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Em 1966, Portugal estreava-se nas grandes competições, alcançando o terceiro lugar no Mundial de Inglaterra, e Eusébio escrevia o seu nome na História. Cinquenta anos mais tarde, outra estrela, Cristiano Ronaldo, representa a selecção no Europeu de França de 2016.

Tudo o que precisamos de saber sobre:

– As aventuras da equipa das «quinas» em todos os Mundiais e Europeus em que participou.
– Os tiros de Eusébio, as reviengas de Chalana, o pé esquerdo de Futre e a magia de Figo.
– Dezenas de fotografias históricas, quadros de classificação e listas de jogadores.
– Cromos indispensáveis, curiosidades e segredos sobre os momentos mais emblemáticos da nossa selecção.

O Observador faz aqui a pré-publicação do livro de Rui Miguel Tovar, edição Marcador, escolhendo algumas curiosidades sobre todos os campeonatos da Europa e do Mundo onde esteve presente a seleção nacional.

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Rui Miguel Tovar é autor de “O Grande Livro da Seleção” (Créditos: Hugo Amaral/Observador)

1966 – Mundial de Inglaterra

– Os números das camisolas portuguesas são escritos em papéis, que, por sua vez, se colocam num saco. Todos os eleitos rejeitam o 13, menos um. Com ele nas costas, Eusébio marca nove golos em cinco jogos e sagra-se o rei dos melhores marcadores da prova (o segundo é o alemão Haller, com cinco).

– Na tarde de 20 de março de 1966, a quatro meses do Mundial, acontece o impensável, com o desaparecimento da Taça Jules Rimet. A Scotland Yard lança-se à procura da taça e encontra-a, sete dias depois, embrulhada num jornal, num jardim em South Norwood, também em Londres. O herói é um cão chamado Pickles.

– No Inglaterra-Argentina, para os quartos de final, o capitão Rattin pede ao árbitro alemão Kreitlein um tradutor para os seus protestos. Nada feito. E ainda recebe ordem de expulsão, por gestos, com o indicador bem afiado para fora do campo. No dia seguinte, Ken Aston (chefe dos árbitros no Mundial) tem uma ideia luminosa à frente de um semáforo: porque não criar o cartão amarelo e o vermelho para advertir os jogadores?

– O Inter chega a acordo com o Benfica. Terminado o Mundial, o avançado Eusébio vai transferir-se para Itália. Com casa escolhida em Milão e tudo. No Mundial 66, acontece o impensável: a Itália perde 1-0 com a Coreia do Norte e é eliminada em plena fase de grupos. Os adeptos italianos não perdoam e bombardeiam o autocarro da seleção, em Roma, com tomates, alfaces, nabos e cenouras. A Federação também não aceita o deslize e fecha a porta aos estrangeiros (só a reabre no início dos anos 80).

21st July 1966: Portuguese footballer, Eusebio, being escorted by two policemen to protect him from the autograph hunters who follow him everywhere. (Photo by Central Press/Getty Images)

Há muitas histórias sobre a permanência de Eusébio no Benfica na década de 1960 — e algumas até envolvem o nome de Salazar. Mas a que Rui Miguel Tovar recorda é outra (Créditos: Central Press/Getty Images)

– A final entre a anfitriã Inglaterra e a RFA é decidida no prolongamento, com um golo fantasma de Hurst: a bola bate na trave, no relvado, e não passa completamente a linha de golo (por seis centímetros, de acordo com um estudo de Ian Reid e Andrew Zisserman da Univerdidade de Oxford, em 1996). Os ingleses festejam, os alemães protestam. O árbitro suíço Gottfried Dienst está indeciso e corre em direção ao auxiliar soviético Toik Bakhramov para saber de sua justiça. As imagens são históricas, com Bakhramov a acenar energeticamente com a cabeça, indicando que sim, é golo. Hoje em dia, Bakhramov é o nome do estádio nacional em Baku, numa homenagem póstuma da Federação do Azerbaijão.

– Bicampeão em título (Suécia 1958 e Chile 1962), o Brasil começa bem (2-0 à Bulgária) e tropeça logo a seguir, com a Hungria (3-1). É a primeira derrota em 15 jogos, depois de 13 vitórias e dois empates, a mais longa sequência de sempre de uma seleção em Mundiais. Na terceira jornada da fase de grupos, o Brasil volta a perder (Portugal, 3-1) e é afastado da prova na fase de grupos, pela primeira e única vez.

– Alf Ramsey é o nome mais importante da Inglaterra campeã mundial. É ele o selecionador, contratado em outubro de 1962 para o lugar de Walter Winterbottom. Internacional pela Inglaterra nos anos 40/50, participa na derrota humilhante com os amadores dos EUA em Belo Horizonte, no Mundial 50, o primeiro de sempre dos ingleses (1-0). Dezasseis anos depois, reentra na história pela porta grande.

