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A sombra da crise na Ucrânia nos Jogos Paralímpicos de Sochi

Apesar da tensão provocada pela presença de tropas russas na Crimeia, delegação ucraniana decidiu representar o país
Ukraine's flag-bearer Mykhaylo Tkachenko arrives in the stadium during the opening ceremony of the 2014 Paralympic Winter Games in Sochi, March 7, 2014. REUTERS/Alexander Demianchuk (RUSSIA - Tags: OLYMPICS SPORT TPX IMAGES OF THE DAY) Foto: ALEXANDER DEMIANCHUK / REUTERS
Ukraine's flag-bearer Mykhaylo Tkachenko arrives in the stadium during the opening ceremony of the 2014 Paralympic Winter Games in Sochi, March 7, 2014. REUTERS/Alexander Demianchuk (RUSSIA - Tags: OLYMPICS SPORT TPX IMAGES OF THE DAY) Foto: ALEXANDER DEMIANCHUK / REUTERS

MOSCOU — O canto ecoou por toda a praça da aldeia em Sochi onde os atletas paralímpicos se reuniam e cresceu enquanto o único representante da delegação ucraniana,  Mykhaylo Tkachenko, marchava: “Paz para a Ucrânia”, pediam os outros atletas. A Rússia inaugurou nesta sexta-feira os Jogos Paralímpicos de Inverno em um balneário do Mar Negro a poucas centenas de quilômetros da península ucraniana da Crimeia, onde a turbulência na Ucrânia colocou em dúvida até o último momento sua participação no evento. Estados Unidos, Reino Unido e França foram alguns dos que anunciaram um boicote à cerimônia de abertura em protesto pela política de Moscou em relação à Ucrânia.

O presidente russo, Vladimir Putin, no entanto, defendeu o evento mundial e denunciou todo vínculo com a crise na Crimeia dizendo que “seria o cúmulo do cinismo se os Jogos Paralímpicos fossem ameaçados”. Na quinta-feira, os atletas foram acolhidos com uma cerimônia simples na Vila Olímpica. Entre eles, os 31 ucranianos que confirmaram um dia depois sua participação no evento. Apesar da tensão provocada pela presença de tropas russas na Crimeia, a delegação decidiu representar o país.

— Ficamos para que as pessoas se lembrem da Ucrânia, um país soberano que enviou sua equipe para os Jogos — disse Valery Sushkevich, chefe do comitê paralímpico ucraniano. — Rezo para Deus para que os paralímpicos contribuam para a paz na Europa, no mundo, e no meu país, a Ucrânia.

A declaração foi feita após um pedido de Sushkevich para que Putin não ataque a Ucrânia durante a competição. Depois de ameaçar abandonar o evento caso a Rússia invadisse o país, o principal dirigente da delegação ucraniana voltou atrás e confirmou, nesta sexta-feira, a participação de sua equipe.

— Estamos levantando a nossa bandeira da paz — disse Suskevich. — Os atletas têm o direito participar dos Jogos em condições pacíficas. Eu desejo todo o sucesso para os atletas paralímpicos russos, mas o time ucraniano tem um desejo colossal de trazer a paz para a Ucrânia.

Na quinta-feira, Suskevich conversou por mais de duas horas com sua equipe, pedindo pensamentos positivos. Dos atletas, ele ouviu relatos conflitantes sobre uma possível intervenção russa na Crimeia. Eles não quiseram falar com a imprensa após a reunião, mas muitos seguraram o choro enquanto Sushkevych, com os próprios olhos lacrimejando, fez uma pausa para se recompor durante uma entrevista.

— Eu devo dizer a vocês, meus atletas, depois dessa cerimônia, choraram. E eu também.

Sushkevych reconheceu que a incerteza tem-se revelado uma distração para alguns de seus atletas, que acompanham a agitação no país através da internet. Um deles, Grygorii Vovchynskyi, afirmou na sexta-feira que a Ucrânia estava se preparando para competir “com um desejo ainda mais forte de vencer”.

— Nós representamos o nosso país, um país muito jovem. Estamos prontos para lutar pela Ucrânia, estamos prontos para demonstrar que somos um povo forte, livre e independente.

O país possui uma equipe forte, principalmente em dois esportes, biatlo e esqui cross-country. Nos Jogos Paralímpicos de Vancouver, em 2010, o país terminou em quinto lugar em número de medalhas com 19 vitórias, e espera-se o mesmo sucesso este ano.

A crise na Ucrânia começou quando o então presidente Viktor Yanukovich desistiu, em novembro do ano passado, de um acordo com a União Europeia, preferindo fechar um acordo financeiro com a Rússia. A decisão gerou protestos contra Yanukovich em várias partes do país, incluindo Kiev, e as manifestações culminaram com o impeachment do presidente pelo Parlamento da capital ucraniana.

Em regiões de maioria russa como a Crimeia, porém, o governo interino de Kiev não é reconhecido e parte da população ainda deseja uma aproximação com a Rússia. Enquanto o governo de Putin diz que as únicas tropas russas na Crimeia são as baseadas em Sevastopol — os soldados que ocuparam posições na região na semana passada não usam insígnias em seus uniformes —, a Ucrânia defende que milhares de tropas extras chegaram e se espalharam por toda a península, o que violaria o tratado que rege a base.