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Gomes revela problemas com ex-técnico do Tottenham e desejo de voltar a jogar no Brasil

Presente na Copa-2010, Gomes ainda espera uma chance para voltar à seleção - Getty Images
Presente na Copa-2010, Gomes ainda espera uma chance para voltar à seleção Imagem: Getty Images

Pedro Taveira

Do UOL, em São Paulo

15/07/2012 06h02

O goleiro Gomes viveu uma temporada atípica em 2011/12. Antes titular incontestável do Tottenham, clube com o qual chegou às quartas de final da Liga dos Campeões no ano passado, o brasileiro perdeu espaço e chegou à condição de terceira opção.

Ao UOL Esporte, Gomes revelou que tudo não passou de um desentendimento com o ex-técnico da equipe, o inglês Harry Redknapp. Agora com o português André Villas Boas no comando do time, a expectativa é voltar a jogar.

ISSO É HEURELHO DA SILVA GOMES

  • Idade: 31 anos
    Clubes: Cruzeiro, PSV e Tottenham
    Títulos: Campeonato Mineiro, Copa do Brasil e Brasileirão (2003); Campeonato Holandês (2005 a 2008) e Copa da Holanda (2005); Copa das Confederações (2005 e 2009)

O brasileiro nunca deixaria de ser titular se dependesse da torcida do Tottenham. O amor dos torcedores pelo “goleiro das defesas impossíveis” é tanto que ele é objeto de uma das mais inusitadas homenagens do futebol mundial: uma música em que os fãs o oferecem até suas esposas.

Caso não volte a ser primeira opção na equipe, o atleta de 31 anos prometeu deixar o clube. E o destino, afirmou ele, pode muito bem ser o Brasil: “se tivesse proposta, voltaria na hora”. Isso porque, apesar de estar há quatro na Inglaterra, disse que não se adaptou.

Presente na última Copa do Mundo, em 2010, Gomes falou ainda sobre a fama de falhar em momentos decisivos e a respeito da expectativa de voltar um dia a vestir a camisa da seleção brasileira.

UOL Esporte – Você foi de ídolo a terceiro reserva do Tottenham em apenas uma temporada. A que se deve essa queda repentina?
Gomes –
Não digo queda. Não joguei muito nessa temporada, foi opção do treinador. Tanto o clube conta comigo que não quis se desfazer de mim. Estou no momento perfeito, me sentindo muito bem, a expectativa é voltar a jogar. Consegui chegar com o clube às quartas de final nas Champions. O melhor momento do time foi comigo jogando. Considero um acidente de percurso. Foi opinião diferente minha e do treinador. E tanto o treinador estava com o pensamento errado que caiu.

"VOCÊ É O AMOR DA MINHA VIDA, EU O DEIXARIA DORMIR COM MINHA MULHER"

  • Gomes foi alvo de uma inusitada homenagem por parte da torcida do Tottenham. Na música, os fãs declaram seu amor pelo goleiro e o oferecem até suas mulheres.

    “Estranho. Uma maneira diferente de homenagear. Eu sei que era só brincadeira e não levei muito a serio. Teve um jogo que eu estava indo embora e o estacionamento passa no meio da torcida; eu apareci e eles cantaram. Eu sou muito bem casado, não preciso disso, não. Independente do que é, respeito. Agradeço por oferecerem as mulheres, mas vou deixar passar”, falou o brasileiro.

UOL Esporte – Houve algum problema seu com o Harry Redknapp?
Gomes –
A única coisa que aconteceu foi falta de verdade. Se ele tivesse me avisado no inicio que não ia me utilizar, tudo bem. Eu perguntei se iria me utilizar e ele disse que eu era o melhor goleiro do time. Descobri cinco minutos antes do nosso primeiro jogo na temporada que ele ia começar com o Friedel. Tinha que ter tido verdade na hora que perguntei se ia contar comigo. Foi complicado, ficou uma coisa fica desgastante. Tentei sair e ele bloqueou a transferência. E quando faltavam quatro rodadas para o fim do Inglês ele veio até mim, insatisfeito com o rendimento do goleiro dele, e pediu ‘por favor, eu preciso de você’. Eu disse pra ele que infelizmente era tarde.