1984 – Europeu de França

– No final da meia final entre França e Portugal, o capitão Platini não só elogia Bento (“Nunca vi um guarda-redes defender tanto”), como ainda pede licença aos dirigentes da UEFA para falar com o árbitro italiano Paolo Bergamo, oferecendo-lhe a camisola. “Disse-me que muita gente lhe pedia a camisola como souvenir, mas que teria muito gosto em oferecer-me aquela. As suas palavras tiveram um significado imenso para mim. Ainda hoje tenho essa camisola guardada”, conta o árbitro.

MARSEILLE, FRANCE - JUNE 23: French captain and midfielder Michel Platini scores the winning goal in extra time as Portuguese goalkeeper Bento (1) and defender Frasco dive in vain during the European Nations soccer championship semi-final match between France and Portugal, 23 June 1984 in Marseille. France beat Portugal 3-2. (Photo credit should read STAFF/AFP/Getty Images)

Manuel Bento (Toni ainda hoje, quando fala do amigo, o recorda como “São Bento”) defendeu tudo e mais um par de botas na meia final contra a França. Mas Michel Platini haveria de o bater (Créditos: STAFF/AFP/Getty Images)

– A última seleção a qualificar-se para o Europeu é a Espanha. A dois pontos e com menos 11 golos do que a Holanda, a Espanha tem de golear Malta, em Sevilha, para marcar presença em França. Aos dois minutos, Señor falha um penálti. Aos 15’, Santillana abre a pista de dança. Aos 24’, Degiorgio empata e provoca a fúria. Daí até ao intervalo, mais dois golos (3-1). Na segunda parte, nada mais do que nove golos (o 12-1 pertence a Señor). Aos 90+1’, o árbitro anula mal um golo a Gordillo, que seria o 13-1. Já não interessa, a Espanha está no Euro, à frente da Holanda, pela regra dos golos marcados (24 contra 22).

– O titular da Jugoslávia na baliza é um tal Simovic, de 29 anos, do Hajduk Split. Com a Bélgica, é traído por um defesa no 1-0 e sai-se mal num canto no 2-0. Visto isto, o selecionador jugoslavo, Veselinovic, mete Ivkovic, de 25 anos, do Estrela Vermelha. É pior a emenda do que o soneto. O 1-0 é um frango (remate da linha de fundo e autogolo), o 2-0 é uma saída desafortunada, o 3-0 é de penálti, o 4-0 um tiro ao boneco, o 5-0 sem hipótese. Cinco anos depois, Ivkovic assinaria pelo Sporting.

– A mascote de Portugal chama-se Patrício. Criada por Raul de Carvalho, baseia-se na imagem do “Zé Povinho”, de Rafael Bordalo Pinheiro, em homenagem aos emigrantes portugueses em França. Em Lisboa, um grupo de artistas lança “Seleção de todos nós”, uma música de apoio aos Patrícios, com letra da autoria de António A. Pinho e música do consagrado Tozé Brito. O LP inclui um lado B com uma versão em francês, adaptação da letra do jornalista António Tavares Teles. A capa do disco é um desenho da autoria do grande mestre da caricatura Francisco Zambujal, um dos nomes grandes da história do jornal A Bola.

– Tal como Portugal, a Dinamarca estreia-se em Europeus e atinge a meia final. No caminho até à eliminação por penáltis, com a Espanha, um craque nórdico destaca-se dos demais. É ele Elkjaer, um ávido consumidor de tabaco e uísque. Nas bancadas, um jovem adepto acompanha a seleção. Chama-se Peter Schmeichel – esse mesmo, o futuro guarda-redes do Sporting. Então com 20 anos de idade, vai de carro até França para ver o jogo com a Bélgica (3-2, resolvido precisamente por Elkjaer). “Foram 38 horas de viagem, de um lado para o outro”, disse ele. “No dia seguinte, joguei pelo Bröndby e perdemos 8-1.”

1986 – Mundial do México

– A Polónia ganha-nos por 1-0, obra de um tal Wlodzimierz Smolarek. Esse golo tem a felicidadede lhe permitir a transferência para a RFA (Eintracht Frankfurt), além de lhe garantir o título de melhor jogador polaco do ano. Mas o que é isso comparado com o prémio de 1981? Cinco anos antes, Wlodzimierz é pai e dá ao filho o nome Eusebiusz, em honra do português Eusébio. E não é que Eusebiusz imita Wlodzimierz e marca a Portugal? Ainda por cima, em dose dupla (2-1 em outubro de 2006, na qualiicação para o Euro-2008).

