Há uma série de circunstâncias capazes de motivar jogos de pouca agressividade de lado a lado numa Copa do Mundo. É possível citar o fato de o torneio ser jogado num período em que os jogadores estão desgastados, e somar a isto o calor que fazia em Moscou na tarde desta terça-feira. Sem contar que, em tese, havia um prêmio pequeno e de valor incerto para o vencedor: enfrentar o segundo colocado de um grupo de desfecho até então incerto, podendo ser as palatáveis Nigéria e Islândia, mas também a Argentina que, embora caótica, tem Messi.
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Mas nem tudo no futebol pode ser visto objetivamente como questão de utilidade. O resultado, em especial quando suas consequências não são extremas como a eliminação de um Mundial, não pode se colocar acima de outros tipos de compromisso: com o jogo, com o espetáculo e, o maior de todos, com o público. E a sonora vaia que tomou o Lujniki durante boa parte do segundo tempo dá conta da percepção do público de que estava sendo lesado.
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Não há qualquer embasamento para afirmar que havia uma grande combinação. Soam até inverossímeis tais acordos envolvendo times inteiros. O futebol, por vezes, conduz a acordos tácitos, ou mesmo táticos: ninguém enxerga motivos para se arriscar e sabe que o rival pensa da mesma forma. Ocorre que desconsiderar a legião de pessoas pelo mundo que se mobilizam para um jogo de futebol é um pecado capital. Ou desconsiderar que não é tão barato, tampouco fácil comprar um ingresso para o Mundial. E no Lujniki, possivelmente havia gente que só conseguira bilhetes para aquela tarde. Enfim... O jogo não merece ser sabotado.
E, neste ponto, os dinamarqueses tiveram a postura mais controversa no campo. A França, desde o início, e qualquer que fosse o resultado entre Peru e Austrália, dependia de um ponto para ter o melhor resultado possível na fase de grupos: terminar em primeiro. E, ainda assim, se houve um time que tentou pressionar, foi o francês. Enquanto isso, embora desde o início do segundo tempo o Peru já vencesse os australianos por 2 a 0, o que anulava qualquer risco de eliminação, a Dinamarca seguiu fazendo todo o possível para que não houvesse jogo. Não mostrou qualquer interesse em buscar a primeira posição. Tampouco se constrangeu ao, sob vaias persistentes, deixar seus zagueiros trocando passes laterais.
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— Só precisávamos de um ponto, contra um dos melhores times do mundo em contra-ataques. Seria burro abrir espaços. Ficamos atrás enquanto pudemos para ter o resultado que precisávamos — disse o técnico da Dinamarca, Age Hareide, antes de ser solicitado a definir, em uma palavra, o 0 a 0 de Moscou. — Na situação em que estávamos, diria que a palavra foi disciplina.
A França fez um movimento natural: trocou seis jogadores e, dos cinco titulares que entraram em campo, dois foram substituídos — Griezmann e Lucas Hernández. Afinal, administrar minutos dos jogadores é desejo de todos a esta altura. E embora todo o jogo tenha sido condicionado pela lentidão, há aspectos negativos, característicos da formação titular, que o time voltou a apresentar. Quando tenta um jogo mais pausado, cadenciado, tem grande dificuldade de criação. Parece travar.
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Conseguiu criar chances nas raras oportunidades em que acelerou ou encontrou um contra-ataque: no primeiro tempo, um contragolpe achou a finalização de Griezmann e, mais tarde, o mesmo Griezmann conseguiu receber em profundidade, às costas da defesa dinamarquesa. Mas foi só. No segundo, após a entrada de Mbappé e Fekir, o time pressionou um pouco mais à frente.
A sensação ainda é de dificuldade para acomodar seus principais jogadores. Contra a Dinamarca, Griezmann começou como uma espécie de "camisa 10", um meia por trás de Giroud e Dembélé. Logo passou a jogar em sua melhor posição, como segundo atacante ao lado de Giroud, quando Deschamps deixou a França ordenada em duas linhas de quatro homens, com Lemar e Dembélé pelos lados. Mas nem sempre o atacante do Atlético de Madrid recebeu bolas na característica que mais se adapta a seu jogo.
— Não foi um jogo tão atraente no fim, porque o time dinamarquês estava ok com o empate. Tivemos algumas oportunidades, mas sem achar os pontos fracos deles. Não tínhamos que correr riscos porque o resultado era bom para os dois — admitiu o técnico da França, Didier Deschamps.
Sem uma grande atuação, a Dinamarca avança para as oitavas de final sem que se saiba, ao certo, o que produziriam seus jogadores de qualidade em um contexto um pouco mais ousado. Por exemplo: Eriksen, excelente no inglês Tottenham, raramente recebe bolas em boas condições de buscar o passe, com opções à sua frente. Pione Sisto, do espanhol Celta de Vigo, dedicou-se mais a ações defensivas pelo lado do campo. O jogo nunca destravou.
As vaias são plenamente justificáveis. No 0 a 0, os dois se classificaram, mas o futebol foi derrotado.