O camisa 10
Serginho destaca a boa infraestrutura e o potencial dos jovens atletas que compõem o elenco do Vôlei Ribeirão

O camisa 10

Com uma trajetória consolidada e repleta de vitórias, o líbero Sérgio Dutra Santos traz experiência e competitividade para o Vôlei Ribeirão

Fundado em junho de 2017, o Vôlei Ribeirão conquistou dois títulos expressivos logo na temporada de estreia. O time, presidido pelo atleta Lipe Fonteles e comandado pelo técnico Marcos Pacheco, venceu a Taça Prata em outubro, e, seis meses depois, sagrou-se Campeão da Superliga B, garantindo uma vaga na principal competição nacional, a Superliga. Com investimento reduzido e elenco enxuto em comparação com os líderes da tabela, a equipe local ficou em 10º lugar entre 12 participantes — com seis vitórias e 16 derrotas —, sendo a última a evitar o rebaixamento. Para alcançar melhores resultados na edição 2019/2020, a diretoria promoveu diversas mudanças no grupo. A maior delas foi a contratação de um líbero que é um grande ídolo da modalidade e, aos 44 anos, continua brilhando em quadra.

Anunciada, oficialmente, em setembro do ano passado, a chegada de Sérgio Dutra Santos, o Serginho ou Escadinha, como é conhecido, gerou uma verdadeira comoção entre os torcedores. O jogador possui uma das carreiras mais vitoriosas do esporte. Convocado para a Seleção Brasileira em 2001, pelo técnico Bernardo Rezende, tornou-se bicampeão olímpico, em 2004 e 2016, e vice-campeão em 2008 e 2012. O currículo conta, ainda, com dois títulos mundiais — dois da Copa do Mundo e sete Ligas Mundiais —, além de acumular conquistas com os clubes, no país e no exterior, e premiações individuais. A experiência e a liderança do craque vêm contribuindo para apurar a técnica e para fortalecer o emocional dos jovens talentos que compõem o time da cidade. Os triunfos nos confrontos diretos contra Ponta Grossa, América Vôlei, Itapetininga e Maringá mostram essa evolução. Feliz por compartilhar conhecimentos com a nova geração, o camisa 10 do Vôlei Ribeirão afirma que, aqui, reencontrou o prazer de estar no ginásio e ganhou uma dose extra de motivação para fazer a diferença. 

Quais as suas impressões sobre Ribeirão Preto?

Confesso que eu não imaginava que seria assim. Já tinha vindo para cá para jogar, mas só conhecia o hotel e o ginásio. Não sabia da grandiosidade de Ribeirão Preto. A cidade é ótima e respira esporte. As pessoas são amistosas, acolhedoras e apaixonadas pelo voleibol. Faço amizade com todo mundo. Estou muito feliz.O líbero tem uma carreira repleta de vitórias com a Seleção Brasileira

Por que decidiu aceitar o desafio de integrar o elenco do Vôlei Ribeirão?

Gostei do projeto que foi apresentado. O Vôlei Ribeirão conta com uma estrutura bem montada e com profissionais extremamente competentes. Essa combinação é essencial para que os atletas tenham um bom rendimento. Todos trabalham muito por aqui. São comprometidos. O Pacheco é um excelente técnico, um líder acostumado a vencer. Vim com a missão de fazer com que esses meninos sejam competitivos e queiram ganhar títulos.

Jogar uma Superliga é uma experiência única. Tive de lutar demais por essa oportunidade e eles têm essa chance em mãos agora. Precisam ter consciência disso. Esses jovens podem fazer história vestindo a camisa de Ribeirão Preto. Podem mudar a vida de suas famílias por meio do trabalho. Potencial existe. Tento lembrá-los disso todos os dias. Não é fácil, mas é possível. Temos que ter paciência. Há muito tempo não sentia tanto prazer em estar em um ginásio. Jogar vôlei tinha se tornado uma tarefa automática, rotineira, algo normal depois de tantos anos. No Vôlei Ribeirão, vivencio uma nova dinâmica. Consigo estar em quadra sem deixar de me divertir, sempre com responsabilidade.

"Temos de ter resistência emocional para deixar os receios de lado e assumir a nossa função com propriedade, superando os erros imediatamente e concentrando todos os esforços na busca pela vitória"

Quais são as principais lições que você compartilha com os outros atletas?

Voleibol é um esporte de confirmação. Não existe um meio termo. De dez ações que você participa, oito precisam ser muito bem feitas para estar entre os titulares. Se fizer cinco, fica no banco de reservas. Se fizer três, não tem time para jogar. Os meninos são jovens, têm disposição, condicionamento físico e muita força, o que é fundamental. Com saltos, pancadas e deslocamentos, a modalidade exige intensidade e agilidade. Só que, para dar sequência à carreira, isso não basta. É preciso técnica e inteligência. Não jogamos com improviso. Vôlei é baseado em estratégia, números, estudo e, principalmente, eficiência.