– Peter Shilton mede 1,85 m de altura. Maradona só 1,65. Separados por 20 centímetros, o capitão argentino salta mais alto do que o guarda-redes inglês e marca golo. Os protestos são mais que muitos, mas o árbitro tunisino Ben Naceur nem liga. Bem vistas as coisas, Maradona joga a bola com a mão. Só assim é que Shilton é batido: o primeiro dos dois golos da Argentina nos quartos de final.

22 Jun 1986: Diego Maradona of Argentina handles the ball past Peter Shilton of England to score the opening goal of the World Cup Quarter Final at the Azteca Stadium in Mexico City, Mexico. Argentina won 2-1. FOTO:BONGARTS

Sim, foi com a mão. Chame-se-lhe a “Mão de Deus” ou o que se quiser chamar. Mas o outro golo da Argentina (e de Maradona) é talvez o melhor de sempre em finais (Créditos: BONGARTS/Getty Images)

– O espanhol Ramón Calderé acusa positivo no controlo antidoping mas não é suspenso, porque os médicos explicam que o medicamento tomado é contra a asma. A FIFA apenas sanciona a Federação Espanhola em 25 mil francos suíços, na ressaca de um 3-0 à Argélia, com dois golos de Calderé.

– Com o braço esquerdo engessado, Gary Winston Lineker (nasce a 30 de novembro, no mesmo dia que Winston Churchill, daí o nome do meio) é o melhor marcador da prova, com seis golos em cinco jogos. O feito vale lhe um contrato com o Barcelona e nem em Espanha vê um cartão, seja amarelo ou vermelho. O título de Sr. Limpo (Mr. Clean) assenta-lhe que nem uma luva, apesar das más-línguas sugerirem que Lineker não ajudava a defesa.

– Bicampeões mundiais em 1930 e 1950, os uruguaios deixaram de somar troféus para colecionarem atos de indisciplina. Em 2010, o suplente Lodeiro só conseguiu estar 18 minutos em campo. Foi expulso com dois cartões amarelos. Em 1986, foi igual, com um outro interveniente (Bossio), que se aguentou 19 minutos com a Dinamarca.

– O problema desse Mundial do México, de há 24 anos, foi o terceiro jogo, com a Escócia, quando o central José Batista entrou duro sobre Gordon Strachan e viu o vermelho direto logo aos 56 segundos, o que ainda hoje é um recorde dos Mundiais.

1996 – Europeu de Inglaterra

– Berti Vogts é o primeiro homem a perder uma final do Europeu como jogador (1976) e outra como selecionador (1992). Vogts, outra vez ele, é também o primeiro a ganhar o Europeu como jogador (1972) e selecionador (1996). De férias em Veneza antes do Euro-96, o selecionador alemão está com a cabeça na lua. Há dúvidas quanto à convocatória do terceiro avançado. “Leva o Bierhoff, que ele recompensar-te-á”, ajuda Monika Vogts, a mulher de Berti. Moral da história: Bierhoff entra na segunda parte da final e marca os dois golos da reviravolta com a República Checa.

– Em 1198, é o Reino da Boémia. Em 1918, já é a Checoslováquia. Em 1969, é a República Socialista da Checoslováquia. Em 1993, e até hoje, eis a República Checa. O futebol dos checos faz jus à Checoslováquia campeã europeia em 1976. À primeira tentativa, o apuramento direto, à frente da Holanda, com quem não perde (0-0, 3-1). À primeira tentativa, o apuramento para a final. E o título só não lhe assenta como uma luva porque Vladimir Smícer atira à trave ao minuto 90. Curiosamente, o avançado casara-se 48 horas antes, em Praga, com a permissão do selecionador Dusan Uhrin.

– Afastada na fase de grupos do Euro 92 e eliminada com um golo de Kostadinov aos 90+1’, no apuramento para o Mundial 94, a França reabilita-se finalmente. Para tal, conta com a astúcia de Aimé Jacquet, um treinador com provas dadas há anos e anos (campeão francês em 1985, ao serviço de Bordéus, já com Chalana no plantel). Neste Euro, o selecionador mistura os veteranos Blanc, Angloma, Desailly, Djorkaeff e Deschamps com os jovens Barthez, Thuram, Lizarazu, Karembeu, Dugarry e Zidane. Voilà, está montado o 11 que dominará o futebol em 1998 (Mundial) e 2000 (Europeu).

