Marta: uma história de futebol e representatividade

Marta, a melhor jogadora de futebol de todos os tempos, também é um símbolo da luta feminina pela igualdade de gênero no esporte e mostra ao mundo todo que futebol é, sim, coisa de menina.

Joao Octavio Laux
Mezzala

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Arte por: Pedro José Domingues/Mezzala

A Rainha do futebol nasceu em Dois Riachos, uma cidade no interior de Alagoano, no dia 19 de fevereiro de 1986. Vindo de uma família humilde, seu pai abandonou uma casa, uma mulher e quatro filhos, quando Marta tinha um ano de idade. Desde então, foi criada pela mãe e pela avó, que são suas grandes inspirações na vida. Em uma entrevista concebida pela Agência EFE, Marta revelou que, nas peladas em que participava no seu bairro na infância, já havia um certo preconceito, e pelo fato de jogar melhor que os meninos, gerava ódio e discórdia, onde eles diziam que ela deveria parar de jogar. Mesmo passando por situações delicadas, como a fome enquanto ainda morava em Alagoas, Marta nunca se desfez da sua essência e continuou em busca do seu sonho, mesmo sem o apoio de seus irmãos.

SUA CARREIRA POR CLUBES

Arte por: Pedro José Domingues/Mezzala

Sua carreira profissional começou em 2000, quando foi contratada pelo Clube de Regatas Vasco da Gama, por onde jogou entre os anos de 2000 e 2002. Após algumas transações internas do clube, Marta foi negociada com o clube sueco Umeå IK, no ano de 2004. Por lá, a jogadora conquistou a UEFA Women’s Champions League e o tricampeonato sueco de futebol feminino (2006–2007–2008).

Marta com a camisa do Umea: (Agência Getty Images)/globoesporte.com

No ano de 2008, a jovem alagoana conquistou pela primeira vez o título de melhor jogadora do mundo e, após a conquista, foi transferida para o clube americano Los Angeles Sol, sendo anunciada no dia 12 de Janeiro de 2009. Jogando o mais fino do futebol, Marta foi artilheira da liga nacional e levou o clube ao vice-campeonato. No fim desse mesmo ano, foi emprestada ao Santos Futebol Clube, onde por lá conquistou a Copa Libertadores da América e a Copa do Brasil. Marta ainda ficou no Los Angeles Sol até o ano de 2010.

Ainda no ano de 2010, Marta foi contratada pelo FC Gold Pride, onde foi artilheira e campeã da Liga de Futebol Feminino dos Estados Unidos. Em dezembro desse mesmo ano, ela voltou ao Santos, com um contrato curto de dois meses.

Créditos: AGIF, Ricardo Saibun/globoesporte.com

No começo do ano de 2011, a Rainha do futebol volta para solo estadunidense, mas dessa vez, como reforço do Western New York Flash. Vestindo a camisa 10 do recém-fundado clube nova-iorquino e jogando ao lado da estrela americana Alex Morgan, a brasileira levou o time ao título da liga nacional daquele ano. No ano seguinte, sua volta para a Suécia se concretizou após ser contratada pelo Tyresö FF, assinando um contrato de dois anos. O clube foi campeão sueco em 2012 e vice-campeão europeu na temporada 2013–2014. Contudo, o clube faliu, e assim, Marta foi contratada pelo também sueco FC Rosengard, por um período de seis meses com uma possível prorrogação de contrato. Jogando pelo time da cidade de Malmö, a brasileira conquistou o bicampeonato nacional em 2014 e 2015 e o vice-campeonato em 2016.

No dia 7 de abril de 2017, a “mãe” do futebol foi contratada pelo Orlando Pride, clube pelo qual a brasileira ainda joga. Nesse mesmo ano, a brasileira ajudou o clube a chegar pela primeira vez aos playoffs. Desde sua chegada ao clube de Orlando, Marta atingiu a marca de 23 gols e 10 assistências em 54 jogos, se tornando a recordista pelo clube nesses quesitos. Em 2018, “Rainha” Marta conquistou seu sexto prêmio de Melhor Jogadora do Mundo da FIFA. Os outros 5 prêmios foram concedidos entre os anos 2006 e 2010 de maneira consecutiva.

Marta é seis vezes melhor jogadora do mundo

A MAIOR QUE A AMARELINHA JÁ VIU

Brasil x Itália — Copa do Mundo Feminina 2019. Marta
Créditos: Assessoria / CBF

Sua trajetória pela Seleção Brasileira de Futebol começa em 2003, nos Jogos Pan-americanos que foram realizados na cidade de Santo Domingo, República Dominicana, onde a jogadora, junto com a equipe, conquistou a medalha de ouro em sua primeira competição pela seleção. Ainda em 2003, Marta jogou Campeonato Sul-Americano. Em 2004, conquistou a medalha de prata nos jogos olímpicos de Atenas, enfrentando a boa equipe estadunidense.

Marta teve um excelente ano de 2007 vestindo a amarelinha. A jogadora ajudou a equipe a chegar pela primeira vez à final dessa competição, contribuindo com gols, entre eles o mais bonito da competição, marcado contra a seleção chinesa. Marta foi a artilheira da competição com 7 gols, sendo escolhida a melhor jogadora daquela edição, recebendo a bola de ouro. A seleção brasileira conquistou o vice-campeonato, perdendo para a Alemanha na final.

