SALVADOR

Goleiro dos Estados Unidos quebra recorde de defesas em mundiais

Tim Howard é eleito o craque do jogo, mas vê seleção norte-americana ser eliminada pela Bélgica no tempo extra

postado em 02/07/2014 10:19 / atualizado em 02/07/2014 10:39

Lorrane Melo - Enviada especial /Enviada especial

AFP PHOTO / ADRIAN DENNIS
 

Salvador — Tim Howard é o mais carinhoso, embora se aqueça de modo diferente, distante do segundo e do terceiro goleiros. Aos 35 anos, necessita de um tratamento especial. Sempre foi assim. Mas isso não significa que ele não possa ser igual aos outros por ter sido diagnosticado, ainda criança, com a síndrome de Tourette, um distúrbio neurológico que tem como principal consequência provocar movimentos involuntários dos músculos: tiques capazes de atrapalhar a vida de qualquer goleiro, mas que o americano foi capaz de controlar com táticas de relaxamento e meditação.

Ontem mesmo, na Arena Fonte Nova, a língua se moveu mais do que devia e a sobrancelha precisou ser contida com os dedos. As mãos — e por que não os pés? —, quando necessárias, no entanto, estavam prontas. Gigantes, tomavam a trave abençoada por todos os santos e acostumada a ver passar uma, duas, várias bolas em todos os jogos desde que a Copa do Mundo aterrissou na Bahia. Com Howard ali, foi diferente. O estádio presenciou um novo massacre. Desta vez, sem goleadas. O arqueiro dos Estados Unidos segurou (quase) tudo o que podia e retardou ao máximo a eliminação dos norte-americanos do Mundial na derrota por 2 x 1, numa partida que seria a melhor apresentação da tal ótima geração belga na competição. Não fosse justamente uma noite protagonizada pelo homem que se vestiu de azul marinho e não gosta de chamar atenção. Ele praticou 16 defesas, quebrando o recorde, num só jogo, que pertencia ao peruano Quiroga. Na edição de 1978, o arqueiro fez 13 contra a Holanda.

“Quando as coisas ficam sérias, meus músculos me obedecem”, conta, voltando a perder o controle ao se distanciar da bola. Realmente, quando os Estados Unidos iam ao ataque — poucas vezes ontem —, Howard virava as costas. Saía de campo. Parecia desatento. Só que nunca. Os olhos que piscam incessantemente sabem se posicionar, mesmo que desajeitados. Fecham-se em um ângulo bom para ele e terrível para quem tenta ultrapassar a barreira de 1,91m de altura.

E quando ele não estava lá, aos 25 minutos do primeiro tempo, por exemplo, o lateral Beasley apareceu para cobri-lo. Porque a Tourette não o impede de nada. Muito menos de ser um bom companheiro em campo. Um líder quando a Bélgica, sempre muito superior em campo, dominava a partida.

Os Diabos Vermelhos chegaram o dobro de vezes com mais perigo. Toque de bola, intensa movimentação ofensiva e a certeza de que o time pode seguir a passos firmes nesta Copa do Mundo e enfrentar a Argentina nas quartas de final, às 13h do próximo sábado, no Mané Garrincha. Ágil, Howard fez defesa de mãos trocadas. E também contou com a sorte quando Mertens cruzou e nem De Bruyne nem Origi conseguiram alcançar. Segundos depois, mandou no travessão.

Howard dava segurança ao grupo. Mais até que o ex-cabeludo campeão mundial Jürgen Klinsmann, impaciente e coçando os poucos fios de cabelo com o ataque que formou — e que, ao contrário dele nos melhores tempos, não conseguia dar o último toque.

A Bélgica, ao contrário, com quase o dobro de posse de bola, chegava com facilidade e parava em... Howard. Ou talvez tropeçando na própria confiança. Ótima geração. Mas ainda sem formar alguém que finalize com precisão. Se tivessem um centroavante em excelente forma, os Diabos Vermelhos não suariam tanto para despachar os Estados Unidos. O placar de 2 x 1, com gols só na prorrogação, representa um engano. Para os dois lados.

Torcida americana animada
Gritos nas arquibancadas de “USA, USA”, que, às vezes, se aportuguesavam para “Es-tados Unidos, Es-tados Unidos”. Traje no estádio: biquínis, mas não no corte brasileiro, camisas de futebol… americano e caras pintadas no azul, vermelho e branco. Uma prévia do Dia da Independência. E mesmo em menor número do que nos outros jogos, eles faziam mais barulho. Os norte-americanos podem não saber jogar o tal do soccer como os outros países (embora toquem de letra), mas são especialistas em torcer e fazem um show como ninguém. E na falta de Beyoncé ou Mariah Carey para cantar o Hino Nacional, foram no gogó mesmo, fazendo inveja e arrepiando a torcida brasileira.

16
Número de defesas do goleiro Howard, dos EUA , a maior quantidade num só jogo de Copa. Ele quebrou o recorde que pertencia ao peruano Quiroga (13), na edição de 1978


Bélgica 2
Courtois; Alderweireld, Kompany, Van Buyten e Vertoghen; Witsel, Fellaini, Hazard (Chadli), De Bruyne e Mertens (Mirallas), Origi (Lukaku)
Técnico: Marc Wilmots

Estados Unidos 1
Howard; Johnson (Yedlin), González, Besler e Beasley; Cameron, Bedoya (Green), Jones, Bradley e Zusi (Wondolowski); Dempsey
Técnico: Jürgen Klinsmann

Gols: De Bruyne, aos dois, e Lukaku, aos 14 minutos do primeiro tempo da prorrogação; Green, a um minuto do segundo tempo da prorrogação
Cartões amarelos: Kompany e Cameron
Público: 51.227 presentes
Árbitro: Djamel Haimoudi (Argélia)