UNITED KINGDOM - JUNE 10: EURO 1996 ROM - FRA 0:1 Newcastle; TEAM FRANKREICH (Photo by Bongarts/Getty Images)

Era assim a França do Euro 96. Muitos destes rostos (sobretudo o de Zidane, à direita, em cima) conquistariam o Mundial e Europeu seguintes (Créditos: Bongarts/Getty Images)

– Na véspera do Alemanha-Rússia (3-0), em Old Trafford, a cidade de Manchester é vítima de um ataque do IRA (grupo paramilitar católico que pretende separar a Irlanda do Norte do Reino Unido e reanexar-se à República da Irlanda). No dia 15 de junho, um carro-bomba explode na Corporation Street. O centro da cidade é devastado e a esmagadora maioria dos prédios é destruída. Não há mortos, só 212 feridos. Cinco dias depois, o IRA emite um comunicado em que reinvidica o atentado e lamenta haver feridos.

– Além de António Oliveira, um outro selecionador português marca presença no Euro. É ele Artur Jorge. “Fui lá para o Euro 96. A pessoa que lá estava [Roy Hogdson, entretanto contratado pelo Inter] queria regressar e arranjou confusão com os amigos jornalistas. Treinar uma seleção é sempre um momento especial, mas foi uma caldeirada, digamos assim. Tivemos azar no grupo: Inglaterra, Escócia – ambas a jogar em casa –, mais a Holanda. Em função da qualidade da Suíça, foi um trajecto razoável”, afirmou, numa alusão ao empate na estreia, com a anfitriã, e às duas derrotas.

2000 – Europeu Bélgica/Holanda

– É o primeiro Europeu jogado em dois países: a candidatura de Bélgica e Holanda sai vencedora em relação às de Espanha e Áustria. Como se isso fosse pouco, a final realiza-se no Estádio Rei Balduíno, antigo Estádio Heysel, palco da infame final da Taça dos Campeões de 1985, na qual se registaram 39 mortes e mais de 600 feridos nos confrontos entre adeptos do Liverpool e da Juventus antes do jogo.

– O jogo entre a Eslovénia e a Jugoslávia é um hino ao futebol do improviso. Zahovic, Pavlin e, de novo, Zahovic garantem o avanço da Eslovénia: 3-0 aos 57 minutos. No instante seguinte, o jugoslavo Mihajlovic é expulso com duplo amarelo pelo português Vítor Pereira. Falta meia hora. A Jugoslávia está reduzida a dez homens e a perder 3-0. O que acontece? Contrariando a lógica, começa a semi-reviravolta, por Milosevic, Drulovic e, de novo, Milosevic. Acaba 3-3. Ufff!

– Nos quartos de final, Vítor Pereira expulsa outro dinossauro do futebol mundial: Gheorghe Hagi. Novamente, com dois amarelos. Quando puxa o ilme atrás, o português diz-se arrependido: “Devo dizer que errei no primeiro deles. A sua entrada sobre o Conte foi dura, mas nunca pensei que tivesse sido tão duuuura. O Conte foi substituído imediatamente [por Di Biagio, aos 56 minutos] e não jogou por seis meses, veja lá bem. Não satisfeito com isso, ele fez-se ao penálti um ou dois lances depois [59’] e mostrei-lhe o segundo amarelo”.

– No dia seguinte à meia final entre Portugal e França, a anitriã Holanda comete a proeza de falhar dois penáltis no tempo regulamentar, um na primeira parte, por Frank de Boer (defesa de Toldo), e outro na segunda, por Kluivert (ao poste), ambos já depois de o italiano Zambrotta ter sido expulso, aos 38 minutos. No desempate por grandes penalidades, os holandeses falham mais três remates, por Frank de Boer, Stam e Bosvelt. Passa a Itália, claro.

– Minuto 103 do prolongamento da final, entre Itália e França: cruzamento da esquerda de Pires e remate de primeira de Trezeguet. A bola entra junto à trave e… finito. Pelo segundo Europeu seguido, o golo dourado dita o vencedor. Ironia das ironias: a final é decidida por um francês a jogar em Itália (Juventus). E, pela primeira vez na história, um campeão mundial é campeão europeu dois anos depois. É o bug do milénio.

David Trezeguet shoots into the top corner and scores the 'Golden Goal' to win the game and the title and Francesco Toldo Goalkeeper of Italy during the final of the Football European Championships (Euro 2000) between France and Italy in Rotterdam, Netherlands on July 02, 2000 ( Photo by Eric Renard / Onze / Icon Sport via Getty Images )

O instante da “bomboca” de David Trezeguet na final contra a Itália. Toldo nem a viu (Créditos: Eric Renard/Onze/Icon Sport via Getty Images)

2002 – Mundial Coreia/Japão

– O treinador sérvio Bora Milutinovic, que só responde a convites de emprego através do e-mail milutinovic@hotmail.com, faz o seu quinto e último Mundial, sempre com equipas diferentes: México 86, Costa Rica 90, EUA 94, Nigéria 98 e China 02.