O atleta tem que pensar, tomar decisões rápidas e fazer com que a ação se torne um ponto no placar. Por isso, o aspecto psicológico também deve ser trabalhado. Muitos se sentem pressionados com as cobranças, ficam abalados e não conseguem render o esperado. Temos de ter resistência emocional para deixar os receios de lado e assumir a nossa função com propriedade, superando os erros imediatamente e concentrando todos os esforços na busca pela vitória. Lembrando que não fazemos nada sozinhos. É um esporte coletivo. Muitas vezes, além de controlar nosso próprio nervosismo, precisamos ajudar nossos companheiros para elevar a confiança do time.

Você se sente à vontade em desempenhar esse papel de líder?

Sim. A minha história me preparou para assumir responsabilidades. Trabalho desde cedo para ajudar os meus pais, saí de casa com 14 anos para jogar e fui pai pela primeira vez aos 21. Além disso, essa característica faz parte da minha personalidade. Sou bastante comunicativo. Converso bastante e cobro o empenho técnico e tático dos outros atletas. Puxo a orelha, mesmo. A posição que eu ocupo demanda isso. Antes, eu atuava como ponteiro. Mesmo atacando, meus principais fundamentos já eram o passe e a defesa.

Passei a ser líbero assim que a posição foi criada, em 1998. É impossível receber pancada o tempo todo e ficar quieto. Tenho que falar com os jogadores para chegarmos ao posicionamento correto e fazer essa engrenagem funcionar com equilíbrio. Sinto um orgulho enorme por ter participado ativamente da evolução desse posto, que mudou a dinâmica da modalidade. Estive ao lado de grandes levantadores e comecei a levantar também, mas não empinava a bola para o alto. Eu acelerava o jogo com o Giba, o Dante e o Giovane, por exemplo. Com isso, a nossa seleção fugia do padrão. Era difícil nos marcar. Era tudo muito rápido. Hoje, é muito legal ver que o meu jeito de jogar influenciou outros atletas pelo mundo, que as minhas conquistas ajudaram a evidenciar a importância dessa posição. O líbero pode, sim, ser decisivo em uma partida.   

Os ingressos para as partidas na Cava do Bosque são trocados por alimentos, fraldas e brinquedos, posteriormente entregues para instituições de caridade da cidade. Essa iniciativa do time pesou na sua decisão, já que você também desenvolve um trabalho de transformação social?

Eu vim para Ribeirão Preto para jogar, para ser um atleta, mas, esse aspecto social, sem dúvida, é um bônus. Gosto, de verdade, de ajudar as pessoas. É gratificante. Diante das dificuldades, o mínimo que podemos fazer é estender a nossa mão. Às vezes, um minuto de atenção, uma simples conversa, uma palavra de motivação pode salvar a vida de alguém. Já vi isso acontecer várias vezes. O Vôlei Ribeirão tem um projeto bem interessante nesse sentido.

Esse esporte me deu tudo o que eu tenho. Agora, é a minha vez de retribuir. Por isso, criei o Instituto Serginho 10, em Guarulhos, cidade onde iniciei minha trajetória como atleta. Está sendo uma importante realização pessoal. Sei que com o esporte e a educação podemos promover a inclusão social, transformar realidades e contribuir para que as crianças e os adolescentes atendidos no espaço tenham um futuro melhor. Atualmente, são cerca de 300 participantes, com uma fila de espera que já conta com mais de 200 nomes. Tenho grandes sonhos em relação ao Instituto. A ideia é construir uma escola bem ao lado e oferecer ensino gratuito de qualidade. Estamos batalhando para isso.     

“Não sei se paro de jogar depois deste campeonato, mas, quando esse dia chegar, não haverá sofrimento”, afirma o atleta

Existe um segredo para trilhar uma carreira tão longeva?

Não bebo, não fumo e sempre fui uma pessoa muito disciplinada. Em cada exercício, em cada treino e em cada jogo, dou o meu máximo. Posso estar extremamente cansado ou com dor, mas só desabo quando saio da quadra. Também sou muito alegre e brincalhão. Gosto de descontrair para animar o time. Nunca fui mal humorado. Encaro o vôlei de forma leve, porque é o que eu amo fazer. 

O campeonato ainda está em andamento, mas você já pensa na próxima temporada?

Ainda não. O foco está nesta edição. Só quando o calendário terminar vou tirar um tempo para analisar os prós e os contras da temporada. A partir daí, decido qual caminho tomar. Sempre coloquei na minha cabeça que um dia a minha carreira como atleta de voleibol vai acabar. Fiquei quatro meses parado antes de receber a proposta do Vôlei Ribeirão e já estava me preparando para a aposentadoria. Não sei se paro de jogar depois deste campeonato, mas, quando esse dia chegar, não haverá sofrimento. Soube aproveitar intensamente essa jornada.

 

Texto: Paula Zuliani 

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