Crédito: Getty Images

As Olimpíadas de 2012, realizada em Londres, certamente foram para esquecer. Uma fatídica eliminação para seleção japonesa, perdendo por 2 a 0 nas quartas de final. Contudo, Marta e seleção brasileira deram a volta por cima em 2014, quando ganharam o Campeonato Sul-americano, disputado no Equador. Assim, sendo campeã da competição continental, a seleção garantiu a vaga na Copa do Mundo e nos Jogos Pan-americanos do ano seguinte. O Brasil fez uma excelente fase de grupos pela Copa do Mundo, ganhando os três jogos. Porém, outra vez fomos eliminados de maneira precoce, enfrentando a seleção australiana. Nos Jogos Olímpicos Rio 2016, Marta estava mais uma vez defendendo a camisa da seleção com toda a sua garra e técnica. A equipe brasileira foi eliminada na fase de semifinal, perdendo nos pênaltis para a boa equipe sueca.

A brasileira Marta, durante jogo entre Brasil e Suécia, válida pela segunda rodada do grupo E, do torneio de futebol feminino da Rio-2016/VEJA.com

Na Copa do Mundo do ano passado na França, a Rainha do futebol bateu mais um recorde após marcar contra a Itália, chegando a um total de dezessete gols na história das Copas, ultrapassando o alemão Miroslav Klose. Marta é a maior artilheira da seleção brasileira com 117 gols marcados, deixando Pelé para trás com seus 95 gols. Marta é a rainha do futebol e a maior jogadora que o Brasil já viu.

Marta comemora ao marcar gol de pênalti durante partida entre Brasil e Itália, válida pela fase de grupos da Copa do Mundo Feminina/VEJA.com

O QUE MARTA REPRESENTA

Marta é empossada como embaixadora da ONU Mulheres em Nova York — Foto: Joanna de Assis/globoesporte.com

Marta sempre se manteve forte e focada para quebrar todas as barreiras que eram impostas à ela e deixar um legado para as mulheres no futebol, além de recordes e prêmios individuais. Porém, jamais havia se mostrado como feminista nem aderido de forma clara as pautas do movimento. Em um jogo pela Copa do Mundo Feminina de 2019, quando marcou um gol de pênalti contra a seleção australiana, no segundo jogo das brasileiras na competição, a rainha chamou atenção do mundo em sua comemoração, abraçando uma causa como sua. Ao marcar o gol, Marta comemorou apontando para as chuteiras personalizadas com um símbolo pela igualdade de gênero no esporte. Após a eliminação para a França, a brasileira desabafou. Algo que pode ser interpretado como um chamado inspirador para as jovens meninas se dediquem a manter o legado de Marta: “Não vai ter uma Marta para sempre, uma Cristiane, uma Formiga. E o futebol feminino depende de vocês para sobreviver”. “ Chore no começo para sorrir no fim”, disse a jogadora.

Marta comemora apontando apontando para as chuteiras personalizadas com um símbolo pela igualdade de gênero no esporte.

Para Marta, não era difícil expandir o movimento sendo dona de uma vida repleta de desigualdades enfrentadas pela mulher, inclusive no esporte. Seu primeiro salário na Europa era equivalente a 3.000 reais. Certamente, isso não se dá por ter sido no início de sua carreira, pois até hoje, mesmo depois de consagrada internacional, ela está muito longe de receber as quantias astronômicas pagas no futebol masculino. Marta chegou à Copa da França, que por sinal foi a de maior audiência na história do futebol feminino, sem ter um contrato fixo de patrocínio, porque todas as propostas lhe ofereciam menos da metade do que já chegou a ganhar em outras temporadas.

Marta protestando contra diferença entre os preços pagos pelos patrocinadores no futebol feminino e masculino, ganhou força na web(Foto: Reprodução/Instagram)

Muito se fala sobre a desvalorização do sexo feminino no esporte ao redor do mundo. Poucos jogos televisionados, baixo valor de patrocínio e falta de apoio são um dos fatores que impedem que o futebol feminino alcance os holofotes da mídia, mas a ideia de que futebol é coisa de homem, torna essa caminhada muito mais complicada, e precisamos desconstruir isso. Marta é a prova de que mulheres são capazes de conquistar seus sonhos e se tornarem inspiração para todo o mundo.

Marta é uma embaixadora da causa pelo empoderamento das mulheres e do futebol feminino no Brasil. Seus pronunciamentos e atitudes na última Copa do Mundo mostraram que a jogadora percebe a importância de se posicionar fora dos gramados. Afirmo isso com base na sua dedicatória após bater o recorde de gols em Copas, onde ela disse que esse novo recorde não representa só a jogadora marta, e sim, todas as mulheres num esporte ainda visto por muitos como masculino. Diante de várias câmeras, a brasileira reforçou o seu engajamento em defender os direitos das que se inspiram nela, dizendo que divide a luta com as mulheres que batalham independente dos setores, e que ainda vão provar que são capazes de fazer qualquer tipo de atividade.

(Vídeo: globoesporte.com)

Marta é inspiração. Marta é, de fato, uma das pessoas mais importantes na história da luta pela igualdade de gênero. Marta é gigante, colocou o futebol feminino no mapa. Ela é a referência que tantas mulheres buscavam para poderem tornar seus sonhos em realidade. O preconceito com o futebol feminino não acabou, mas a Rainha trouxe visibilidade e respeito para a modalidade. Ela é a razão por várias meninas estarem buscando o sonho de ser jogadora cada vez mais cedo.

(Foto:futeblog.com.br)

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