– É o Mundial do politicamente correto. A FIFA toma a decisão inédita de dividir o Mundial pelas duas fortes candidaturas (Coreia do Sul e Japão). A globalização chegara! No campo, os favoritos França (campeã em título, nem sequer marca um golo), Argentina e Portugal não passam da fase de grupos.

– No dia 30 de junho, enquanto se realiza o encontro decisivo entre Brasil e Alemanha, joga-se a final do Mundial alternativo entre as piores seleções do Mundo. De um lado, a seleção do Butão (202.ª classiicada no ranking FIFA). Do outro, Montserrat (203.ª). Acaba 4-0 para o Butão, com hat-trick de Wangay Dorji. Outro fenómeno.

– Pela segunda vez na história, um país sagra-se campeão fora do seu continente. Mais uma vez, é o Brasil que deixa a sua marca: Suécia 1958, Japão/Coreia do Sul 2002. Em seguida, a exceção vira tradição: a Espanha é campeã na África do Sul, em 2010, e a Alemanha campeã no Brasil, em 2014.

Brazil's forward Ronaldo, wrapped in the national colors, celebrates in silence on the pitch of the International Stadium Yokohama, Japan after Brazil won 2-0 against Germany in match 64 of the 2002 FIFA World Cup Korea Japan final 30 June, 2002. Ronaldo scored the two winning goals, giving Brazil its fifth World Cup title. AFP PHOTO ROBERTO SCHMIDT (Photo credit should read ROBERTO SCHMIDT/AFP/Getty Images)

Oliver Kahn foi o melhor (para a FIFA) do Mundial asiático. Pergunta: de quantas defesas do guarda-redes alemão se recorda? E de golos (e, principalmente, do penteado) de Ronaldo? Pois… (Créditos: ROBERTO SCHMIDT/AFP/Getty Images)

– O avançado argentino Caniggia é suplente no jogo com a Suécia. Só vale a vitória para a Argentina. O jogo é áspero, a Suécia joga para o empate e não tem rodeios em maltratar Ortega. À quinta falta sobre o 10, Caniggia levanta-se do banco e gesticula na direção do árbitro. Ali Bujsaim, dos EAU, pede-lhe calma. Caniggia continua, Ali ameaça-o, Caniggia provoca. Vermelho direto. É como ir para a prisão sem passar pela casa de partida no Monopólio. Caniggia é o único jogador do Mundo a ser expulso num Mundial sem ter feito um único minuto.

2004 – Europeu Portugal

Disputaram-se 31 jogos, em dez estádios, de oito cidades.

LISBON, PORTUGAL - JULY 4: Cristiano Ronaldo of Portugal in tears after the UEFA Euro 2004, Final match between Portugal and Greece at the Luz Stadium on July 4, 2004 in Lisbon, Portugal. (Photo by Ben Radford/Getty Images) *** Local Caption *** Cristiano Ronaldo

Cristiano Ronaldo, então com 19 anos, a chorar no relvado do estádio da Luz depois da final perdida para a Grécia. Maldito sejas, Charisteas! (Créditos: Ben Radford/Getty Images)

ALGARVE
Estádio do Algarve.
Lotação: 30.305 lugares.
Arranque da obra: 2 de julho de 2001.
Jogo inaugural: Portugal-Inglaterra, 18 de fevereiro de 2004.

COIMBRA
Estádio Municipal Cidade de Coimbra.
Arranque da obra: 20 de novembro de 2001.
Jogo inaugural: Académica-Benfica (1-2), 29 de outubro de 2003.

LEIRIA
Estádio Municipal Dr. Magalhães Pessoa.
Arranque da obra: 10 de setembro de 2001.
Jogo inaugural: Portugal-Kuwait (8-0), 19 de novembro de 2003.

AVEIRO
Estádio Municipal de Aveiro – Mário Duarte.
Arranque da obra: 24 de setembro de 2001.
Jogo inaugural: Portugal-Grécia (1-1), 17 de novembro de 2003.

GUIMARÃES
Estádio D. Afonso Henriques.
Arranque da obra: 28 de maio de 2001.
Jogo inaugural: Vit. Guimarães-Kaiserslautern (4-1), 25 de julho de 2003.

BRAGA
Estádio Municipal de Braga.
Arranque da obra: 11 de dezembro de 2001.
Jogo inaugural: Braga-Celta Vigo (1-0), 30 de dezembro de 2003.