UOL Esporte – Como você reagiu à contratação do veterano Brad Friedel no início da temporada?
Gomes –
Normal, até porque ele (técnico Redkanapp) disse para o presidente que queria um segundo goleiro bom. Falou que era o segundo goleiro perfeito para o clube e o presidente contratou pensando que era o segundo goleiro. O Friedel foi muito bem recebido por mim no clube e somos super amigos. Meu problema não era ele.

UOL Esporte – Você ficou marcado por alguns erros em momentos decisivos. Existe alguma falha inexplicável?
Gomes –
Eu não considero que minhas falhas foram em momentos importantes. A que eu tive contra o Real Madrid foi em jogo importante, mas que já não valia mais nada. A gente tomou 4 a 0 no primeiro jogo e o gol que eu sofri em Londres não mudaria nada. Teve também a partida contra o Chelsea. A galera fala que falhou porque foram erros muito próximos, mas ninguém fala do jogo contra o Milan que eu salvei o time e fomos para as quartas das Champions.

A única coisa que aconteceu foi falta de verdade. Se ele tivesse me avisado no inicio que não ia me utilizar, tudo bem

Gomes, sobre relação com ex-técnico

UOL Esporte – Mas pensa os erros podem ter ajudado na eventual perda de espaço ou prestígio com o técnico?
Gomes –
Acho que não. Senão o treinador não teria falado que eu ia jogar a temporada. Errei em dois jogos. Foi uma temporada super constante, bati recordes. A gente foi jogar contra a Costa do Marfim na Copa do Mundo e o Yaya Toure falou ‘você classificou o Tottenham, você foi foda’. Por uma falha talvez eu tenha pagado a conta. Eu acho, por tudo que fiz dentro do clube, que não saí do time por causa dessas falhas. Se fosse por isso, eu tinha saído e o clube não quer me deixar sair. Não iriam pedir sete milhões de euros em um goleiro de 31 anos.

UOL Esporte – André Villas Boas irá assumir o Tottenham. Qual sua opinião sobre ele?
Gomes –
A gente tem jogador que encaixa bem na filosofia dele. A gente precisava dessa mudança, estávamos jogando muito o jogo inglês. Na Inglaterra quem joga o jogo inglês se dá mal. É bola longa para o atacante escorar, a bola não passa pelo meio. (Com Redkanapp) a gente não tinha trabalho tático, era joguinho direto o tempo todo, não trabalhava uma bola parada. O Villas Boas é um cara diferente, gosta de sair jogando.

UOL Esporte – Há algum outro técnico com o qual você gostaria de trabalhar?
Gomes –
Guus Hiddink (holandês, atualmente no Anzhi Makhachkala). Trabalhei com ele no PSV, é  um cara diferenciado. Tira o máximo do jogador dentro de campo e entende dificuldade fora. É um treinador paizão.

UOL Esporte – Você criticou o treinamento dado aos goleiros na Europa. No que isso se difere do Brasil e quais as vantagem e desvantagens?
Gomes –
(Na Europa) é muito robótico. Treinamento tem que ser situação de jogo. Aqui para cair no chão é só no chute a gol. A gente passa muito tempo em pé. É diferente. Eu sinto hoje que se tivesse tido uma sequência (treinando no Brasil), se alguém tivesse essa mentalidade, eu com certeza poderia estar em um nível melhor.

UOL Esporte – Pensa que em algum momento de sua carreira poderia ter atuado em uma equipe de ponta?
Gomes –
Tive a oportunidade. Do PSV eu poderia ter saído pra outras equipes, mas o Tottenham me apresentou um projeto de trabalho, de crescimento. Antes teve rumores de Milan, Arsenal e Chelsea, mas era para ser segundo goleiro e eu não quis. Não me sinto frustrado, o Tottenham está entre os cinco maiores da Inglaterra.

GOL DA HOLANDA NA COPA-2010 É TABU ENTRE EX-GOLEIROS DA SELEÇÃO

  • Reserva de Júlio César na Copa-2010, Gomes nunca conversou com o ex-companheiro sobre o lance que eliminou o Brasil no Mundial. Na partida contra a Holanda, o então camisa 1 se desentendeu com o volante Felipe Melo e a bola batida por Wesley Snejder entrou.

