Se um Amrabat incomoda muita gente, dois incomodam muito mais. Um dos pilares da seleção do Marrocos que enfrentará Portugal nas quartas de final, o volante Sofyan Amrabat busca a cada passo — e já foram muitos neste Copa do Mundo, a ponto de ser o jogador marroquino com maior distância percorrida (48,1 km) — ser uma versão aprimorada do irmão, Nordin Amrabat, a quem já apontou como sua inspiração no futebol. Neste sábado, no jogo que vale vaga na semifinal, Sofyan terá a chance não só de mais um feito inédito pelo país do norte africano, como também de vingar um dos traumas da geração do irmão na seleção.
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Nordin, hoje com 35 anos, viu sua imagem correr o mundo na Copa de 2018 com um desabafo curto e grosso, em inglês, diante de uma câmera: "VAR is bullshit" (em português: “O VAR é uma bosta”). A bronca do ponta-direita daquela seleção marroquina veio na última rodada da fase de grupos, após sofrer um empate da Espanha nos acréscimos do segundo tempo, em um lance inicialmente anulado em campo, mas validado após revisão pelo árbitro de vídeo. O motivo da irritação, no entanto, havia surgido na partida anterior, uma derrota por 1 a 0 para Portugal que eliminou o Marrocos com antecedência.
Naquele jogo, os marroquinos reclamaram de uma falta cometida pelo zagueiro português Pepe, ignorada pela arbitragem, no lance do gol de Cristiano Ronaldo, além de dois possíveis pênaltis a favor do Marrocos — um toque com a mão do mesmo Pepe e um empurrão do zagueiro Font no atacante Boutaïb — nos quais o VAR não chamou o árbitro de campo para consultar as imagens. Depois da derrota, Nordin acusou o árbitro de pedir a camisa de Cristiano Ronaldo após o apito final; a Fifa disse que a acusação não foi comprovada. Sofyan era reserva daquela seleção e só atuou na estreia, contra o Irã, entrando no lugar do irmão, que precisou ser substituído por suspeita de concussão após um choque de cabeça.
Hoje aposentado da seleção, Nordin deixou o caçula Sofyan, de 26 anos, como um sucessor quase idêntico — a começar pelo visual careca e de barba, adotado pelo mais novo no lugar do cabelo curto e rosto liso depois que o mais velho se retirou dos “Leões do Atlas”. Assim como Nordin, que converteu-se em motorzinho do time na Rússia ao atuar muito além da ponta direita e se desdobrar na defesa e no ataque, o Amrabat versão 2022 parece onipresente na marcação: é o quarto jogador com mais desarmes e interceptações nesta Copa, 16.
Sofyan, por outro lado, evita as incursões ofensivas e o temperamento esquentado do irmão. O mais perto que chegou de causar polêmica neste Mundial, até agora, foi compartilhando nas redes sociais algumas montagens, feitas por torcedores marroquinos após a classificação sobre a Espanha, nas quais aparecia como um “fortão” se impondo diante de espanhóis como Gavi e Busquets. Emocionado após o jogo, Amrabat disse que precisou tomar injeções para superar dores nas costas e entrar em campo, um problema que deixa dúvidas sobre suas condições físicas para o duelo contra Portugal, e que também o aproxima ainda mais à imagem “raçuda” de Nordin.
— Todos gostam da vida boa, mas no futebol você exige o máximo do seu corpo todos os dias, então tem que se preparar e fazer sacrifícios. Mais jovem, quando entrava de férias da escola e dos treinos, era legal ver os amigos, mas depois de alguns dias eu já queria voltar à rotina. Para mim, a maior motivação sempre foi dar orgulho à minha família — disse Sofyan, em 2021, em entrevista ao site oficial da Fiorentina (ITA), seu clube atual.
Até a opção de Amrabat por defender Marrocos passa pelo irmão mais velho. Ambos nasceram nos arredores de Amsterdã, com família marroquina, e chegaram a defender as seleções de base da Holanda. Nordin foi o primeiro a optar pela nação dos pais, e disputou a Olimpíada de Londres-2012 pelo Marrocos. Em 2017, o então treinador da seleção holandesa, Dick Advocaat, tentou recrutar Sofyan, que foi convencido a se juntar ao Marrocos após assistir uma vitória por 3 a 0 sobre o Gabão, com o irmão mais velho em campo.
— A atmosfera do estádio (em Casablanca) estava inacreditável, até hoje me dá arrepios. Eu vi aquele jogo e, no fundo do meu coração, soube que não poderia atuar por outro país — afirmou.