2006 – Mundial Alemanha

– No mesmo dia do Portugal-Inglaterra, para os quartos de final, o Sporting faz 100 anos de vida. O centenário em Alvalade não é “aquela” coisa que se espera, porque a Seleção passa às meias finais e a festa é outra. Vale ao Sporting o herói dessa eliminatória ter sido o seu guarda-redes, Ricardo, que defende três penáltis no desempate (de Lampard, Gerrard e Carragher). É a primeira vez que um guarda-redes detém três penáltis numa série em Mundiais. Os únicos a enganá-lo são Owen e Hargreaves.

Portuguese goalkeeper Ricardo (R) saves a penalty kick of English midfielder Frank Lampard during the penalty kick of the World Cup 2006 quarter final football game England vs. Portugal, 01 July 2006 at Gelsenkirchen stadium. AFP PHOTO / ODD ANDERSEN (Photo credit should read ODD ANDERSEN/AFP/Getty Images)

Não foi só o penálti de Lampard que Ricardo defendeu contra a Inglaterra em Gelsenkirchen; defendeu outros dois e estabeleceu um recorde (Créditos: ODD ANDERSEN/AFP/Getty Images)

– Nos oitavos de final, dá-se a Batalha de Nuremberga. O que é isso? É a designação para o truculento jogo entre Portugal e Holanda, quando o árbitro russo Valentin Ivanov mostra 16 cartões amarelos e expulsa quatro jogadores (Costinha, 45’; Boulahrouz, 63’; Deco, 78’; e Van Bronckhorst, 90+5’). Bolas, é este o jogo mais violento de sempre em fases finais? Nem por isso: só 25 faltas.

– Mergulhado numa profunda crise futebolística, com o aparecimento e o desenvolvimento do Calciocaos, escândalo entre dirigentes e árbitros, a Itália entra em convulsão desportiva nas vésperas do arranque da fase final, mas a Azzurra mantém-se fiel ao seu estilo de impressionar tudo e todos nas horas mais difíceis. E, tal como em 1982 (Totocalcio), levanta a taça.

– O árbitro inglês Graham Poll é um dos favoritos para dirigir a final, mas nem sequer passa à segunda fase (ao contrário da seleção do seu país), por culpa de um clamoroso erro, ao mostrar três cartões amarelos ao mesmo jogador, o defesa croata Simunic, aos 61’, 90’ e 90+3’, contra a Austrália. A FIFA afasta-o sem pestanejar.

– A Suíça empata 0-0 com a França, ganha 2-0 ao Togo e repete o resultado com a Coreia do Sul. Apurada em primeiro lugar do grupo, joga com a Ucrânia nos oitavos de final. Aos 90’, 0-0. Aos 120’, mais do mesmo. Nos penáltis, o guarda-redes Zuberbühler defende o primeiro remate, de Shevchenko. O problema é que os suíços falham todos. É histórico, inédito. Jamais visto. A Suíça sai do Mundial sem derrotas nem golos sofridos.

2008 – Europeu Aústria e Suíça

– Vejam lá bem a Espanha de Luis Aragonés: Rússia 4-1, Suécia 2-1, Grécia 2-1 (fase de grupos), Itália 0-0 (quartos de final), Rússia 3-0 (meias finais) e Alemanha 1-0 (final). É apenas a segunda vez que uma seleção levanta o troféu só com vitórias na fase de grupos, após a França em 1984.

– Otto Rehhagel é o pior treinador de sempre a defender títulos. Depois de conquistar o Euro 2004, numa final com Portugal em pleno Estádio da Luz, o selecionador alemão da Grécia assina o pior desempenho possível, com três derrotas inapeláveis: Suécia 2-0, Rússia 1-0 e Espanha 2-1. Quem marca o golo de honra? Charisteas, pois está claro, o herói da final de 2004.

– Espanha e penáltis, que mistura insossa. Para eles, espanhóis. Se a isso juntarmos o dia 22 de junho, está o caldo entornado. Só há três exemplos, e nenhum que se aproveite. A saber, só derrotas da Espanha nesse dia: Bélgica, 5-4 no Mundial 86; Inglaterra, 4-2 no Euro 1996; Coreia do Sul, 5-3 no Mundial 2002. À quarta será de vez? Casillas defende o remate de De Rossi e ainda o de Di Natale. Com a meia final nos seus pés, Fàbregas quebra o enguiço do 22 de junho.