    “Nunca conversamos sobre o lance. Acho que isso é muito pessoal. Talvez eu tenha um pensamento diferente do dele e ele do meu. Nós sempre comentávamos durante os treinamentos as coisas que aconteciam no jogo anterior, mas desse (derrota para a Holanda) a gente não teve oportunidade. Estava todo mundo emocionado, ele foi um dos caras que mais chorou e sentiu muito a saída da seleção da Copa”, falou Gomes.

    “Não dá pra dizer ‘olha, teve falha de comunicação’. É muito difícil, ainda mais com a Jabulani. Aquela bola era o terror dos goleiros”, completou o atleta do Tottenham.

UOL Esporte – Você está vendo o surgimento de novos goleiros na seleção. É algo que te faz trabalhar mais para não perder mais espaço ainda ou é algo que te desmotiva por não ser lembrado mais?
Gomes – Eu fui convocado duas vezes, cortado uma. Depois disso eu parei de jogar. Meu pensamento hoje é seleção, mas tenho que voltar ao meu nível. Essa temporada vai ser importante pra mim no que diz respeito a 2014. Estou numa idade fantástica. Claro que penso com minha experiência em ajudar o Brasil. A preparação para 2010 foi importante. Não joguei, mas pude sentir o clima, sei como as coisas acontecem. O grupo não está fechado, o Mano tem muitas duvidas com relação a isso, principalmente goleiro. O Jefferson tem ido, mas, fora isso não tem goleiros com constância.

UOL Esporte – Da nova geração de goleiros brasileiros tem algum nome que te chame a atenção?
Gomes –
Eu acho que a gente está com um pouco de dificuldade. Tem uma geração que não é tão nova. A geração mais nova tem o Rafael, do Santos, e o Neto, da Fiorentina. A outra galera já tem 25, 26 anos. Acho muito importante que essa garotada tenha oportunidade agora, comece a viver isso agora. Não adianta renovar sem dar experiência antes.

UOL Esporte – O Dida, que voltou ao Brasil, já falou algumas vezes que tinha um sonho de jogar no futebol inglês...
Gomes –
(Interrompe) Não aconselho. O goleiro precisa se adaptar, é muito contato físico. É o pior lugar do mundo para goleiro jogar. O juiz não vai dar falta em você na pequena área. Se você sair, tem que ser para atropelar. Os caras são fortes pra caramba e só se trabalha academia, até para trombar e ficar em pé. Nunca fui muito fã de academia e tomei porrada demais, quebrei dente, fiz dois canais. Para goleiro é difícil pra caramba... Não indicaria.


Se tivesse proposta de clube brasileiro, voltaria na hora, sem pensar. Eu já estou cansado de Europa, não consegui me adaptar

Gomes, sobre voltar a jogar no Brasil

UOL Esporte – Você também estuda uma volta ao futebol brasileiro?
Gomes –
Hoje eu já te falo que sim. Se tivesse proposta de clube brasileiro, voltaria na hora, sem pensar. O problema é que o brasileiro quer mais ou menos. O clube liga e pensa qual a possibilidade, tem especulação. O pessoal não chega e fala ‘vou querer, vamos conversar’. Aqui na Europa eles chegam e contratam. E quando fica esperando muito você não sente confiança. Eu já estou cansado de Europa. Voltaria por causa de minha família, minha mãe e irmãos. Minha mulher e meus filhos estão super bem aqui, mas eu não consegui adaptar.

UOL Esporte – Pensa em já em aposentadoria ou ainda é cedo?
Gomes –
Eu me cuido muito. Durante o tempo que eu fiquei parado, fiz muita academia, reforço muscular. Sou um cara muito caseiro, não perco muita noite de sono. Acho que tenho muito tempo na ativa porque eu me sinto bem, sei que estou bem, aguento treinamento forte. Até hoje tive poucas lesões de ficar muito tempo parado. Tenho um tempo longo ainda jogando em alto nível, imagino que uns cinco anos.