mãos, mas ainda faltava a principal meta da temporada. O retorno à Série A.

- A vitória no Atletiba foi o nosso trampolim. Ganhamos moral com isso. A torcida inflamou, o time confiou nele mesmo. Todo mundo voltou a acreditar. A partir daquele momento, tivemos quase que a certeza de que iríamos conseguir sair da Série B – afirmou Jeci.

Preparo psicológico sob comando de Ney Franco

Antes do Brasileirão, no entanto, havia a Copa do Brasil. E um imenso balde de água fria, com a eliminação para o Avaí, que tirou o time das oitavas de final da competição.

Veio a estreia na Série B, e, junto com ela, mais uma decepção. A derrota por 3 a 1 para o Náutico não era o resultado esperado. Em seguida, os empates com América-MG e Portuguesa. Mas, em nenhum momento, o time se deixou abalar, segundo Jeci. E o responsável por isso foi um só: o técnico Ney Franco.

- Estávamos muito bem preparados psicologicamente. O Ney conversava muito com a gente, incentivava mesmo. Falava que a gente era capaz de conquistar tudo o que queríamos. Ele tem um caráter extraordinário. Um dos melhores técnicos do Brasil. Soube levar a situação tranquilamente e conseguiu o que poucos conseguem. Titulares, reservas e até os que não eram relacionados respeitavam ele. Um cara extraordinário, que vai ser o treinador da Seleção, um dia – profetiza Jeci.

Aos poucos, o Coxa foi se encontrando em campo e subindo na tabela. A meta era estar no G-4 quando o campeonato fosse paralisado para a Copa do Mundo. Ambiciosa, mas não impossível. Em 5 de junho, a vitória por 3 a 1 sobre o Santo André garantiu o terceiro lugar pré-Copa para o Coritiba. Primeira parte da missão: cumprida.

Couto Pereira reabre com vitória do Coxa

O caminho estava livre para o Coxa. Na sequência do campeonato, a liderança foi alcançada, com um empate e três vitórias. Porém, veio agosto. E a tensão começou a aparecer. Em sete jogos, foram cinco derrotas. Só um incentivo do tamanho de um estádio poderia parar a queda de rendimento repentina do time. E ele apareceu em 18 de setembro, quando o Couto Pereira foi reaberto, e o investimento de cerca de R$ 1 milhão para obras de infraestrutura valeu a pena. O dono da casa fez a festa com 2 a 0 sobre a Portuguesa.

festa da torcida do Coritiba no estádio Couto PereiraTorcida do Coxa faz festa na reabertura do estádio Couto Pereira (Foto: Giuliano Gomes / Agência Estado)

De volta ao lar, o Coritiba manteve regularidade na competição e chegou para a partida contra o Duque de Caxias com sede de vitória. Bastava um resultado positivo para que o sonho do retorno à Série A fosse concretizado matematicamente. Tudo estava dando certo. O placar mostrava 2 a 0, com gols de Léo Gago e Enrico. Aos 32 do primeiro tempo, no entanto, Somália diminuiu para os cariocas. O cronômetro foi acelerando, e a torcida começou a comemorar em São Januário. Veio, então, o minuto 41 da etapa complementar, e, com ele, o gol de Frontini. Era o empate do Tricolor da Baixada.

Mais um balde de água fria? Mais espera para voltar à Série A? Não, o apito final ainda não tinha sido dado. Aos 43, Marcos Aurélio balançou as redes e confirmou a classificação com o 3 a 2.

Jéci levanta a taça de campeão do CoritibaJeci levanta a taça de campeão (Foto: Ag. Estado)

Para coroar a trajetória, só faltava o título. Em 20 de novembro, o time de Ney Franco empatou em 2 a 2 com o Icasa e virou torcedor do Santo André, que enfrentava o Bahia, adversário pela taça. Quando o placar em Juazeiro do Norte, anunciou a vitória da equipe do ABC Paulista, de virada, por 2 a 1, a saga paranaense estava, enfim, terminada. Final feliz para o Coxa.

- Somos fortes. Sabemos do que somos capazes. Não seria uma ou duas derrotas que iriam nos desviar do caminho. O objetivo era claro. Fomos lá e conseguimos. Mostramos que para ser do Coritiba não pode ser apenas mais um. O Coxa é tradição. Se é para entrar na briga, é para ganhar – concluiu Jeci.

Assim, foi encerrada a disputa da Série B em 2010. Com o Coritiba em primeiro lugar (71 pontos), seguido por Figueirense (67), Bahia (65) e América-MG (63). Já Brasiliense, Santo André, Ipatinga e América-RN foram rebaixados para a Série C.

ABC é campeão da Série C

Em 2010, só deu ABC na Série C. O time de Natal venceu o Ituiutaba-MG na final por 1 a 0, com gol de Cascata, e conquistou o título da competição. A campanha do time potiguar teve destaque com sete vitórias, cinco empates e somente duas derrotas, tendo um saldo de 11 gols ao término da disputa.

Além de ABC e Ituiutaba, Salgueiro-PE e Criciúma-SC também se classificaram para a Série B de 2011. A equipe de Santa Catarina, que perdeu a semifinal para a mineira nos pênaltis, após dois empates, ficou com a terceira colocação. Já o time pernambucano terminou com um ponto atrás, em quarto lugar, depois da derrota por 2 a 0 na partida de volta contra o ABC.

Já Alecrim-RN, Juventude-RS, Gama-DF e São Raimundo-PA foram rebaixados para a Série D.

Confusão e título do Guarany de Sobral na Série D

A polêmica tomou conta da fase final da Série D. Classificado à decisão, o América-AM foi punido pelo STJD pela escalação irregular de Amaral Capixaba na partida contra o Joinville e foi obrigado a pagar R$ 300 de multa, além de perder seis pontos, o que lhe tirou a vaga para a Série C. Com isso, o Joinville substituiu o time amazonense e subiu de divisão em 2011.

Independente da decisão da Justiça, o Guarany de Sobral já havia vencido o América-AM na final por 4 a 1, após o empate em 1 a 1 no jogo de ida. Por isso, o time potiguar levantou a taça e também subiu para a Série C. Madureira e Araguaína completaram a lista de classificados.