VIENNA, AUSTRIA - JUNE 22: Gianluigi Buffon (L) of Italy walks off dejected as Spanish players celebrate after Cesc Fabregas of Spain shoots and scores the winning penalty in the shoot out during the UEFA EURO 2008 Quarter Final match between Spain and Italy at Ernst Happel Stadion on June 22, 2008 in Vienna, Austria. (Photo by Clive Rose/Getty Images)

Gianluigi Buffon é especialista a travar penáltis, mas não conseguiu travar a fúria espanhola em Viena (Créditos: Clive Rose/Getty Images)

– É um dos jogos mais emocionantes da história dos Europeus, aquele entre Turquia e Croácia nos quartos de final. O nulo mantém-se teimosamente até aos 119’. No último instante do prolongamento, Klasnic faz o 1-0. Bola ao meio e pontapé para trás. Rüstü atira lá para a frente e Semih acerta um pontapé do meio da rua, fazendo o empate. Nos penáltis, os croatas sentem (e de que maneira) aquele golo sofrido. O resultado é de 3-1 para a Turquia.

– Um dia depois da final ganha pela Espanha à Alemanha, é altura do balanço. Xavi é naturalmente eleito o melhor do torneio. Perguntam ao escocês Andy Roxburgh, um dos elementos mais credenciados da Comissão Técnica da UEFA, qual o melhor jogo do Euro. “Portugal A-Portugal B, durante um treino aberto a 12 mil adeptos em Neuchâtel. Que grande exibição de futebol e qualidade técnica.” Entre os eleitos, Pepe, Bosingwa, Deco e Ronaldo.

2010 – Mundial África do Sul

– Portugal empata 0-0 com a Costa do Marfim, treinada por Sven-Goran Eriksson, e é a primeira vez que o sueco não vai a penáltis com portugueses: Boavista-Fiorentina na Taça UEFA 86-87, FC Porto-Sampdoria na Taça das Taças 94-95, Portugal-Inglaterra no Euro 2004 e Portugal-Inglaterra no Mundial 2006.

– A caminhada da Argentina para o título de campeã mundial em 1986 começa com a Coreia do Sul, num jogo em que Maradona é travado em falta 11 vezes, duas das quais por Huh Jung-Moo. Coincidência das coincidências, os dois voltam a cruzar-se 24 anos depois, agora como selecionadores, no Argentina-Coreia do Sul para a fase de grupos.

– No dicionário futebolístico, exemplo defensivo é sinónimo de Carlos Gamarra, o paraguaio que não faz uma única falta em todo o Mundial França-98, ao longo de 383 minutos. A Coreia do Norte entra nessa lista de ilustres benfeitores, com apenas três faltas em 94 minutos no jogo com Portugal, através de Chol-Jin, aos 32’, Yun Nam, aos 83’, e Jong-Hak, aos 90+2’.

– Bill Clinton, presidente dos EUA entre 1993 e 2001, está de férias e vai à África do Sul. Por sorte, os EUA jogam com a Argélia, num encontro resolvido por Donovan em cima do minuto 90, com um golo que significa a qualificação para os oitavos. “Bebi cerveja com os jogadores no balneário e festejei à grande. Gostei tanto da experiência, que vou ficar aqui para ver mais um jogo. Pela pátria, faço tudo.”

PRETORIA, SOUTH AFRICA - JUNE 23: Former US President Bill Clinton poses with jubilant US players in their dressing room after the 2010 FIFA World Cup South Africa Group C match between USA and Algeria at the Loftus Versfeld Stadium on June 23, 2010 in Tshwane/Pretoria, South Africa. (Photo by Jeff Mitchell - FIFA/FIFA via Getty Images)

É verdade e há uma fotografia para o comprovar: o ex-presidente Bill Clinton divertiu-se à grande e à americana com a seleção do seu país na África do Sul (Créditos: Jeff Mitchell – FIFA/FIFA via Getty Images)

– É um lateral-direito por excelência. Um dos melhores do Mundo. Recém-campeão italiano e europeu, no Inter de Mourinho. Maicon é o seu nome. Maicon? Como os seus pais, Manoel e Anísia, gostam de cinema e têm uma paixão em comum (Michael Douglas), não têm dúvidas em batizá-lo com o nome do ator. No cartório de Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul, o nome acaba por se aportuguesar, por erro do cartório: Maicon Douglas. Com o segundo filho, já não há margem para erro: Marlon Brando.

2012 – Europeu Polónia e Ucrânia

– A Espanha é infalível. O goleador do Euro 2008 e do Mundial 2010 está lesionado. E agora? O capitão sem braçadeira lesiona-se. E agora? O lateral esquerdo do Euro 2008 e do Mundial 2010 está destreinado, porque não joga no Benfica de Jesus. E agora? Adelante. Na ausência de Villa, entra Torres. Na ausência de Puyol, puxa-se Sergio Ramos para o meio e joga-se com Arbeloa à direita. Na ausência de Capdevila, entra Jordi Alba. Peça por peça, Vicente del Bosque (ser campeão europeu e mundial em clubes e seleções é feito inédito) desmonta uma Espanha e reinventa outra.

