Esportes Copa das Confederações

Na Copa das Confederações de 1997, o nascimento de uma dupla que não vingou: Rô-Rô

Ronaldo e Romário formaram um ataque dos sonhos que encantou a torcida. Mas o destino não os quis juntos na Copa da França
Parceria. Ronaldo e Romário fizeram 11 gols juntos Foto: Ivo Gonzalez / Ivo Gonzalez - 12.12.1997
Parceria. Ronaldo e Romário fizeram 11 gols juntos Foto: Ivo Gonzalez / Ivo Gonzalez - 12.12.1997

RIO - Muita coisa acontecia por aqui naquele dezembro de 1997 em que se realizou em Riad a primeira Copa das Confederações. Embora já tivesse esse nome – e fosse a ratificação da Fifa à ideia lançada pelos sauditas nas duas Copas Intercontinentais de 1992 e 1995 – o futebol brasileiro não parecia muito ligado nela, a ponto de a maioria de nossos jornais a tratarem como Torneio da Arábia. O próprio técnico da seleção brasileira, Mário Jorge Lobo Zagallo, admitia estar mais interessado em usar a competição como laboratório de testes para a Copa do Mundo do ano seguinte, na França, do que na possibilidade de conquistar a taça que mais uma vez levava o nome do Rei Fahd.

E o que acontecia por aqui? No dia 4, a repercussão do sorteio para a fase de grupos da Copa do Mundo, o qual punha o Brasil no mesmo grupo de Escócia, Marrocos e Noruega. Embora Zagallo falasse mais da sorte da Argentina, cujo grupo era, longe, “o mais fraco dos oito”, a quase totalidade dos analistas reconhecia que a sorte brasileira não tinha sido menor. Contra aqueles três adversários, a classificação às oitavas era praticamente certa.

De negativo para o futebol brasileiro, o sorteio só teve um ponto, felizmente extracampo: o presidente da Fifa, João Havelange, negou-se a convidar para assistir à cerimônia o ministro dos Esportes do Brasil, Edson Arantes do Nascimento, sinal de que as relações entre ambos continuavam péssimas.

O ministro recebeu o gesto de Havelange com calma e elegância. Até porque, àquela altura, tinha suas atenções voltadas para Brasília, onde, no dia 10, a Lei Pelé seria aprovada pela Câmara dos Deputados. Ao fim da cerimônia, o ministro foi às lágrimas.

Três dias antes disso, depois de conseguir junto à Fifa a liberação de seus jogadores em atividade na Europa, a seleção brasileira fazia um amistoso no Ellis Park, em Johannesburgo, contra a seleção sul-africana. A vitória por 2 a 1, gols de Romário e Bebeto, antecipava uma dúvida que rondaria Zagallo por algum tempo: dos dois tetracampeões em 1994, qual faria dupla com Ronaldo na França, uma vez que Zagallo não admitia a hipótese de escalar três atacantes? O amistoso aconteceu já a caminho de Riad, onde Ronaldo, então no Internazionale de Milão, iria se juntar à delegação.

Otimismo brasileiro

Zagallo chegou à capital saudita com muitos motivos para estar confiante. Naquele mesmo ano, com o mesmo time-base, ganhara na Bolívia a Copa América, fato que acontecia pela primeira vez fora de casa. Ganhara a Copa América e ainda por cima mandara um recado aos críticos que, desde sua volta à seleção, não o deixavam em paz: “Vocês vão ter que me engolir!”. O otimismo aumentou quando os dois grupos foram sorteados. No A, Brasil, Arábia Saudita, México e Austrália; e no B, Uruguai, República Tcheca, África do Sul e Emirados Árabes.

Se a estreia contra a Arábia Saudita foi boa (3 a 0, dois gols de Romário e um de César Sampaio), o segundo jogo, diante da sólida retranca australiana armada pelo treinador Terry Venables (que acabaria se gabando de ter descoberto “a fórmula para parar o ataque brasileiro”), deixou o técnico Zagallo apreensivo (0 a 0). Ronaldo e Bebeto, com Romário no banco, não se entenderam.

Por aqui, outro 0 a 0 soava mais alto. Era o resultado da primeira partida da decisão do Campeonato Brasileiro entre o Vasco de Antônio Lopes e o Palmeiras de Felipão. No Morumbi, Edmundo, artilheiro com 29 gols, caminhando para ser eleito o melhor jogador da competição, perdeu a cabeça, tomou a bola nas mãos e atirou-a sobre Roque Júnior. Punido com o terceiro cartão amarelo, era quase certo ficar de fora do segundo jogo, no Maracanã. Mas o quase não é tudo onde funciona o truque do “efeito suspensivo”, tão usado no Brasil. Edmundo jogou. E outro 0 a 0 deu o título ao Vasco. Longe de Riad, talvez atento à disputa entre Romário e Bebeto, o craque vascaíno não fazia por menos: já contratado pela Fiorentina, já se via como futuro “melhor do mundo” e jogando ao lado de Ronaldo na seleção.

Quem seria eleito melhor do mundo, pela revista “France Football”, foi o próprio Ronaldo, o primeiro latino-americano, depois de Di Stéfano, a receber a homenagem. Que coincidiu com sua recuperação, após três atuações decepcionantes em Riad. Na vitória por 3 a 2 sobre o México, os gols tinham sido de Romário, Denílson e Júnior Baiano. Mas já nos 2 a 0 contra a República Tcheca, ele e Romário se completaram e marcaram os gols. A decisão foi contra Austrália, a mesma da retranca do segundo jogo. E a seleção brasileira desencantou: 6 a 0 que desmoralizavam a fórmula mágica de Vanables, davam ao Brasil a Copa Fahd e punham na cabeça de Zagalo uma certeza: marcando três gols cada, jogando daquele jeito, Ronaldo e Romário seriam seus homens de frente na França.

Na volta da seleção ao Brasil, Romário estava feliz: acabara de ser contratado pelo Flamengo. Já Bebeto estava triste. Tinha plena consciência de que, definitivamente inimigo dos três atacantes, Zagallo lhe apontaria um lugar no banco. Não podia adivinhar que o azar conspiraria contra a dupla Rô-Rô.

Em 1998, atuando pelo Flamengo contra o Friburguense, em jogo do Campeonato Carioca, Romário sofreu uma contratura muscular na panturrilha. Ainda em tratamento, foi convocado para a Copa da França. Inicialmente a lesão foi tratada como leve e de rápida recuperação. Depois, conforme relatou anos mais tarde o médico Lídio Toledo, exames apontaram corte de oito centímetros no músculo, o que tornava improvável, numa segunda avaliação, o aproveitamento dele no Mundial.

A dez dias da estreia do Brasil na Copa, Romário foi cortado. A decisão renderia polêmica, mágoa e muito disse-que-me-disse. O artilheiro chorou, desapontado, na entrevista coletiva do dia do corte. Depois acusou Zagallo e o coordenador Zico de não quererem esperar por ele. Antes que a Copa terminasse Romário já estava novamente em campo, pelo Flamengo.

Ressentido, o Baixinho mandou pintar caricaturas de Zico e Zagallo, em situações que foram consideradas desrespeitosas, na porta do banheiro de uma boate da qual era dono. O episódio rendeu desavenças, processo e multa ao jogador.

A dupla com Ronaldo, que em 1997 dava esperança à torcida para a Copa do ano seguinte, ficou só nos sonhos de quem queria ver repetida em Paris a atuação de gala na final em Riad.