– O árbitro da final entre Espanha e Itália é português e chama-se Pedro Proença. É também ele o homem do apito na final da Liga dos Campeões desse ano, em Munique, entre Bayern e Chelsea. Pela primeira vez na história, o mesmo homem dirige os dois jogos mais importantes do ano. Nos últimos minutos de descontos da final do Euro, é Casillas quem se dirige a Proença e pede para acabar com aquilo – a Itália está destroçada e não consegue sequer tocar na bola.

KIEV, UKRAINE - JULY 01: Mario Balotelli of Italy (L) jokes with referee Pedro Proenca and Alvaro Arbeloa of Spain during the UEFA EURO 2012 final match between Spain and Italy at the Olympic Stadium on July 1, 2012 in Kiev, Ukraine. (Photo by Claudio Villa/Getty Images)

Com a malandragem de Mário Balotelli em campo, ao árbitro pede-se pulso firme e mil olhos. E Pedro Proença teve-os (Créditos: Claudio Villa/Getty Images)

– Paulo Bento tem um currículo inestimável como jogador. Tanto assim é que levanta a Taça de Portugal por três clubes (Estrela, Benfica e Sporting). Além disso, é campeão nacional em Alvalade e capitão do Oviedo. Pela Seleção, vai ao Euro 2000. Doze anos depois, repete a presença, agora como selecionador. Curiosamente, é o treinador mais novo desta fase final, com 42 anos de idade. No outro lado do ranking, com 73, está um senhor italiano chamado Giovanni Trapattoni, campeão português pelo Benfica em 2005.

– Há neste Euro um outro selecionador de nacionalidade portuguesa, além de Paulo Bento. É ele Fernando Santos. Qualificado sem derrotas (sete vitórias e três empates) nem necessidade de ir ao play-off, a Grécia é sorteada para o grupo A. Empata com a anitriã Polónia (1-1), perde com a República Checa (2-1) e ganha à Rússia (1-0). Nos quartos de final, aguenta o 0-0 com a Alemanha até aos 39 minutos e ainda faz o 1-1, aos 55’. Depois, acaba-se o sonho, por 4-2.

– O Sporting é o único clube português que se faz representar noutras seleções, através de Izmailov (Rússia) e Schaars (Holanda). A aventura dos estrangeiros da nossa 1.ª Divisão em Europeus começa em 1992 e continua por aí fora. A saber: em 1992, Iuran, Schwarz, Thern (Benfica); em 1996, Iordanov (Sporting); em 2000, Mpenza mais Schmeichel (Sporting), Drulovic (FC Porto) e Poborsky (Benfica); em 2004, Fyssas, Sokota e Andersson (Benfica); Alenitchev (FC Porto); em 2008, Linz (Sp. Braga) e Katsouranis (Benfica).

2014 – Mundial Brasil

– Nawaf Shukralia é um árbitro do Bahrain. A FIFA nomeia-o primeiro para o adeus da Espanha (frente à Austrália) e depois para o de Portugal (diante do Gana). É o árbitro menos ibérico da história.

– Götze é o quarto jogador do Bayern a marcar em finais depois de Gerd Müller, em 1974, e Breitner, em 1974 e 1982. Götze é também um dos poucos a fazê-lo com 22 anos de idade. O anterior havia sido Breitner, na tal decisão de 1974.

RIO DE JANEIRO, BRAZIL - JULY 13: Mario Goetze of Germany (L) celebrates scoring his team's first goal with Thomas Mueller during the 2014 FIFA World Cup Brazil Final match between Germany and Argentina at Maracana on July 13, 2014 in Rio de Janeiro, Brazil. (Photo by Jamie McDonald/Getty Images)

Goetze repetiu a proeza do também alemão Breitner no Rio de Janeiro. E a Alemanha trouxe o caneco do Brasil (Créditos: Jamie McDonald/Getty Images)

– Lionel Messi não toca uma vez na bola dentro da área da Holanda em 120 minutos, naquela que é a primeira meia final de sempre sem qualquer golo.

– O suíço Xherdan Shaqiri é o primeiro jogador de sempre num Mundial a assinar um hat-trick com o pé esquerdo (3-0 às Honduras).

– Nos históricos 7-1 da Alemanha ao Brasil, há três golos em 222 segundos. Vamos lá ver: 44 segundos do 2-0, de Klose, até aos 3-0, de Kroos; 13 para o 4-0, de Kroos; 165 para o 5-0, de Khedira. É dose.

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Rui Miguel Tovar é jornalista.